Parábola multi-sincrética de duas tribos em guerra, por Romulus

Por Romulus

Ao ler o “Xadrez” de hoje de Luis Nassif, lembrei-me de algo que aconteceu comigo algum tempo atrás. Ainda não consegui determinar exatamente a relação entre as duas coisas. Talvez os leitores do blog possam me ajudar. Se estiverem dispostos e sentindo-se generosos para comigo, após lerem o post “O xadrez da segunda rodada do impeachment”, por favor passem ao relato que segue.

*********

Um índio velho, “aculturado” desde que veio para a “civilização” na meia idade, decidiu permitir-se um capricho na senioridade: pegar um avião para vir conhecer, in loco, o chocolate suíço. Ouvira dizer que o cacau a 100% dos Alpes era o que mais lembrava a bebida sagrada dos primos Astecas de outrora.

Sabia que haveria de ter nessa terra estranha alguém que falasse a sua língua. Resolveu procura-lo então nas redes sociais e em blogs (eta, índio antenado!). O destino fez com que de todos os muitos lusófonos vivendo nestas paragens, ele viesse a encontrar não outro que a mim, imaginem vocês. Ficamos amigos e tivemos longas conversas depois que ele aqui chegou em sua busca pelo chocolate.

Vendo minha angústia atual, acendeu o inseparável cachimbo e contou-me uma parábola, uma dessas histórias cheias de simbologias e significados ocultos. Histórias das quais extraímos metáforas e extrapolamos algumas conclusões. Talvez para a vida. Ou quem sabe não. Como quem me contou é índio sim mas também brasileiro – e aculturado – a parábola está banhada no sincretismo, esse dom do nosso povo de sintetizar a tese e a antítese e criar algo novo, que não é nem uma coisa nem outra. Não estranhem: por sincrética, a parábola tem floresta, índio, cruzada santa, cemitério indígena amaldiçoado, almas penadas, exorcismos neopentecostais de TV e outros encontros fortuitos que só se dão no Brasil.

Ainda interessados? Então vamos à história que me contou o sábio índio, vovô Jararaca-sentada:

Duas tribos lutavam com unhas e dentes por uma mesma floresta. Os dois povos se odiavam desde tempos imemoriais. Mas, temendo a mútua aniquilação, os respectivos caciques e xamãs encontravam-se secretamente na cachoeira, onde o barulho das águas abafava as conversas que não deviam dali escapar. Formulavam versões sucessivas de um pacto de sangue que finalmente pudesse ser aceito pelos dois caciques.

A guerra era “santa”. Uma cruzada do “bem contra o mal“. Mas poderia trazer também a aniquilação total. Com o pacto de sangue que propunham, a guerra poderia ser evitada. Guerra de extermínio, bem entendido, mas um extermínio em uma gloriosa causa. Os mártires haveriam de ir todos para o céu, cria a maioria.

A partir do tal pacto, as perdas humanas das tribos dali por diante seriam limitadas a pequenas rusgas na mata fechada. Somente quando houvesse encontros fortuitos entre os respectivos grupos de caçadores. Mas isso era algo do jogo desde que Tupã Krishina criara o mundo.

A (re-)”pactuação” entre caciques e xamãs não seria vitória nem derrota total. Era meia vitória / meia derrota – para ambos os lados. Ninguém sairia com o que queria. Ao contrário, todos sairiam meio vencedores e meio perdedores. Mas sairiam. Ponto.

O prêmio por lutar exclusivamente pela “vitória total” – causa justa e permitida pelas regras e costumes das tribos – poderia (disse-me o índio: “poderia”… no condicional…) ser a vitória naquela “cruzada”… mas vitória de Pirro. Quem viesse a ser a reencarnação amazônica desse antigo general continuaria cacique, caso fosse o único que continuasse de pé ao final. Isto é: depois de lavar o pecado da terra com o sangue dos índios justos naquela luta infernal. Esse seria o sacrifício supremo a Tupã Krishina, que criara seu povo num porre de cauim.

