Garnier, o “mais difícil dos chefes militares”, aceitou dar um golpe de Estado com Bolsonaro

Bolsonaro consultou as Forças Armadas sobre dar um golpe após a vitória de Lula. A Marinha aceitou. Mas sem o Exército, Bolsonaro recuou

Almirante Garnier, ex-comandante da Marinha, aceitou embarcar no plano de golpe de Jair Bolsonaro contra a posse de Lula, segundo informações de O Globo. Foto: Reprodução/Youtube
Almirante Garnier, ex-comandante da Marinha, aceitou embarcar no plano de golpe de Jair Bolsonaro contra a posse de Lula, segundo informações de O Globo. Foto: Reprodução/Youtube

No final de 2022, após a vitória eleitoral de Lula, Jair Bolsonaro teria se reunido com a cúpula das Forças Armadas para discutir um plano de golpe, numa tentativa desesperada de permanecer no poder.

O Exército teria negado adesão ao golpe. Não se sabe qual teria sido a conduta da Força Aérea. Mas o almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha (que tem cerca de 80 mil homens e mulheres em seu corpo), embarcou prontamente na empreitada golpista.

Os detalhes da reunião teriam sido narrados na delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O trecho sobre a proposta às Forças Armadas vazou à imprensa nesta quinta (21).

O ministro da Defesa do governo Lula, José Múcio Monteiro, disse que o golpe “não interessou às Forças Armadas”. “Foram atitudes isoladas”, afirmou, reclamando ainda da “suspeição coletiva” em que se encontram os militares hoje.

Quem é Almir Garnier

Não é surpresa nenhuma que Garnier tenha aparecido na delação de Cid como um entusiasta do golpe. Em junho passado, o Financial Times publicou reportagem sobre a “discreta campanha” dos Estados Unidos para garantir a posse de Lula.

“Um alto funcionário brasileiro que esteve intimamente envolvido lembra que o ministro da Marinha de Bolsonaro, almirante Almir Garnier Santos, era o mais ‘difícil’ dos chefes militares. ‘Ele ficou realmente tentado por uma ação mais radical’, diz. ‘Então tivemos que fazer muito trabalho de dissuasão, o departamento de estado e o comando militar dos EUA disseram que iriam rasgar os acordos [militares] com o Brasil, desde treinamento até outros tipos de operações conjuntas'”, revelou o FT

A lealdade a Bolsonaro e o desprezo pelo governo recém eleito já ficara patente quando Garnier decidiu não participar da passagem de bastão para seu substituto, o almirante Marcos Sampaio Olsen.

Em meio a uma transição tensa, duramente marcada pelo 8 de Janeiro, Olsen chegou com as seguintes falas: “Temos um Brasil polarizado, e os militares foram trazidos para esse contexto. Precisamos reforçar que é uma instituição de Estado. (…) É equívoco achar que as Forças Armadas podem ser um poder moderador.”

Garnier, em sentido oposto, gravou vídeo justificando o apoio a Bolsonaro entre militares. Em outra peça divulgada na internet, disse que “sem valores morais é impossível construir uma Nação”, reproduzindo o discurso bolsonarista.

Em 15 de dezembro de 2022, quando a marcha golpista de Bolsonaro caminhava para o fracasso, Garnier participou da formatura de quase mil novos fuzileiros navais. Na despedida emocionada, fez um discurso dúbio.

“Nem sempre conseguimos fazer tudo que queremos. Muitas vezes queremos navegar em direção ao porto seguro em linha reta, mas a tempestade nos impede, e temos de navegar de acordo com o que aprendemos para contornar furacões, afim de não perder nosso barco e colocar em risco nossa tripulação. Mas saibam os senhores que a manobra de tempestade girará novamente o barco em direção ao porto seguro que queremos. E lá nós chegaremos, pode demorar um pouco mais, mas chegaremos. O importante é que estejamos unidos.”

Garnier disse também que a tropa estava em plena “condições de cumprir missões onde quer que o poder político nos demande.” E finalizou com um chamado: “O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever. Tenho tentado cumprir o meu. Cumpram o de vocês”.

A delação de Cid

O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, revelou em delação premiada que presenciou o encontro do ex-presidente com a cúpula das Forças Armadas e aliados militares, para discutir a possibilidade de implementar uma minuta de intervenção militar no país.

O tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid. Foto: Agência Senado

De acordo com o jornalista Talento Aguirre, que ouviu fontes que acompanharam as negociações de delação, Cid narrou também os detalhes de um encontro anterior, no qual o ex-assessor especial Filipe Martins entregou a minuta de decreto golpista para Bolsonaro.

