Lava Jato não pode ser anulada como a Castelo de Areia, diz Celso Vilardi

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Celso Vilardi, que atuou na Castelo de Areia e agora defende executivo da Camargo Corrêa na Lava Jato, repetiu a estratégia de atacar o uso de grampos. Mas mesmo que tenha sucesso, ele avaliou que a anulação das provas será parcial. As confissões feitas pelos réus delatores darão fôlego aos processos contra investigados no caso Petrobras, disse ao GGN. Assista abaixo

Jornal GGN – O advogado Celso Vilardi disse em entrevista ao Jornal GGN que, embora inúmeros ações que apontam vulnerabilidades na Lava Jato tramitem na Justiça com alguma expectativa de sucesso, as confissões feitas pelos réus delatores e as informações juntadas aos autos pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, dificultam a anulação de toda a operação que investiga agentes envolvidos nos esquemas de corrupção na Petrobras.

Vilardi, que conseguiu esvaziar a Castelo de Areia atacando o uso dos grampos, repetiu a estratégia na Lava Jato. Em peça de defesa do cliente João Auler, ex-presidente do Conselho Administrativo da Camargo Corrêa, apresentada em janeiro, Vilardi sustentou que os grampos que deram origem à Lava Jato desrespeitaram a Lei de Interceptações Telefônicas. No caso, a interceptação autorizada contra José Janene (ex-deputado do PP, morto em 2010) teria sido ampliada indiscriminadamente e acabou chegando no doleiro Alberto Youssef.

“Nós entendemos que essa interceptação telefônica foi prospectiva, que é você fazer a interceptação para colher algum fato. Uma interceptação tem que partir de um fato para que este seja aprofundado na investigação. Procuramos a nulidade”, disse Vilardi, em entrevista conduzida pelo jornalista Luis Nassif.

“Agora, mesmo com a nulidade, esse não é um caso como a Castelo de Areia, porque uma anulação da interceptação não obrigatoriamente vai anular todo o processo. Tem confissões, delações. Pode ter anulação parcial, mas isso vai ser julgado pelos tribunais. A última palavra deve ser do Supremo.”

Para ler a primeira parte da entrevista com Celso Vilardi, clique aqui.

 

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Abaixo, a segunda parte da entrevista de Celso Vilardi ao GGN.

Jornal GGN – O fato de o doleiro Alberto Youssef já ter participado de delação premiada [no caso Banestado] e reincidido no crime cria argumentos em favor da defesa?

Celso Vilardi – O sistema de delação premiada no Brasil me preocupa porque uma pessoa como Youssef tem benefícios iguais a de outras pessoas que não têm o histórico dele. Independente disso, a questão de Youssef poder ou não fazer delação não anula o que ele falou [na Lava Jato]. O que ele falou não será anulado se a delação for anulada. As palavras estão ali. Acho difícil anular a investigação por conta desse problema.

GGN – Quais são as próximas etapas da Lava Jato, agora?

Vilardi – Acho que a liberdade [dos executivos investigados na Lava Jato a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal, em abril] coloca o processo em ritmo melhor. A pressão diminui em torno do processo e até do próprio juiz. Porque a prisão é um instrumento de pressão para todos os players. Agora, estamos partindo para a fase final. Devemos ter um julgamento até junho. E, depois, dependendo da postura do juiz, vamos começar o caminho dos tribunais. Enquanto isso, há várias recursos que estão tramitando, questões de competência que serão julgadas.

GGN – O senhor defende o empresário João Auler [ex-presidente do Conselho Administrativo da Camargo Corrêa], e o orientou a não fazer a delação premiada. Inclusive, abriu mão de defender outros empresários da Camargo que aceitaram o acordo de cooperação. Por que essa postura?

Vilardi – Eu não o orientei. A delação é uma postura do cliente. Ele quer ou não quer [fazer a delação]. Eu posso estar com ele ou não estar porque tenho questões que podem me impedir de participar de uma delação. Mas eu não o orientei. O que posso fazer, e fiz com ele, é colocar os prós e os contras, o que ele vai enfrentar em um cenário de delação. Mas ele não queria, disse que não tinha nada para falar. E assim defendemos esperando que ele seja absolvido.

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GGN – Ter uma mesma advogada para todas as delações, o que significa isso?