– Sim, continuaria cacique. Mas agora de um silencioso cemitério – e cemitério indígena, vejam bem.

Nota: Para que eu compreendesse melhor as implicações de morar em um “antigo cemitério indígena”, o velho índio recomendou que assistisse ao filme “Poltergeist” no Netflix (eta, índio antenado! (2))

Voltando à história, havia mais um detalhe: o “cacicado” tinha tempo marcado para terminar: dali a dois anos e meio. Em tal data o próprio Tupã Krishina ameaçava voltar, desgostoso com o conflito que se arrastava e não saia do impasse.

Em tom solene o meu amigo índio proclamou: “aos homens não é dado conhecer o que Tupã Krishina fará”. Dessa forma, não havia xamã que pudesse afirmar com tanta antecedência o que o severo deus faria dali a dois anos e meio.

Para dificultar ainda mais a decisão, havia riscos mesmo na vitória total na tal guerra santa. Os xamãs dos dois lados mandavam avisar que depois da guerra, independentemente de qual cacique fosse o último a ficar de pé, as almas penadas daqueles que caíssem ao longo dos dias de batalha voraz voltariam para atormentar o cemitério.

O cacique tinha grandes planos para o local. Sonhava vê-lo coberto de verde novamente. Mas a assombração das almas penadas não permitiria que um vasto pomar, sonhado pelo cacique, crescesse no local. Em vingança, essas almas malditas fariam tudo gorar e secar… todas as mudinhas de árvore.

Os caciques sabiam por relatos da oralidade que a oferta de frutos tinha o condão de pacificar muitas almas em tribos conflagradas. Dos dois lados. De forma que os índios a quem não faltassem frutas costumavam voltar ao seu juízo habitual. Não se esperava desses índios que apelassem para alternativas amalucadas diante do desespero da ausência de frutos.

Os caciques imaginavam que, comendo apenas milho velho naqueles anos até o fim do cacicado, não havia pajelança ou tele-exorcismo neopentecostal capaz de impedir as almas penadas de voltarem com tudo, incorporarem nos índios sobreviventes e exilarem o cacique e sua família por 20 anos no mínimo. O tempo de uma geração.

Assaltavam o cacique grandes dúvidas: o que seria melhor para ele? E para sua família? E para toda a tribo? O cacique teria de escolher entre: (1) a “cruzada”, justíssima e moralíssima, ou (2) aquele pacto que faria até sua mãe cuspir em seu rosto quando voltasse com a “boa” nova. Escolheria entre a bendita “vitória total”, de Pirro, ou uma meia vitória / meia derrota, desde logo alcunhada de “A Grande Covardia” ou “A Vergonha”.

Não pensem que a decisão do cacique era fácil. Muito pelo contrário. Anos e anos de imbróglio já se somavam, com perda gradual de sangue de lado a lado.

Antes de decidir, ele procurou filósofos na “civilização” para aconselhar-se. Ao ouvir o relato do cacique, vieram eles com nomes estranhos para encaixar nas opções, mas cujos significados o cacique estranhamente compreendia. Enunciava um dos filósofos: “a Política, goste-se ou não, é terreno para considerações alheias à Lei e à moral – com limites, bem entendido. É para os fortes de estômago e de fígado leve, com pele grossa e memória fraca, que facilmente esquecem estocadas dos que até ontem eram tidos como inimigos”.

O cacique compreendeu, mas disse que seria difícil explicar isso aos seus na tribo. O filósofo ofereceu então uma tradução metafórica para aquela tal de política: “é a arte de intuir – olhando tudo em volta – quando se está cacifado para meter o dedo no olho do adversário e ganhar terreno e quando se está cacifado apenas para levar dedada no próprio olho e recolher-se ao seu canto. E em silêncio. Inclusive momentos há em que não se furam os olhos de ninguém, porque ambos concordam em amarrar as próprias mãos e a ficar parados no mesmo lugar.

