Novo livro de Luiz Fernando de Paula é essencial para o entendimento do Brasil atual

O lançamento do livro está marcado para o dia 01 de junho na Livraria Martins Fontes na Avenida Paulista, em São Paulo.

Economia Brasileira na Encruzilhada: Ensaios Sobre Macroeconomia, Desenvolvimento Econômico e Economia Bancária, de Luiz Fernando de Paula

por Carmem Feijó e Fernanda Feil

A dificuldade não reside tanto em desenvolver novas ideias, mas em escapar das velhas, que se ramificam, para aqueles que foram educados como a maioria de nós, em cada canto da nossa mente.” Com essa epígrafe de Keynes, Luiz Fernando de Paula introduz o leitor a sua mais nova obra: “Economia Brasileira na Encruzilhada: Ensaios Sobre Macroeconomia, Desenvolvimento Econômico e Economia Bancária”, lançado pela editora Appris.

Luiz Fernando parte de uma análise keynesiana-estruturalista da economia brasileira, entendendo como pressuposto básico que a teoria econômica serve ao propósito maior de fazer diagnósticos e propostas de política com vistas a promover o desenvolvimento econômico sustentável. Na perspectiva keynesiana-estruturalista, desenvolvimento econômico se traduz em mudança estrutural, com aumento de complexidade tecnológica, da produtividade agregada e da qualidade de emprego. Isto implica dizer que o processo de desenvolvimento não é alcançado de forma autônoma e o mercado, deixado às suas próprias forças, não atua, necessariamente, para levar a economia ao pleno emprego de suas forças produtivas. A contribuição revolucionária do pensamento de Keynes é mostrar que decisões são tomadas em ambiente de incerteza não-probabilística e, portanto, a moeda, o ativo mais líquido da economia, não é neutra. Agentes racionais, fazendo escolhas racionais com toda informação disponível, atuam de forma defensiva. Neste caso, o investimento em ativos de baixa liquidez e retorno em longos períodos de tempo, mas geradores de renda e emprego, devem competir com outros tipos de investimento. Ou seja, a cada decisão de escolha de portfólio feita pelos agentes econômicos, as perspectivas de ganho monetário futuro são comparadas às alocações alternativas de maior liquidez. A conclusão de Keynes e dos pós Keynesianos é que, em uma economia monetária, como as modernas, é a preferência pela liquidez dos agentes que define o nível de investimento em ativos fixos, e não a poupança prévia. Por isso, o equilíbrio de curto prazo pode ocorrer, e este é o padrão, abaixo do pleno emprego. O desenvolvimento do sistema financeiro joga papel de destaque numa economia monetária moderna, e por ter um comportamento pró-cíclico, exacerba as flutuações econômicas. A atuação das políticas econômicas ativas e do Estado como regulador de mercados não competitivos é, assim, fundamental para reduzir a volatilidade do crescimento, dar confiança à tomada de decisão dos agentes econômicos e desta forma garantir uma trajetória de desenvolvimento sustentável e inclusiva.

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Passando para a abordagem mais empírica, o livro oferece análises sobre a economia brasileira divididas em três grandes blocos. O primeiro, “Desenvolvimentismo”, trata do debate sobre políticas desenvolvimentistas e as escolhas mais votadas para flexibilização dos mercados e a intervenção do Estado. A análise do processo de industrialização e desindustrialização é central nessa primeira parte. Assim, a primeira parte avalia os caminhos da economia nacional frente aos desafios de um país periférico em se desenvolver no contexto de integração financeira. O autor oferece uma interpretação sobre o sucesso e o fracasso das políticas macroeconômicas dos governos PT e dos sucessores em manter a estabilidade de crescimento, equilíbrios fiscal e externo, e inclusão social e distribuição de renda. Trata-se, portanto, de análise atual sobre as escolhas de políticas macroeconômicas e sociais adotadas e suas consequências para entender o vexaminoso momento de crescimento pífio que estamos vivendo desde meados de 2010. 

A segunda parte, “Macroeconomia” trata mais especificamente das políticas adotadas, focando em períodos específicos, analisando os drivers do crescimento e a posterior recessão. Essa seção regride ao início do período de liberalização financeira, e a posterior  adoção do Regime de Metas de Inflação, na sequência do fim da âncora cambial do Plano Real. Aborda, no mesmo sentido, a prevalência de altas taxas de juros reais no Brasil, seu efeito contágio da dívida pública e a taxa de câmbio apreciada. Avalia as políticas de recuperação da Grande Crise Econômica Mundial em 2009, e as tentativas falhas de coordenação de políticas macroeconômicas nos anos 2010, com forte atuação contracíclica. Finalmente, essa parte traz uma avaliação da economia brasileira durante a pandemia do coronavírus e as políticas econômicas implementadas, em 2020, para  o enfrentamento dos efeitos econômicos e sociais da pandemia.

