Eleição na Alemanha reforça isolamento internacional do Brasil, por Arnaldo Cardoso

Para o governo brasileiro que recentemente recebeu no Palácio do Planalto uma deputada alemã líder da AfD, o resultado da eleição aumentará suas dificuldades no relacionamento com o mais influente país da União Europeia.

Reprodução RFI

Eleição na Alemanha reforça isolamento internacional do Brasil

por Arnaldo Cardoso

O resultado da eleição de ontem (26) na Alemanha com o SPD (Partido Social-Democrata) ligeiramente na frente do CDU (União Democrata-Cristã) e o Die Grünen (Os verdes) como terceira força política do país, abriu a fase de negociações para a formação do governo e definição de quem substituirá a chanceler Angela Merkel que encerra seu longo governo de dezesseis anos com alta aprovação dos alemães.

A estreita vantagem obtida por Olaf Scholz (SPD) e seu estilo discreto impediram que o resultado fosse comemorado com euforia. Críticos de Scholz apontam sua falta de carisma e perfil tecnocrático como fraquezas para o enfrentamento dos desafios políticos que o novo chanceler do país terá pela frente.

Elevados impostos, pensões, clima, educação, segurança interna, migrações, segurança sanitária, envelhecimento da população são alguns dos problemas que demandarão respostas consistentes do novo governo e, para isso, a qualidade da coalizão de governo será fundamental.

O SPD conduziu sua campanha eleitoral com discurso comprometido com a agenda ambiental, afirmando que todas as decisões de seu governo, tanto no plano interno como externo estariam comprometidas com os princípios da sustentabilidade. Também afirmou a centralidade das questões sociais para sua agenda de governo.

Os Verdes que saíram da eleição com 14,8% dos votos, conquistando assim mais 51 cadeiras no Parlamento se firmaram como parceiros indispensáveis em qualquer formação de governo.

Para progressistas e políticos comprometidos com a democracia na Alemanha, e no mundo, o grande alívio trazido pelo resultado da eleição foi o desempenho abaixo do previsto da AfD (Alternativa para a Alemanha) que perdeu várias cadeiras no Parlamento (até o momento da apuração, 11).

A agremiação da extrema-direita, que tem entre seus apoiadores grupos neonazistas e que tem sido monitorada pelos serviços de inteligência do país por suspeitas de afrontas à democracia, está fora das negociações para formação de governo por ser rejeitada pelas três principais forças políticas do país.

A toxicidade da AfD é tão reconhecida pela imensa maioria da sociedade alemã que chega a ser explorada em propagandas “espirituosas” como a da BVG (empresa de transporte público de Berlim) que fixou em portas de vagões de seus trens (foto que ilustra esse texto) a frase “Wir sind gegen jede Form van Hetze. Deshalb sind wir auch manchmal zu spät” (“Somos contra qualquer forma de pressão/perseguição. É por isso que às vezes chegamos atrasados”. Em tradução livre) e acima dela a ilustração do que é proibido nos vagões: comer, beber, e a AfD entre elas. (Foi minha amiga Katia, brasileira que vive desde 2015 em Berlim que me contou sobre a peça publicitária da BVG, explicando sua sutileza ao brincar com os sentidos da palavra Hetze. Ela ainda acrescentou: “Quem disse que os alemães não têm humor?”).

Para o governo brasileiro que recentemente recebeu no Palácio do Planalto uma deputada alemã líder da AfD, o resultado da eleição aumentará suas dificuldades no relacionamento com o mais influente país da União Europeia. Tanto o SPD quanto Os Verdes já fizeram enfáticas declarações públicas de condenação à política ambiental do governo Bolsonaro e às suas posições em temas de direitos humanos. Em função dessas posições, mesmo o país tendo interesses comerciais na relação com o Brasil, as três principais forças políticas do país rejeitam a assinatura de acordo de livre comércio da UE com o Mercosul.

A cada dia aumenta o isolamento internacional do Brasil em função das indefensáveis posições de seu atual governo, que combinam anacronismo, radicalismos e elevada dose de insanidade.

Pobre Brasil.

Arnaldo Cardoso, sociólogo e cientista político formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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