E, de repente, sem me contar o final daquele conflito, o índio partiu para os finalmentes. Arrematou ele o relato com uma “moral da história: “quem tem dificuldade de aceitar essa realidade, que não se aventure nessa tal política. Que não peça para ser cacique. Preserve a liberdade de se limitar a jogar o jogo de acordo com o que os seus filósofos chamam de moral e Lei”.

Ao ouvir o fim do relato do velho Jararaca-sentada, já com os lábios e a língua enegrecidos pelo cacau amargo a 100%, cheguei a uma conclusão. Disse-lhe: “olha, ‘seu’ Jararaca-sentada, o chocolate fica por minha conta. Foi mais do que pago por esse seu relato tão cheio de peso. Não consigo nem sorrir nem chorar ao ouvi-lo. Mas ele me traz uma conclusão: essa tal de política não é mesmo para mim. Odeio injustiças. Não consigo vê-las e aceitá-las calado. Para mim a escolha sempre seria fazer o que ‘é certo’, não o que é ‘necessário’. Aliás, ‘seu’ Jararaca-sentada, concluo nossa conversa dizendo que a sua narrativa me fez lembrar do nosso país natal no momento atual. Não sei por que, mas enquanto o Sr. falava eu sonhava acordado e via a floresta como o Brasil. Que loucura, não? Deve ter sido esse vinho branco de Valais que pedimos para acompanhar o chocolate”.

 

Fim?

 

 

 

Redação

11 Comentários

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  1. MEU comentário ao post original do NASSIF:

    IA COMENTAR ONTEM MAS DESISTI…

    Amigos,

    Ontem ao terminar de ler o “xadrez”, logo depois que Nassif o publicou, confesso que me senti cansado. Nao pela leitura do post – no nível excelente de toda a serie “xadrez” – mas por ter aceitado o desafio do Nassif na parte final e tentado pensar no pos-impeachment. Sugou todas as minhas energias e logo desisti de publicar minhas tentativas frustradas de comentario.

    O que me cansou tambem, me desculpem, foi ler alguns comentarios reprovando-o por mencionar novamente Lula 2018 como moeda de troca para a repactuaçao. Nao vamos matar o mensageiro porque nao gostamos da mensagem. Há apenas o relato do que ele, em sua analise, enxerga como barganhas possiveis capazes de resolver o impasse atual.

    Para mim fica claro da leitura que em nenhum momento aponta a entrega dessa “moeda” como (1) soluçao de que goste, (2) que considera “correta” em um juízo moral ou (3) que a considere como estritamente legal de acordo com as regras que existem hoje.

    É evidente que ele sabe que isso nao deixa de ser uma mudança nas regras do jogo. Mas (1) se aplica para a frente e (2) é bem menos agressiva que o impeachment sem crime. Nada que nao tenha acontecido antes. Nao se aprovou a reeleiçao mudando a regra do jogo? A logica agora seria a inversa: aprova-se uma emenda impedindo mais de 2 mandatos para chefes do Executivo federal. Provavelmente essa é a oferta na mesa.

    Gosto dela? Nem um pouco. Acho “certa”? Nunca. Acho que viole o Direito? Nao necessariamente, porque vai mudar uma regra para aplicaçao apenas futura e muda questoes nao abarcadas por clausulas petreas.

    É “golpe”? Diria que sim, mas agora um golpe – no sentido de mudança das regras do jogo pre-estabelecidas – que é apenas politico. Ou seja, muda-se a regra do jogo que permitia a Lula concorrer novamente. Muda-se a configuraçao politica por meio de uma intervençao direta e sob medida.

    Eu aceitaria isso? Sinceramente nao sei a resposta. Ainda bem que nao toca a mim decidir!

    Vejam: tambem nao toca ao Luis Nassif!

    Como observador externo ele apenas descreveu para nos o que viu ou imagina estar sobre a mesa de negociaçao. Ponto.

