O ‘Trump dos trópicos’ e a submissão do Brasil à economia e Defesa dos EUA

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Brasil fiel a serviço dos EUA: desde a liberdade concedida na tecnologia de Defesa e inteligência militar brasileiras, até abdicando de garantias da OMC

O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e o presidente dos EUA, Donald Trump, na Casa Branca, em Washington (EUA) – Foto: Reuters

Jornal GGN – Jair Bolsonaro tratou de fazer jus ao apelido dado a ele mundo afora, o “Trump dos trópicos”, e mostrou colocar o Brasil fielmente a serviço dos Estados Unidos, desde a liberdade concedida ao presidente norte-americano na tecnologia de Defesa e inteligência militar do Brasil, até mesmo abdicando de garantias na Organização Mundial do Comércio (OMC). Do lado de lá, a resposta de Donald Trump foi uma mostra de retribuição pela fidelidade, acenando o ingresso do país à OTAN e à OCDE, sem nenhuma garantia.

A quem interessa?

Além do acordo da base espacial militar de Alcântara no Maranhão, permitindo aos norte-americanos lançarem, por enquanto, satélites comerciais, e a já dada permissão também para que eles tenham acesso à tecnologia militar e de inteligência nacional desenvolvida dentro da Embraer, o próximo passo era a OCDE.

E Trump confirmou apoiar a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o bloco considerado das economias mais industrializadas do mundo, que permitirá participar de licitações e negociações do Pentágono, incluindo da área de Defesa, de interesse da então brasileira Embraer, e hoje mais interessante aos Estados Unidos pela recente aquisição da fabricante de aeronaves.

Estratégico pelas decisões tomadas, Trump basicamente aceitou fazer negócio que lhe trará lucro e lucro a nenhum preço. O custo pagará o Brasil, que em troca do apoio mostrado por Trump pela adesão à OCDE e a possibilidade também de aceno junto à OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), o país terá que abandonar o tratamento que detém hoje na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Importância da OMC

OMC
Foto: WTO/OMC

Acontece que Trump é contra a lista de países de tratamento especial da OMC, criada em 1995 para regular o comércio mundial e que conta hoje com a adesão de 164 nações. Além de regular o mercado, a OMC também media conflitos comerciais, estabelecendo regras sobre tarifas, além de orientar para uma abertura progressiva e controlada do comércio internacional, o que muitas vezes é confrontado pelos EUA, nos obstáculos impostos para o livre comércio – que favorece, por outro lado, o mercado nacional.

Foi um pedido explícito do mandatário dos EUA: o Brasil deve abrir mão do status especial nas negociações da OMC. “O presidente Bolsonaro concordou que o Brasil começará a abrir mão do tratamento especial e diferenciado nas negociações da Organização Mundial do Comércio, em linha com a proposta dos Estados Unidos”, anunciou, em comunicado, o Ministério das Relações Exteriores de ambos os países, na noite de ontem.

Prós aos EUA, contras ao Brasil

A dívida está toda com o Brasil. Enquanto que o acordo para os norte-americanos usarem a base de Alcântara não prevê o uso militar, a priori, tampouco proíbe ou impede que articulações nesse sentido venham a ser fechadas em um futuro, seja ele próximo ou mais longo. Da mesma forma, o apoio dado por Trump para a participação do Brasil na OCDE não garante em 100% a entrada no bloco, mas às custas disso o país tem que abdicar de garantias que obteve na OMC para manter o apoio de Trump.

O contentamento de Donald Trump, que elogiou “os esforços do Brasil” e manifestou apoio para o início do processo de adesão ao bloco, é questão de lógica. Uma vez que a entrada à OCDE não depende só dos EUA e há ainda um longo processo pela frente, Trump manifestou no encontro com Bolsonaro que a nação brasileira “poderá” tornar-se aliada prioritária extra-OTAN. E ainda é somente uma intenção.

Submissão à Defesa e Militarização dos EUA

Foto: Reprodução Redes Sociais

Na prática, a condição não necessariamente atende só ao Brasil, porque é uma forma de introduzir interesses dos próprios estadunidenses. Ao todo, foram 17 países que receberam essa classificação do governo dos EUA, que permite o país beneficiado tornar-se comprador preferencial de equipamentos e tecnologia militar, participar de leilões do Pentágono e receber treinamentos militares com as Forças Armadas dos EUA.

Ser um aliado prioritário extra-OTAN faz com que alinhe o país às condições militares e Defesa não necessariamente nacional, mas dos próprios Estados Unidos. Como se tratam de negociações e acordos comerciais na área militar e de Defesa, automaticamente implica ameaças estratégicas e interesses geopolíticos.

Mais palavras, poucos acordos

E ainda que a ideia tenha arrancado um sorriso dos defensores de Bolsonaro e do próprio mandatário, Trump tampouco garantiu nada: “Eu disse ao presidente Bolsonaro que eu também pretendo classificar o Brasil como aliado prioritário extra-Otan, ou mesmo, se pensarmos, em um aliado Otan”, sugeriu, apenas.

Ainda não houve a formalização do caso, com documento oficial ou análise de técnicos e assessores sobre a medida, um procedimento necessário nestes casos. A mera intenção de Trump também dependeria da aprovação de todos os outros países integrantes, que ao total são 29. Há ainda especialistas que defendem que tal decisão, por ser de tamanha importância, deve passar pelo crivo do Congresso Nacional.

 

Leia, abaixo, sobre o que trata ser membro da OMC: 

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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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