E já que segue a treta sobre a estação Angélica do Metrô, voltarei a deixar aqui o lance sobre de onde surgiu o “gente diferenciada”, uma vez que sigo vendo a galera misturando alhos com bugalhos e querendo atribuir isso à associação de moradores. Já havia escrito sobre isso aqui e aqui, bem como já repasso para o Fora de Pauta. Por que falo isso? Porque pode se estar cometendo uma senhora injustiça para com a psicóloga Guiomar Ferreira, a quem estão dizendo que é a autora de tal frase. Ela diz que nunca falou isso e que James Cimino, repórter da Folha, é que pôs palavras em sua boca. Por isso, só saberemos se ela disse mesmo isso ou não se o referido repórter mostrar a gravação da entrevista que fez com a psicóloga para a matéria dele, publicada em 13 de agosto do ano passado. Segue a matéria original (e deixarei a declaração em negrito para que a galera ver melhor):
13/08/2010 – 07h51
Moradores de Higienópolis, em SP, se mobilizam contra estação de metrô
JAMES CIMINO
DE SÃO PAULO
Um grupo de moradores de Higienópolis (bairro nobre da região central de São Paulo) iniciou um movimento com o objetivo de impedir a construção da estação Angélica da futura Linha 6 – Laranja do metrô.
A nova estação deve ocupar o espaço onde hoje há o supermercado Pão de Açúcar, na esquina da avenida Angélica com a rua Sergipe. A obra prevê desapropriações.
Abaixo-assinado elaborado pela Associação Defenda Higienópolis e espalhado por diversos condomínios da região contesta o projeto.
A principal alegação é a de que, num raio de 600 metros do local, já existem mais quatro estações e que a construção deveria ser feita na praça Charles Miller, para atender aos estudantes da Faap e aos frequentadores do estádio do Pacaembu.
No mesmo documento, os moradores manifestam a preocupação de que a obra aumente o fluxo de pessoas na região “especialmente em dias de jogos e shows” e de “ocorrências indesejáveis”.
Outro receio, diz o documento, é que a estação vire um atrativo para camelôs. Para o engenheiro civil Mario Carvalho, síndico do edifício Palmares e um dos criadores do manifesto, a contrariedade à obra é de natureza técnica.
“Eu não sou contra o metrô passar pelo bairro. Mas essa estação fica a menos de um quilômetro da estação Higienópolis. A proximidade inclusive aumenta custos de manutenção dos trens devido ao arranque e à frenagem em curto espaço de tempo.”
Carvalho critica ainda o slogan proposto pelo Metrô à nova linha. “Eles chamam essa linha de ‘universitária’, mas ela passa pela PUC, pelo Mackenzie, mas não passa pela Faap. A estação tinha que ser no Pacaembu.”
Adriano Vizoni/Folhapress
Pessoas caminham onde deve ser construida estação do metrô; moradores de Higienópolis protestam
“GENTE DIFERENCIADA”
Enquanto escolhe produtos na tradicional Bacco’s Vinhos da rua Sergipe, cujo imóvel pode ser desapropriado pelo Metrô, a psicóloga Guiomar Ferreira, 55, que trabalha e mora no bairro há 25 anos, diz ser contrária à obra.
“Eu não uso metrô e não usaria. Isso vai acabar com a tradição do bairro. Você já viu o tipo de gente que fica ao redor das estações do metrô? Drogados, mendigos, uma gente diferenciada…”
A engenheira civil Liana Fernandes, 55, cuja filha mora no bairro, retruca a psicóloga: “Pois eu acho ótimo. Mais ônibus e mais metrô significam menos carros e valoriza os imóveis.”
Com um bilhete único na mão, a publicitária Isadora Abrantes, 24, diz que a região precisa de transporte. “As pessoas contrárias à obra são antigas e conservadoras. As torcidas já passam por aqui sem metrô. A única coisa que sou contra é desapropriar o Pão de Açúcar. Tinha que desapropriar o McDonald’s.”
Para Cássia Fellet, ex-presidente da Associação de Moradores e Amigos do Pacaembu, Perdizes e Higienópolis, as críticas à futura estação não são consenso no bairro.
“É um grupo pequeno de pessoas que podem ser desapropriadas. Elas não têm representatividade”, diz. E mesmo solidária aos vizinhos, Fellet diz que o interesse público deve ser prioridade: “Higienópolis precisa do metrô e São Paulo precisa de transporte público”.