    Ontem acabei pensando (talvez demais) sobre diferenciaçoes entre o que sao preferencias pessoais idiossincraticas, o que é ditado pela moral e o que é ditado pelo Direito. Ensaiei ontem ainda colocar um comentario falando sobre isso. Desisti. Ate eu achei muito chato. Rs

    O que fiz em vez disso foi tranformar aquelas ideias numa parabola, que acabei transformando em post. Reproduzo aqui embaixo. Nao é pequena mas por favor leiam antes de criticar o Nassif quando ele falar novamente em “repactuaçao” e “Lula 2018” como elemento em uma grande barganha politica. Todos somos livres para gostar ou nao, achar certo ou nao e – acredito que numa visao bem minoritaria – dizer que seria inconstitucional.

    É isso. Ao post:

     

    Parábola Multi-Sincrética de Duas Tribos em Guerra

    O Jornal de todos Brasis

    Parábola Multi-Sincrética de Duas Tribos em GuerraROMULUSSEG, 11/04/2016 – 16:06

    Ao ler o “Xadrez” de hoje de Luis Nassif, lembrei-me de algo que aconteceu comigo algum tempo atrás. Ainda não consegui determinar exatamente a relação entre as duas coisas. Talvez os leitores do blog possam me ajudar. Se estiverem dispostos e sentindo-se generosos para comigo, após lerem o post “O xadrez da segunda rodada do impeachment”, por favor passem ao relato que segue.

    *********

    Um índio velho, “aculturado” desde que veio para a “civilização” na meia idade, decidiu permitir-se um capricho na senioridade: pegar um avião para vir conhecer, in loco, o chocolate suíço. Ouvira dizer que o cacau a 100% dos Alpes era o que mais lembrava a bebida sagrada dos primos Astecas de outrora.

    Sabia que haveria de ter nessa terra estranha alguém que falasse a sua língua. Resolveu procura-lo então nas redes sociais e em blogs (eta, índio antenado!). O destino fez com que de todos os muitos lusófonos vivendo nestas paragens, ele viesse a encontrar não outro que a mim, imaginem vocês. Ficamos amigos e tivemos longas conversas depois que ele aqui chegou em sua busca pelo chocolate.

    Vendo minha angústia atual, acendeu o inseparável cachimbo e contou-me uma parábola, uma dessas histórias cheias de simbologias e significados ocultos. Histórias das quais extraímos metáforas e extrapolamos algumas conclusões. Talvez para a vida. Ou quem sabe não. Como quem me contou é índio sim mas também brasileiro – e aculturado – a parábola está banhada no sincretismo, esse dom do nosso povo de sintetizar a tese e a antítese e criar algo novo, que não é nem uma coisa nem outra. Não estranhem: por sincrética, a parábola tem floresta, índio, cruzada santa, cemitério indígena amaldiçoado, almas penadas, exorcismos neopentecostais de TV e outros encontros fortuitos que só se dão no Brasil.

    Ainda interessados? Então vamos à história que me contou o sábio índio, vovô Jararaca-sentada:

    Duas tribos lutavam com unhas e dentes por uma mesma floresta. Os dois povos se odiavam desde tempos imemoriais. Mas, temendo a mútua aniquilação, os respectivos caciques e xamãs encontravam-se secretamente na cachoeira, onde o barulho das águas abafava as conversas que não deviam dali escapar. Formulavam versões sucessivas de um pacto de sangue que finalmente pudesse ser aceito pelos dois caciques.

    A guerra era “santa”. Uma cruzada do “bem contra o mal”. Mas poderia trazer também a aniquilação total. Com o pacto de sangue que propunham, a guerra poderia ser evitada. Guerra de extermínio, bem entendido, mas um extermínio em uma gloriosa causa. Os mártires haveriam de ir todos para o céu, cria a maioria.

    A partir do tal pacto, as perdas humanas das tribos dali por diante seriam limitadas a pequenas rusgas na mata fechada. Somente quando houvesse encontros fortuitos entre os respectivos grupos de caçadores. Mas isso era algo do jogo desde que Tupã Krishina criara o mundo.

