Jornal GGN – A cabotagem é o modal de transporte mais adequado para longas distâncias em regiões próximas à costa. Em percursos superiores a mil quilômetros, deveria ser o modal mais competitivo de qualquer sistema de integração territorial. No Brasil, no entanto, a modalidade ainda é pouco conhecida e pouco utilizada, representando apenas 12,5% da matriz nacional.
Pior. Retirando da estatística a utilização de cabotagem feita pela Petrobras para movimentar pela costa derivados de petróleo, esse percentual cai para 4,5%. Retirando o movimento de granel sólido, cai para 1,5%.
Em outros países, o modal tende a ser muito mais representativo. Na China, a cabotagem responde por 48% da movimentação de carga. Na comunidade europeia 37%. Há, portanto, um espaço enorme para o crescimento das atividades de cabotagem no Brasil, especialmente porque o país concentra grande parte de sua população, renda e produção em regiões litorâneas.
E de fato nos últimos dez anos a cabotagem teve um crescimento significativo. Na média, o setor cresceu 13,5% ao ano. Para se ter uma ideia, no mesmo período o crescimento médio da economia foi de 2,7% ao ano.
Um dos pontos principais para esse crescimento foi a definição clara de um marco regulatório estável, que deu previsibilidade para o setor e atraiu investimentos nacionais e estrangeiros. Isso porque, apesar de a lei só permitir que operem na cabotagem empresas brasileiras de navegação, ela não estabelece limites para a origem do capital, de modo que uma empresa brasileira pode ter 100% de capital estrangeiro e ainda atuar no setor.
Mesmo assim, a área ainda possui alguns gargalos, leis que foram escritas e que visavam dar mais competitividade diante dos outros modais, mas que ainda não estão efetivamente sendo aplicadas. Com isso, o empresário do setor ainda enfrenta custos desiguais, que impactam no preço do serviço.
O assunto foi detalhado por Cleber Lucas, presidente da Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (ABAC), no 64º Fórum de Debates Brasilianas.org.
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O crescimento da cabotagem em uma economia recessiva
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“Apesar de um crescimento bastante expressivo nos últimos anos, o que se percebe é que a cabotagem ainda é um modal pouco conhecido. E é fácil a gente entender os motivos disso. Se coloca na matriz de transporte uma fatia de 12 a 13% para a cabotagem no Brasil. Mas se retirar da cabotagem o que é feito pela Petrobras com derivados de petróleo, esse percentual cai para a faixa de 4,5%. E se desses 4,5% se retira o movimento do granel sólido, resta para a carga manufaturada 1,5%. Então, quando a gente confronta 1,5% de cabotagem, de produtos industrializados, que pretendem substituir o transporte rodoviário de longa distância no Brasil, realmente, a participação é muito pequena e a percepção dessa atividade é muito pequena no país. E o interessante da curva de crescimento da cabotagem é que ela é uma curva longa. Se você pegar uma série histórica de dez anos, o crescimento é da faixa de 13%. Contra um crescimento da economia brasileira no mesmo período de 2,7%. Então, é uma atividade que cresce numa escala de quase cinco vezes a economia brasileira”.
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Os desafios das empresas que operam no setor
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“O fato é que cada nova carga da cabotagem é um novo projeto. Então, o trabalho dos que operam nesse setor hoje é como chegar a esse mercado e como propor um produto que substitua, eficientemente e com vantagens, a prática atual. A comercialização de uma carga para cabotagem na verdade é muito mais uma venda de um serviço logístico do que um transporte marítimo. Envolve coletar a carga na ‘casa’ do cliente e entregar na casa do cliente do nosso cliente. Isso passa por modais rodoviários, ferroviários, por operações portuárias, para então chegar num transporte marítimo que é o cerne de oferecer competitividade a esse novo sistema de transporte”.
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A importância do marco regulatório para o crescimento sustentável da cabotagem
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“Bem, e qual é o motivo desse crescimento sustentável, de forma ampla, e de haver esses investimentos associados? Um dos pontos importantes é um marco regulatório estável. Nós, iniciativa privada, não nos sentimos seguros de investir com um marco regulatório instável. Um marco bem definido é a chave para você destravar investimento em qualquer atividade. E o que é esse marco regulatório? A cabotagem no Brasil é privativa de empresas brasileiras de navegação. Mas diferentemente de outros segmentos não há limitação para a origem do capital. Portanto, uma empresa brasileira de navegação pode ter 100% de capital estrangeiro. Todos são muito bem vindos a investir na cabotagem no Brasil”.