O documento previa caminhos para prender o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Morais, e suspender o resultado da eleição vencida por Lula. 

Cid também teria presenciado o encontro com as Forças Armadas, quando Garnier teria garantido que sua tropa estaria pronta para aderir a um chamamento, enquanto o comando do Exército teria negado a proposta. Sem o Exército, Bolsonaro não deu seguimento ao plano.

O relato teria caído “como uma bomba entre os militares” e teria gerado uma grande tensão nas Forças, segundo Bela Megale, no O Globo. 

Tendo em vista o peso das declarações, a Polícia Federal (PF) tem tratado o tema com total sigilo, uma vez que é preciso que haja provas sobre os fatos narrados.

4 Comentários

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  1. “sem valores morais é impossível construir uma Nação”
    Parece mais uma confissão de culpa. Afinal, onde o distinto almirante encontrou valores morais no governo Bolsonaro, que ele tanto confia, a ponto de concordar participar de imediato, em um ato criminoso e antipatriota, como é a tentativa de golpe de estado? Gostaria de saber que valores morais um criminoso, praticante de um golpe de estado, carrega dentro de si? Que orgulho é esse, que mais se parece com uma apologia ao crime?
    Talvez o pijama seja o melhor destino para um almirante rebelde.

  2. “sem valores morais é impossível construir uma Nação”
    Parece mais uma confissão de culpa. Afinal, onde o distinto almirante encontrou valores morais no governo Bolsonaro, que ele tanto confia, a ponto de concordar participar de imediato, em um ato criminoso e antipatriota, como é a tentativa de golpe de estado? Gostaria de saber que valores morais um criminoso, praticante de um golpe de estado, carrega dentro de si? Que orgulho é esse, que mais se parece com uma apologia ao crime?
    Talvez o pijama seja o melhor destino para um almirante rebelde.

  3. Os milicos milicianos são todos iguais. O miliquinho amestrado denunciou somente essa escória porque ousou colocar a cabeça para fora da latrina que habita. Os outros,com medo de perder seu viagra,continuam golpistas,mas com a cabeça na latrina.

  4. Delação Combinada

    Peça chave no inquérito que investiga a intentona de 8 de janeiro, o ex-ajudante de ordens do inominável resolveu “colaborar”. O oficial, confiante na permanência no poder de seu chefe, foi descuidado e deixou inúmeras pontas soltas. A abundância das marcas de batom na cueca o deixou numa situação extremamente delicada. Não teve outra alternativa a não ser colaborar para minimizar os danos pessoais que certamente irá sofrer.

    A tal colaboração (ou delação) premiada, como se sabe, quase sempre é uma “delação combinada”.

    Uma combinação que começou logo após a prisão cautelar do sujeito, com uma verdadeira romaria de oficiais de alta patente à sua cela. Certamente não foi por simples motivação humanitária que seus irmãos de farda o procuraram.

    Claro que essas visitas e conversas prosseguiram posteriormente por outros canais, em meio a duas trocas de advogados da sua defesa. Tratou-se de uma negociação difícil, obviamente.

    Com a carreira arruinada, com repercussão em seus familiares, na iminência de passar um período longo na cadeia, sem qualquer vocação para ser mártir, não poderia ser o “boi de piranha” da ocasião. Foi compelido a colaborar.

    Portanto, o conteúdo dessa delação refletirá o arranjo de bastidores feito em conluio com os seus superiores. Tudo cuidadosamente planejado para salvaguardar a instituição militar, particularmente o exército.

    Se existiu a intenção de dar um golpe, a ideia teria vindo dos assessores civis do então presidente, prontamente rejeitada pelos comandantes militares. Para que essa tese não ficasse por demais inverossímil, tinham que envolver algum graúdo. Aí entra o almirante rebelde, que não quis se dobrar aos enviados do departamento de estado dos EUA, que foram os que de fato dissuadiram os militares da ideia golpista.

    Novas revelações desta colaboração premiada virão, mas tudo dentro do mesmo roteiro.

    Quanto ao ex-presidente, bem, cada um que cuide de seus problemas. Não há mais nenhuma vantagem para os generais em protegê-lo. Para eles, virou um leproso do qual querem distância.

    O que vai ficar embaixo do tapete, que a “grande imprensa” já deve ter sido orientada a não investigar, é o que faziam os “kids pretos” na Esplanada. Eles não agem sem ordens superiores. Era uma operação de amplo conhecimento dos comandantes militares ou iniciativa clandestina de alguma dissidência? Tudo indica que ficaremos sem saber. Como ocorreu no passado no caso Para-Sar e no Riocentro. O golpismo militar sobrevive, à espera de uma nova oportunidade.

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