Carmen Lúcia e o jogo para beneficiar grandes laboratórios, por Luis Nassif

Carmen Lucia e João Pedro Gebran Neto em encontro da Interfarma

Declaração da Ministra Carmen Lúcia:

“Saúde não é mercadoria. Vida não é negócio. Direitos conquistados não podem ser retrocedidos, sequer instabilizados”.

Vamos ver na prática como se comporta a Ministra.

Desde 2009, a Ministra Carmen Lúcia sentou em cima de um dos grandes processos da República, beneficiando claramente a indústria farmacêutica multinacional.

No dia 30/04/2009, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, ligada à Procuradoria Geral da República, entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra os artigos 230 e 231 da Lei Federal no. 9.279, sobre as patentes pipeline. Tratava-se de um dos negócios mais suspeitos da República. No bojo da nova Lei de Patentes, o governo FHC reconheceu até o direito de patente pipelines, que já se encontravam em domínio público. O documento da PGR dizia que foi “uma espécie de apropriação de um bem comum do povo sem qualquer amparo constitucional”.

Essa lei encareceu absurdamente uma relação enorme de remédios, prejudicando os consumidores e prejudicando o SUS (Sistema Único de Saúde).

No despacho, Carmen Lúcia dizia que

“Adoto o rito do art. 12 da Lei n. 9.868/99 e determino sejam solicitadas informações ao Congresso Nacional, no prazo máximo de dez dias.4.Imediatamente após aquele prazo, dê-se vista ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, para que cada qual se manifeste na forma da legislação vigente. Publique-se.”

No dia 19 de maio de 2009, Carmen Lúcia reiterava:

“Em complementação ao despacho de 28.4.2009, determino sejam requisitadas informações ao Presidente da República, no prazo máximo de dez dias, abrindo-se, após, o prazo de cinco dias para manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente (art. 12 da Lei n. 9.868/99). Publique-se.”

Nos meses seguintes, ingressaram na ação como amicus curiae a Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids – ABIA, Médicos sem Fronteiras – MSF, Federação Nacional dos Farmacêuticos – FENAFAR, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC, Grupo de Incentivo à Vida – GIV e o Grupo de Apoio à Prevenção da Aids no Estado do Rio Grande do Sul, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Associação Brasileira de Propriedade Intelectual e a Conectas Direitos Humanos.

No dia 07/11/2016, denunciamos no GGN o jogo da Ministra. O atraso beneficiava diretamente os grandes laboratórios internacionais.    

Apenas no dia 28 de junho de 2018 o caso foi incluído na pauta de julgamento.

Ontem, sem nenhuma explicação maior, Carmen Lúcia retirou o tema da pauta do Supremo.

Em qualquer país com estado de direito pleno, a presidente do Supremo estaria respondendo por prevaricação.

Em 2016, a Interfarma – que representa os grandes laboratórios – montou um enorme lobby em favor da judicialização da saúde. Havia a suspeita de que, por trás das ações judiciais, criou-se uma verdadeira indústria para a venda de medicamentos de alto custo.

Segundo dados do Ministério da Saúde, 80% das ações eram propostas pelo mesmo escritório de advocacia, comprovando a existência de uma articulação. Foram acusações graves:  

“Há convênios de laboratórios fabricantes com laboratórios de análises clínicas, e este laboratório fabricante paga o de análise para fazer um exame que comprove a necessidade daquela pessoa ter o medicamento que ela fabrica, que vira uma decisão judicial”, afirmou o ministro Ricardo Barros.

O Ministério Público de São Paulo identificou a compra de medicamentos para hipercolesterolemia homozigótica, doença rara, a um custo de mil dólares o comprimido. Segundo o Secretário da Saúde de São Paulo, David Uip, “Em 30 dias são 30 mil dólares. Isso custou R$ 36 milhões ao Estado e na absoluta maioria não havia sequer a indicação da doença”, disse. “Os médicos ganhavam para prescrever”, afirmou.

Carmen Lúcia, que adiou por anos um julgamento que poderia reduzir o custo dos medicamentos, tornou-se uma verborrágica defensora dos direitos dos doentes: “Estamos aqui para tornar efetivo aquilo que a Constituição nos garante. A dor tem pressa. Eu lido com o humano, eu não lido com o cofre”, disse. “O que o juiz fala quando a gente discute (o tema) é que há uma judicialização da saúde. Não. Há a democratização da sociedade brasileira, do cidadão que até a década de 1980 morria sem saber que tinha direito à saúde e que podia reivindicar esse direito. Como juíza, o meu papel é garantir esse direito”, afirmou.

Não será com frases de efeito que Carmen Lúcia se livrará das explicações que deve à opinião pública.

