Chico Mendes: a voz que não cala, por Sarah Fernandes

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Especial do Brasil de Fato

Reportagem: Sarah Fernandes 

Chico Mendes, cujo assassinato completa 30 anos no próximo dia 22, deu a vida pelos direitos dos povos da floresta e deixou como legado a criação das reservas extrativista e o acesso à educação nos rincões da Amazônia.

A criação da Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre, tida como principal legado do líder seringueiro, conseguiu manter os trabalhadores em suas unidades produtivas com segurança. Mais do que isso: garantiu acesso a programas estatais de construção de casa, banheiros e a abertura e manutenção das escolas dos seringais, um sonho do líder seringueiro, que só aprendeu a ler aos 18 anos.

A luta capitaneada pelos seringueiros nos anos 1970 e 1980 por melhores condições de vida, muitas delas lideradas por Chico Mendes, rendeu diversos frutos positivos. Porém, apesar dos avanços, os trabalhadores ainda enfrentam sérias dificuldades para garantir a sobrevivência diária na floresta e muitos ainda têm a pobreza como principal oponente.

Casa tradicional da Reserva Extrativista Chico Mendes

Neste especial Chico Mendes: a voz que não cala, você ouve quatro audiodocumentários.

Os três primeiros narram a luta dos povos que habitam as reservas extrativistas para continuar sobrevivendo como trabalhadores e trabalhadoras da floresta, em tempos que o látex e a castanha rendem tão pouco financeiramente e que as leis que deveriam proteger os povos da floresta acabam os criminalizando.

O quarto e último episódio relembra quem foi Chico Mendes, com depoimentos exclusivos de pessoas que o conheceram e participaram dos “empates” organizados nos anos 1970. Ouça!

CAPÍTULO 1: NO SERINGAL DO SÉCULO 21

A castanha e o látex, que outrora foram os principais produtos do extrativismo no Acre, alcançam valores de venda cada vez menores.

A falência da economia extrativista obriga os trabalhadores e trabalhadoras da floresta a tentarem aumentar seu número de cabeças de gado, único produto, além da madeira, com algum valor de mercado.

O rebanho bovino no estado cresceu 20% só entre 2006 e 2017, passando de 1,7 milhão de cabeças para 2,1 milhões, segundo o Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entretanto, cada animal representa um perigo maior de desmatamento da floresta.

Família do seringueiro Valtemir Silva Santos em sua casa na Resex Chico Mende

No entanto, é o extrativismo que pode garantir a preservação da Amazônia e dos povos que ali resistem, como ressalta a trabalhadora rural e liderança sindical Dercy Teles. “O extrativismo da borracha e da castanha, está provado secularmente, não precisa de estudo, é capaz de manter a sustentabilidade da floresta. Eu tenho mais de meio século de vida, nasci e me criei na floresta, e sei que se houvesse uma política que garantisse a comercialização da castanha e da borracha a preço justo a floresta estava com sua sustentabilidade garantida.”

Quais os dilemas impostos aos povos que habitam as reservas extrativistas no século XXI? Ouça No Seringal do Século XXI, o primeiro capítulo da série Chico Mendes, a voz que não cala.

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O seringueiro Valtemir Silva Santos

CAPÍTULO 2: A VIDA DAS MULHERES NO SERINGAL

Da resistência ativa contra o desmatamento da floresta ao sustento dos filhos. Da liderança política ao trabalho na roça. Da sala de aula à quebra da castanha. Aí estão as mulheres dos 48 seringais da Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre.

Três décadas após as mobilizações seringueiras no estado, mulheres sustentam famílias com programas de transferência de renda e trabalho na agricultura.

O manejo madeireiro, atividade econômica importante na reserva, pouco inclui a comunidade e gera lucro apenas para latifundiários. O ônus social para as mulheres, porém, é grande.

Dercy Teles, trabalhadora rural

O Acre é um dos estados brasileiros que concentrou as maiores taxas de homicídios de mulheres em 2017, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Foram registradas 34 mortes no último ano, uma taxa de 8,3 óbitos por 100 mil mulheres. Ao todo, 658 acreanas sofreram lesões corporais em casos de violência doméstica e 210 foram vítimas de estupros, de acordo com o mesmo levantamento.

Como as mulheres conseguem resistir contra a pobreza nos seringais do século XXI? De onde tiram forças para seguir lutando?

Ouça A vida das mulheres no Seringal, o segundo capítulo da série Chico Mendes, a voz que não cala.

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CAPÍTULO 3: QUANDO A TRADIÇÃO VIRA CRIME

“Nós estamos completando 30 anos do assassinato do Chico e posso assegurar que o que foi um sonho está se tornando um pesadelo”. É assim que o trabalhador rural Osmarino Amâncio retrata a preocupação dos seringueiros sobre um dos problemas de mais difícil gestão dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre: a criminalização dos trabalhadores rurais por executarem atividades tradicionais ao seu modo de vida.

Devido a legislação da reserva, o que era um meio de subsistência se tornou crime ambiental.

Queima de pequenas áreas para abrir roçados, caça de animais para alimentação e derrubada de árvore para manutenção de casas rendem processos jurídicos e multas que chegam a R$ 80 mil.

Carros do Icmbio passam pela Resex Chico Mendes

Com o comprometimento do governo do Acre em zerar o desmatamento até 2020, a expectativa dos povos da floresta é que a pressão sobre os trabalhadores aumente ainda mais.

Enquanto isso, ganham força a extração de madeira certificada e o agronegócio, atividades concentradas nas mãos daqueles com maior poder aquisitivo.

Ouça Quando a tradição vira crime, terceiro capítulo da série Chico Mendes, a voz que não cala.

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O Seringueiro e sindicalista Osmarino Amancio

CAPÍTULO 4: O LEGADO DA RESISTÊNCIA

A luta para que famílias rurais permanecessem em suas terras. A proposta de um novo modelo de reforma agrária. A defesa implacável dos povos da floresta. Estas foram apenas algumas das bandeiras defendidas pelo seringueiro Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, e que fizeram de sua vida um exemplo de luta por justiça social.

Com a crise, o governo ditatorial do início dos anos 1970 incentivou fortemente a ocupação dos seringais pela agropecuária. Sob o lema “integrar para não entregar”, financiou a tomada das terras por grandes fazendeiros de diversos estados, chamados “paulistas”, como conta o professor de antropologia da Universidade Federal do Acre, Manoel Estébio.

Castanheiras na Resex Chico Mendes

Qual foi a importância da militância de Chico Mendes, que mudou para sempre a história da Amazônia?

Ouça O legado da resistência, quarto e último capítulo da série Chico Mendes, a voz que não cala.

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FICHA TÉCNICA:

Reportagens: Sarah Fernandes 
Apresentação e produção: Sarah Fernandes e Danilo Ramos 
Fotos: Danilo Ramos 
Edição: Daniela Stefano 
Operação de áudio e sonorização: Jorge Mayer e Adilson Oliveira 
Ilustrações: Lucas Milagres

Agradecimentos à geógrafa Pietra Cepero, Dercy Teles e Osmarino Amâncio.

 

 

 

 

 

 

 

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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