Vilardi – É ruim. Eu acho que isso é uma questão que, outra vez, temos que falar, da regulação da delação. Inclusive a Ordem dos Advogados do Brasil precisa se posicionar. Porque o Código de Ética tem décadas e décadas. Não é que a ética muda, mas outras situações surgem. Não pode haver conflito. Há conflito entre delator e delatado? Um concorda, outro não concorda? Eu não tenho posições absolutamente concretas a respeito desse tema, mas acho que a Ordem precisa se manifestar não só em relação a isso, mas também ao que acontece nessas operações com os advogados. A Ordem tem feito um silêncio revelador. Os advogados ficam sem cobertura. A Ordem tem que defender, criticar e punir. Nem no âmbito nacional nem no estadual temos tido uma Ordem presente.

GGN – Em peça assinada pelo seu escritório em janeiro, em defesa do executivo João Auler, seu escritório levanta uma série de vulnerabilidades na Lava Jato. Entre elas, o grampo telefônico. O juiz que autorizou os grampos teria descumprido o artigo 2º da Lei de Interceptações Telefônicas. É possível anular a Lava Jato em cima dessa vulnerabilidade?

Vilardi – É possível, é isso que está tramitando. Nós entendemos que essa interceptação telefônica foi prospectiva, que é você fazer a interceptação para colher algum fato. Na verdade, uma interceptação tem que partir de um fato para que este seja aprofundado na investigação. A gente entende que não existia fato concreto a determinar a investigação, então ela foi prospectiva. Procuramos a nulidade.

Agora, mesmo com a nulidade, esse não é um caso como a Castelo de Areia porque uma anulação da interceptação não obrigatoriamente vai anular todo o processo. Tem confissões, tem delações. Em alguns casos, depende, pode ter anulação parcial. Mas isso vai ser julgado pelos tribunais. A última palavra deve ser do Supremo.

 

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GGN – Sobre o vazamento de informações no decorrer da Lava Jato, o que é crime e o que é inconfidência, apenas?

Vilardi – Crime é vazar informação que está sob sigilo. Acontece, e tem acontecido. Mas nunca se investiga o vazamento criminoso, essa é a verdade. Quando você pergunta para as autoridades, faz uma crítica, pede investigação… Dizem que só depois que os advogados foram autorizados a terem acesso aos autos é que houve o vazamento. Lógico, se está com eles, ninguém sabe, mas quando deflagra, o advogado tinha procuração. Sempre o culpado é o advogado. Mas em alguns casos se verifica nitidamente – não falo da Lava Jato, mas na Castelo de Areia, por exemplo – que cada vez que teria um julgamento no tribunal ou cada vez que havia um pedido de vistas, se o julgamento se dava na terça, no domingo já tinha matéria de capa nos jornais. Coincidência que sempre tinha um fato novo antes do julgamento! Na maioria das vezes, eles atribuem isso aos advogados. E muitas vezes os advogados vazam mesmo. Tem advogado que, para obter um elo de confiança com jornalista, entrega peças judiciais prejudicando o próprio cliente. É difícil apurar isso.

GGN – É justificável fazer que a Lava Jato tenha um recorte político que vai de 2004 a 2014 [quando há indícios de que o pagamento de propinas na Petrobras ocorre ao menos desde o final da década de 1990]?

Vilardi – É difícil de dizer porque é uma questão de método de investigação que não me cabe. O que acho da questão política é que a presença de partidos políticos traz prejuízo para o processo inominável. Quando você está investigando o partido do governo e tem uma classe, hoje, formadora de opinião em que 90% é contra o partido do governo, você tem um desejo de condenação reiterado que a mídia acaba captando e vai passando para a sociedade como um todo, num efeito que é absolutamente incontrolável. Mas sobre o corte [temporal da investigação, prefiro não opinar. 

 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

2 Comentários

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  1. INCOMPETÊNCIA DO JUIZ MORO.

    O advogado entrevistado tocou num ponto muito importante que pode dar causa à nulidade do processo da Operação Lava Jato: a INCOMPETÊNCIA do juiz Moro.

    Como não houve aprofundamento da questão,  vou tentar esclarecer.A Petrobras tem sede e foro na cidade do Rio de Janeiro; dos crimes que estao sendo apurados, NENHUM FOI COMETIDO NO PARANÁ.  Assim, fica patente A INCOMPETÊNCIA, em razão do LUGAR, do juiz Moro.

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