    A (re-)”pactuação” entre caciques e xamãs não seria vitória nem derrota total. Era meia vitória / meia derrota – para ambos os lados. Ninguém sairia com o que queria. Ao contrário, todos sairiam meio vencedores e meio perdedores. Mas sairiam. Ponto.

    O prêmio por lutar exclusivamente pela “vitória total” – causa justa e permitida pelas regras e costumes das tribos – poderia (disse-me o índio: “poderia”… no condicional…) ser a vitória naquela “cruzada”… mas vitória de Pirro. Quem viesse a ser a reencarnação amazônica desse antigo general continuaria cacique, caso fosse o único que continuasse de pé ao final. Isto é: depois de lavar o pecado da terra com o sangue dos índios justos naquela luta infernal. Esse seria o sacrifício supremo a Tupã Krishina, que criara seu povo num porre de cauim.

    – Sim, continuaria cacique. Mas agora de um cemitério. E cemitério indígena, vejam bem.

    Nota: Para que eu compreendesse melhor as implicações de morar em um “antigo cemitério indígena”, o velho índio recomendou que assistisse ao filme “Poltergeist” no Netflix (eta, índio antenado! (2))

    Voltando à história, havia mais um detalhe: o “cacicado” tinha tempo marcado para terminar: dali a dois anos e meio. Em tal data o próprio Tupã Krishina ameaçava voltar, desgostoso com o conflito que se arrastava e não saia do impasse.

    Em tom solene o meu amigo índio proclamou: “aos homens não é dado conhecer o que Tupã Krishina fará”. Dessa forma, não havia xamã que pudesse afirmar com tanta antecedência o que o severo deus faria dali a dois anos e meio.

    Para dificultar ainda mais a decisão, havia riscos mesmo na vitória total na tal guerra santa. Os xamãs dos dois lados mandavam avisar que depois da guerra, independentemente de qual cacique fosse o último a ficar de pé, as almas penadas daqueles que caíssem ao longo dos dias de batalha voraz voltariam para atormentar o cemitério.

    O cacique tinha grandes planos para o local. Sonhava vê-lo coberto de verde novamente. Mas a assombração das almas penadas não permitiria que um vasto pomar, sonhado pelo cacique, crescesse no local. Em vingança, essas almas malditas fariam tudo gorar e secar… todas as mudinhas de árvore.

    Os caciques sabiam por relatos da oralidade que a oferta de frutos tinha o condão de pacificar muitas almas em tribos conflagradas. Dos dois lados. De forma que os índios a quem não faltassem frutas costumavam voltar ao seu juízo habitual. Não se esperava desses índios que apelassem para alternativas amalucadas diante do desespero da ausência de frutos.

    Os caciques imaginavam que, comendo apenas milho velho naqueles anos até o fim do cacicado, não havia pajelança ou tele-exorcismo neopentecostal capaz de impedir as almas penadas voltarem com tudo, incorporarem nos índios sobreviventes e exilarem o cacique e sua família por 20 anos no mínimo. O tempo de uma geração.

    Assaltavam o cacique grandes dúvidas: o que seria melhor para o ele? E para sua família? E para toda a tribo? O cacique teria de escolher escolheria entre: (1) a “cruzada”, justíssima e moralíssima, ou (2) aquele pacto que faria até sua mãe cuspir em seu rosto quando voltasse com a “boa” nova. Escolheria entre a bendita “vitória total”, de Pirro, ou uma meia vitória / meia derrota, desde logo alcunhada de “A Grande Covardia” ou “A Vergonha”.

    Não pensem que a decisão do cacique era fácil. Muito pelo contrário. Anos e anos de imbróglio já se somavam, com perda gradual de sangue de lado a lado.