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As leis que poderiam favorecer o setor, mas ainda não pegaram
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“Bem, mas nós temos algumas leis que não pegaram. Talvez por sermos pouco conhecidos e talvez por termos uma participação ainda pequena, sofremos com alguns entraves. Um deles, equiparação dos preços dos combustíveis da cabotagem ao longo curso. A lei estabelece que uma embarcação brasileira na atividade de navegação de cabotagem tem direito de ter o preço do seu combustível equiparado ao da embarcação estrangeira que está abastecendo do seu lado. Pasmem os senhores, nós pagamos 20 a 25% a mais sobre o nosso combustível do que as embarcações estrangeiras que aqui abastecem. Por entendimento do único fornecedor desse setor de que imposto não faz parte de preço. Outra questão, a compensação do adicional de frete. O adicional de frete sai do Fundo da Marinha Mercante, vem para a empresa de navegação e não pode voltar para o Fundo pagando os seus investimentos. Você tem que primeiro entrar na prioridade e ser ressarcido para depois pagar os seus financiamentos com o mesmo órgão que é responsável por te pagar o adicional de frete. A grande diferença é que esse ressarcimento para a empresa de navegação dura três anos. Então, é mais algo que tira a competitividade da empresa”.
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Combustível: o item de consumo mais oneroso em atividades de transporte
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“Eu citei a questão da equiparação do preço às embarcações de longo curso, mas queria chamar a atenção dos senhores para algo ainda mais pernicioso. O combustível é na atividade de transportes talvez o item de consumo mais oneroso. Seja ela a atividade que for. Pois bem, ao competir com o transporte rodoviário de longa distância nós temos que competir com uma indústria, que é a indústria rodoviária, que usa o seu principal item de custo, que é o combustível, tendo subsídio, basicamente. Todos nós acompanhamos que o combustível no Brasil é um item de política econômica, que é gerenciado para não ter reflexo sobre inflação e outros dados. O transportador rodoviário consome um combustível subsidiado enquanto a cabotagem, que navega ao seu lado, usa um combustível que é sujeito a todo tipo de intempérie, além das questões cambiais relativas, que quando o petróleo cai não há nenhuma vantagem, pois o câmbio sobe”.
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As assimetrias regulatórias e documentais que tiram competitividade da cabotagem
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“Outras assimetrias estão na questão de regulamentação, na questão documental. O transporte marítimo é fiscalizado em cada porto. Antes de sair de cada porto, a Marinha do Brasil tem que fazer uma inspeção, que se chama Port State Control, para poder liberar o navio. A Anvisa inspeciona todos os navios e recebe uma taxa, mesmo que seja de porto nacional para porto nacional. A Polícia Federal visita os nossos navios em cada porto nacional. A Receita Federal nos exige todos os documentos que são exigidos para o transporte internacional. O Ministério da Agricultura nos inspeciona em todos os portos nacionais. Esse tipo de burocracia rouba da cabotagem uma competitividade que é preciosa e que é absolutamente necessária para que essa atividade se desenvolva”.
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Adicionar as hidrovias
Prezado Nassif,
se as hidrovias (nos rios) fossem adicionadas à contabilidade, o potencial de crescimento do transporte embarcado (águas interiores e exteriores) seria enorme.
Mas ficamos na preguiça de usar o que já existe: transporte rodoviário.
Transporte marítimo…………….
“Mas ficamos na preguiça de usar o que já existe: transporte rodoviário.” (dflopes).
Não é bem assim, pois trabalhei durante muitos anos na Cia de Navegação LLoyd Brasileiro, e via como os lobbyes, trabalhavam em Brasilia para boicotarem toda e qualquer iniciativa de se fortalecer a Marinha Mercante nacional, e beneficiar interesses escusos de estrangeiros.
Tanto é que, em 1997, pela mão de Collor e FHC, foi o LLoyd para a “cucuias”, entregando as linhas pioneiras da Africa, da europa e américa doando seu patrimônio a preço de batatas aos concorrentes.
Os fabricantes de carros, caminhões e carretas, sempre irão boicotarem os projetos de se fortalecer o transporte marítimo e fluvial, ao contrário de outros países, pois no nosso caso, além do interesse nacional, há que ceder/atender as pressões de interesses estangeiros!!!
É como sempre digo: o Brasil, nosso grande país, merecia melhor sorte !!!!!!!!!!