Portanto, meus caros, não foi a associação de moradores de Higienópolis que deu a tal declaração sobre “gente diferenciada”, mas, segundo a matéria, a psicóloga em questão. E a psicóloga em questão nega ter dito tal frase e que teria sido o repórter que pôs palavras em sua boca (negritarei o que ela disse a respeito):
12/05/2011 20h26 – Atualizado em 12/05/2011 20h33
Psicóloga nega ter dito que Metrô atrai ‘mendigos, gente diferenciada’ Frase se tornou mote de protestos contra o Metrô de SP.
Empresa desistiu de construir estação em avenida de bairro nobre.
Página criada no Facebook para organizar
protesto contra o Metrô de SP (Foto: Reprodução)
A psicóloga Guiomar Ferreira negou nesta quinta-feira (12) que tenha dito que a construção de uma estação de Metrô em Higienópolis, na Zona Oeste de São Paulo, atrairia “drogados, mendigos, uma gente diferenciada” para a área, um bairro nobre.
A frase consta de reportagem publicada pelo jornal “Folha de S.Paulo” em agosto do ano passado e voltou à tona depois da notícia, na quarta-feira (11), de que o Metrô de São Paulo decidiu não mais construir uma futura estação da linha 6 (ainda em projeto) na Avenida Angélica, no coração do bairro.
Desde então, a expressão se tornou um dos assuntos mais comentados no Twitter (com a hashtag #gentediferenciada) e foi usada para batizar, em tom de ironia, um protesto a favor da construção da estação no bairro, o “Churrascão da Gente Diferenciada”, organizado por meio do Facebook (veja acima).
“Eu não disse isso. A frase é dele [repórter]. Isso não faz parte do meu vocabulário”, disse Guiomar, em entrevista por telefone. Segundo ela, a publicação indica que “são pessoas diferenciadas, como se eu tivesse um preconceito terrível contra pessoas que usam drogas. Ele deturpou muito.”
Guiomar disse que o fato de o local cogitado para a estação Angélica ser próximo de outra estação prevista, a Higienópolis-Mackenzie, é o principal motivo de sua contrariedade. “É evidente que muda o perfil do bairro, […] mas eu acho que é uma perda de dinheiro duas estações a três, quatro quadras uma da outra, com tantos locais de São Paulo que precisam mais.”
Procurada pelo G1, a “Folha” informou que mantém o que foi publicado. Segundo o jornal, a entrevista foi concedida em frente de uma terceira pessoa. Informou também que não tem registro de que a psicóloga tenha contestado a declaração, seja por carta ou e-mail.
‘Churrascão’ cancelado
A manifestação “Churrascão da Gente Diferenciada” começou a ser organizada na quarta, depois da notícia, publicada na “Folha de S.Paulo”, de que a decisão do Metrô de mudar o local da estação ocorreu após pressão de moradores.
Até as 20h desta quinta, mais de 49 mil pessoas haviam confirmado presença no evento, de acordo com a página criada para esse fim no Facebook. Segundo a página, o evento, marcado para sábado, às 14h, na Praça Vilaboim, não será mais um churrasco.
“A princípio, reuniremos assinaturas e as encaminharemos ao governo do estado para que eles prestem esclarecimentos, planos concretos e datas sobre as novas estações e linhas do metrô”, diz a página.
O organizador também informa que a “ideia de modificar o evento partiu por duas razões: ainda que a subprefeitura da Sé não tivesse mostrado qualquer atitude contrária ao Churrascão, a Polícia Militar e a CET mostraram preocupação, uma vez que a avenida Higienópolis, onde o evento seria realizado, é muito estreita e mesmo que nos seja assegurado o livre direito de nos manifestar, ainda não podemos obstruir vias públicas e tampouco nos responsabilizar pelas atitudes de manifestantes mal-intencionados”.
O que diz o Metrô
Segundo o Metrô, ainda não há um endereço definido para a construção da nova estação. Em nota, a empresa estatal informou que a alteração “tem caráter exclusivamente técnico, em nada motivada por pressão dos moradores da região de Higienópolis, a favor ou contra a estação”.
“O Metrô está reavaliando a localização da futura Estação Angélica, em razão de estar apenas a 610 metros da futura Estação Higienópolis-Mackenzie e a 1.500 metros da futura Estação PUC-Cardoso de Almeida, visando melhor equilíbrio da linha. No momento, a área técnica do Metrô estuda a melhor localização de uma nova estação que atenda à Faap, Av. Higienópolis e Praça Vilaboim, assim como o Estádio do Pacaembu. A definição da nova localização depende da conclusão de estudos geotécnicos e do melhor posicionamento para implantação da obra, de forma a causar o menor impacto na região”, informa o texto.