    Antes de decidir, ele procurou filósofos na “civilização” para aconselhar-se. Ao ouvir o relato do cacique, vieram eles com nomes estranhos para encaixar nas opções, mas cujos significados o cacique estranhamente compreendia. Enunciava um dos filósofos: “a Política, goste-se ou não, é terreno para considerações alheias à Lei e à moral – com limites, bem entendido. É para os fortes de estômago e de fígado leve, com pele grossa e memória fraca, que facilmente esquecem estocadas dos que até ontem eram tidos como inimigos”.

    O cacique compreendeu, mas disse que seria difícil explicar isso aos seus na tribo. O filósofo ofereceu então uma tradução metafórica para aquela tal de política: “é a arte de intuir – olhando tudo em volta – quando se está cacifado para meter o dedo no olho do adversário e ganhar terreno e quando se está cacifado apenas para levar dedada no próprio olho e recolher-se ao seu canto. E em silêncio. Inclusive momentos há em que não se furam os olhos de ninguém, porque ambos concordam em amarrar as próprias mãos e a ficar parados no mesmo lugar.

    E, de repente, sem me contar o final daquele conflito, o índio partiu para os finalmentes. Arrematou ele o relato com uma “moral” da história: “quem tem dificuldade de aceitar essa realidade, que não se aventure nessa tal política. Que não peça para ser cacique. Preserve a liberdade de se limitar a jogar o jogo de acordo com o que os seus filósofos chamam de moral e Lei”.

    Ao ouvir o fim do relato do velho Jararaca-sentada, já com os lábios e a língua enegrecidos pelo cacau amargo a 100%, cheguei a uma conclusão. Disse-lhe: “olha, ‘seu’ Jararaca-sentada, o chocolate fica por minha conta. Foi mais do que pago por esse seu relato tão cheio de peso. Não consigo nem sorrir nem chorar ao ouvi-lo. Mas ele me traz uma conclusão: essa tal de política não é mesmo para mim. Odeio injustiças. Não consigo vê-las e aceitá-las calado. Para mim a escolha sempre seria fazer o que ‘é certo’, não o que é ‘necessário’. Aliás, ‘seu’ Jararaca-sentada, concluo nossa conversa dizendo que a sua narrativa me fez lembrar do nosso país natal no momento atual. Não sei por que, mas enquanto o Sr. falava eu sonhava acordado e via a floresta como o Brasil. Que loucura, não? Deve ter sido esse vinho branco de Valais que pedimos para acompanhar o chocolate”.

     

    Fim?

     

     

     

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    Quando perguntei, uma deputada suíça se definiu em um jantar como “uma esquerdista que sabe fazer conta”. Poucas palavras que dizem bastante coisa. Adotei para mim também.

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  2. Tudo muito bom, tudo muito bem
    Tudo muito bom, tudo muito bem.
    Entendam todos, de uma vez por todas.
    O Brasil não pode mais aceitar acomodações.
    O Brasil está cansado de anistias gerais e irrestritas.
    Se há um preço a pagar por uma ruptura, que o Brasil o pague.
    Não pode haver acordo.
    Não vai haver golpe.

  3. Aqui eu vejo dois possíveis

    Aqui eu vejo dois possíveis desfechos para o seu país.

    Se os golpistas conseguirem o impeachment (os seus parlamentares são corruptos e o seu judiciário também é corrupto, então é possível), o novo governo irá prometer que será “a solução de todos os problemas” mas obviamente não irá conseguir cumprir a promessa, ou no máximo conseguirá enganar por um ano ou dois. Haverá revolta obviamente mas no geral o seu povo é apático, então não creio que haveria uma revolta generalizada pelo menos até o momento em que a situação ficasse insustentável (a promessa de resolver todos os problemas obviamente não poderia ser cumprida). Nesse momento então como é tradição dos governos de direita sul americanos sua república se tornaria uma ditadura por ser a única maneira de manter um povo revoltado sob controle contra um governo que claramente só responde a uma pequena elite.