A terceira parte, “Setor Bancário”, trata de forma maestral do comportamento dos bancos e ciclo do crédito no Brasil, levando em conta as especificidades institucionais e macroeconômicas do período analisado. Avalia, também, a atuação dos reguladores do mercado financeiro e a influência da globalização financeira no sistema financeiro doméstico. Como não poderia deixar de faltar, essa parte fala sobre os altos spreads bancários no Brasil e da concentração regional do crédito.

Os 12 capítulos do livro oferecem ao leitor, de forma sistemática e objetiva, várias interpretações sobre aspectos da conjuntura e da estrutura da economia brasileira. No todo, o livro oferece uma leitura crítica e coerente sobre a nossa trajetória de desenvolvimento em mais de três décadas. O momento do livro é muito oportuno, pois como está no título, a economia brasileira está numa encruzilhada. O livro propõe, de forma clara, o debate sobre: o espaço para políticas de cunho desenvolvimentista; como combater o rentismo; como recuperar políticas públicas e como reorganizar as instituições de Estado, tão destruídas pela obsessão de ajuste fiscal e pela ideologia neoliberal.

A lição que fica é que o Estado, na visão keynesiana- estruturalista, é o principal agente indutor do desenvolvimento e para tanto deve manter os preços macroeconômicos – a taxa de juros, a taxa de câmbio, a taxa de inflação, dentre outros – de forma a estimular o desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo, além de promover políticas industriais estruturantes. A política fiscal deve recuperar protagonismo e novas regras fiscais, funcionais ao desenvolvimento, devem ser desenhadas e implementadas. Como não poderia deixar de ser em uma obra pós-keynesiana de Luiz Fernando de Paula, o livro trata especificamente da questão do financiamento do desenvolvimento, ou seja, da funcionalidade do crédito, e do setor financeiro para o processo de desenvolvimento. A competência da obra é trazer temas heterogêneos que se completam no objetivo maior de contribuir para o debate sobre como promover o desenvolvimento e garantir o pleno emprego por meio da mudança estrutural da economia. A missão é ousada e a obra responde a altura.

Em resumo, Luiz Fernando organizou uma obra multidisciplinar essencial para o entendimento do Brasil atual, problematizando os principais entraves ao crescimento econômico e possíveis alternativas para superá-los. Nesse ano eleitoral com fortes ataques a democracia, às instituições de Estado e ao próprio desenvolvimento econômico, ler análises consistentes sobre como chegamos ao ponto que estamos, é essencial para recuperar a esperança de voltar crescer de forma sustentável e com garantia de melhor padrão de vida para a população.

Luiz Fernando de Paula é economista com doutorado pela Unicamp. Realizou seu pós-doutoramento na Universidade de Oxford (2000/01). Foi Professor Visitante no Centre for Brazilian Studies da Universidade de Oxford (2006) e no Latin American Institute da Frei Universitat Berlin (2017 e 2020). Atualmente, é professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ) e coordenador do Grupo de Estudos de Economia e Política (Geep), no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp-Uerj), onde é professor voluntário. É professor titular aposentado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE/Uerj). Foi presidente da Associação Keynesiana Brasileira (AKB) em 2009/2013. É, atualmente, bolsista de produtividade nível 1-C do CNPq e cientista do Nosso Estado da Faperj. É, ainda, coeditor da Brazilian Keynesian Review e membro do Conselho Editorial da Revista de Economia Política e da European Journal of Economy and Economic Policy: Intervention. É autor do livro Financial Liberalization and Economic Performance: Brazil at the Crossroads (Routledge) e de Sistema financeiro, bancos e financiamento da economia (Campus/Elsevier), e, ainda, coautor dos livros Economia monetária e financeira (Campus) e Macroeconomia da estagnação brasileira (Alta Books)

O lançamento do livro está marcado para o dia 01 de junho na Livraria Martins Fontes na Avenida Paulista, em São Paulo. O evento começará às 18h. No Rio de Janeiro o lançamento ocorrerá no dia 24 de junho na sede do Iesp / Uerj, em Botafogo, também às 18 horas.

Carmem Feijó – professora titular da Universidade Federal Fluminense, pesquisadora Cnpq  e coordenadora do grupo de pesquisa Financeirização e Desenvolvimento – Finde

Fernanda Feil – pesquisadora de pós-doutorado da UFF e do grupo de pesquisa Financeirização e Desenvolvimento – Finde  

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