 

 

Luis Nassif

Luis Nassif

View Comments

  • Enquanto vigorar esse

    Enquanto vigorar esse monstrengo sistema judiciário nosso país continuará sendo a merreca de sempre. Desde quando alguma lei (não regulamento interno que, no máximo, serviria como bula de remédio) permite que o então presidente(A) do stf (minusculinho) paute apenas as ações de seu (pessoal, negocial, suspeito, haja saco) interesse? Esses ministrecos que apresentem as provas de que leis os "seguram" ou os "soltam" em razão do que está para julgar. Mas, quando os demais poderes se encagaçaram e aceitaram que o cnj e o cnmpf fossem conduzidos e manipulados de dentro pra fora, lascou-se a população em geral. 

  • #

    Parabéns pelos artigos, Nassif.

    Infelizmente, enquanto a grande mídia não martelar essas informações – o que nunca irá acontecer - “ninguém” vai saber, e por isso, “não é um escândalo”.

    Na verdade, se a Globo ou qualquer outro tubarão da mídia quiser, destrói a reputação da digníssima juíza em 15 dias.

    E é nesse passo que todos os outros juízes se submetem aos tubarões da mídia: Todos têm o rabo sujo.

     

  • Medicamentos necessitam de

    Medicamentos necessitam de testes para que organismo doente demonstre a eficácia do mesmo. Alguém se habilita, ou indica alguém?

  • Responder por prevaricação
    Responder por prevaricação para quem?????

    Urge um verdadeiro controle externo e popular para revisar atos desse pessoal.....do jeito que está, não respondem a ninguém, ou pra órgãos porcorativistas, é uma teta....

  • Fico imaginado do que adianta
    Fico imaginado do que adianta ter conhecimento jurídico para atuar como juiz se falta o caráter para fazer cumprir a lei. Qualquer cidadão digno corajoso e realmente compromissado com o país e seu povo poderia ser um juiz do STF. O que vemos hoje é menos saber jurídico e mais manipulação das leis para satisfazer objetivos próprios e do poder dominante. Fica claro que quando se quer trapacear inventa-se qualquer desculpa para justificar atos ilegais, bem como entrar em contradição com suas próprias posições, que mudam de acordo com o freguês. Sinceramente se um dia quisermos ser uma democracia plena, um país civilizado não é só com a globo que teremos que lidar,e sim com poder judiciário que se tornou uma aberração e ainda está evoluindo para algo muito pior.

  • Carmen Lúcia e o jogo para beneficiar grandes laboratórios

    Executivo + Legislativo + Judiciário + Corporações = MÁFIA

  • "Valorosa" Carmem Lucia

    Quando vejo médicos prescrevendo muitos exames que devem ser realizados em suas clinicas e prescrevendo remédios caros, lembro daqueles que iam às manifestações contra Dilma, com nariz de palhaço, berrando contra o Mais Médicos e a corrupção...  E quando vejo juizes judicalizando tudo, inclusive a saude, penso que eles devem ser feitos de aço, nunca ficam doentes, não têm familia, não gostam de ninguém; pois uma ação como essa da Ministra Carmem Lucia não apenas prejudica o Erario, rentabiliza laboratorios, como também repercute na saude dos cidadãos. E ela, querendo ou não, também é cidadã brasileira e suas ações nos tribunais também a alcaçam em algum momento. Ou os deuses aqui na Terra pensam que estão imunes a tudo, incluindo aos seus lobbies?

    • Dizem que dinheiro não traz felicidade, manda buscar...
      Com um salário na faixa dos 40 mil por mês, fora os penduricalhos, direito a assistência médica bancada pelo Estado como "servidora pública" e com tantos serviços prestados à indústria farmacêutica e às grandes corporações, será que se ela precisar de tratamento médico passará pelo calvário do cidadão comum? A elite brasileira, da qual ela é parte e a quem de fato serve, não é cidadã, é oligarca, aristocrata, demófoba, classista, tosca, ignorante, irresponsável, provinciana e mesquinha. Exatamente pra não ser tratada como uma "cidadã comum" que ela fez tantos "sacrifícios" pra virar juíza, ter poder sobre a vida dos outros, e se blindar dos problemas de comuns (e) mortais - duas coisas que juízes certamente pensam que não são -, porque riqueza e poder, a que cidadãos comuns não têm acesso, é o que interessa a muitos e realmente pode fazer a diferença entre uma vida boa, mesmo com doenças - caso da elite -, e uma sobrevida difícil, mesmo sem elas - caso do povo, porque não/nunca vivemos numa democracia cidadã mas numa sociedade de casta.

      Sampa/SP, 07/09/2018 - 13:04

  • A ministra Carmen Lúcia não

    A ministra Carmen Lúcia não era assim. A impressão que passa é a de que está tendo um longo surto psicótico.

  • Explicações à opinião pública?

    "Não será com frases de efeito que Carmen Lúcia se livrará das explicações que deve à opinião pública". Nassif, acho que tal postura (explicações à opinião pública) se espera de quem tem um biografia a preservar. Acho que a sociedade não deve esperar tal atitude de que tem um capivara, que neste caso, se aplica perfeitamente a tal ministra.

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