    No segundo cenário, se o impeachment não passar acredito ser praticamente certo que os golpistas então iriam insuflar guerra civil, pois eles mostraram ter a falta de escrúpulos e o financiamento necessário para convencer uma parte considerável da população (já previamente doutrinada pelos jornais e TVs) para partir para o confronto aberto e o seu governo até agora se mostrou fraco demais para impedir tais atos com a firmeza necessária, portanto incentivando os golpistas a partirem para a violência por considerarem que o governo não irá  tentar impedir. O que aconteceria depois dependeria do exército, que teria que tomar uma posição: Se ele continuar sob o controle do governo a revolta terminaria rapidamente (pois os golpistas são um número pequeno), mas se uma parte do efetivo militar se voltar a favor dos golpistas então seria guerra civil generalizada tal qual a guerra civil americana.

    O terceiro cenário seria acontecer o “pacto” proposto por Lula mas acho bastante improvável que isso aconteça. Os golpistas deixaram claro que queimaram todas as possibilidades de diálogo e os brasileiros por sua vez seriam estúpidos de aceitarem novamente os golpistas em qualquer cargo importante, o seu empresariado também está jogando “tudo ou nada” e quem não têm mais nada a perder sempre prefere a violência ao diálogo.

  4. Caro Romulus, vejo que você

    Caro Romulus, vejo que você está bastante antenado, aí na Suíça, com o que está acontecendo no Brasil. Você se lembra do que aconteceu no Reino Unido com a ascenção de Toni Blair ao poder? O trabalhismo foi pro brejo e as receitas da Tatcher acabaram sendo aplicadas. A Dilma mesmo, por aqui, é acusada de comportamento similar. As principais políticas sociais não foram abandonadas, mas houve um Levi no fim do túnel…Nenhum país é completamente independente nos dias de hoje. Mesmo a Coreia do Norte que resolveu peitar o Império está sendo criticada pela China e Rússia (ver Sputnik Brasil de hoje). A pergunta é por que? Penso que seja que se aquela atacar por engano os EUA ou aliados, ou se sofrer um ataque preventivo (como alguns falcões advogam), o mundo se veria em um conflito nuclear generalisado.

    Portanto, algumas conceções ao Império terão que ser feitas, desde que não eliminem nossa independência. É um fio de navalha! Exige muita sabedoria política e, sobretudo, confiança por parte do povo, de que não estamos sendo enganados por nosso governo. Lula carrega, naturalmente, um bornal cheio desta confiança popular, o que acho difícil de encontrar em outra pessoa. Por isso, Lula é a pessoa certa para conduzir a nação brasileira à emergência.

    1. Lula (ainda) é o cara – se ainda os há

      Estou totalmente de acordo sobre a relevancia de Lula. A questao é o que ele deve fazer para minimizar as perdas que vimos tendo. E se mesmo oferecendo a Jararaca em holocausto haverá paz. Ninguem sabe.

      Aliás, por falar em repactuaçao, a nomeaçao de Levy foi uma das muitas para tentar “repactuar”. Se nao com a oposiçao, com o mercado financeiro. Por diversas razoes muito discutidas no blog do Nassif fez mais mal do que bem.

  5. A corda

     Meu filho a “corda esticou demais” , procurar um espaço para qualquer negociação, encontra-se a cada dia mais improvavel, vc. comenta sobre uma “guerra de tribos”, só que atravessamos este ponto, ambos os contendores, ambos os lados, já não mais comportam-se como tribos, sequer possuem dirigentes confiaveis, colocaram as forças no terreno, assumiram o carater de “hordas”, do ou é tudo ou nada, e mesmo os que teoricamente vencerem/perderem irão continuar no “campo de batalha”, sem lideranças sólidas para controla-los.

      A preocupação de todos é com o dia de amanhã até 17/04, um imediatismo infantil, facebookeano, twiteiro, atingiu a todas as hordas, que nem comentam ou analisam que o grande teste não termina dia 17/04, ele neste dia irá começar, independente do resultado, as grandes batalhas estão não apenas previstas, possuem data para explodir : 18/04/2016

    1. Planos para o Natal?

      Caro Jr.,

      Comentário preciso.