Se a reportagem da Folha distorceu ou não o que Guiomar Ferreira disse, não saberei. Porém, não podemos descartar que possa ter havido isso. O fato de Guiomar não ter reclamado do que a Folhadisse que ela disse não significa que obrigatoriamente não possa ter havido distorção daquilo que ela disse. Quantas não são as pessoas que tiveram algo distorcido pela mídia e deixaram para lá? Se o repórter James Cimino tiver a gravação do que Guiomar disse, muito mais fácil fica de sabermos se ela disse ou não tal coisa.
++++++++++++++++++
ADENDO: segue também o texto do abaixo-assinado virtual para que a galera possa comparar, uma vez que o texto que escrevi era resposta ao do colega Rodolfo, que recortou e colou o texto original. E é mais do que adequado deixá-lo aqui para que a galera leia e veja que uma coisa é a tal suposta declaração e outra é são as razões apontadas para não haver estação na Angélica). Negritarei para facilitar a visualização:
Para:Companhia do Metropolitano de São Paulo
PORQUE NÃO QUEREMOS A ESTAÇÃO ANGÉLICA:
1 – Temos 4 estações no raio de 600 m.: Marechal Deodoro, Santa Cecília, Higienópolis (Mackenzie) e Paulista.
2 – A localização sugerida pelo Metrô envolve um alto custo de desapropriação. O custo desta estação será muito maior do que se ela fosse construída em uma área pública, como a Praça Charles Miller, Pacaembu.
3 –A linha Angélica (Linha Laranja) deveria atender a 3 universidades (PUC, FAAP e Mackenzie), porém a estação que deveria estar no Pacaembu para atender a FAAP, jogos de futebol, shows, eventos religiosos, museus e teatro não será construída, mesmo que o entorno do estádio seja claramente a distância ideal entre as estações PUC e Mackenzie.
4 – Uma estação na avenida Angélica, entre a Avenida Higienópolis e a rua Pará, aumentará o fluxo de pessoas em circulação na região, especialmente em dias de jogos e shows.
5 – O aumento deste fluxo de pessoas no bairro deve gerar um aumento de ocorrências indesejáveis, afetando a qualidade de vida dos moradores que estão acostumados a andar a pé.
6 – As obras do METRÔ causam impacto profundo nos prédios e ruas vizinhas em um raio próximo. Acidentes como o que aconteceu na construção da estação Pinheiros são imprevisíveis. Higienópolis é um bairro verticalizado com construções antigas e prédios muito próximos um do outro.
7 -Estações de METRÔ geram um aumento natural do comércio ambulante. Pelo tamanho previsto da Estação Angélica, pode virar um camelódromo e degradar o entorno.
Portanto, como podem ver, nenhuma menção a “gente diferenciada”.
++++++++++++++++++
Por ora, apenas o que podemos dizer é que:
1) A associação de moradores de Higienópolis NÃO falou absolutamente nada sobre “gente diferenciada”. Repetindo: A associação de moradores de Higienópolis NÃO falou absolutamente nada sobre “gente diferenciada”. Mais uma vez: A associação de moradores de Higienópolis NÃO falou absolutamente nada sobre “gente diferenciada”. Again: A associação de moradores de HigienópolisNÃO falou absolutamente nada sobre “gente diferenciada”. Once more: A associação de moradores de Higienópolis NÃO falou absolutamente nada sobre “gente diferenciada”;
2) Se alguém falou de “gente diferenciada”, teria sido a tal Guiomar, mas para saber se isso é verdade, deve o senhor James Cimino, repórter da Folha, mostrar a gravação na íntegra para que saibamos isso. Se não há essa gravação, temos de conceder o benefício da dúvida para a psicóloga em questão;
3) De qualquer maneira, querer misturar a tal declaração que Guiomar teria dado com a história do abaixo-assinado não é fair play. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, conforme já visto aqui;
4) Quem ler as razões do abaixo-assinado verá que as alegações contra a estação são de ordem puramente técnica, e nada além disso.
Portanto, se alguém quiser alegar qualquer coisa a favor da estação Angélica, que leve em conta que não dá para ligar a associação de moradores de Higienópolis ao que supostamente declarou a tal Guiomar Ferreira, sendo que a própria disse que o repórter pôs palavras em sua boca. Com a palavra, o senhor James Cimino e aguardamos a gravação que ele fez naquele dia.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.