      A maioria dos apoiadores – tanto do golpe quanto do governo – quer uma vitória total. A radicalizaçao foi tao exacerbada que veem qualquer coisa menos que uma vitoria total como derrota – inaceitavel.

      Realmente num cenario como esse, com o grosso das tropas radicalizado, e com os lideres perdendo legitimidade e força de comando, um acordo fica cada vez mais distante. E, como vc disse, dia 17 é o inicio da “batalha final”, nao o fim.

      Desde a escalada da conduçao coercitiva, as Convençoes de Genebra foram denunciadas – primeiro e em maior grau pelos do golpe. Nao ha limite para arma quimica ou biologica e nao ha respeito aos PoWs – imagens e conteudos extraidos de prisioneiro de guerra sao usado abertamente como armas e propaganda.

      Se houver armas nucleares, estamos a um passo de os dois lados apertarem o botao vermelho.

      A minha esperança é numa cada vez mais longinqua detente via repactuaçao. Mas quem falar que sabe onde estaremos no natal esta mentindo.

      1. Esperanças, detente

            Meu caro,

            Em varios posts recentes, eu como vc. e alguns outros, diria “mais experientes” ( velhos ), até o moderador deste sitio, nos referimos a uma saida pactuada desta situação gravissima, mas sempre fomos bombardeados pelo radicalismo infantil que instalou-se em ambos os lados, portanto, infelizmente, e poderiam ser elencados varios motivos, a “janela” para esta forma de solução de compromisso, foi fechada – todos os contendores, exageraram em seus erros, tanto o governo como a oposição. ( se é que ainda existe um governo e uma oposição definidas, pois caso existissem a “janela” não teria sido fechada )

             Mas como vc. usou a palavra “détente” , creio que com esta situação de radicalismos, de tantas posições exacerbadas e fixas, onde qualquer fato ou verdade pode ser manipulado a bel prazer dos envolvidos, pactos, concertações, compromissos, não são mais possiveis, uma “détente”, ou até uma forma de “paz armada”/armisticio, poderia ser algo a procurar após 17/04, independente do resultado, pois teremos, as pessoas que ainda possuem uma réstia de consciência, que não querem que o Brasil conflagre-se, um inicio de solução, algo real a ser negociado, parametrizado, para pelo menos que se consiga levar o País alem do Natal/16, mas até 2018.

              Quanto a este Natal/ Ano Novo : Lambert Beach Resort – Ilhas Virgens Britanicas,  como vou pela Copa Airlines, antes dou uma passada em Panamá City , só para escala e levar um papinho com alguns advogados.

               (brincadeirinha).

        1. hahaha

          Ótima pedida. Quando chegar mais perto vc me dê um toque por favor sobre as datas exatas. Vou te mandar uma procuração para resolver umas pendências minhas lá no ístimo tb. O engajamento da Suiça com a OCDE aumentou um pouco as burocracias necessarias para nao ter problemas… rs

  6. Pra Mim e Pro Moses…

    Tem dia que é noite em argumentos absolutos que fazem lembrar (sei lá por que?) no caso, o “causo da “sabedoria” empregada pelos banqueiros Safra ao negociarem, quando enfatizavam sempre à outra parte, com voz solidária, que o mais importante era o negócio ser bom para os dois, enquanto pensavam, pra mim e pro Moses e vice-versa, e a outra parte, envaidecida, pela parte que (não) lhe tocava, correspondia por não aprender nunca, que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, mesmo quando aparentemente iguais e absolutas.

    O Brasil, definitivamente, não é para amadores. Lula que o diga, pois esse aprende. 

  7. Sincretismo é tudo

    Nada como Atrologia, Tarot e Geomtria.

    Não sai acordo porque não querem usar as ferramentas mínimas e necessárias para tanto.

    O Índio, apesar do estomago de avestruz, não têm o conhecimento para entabular o conflito do caso em tela.

    Duvido que seu intelocutor Suiço, viajado e escolado também o tenha.

    Fica a dica, procurem um profissional.

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