Classe média brasileira é negra, jovem e otimista

Para especialista em mercado, empoderamento está mudando perfil do consumidor brasileiro 
Na última década, 20 milhões de brasileiros migraram para as classes D e C. Além disso, 44% da nova parcela que adentrou a classe A, são os primeiros endinheirados da família, segundo Renato Meirelles, que é sócio-diretor do Data Popular. Para o especialista em mercado de baixa renda, o “empoderamento”, ou seja, o maior acesso aos recursos financeiros está alterando o perfil do consumidor no país.
Durante o 16º Fórum de Debates Brasilianas.org, realizado no dia 1º de novembro, em São Paulo, Meirelles destacou que, entre os anos de 2004 e 2010, a população brasileira saltou de 181 milhões para 193 milhões. No mesmo período, a parcela de pessoas classificadas na classe C (com rendimento per capita mensal que varia de R$ 323,00 à R$ 1.388,00) saltou de 42 milhões para 104 milhões, representando hoje mais da metade do país (58,3%). “E vamos chegar à Copa do Mundo, em 2014, com seis em cada dez brasileiros na classe média [C]”, continuou.
A classe média brasileira é considerada a mais rica entre os BRICs (sigla que dá nome para o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia e China), e detém mais recursos do que 62% da população mundial. Meirelles apontou, ainda, que essa parcela movimenta por ano R$ 1,03 trilhão, “o mesmo que o PIB de Portugal, Argentina, Uruguai e Paraguai juntos”.
É quem segura a crise
Segundo Meirelles, o que tem protegido o Brasil, num cenário de turbulência mundial, é o seu mercado interno, em especial a classe C que lida com a crise gastando.
Dados de 2011 revelam que 51% dos cartões de crédito estão na mão desse grupo, contra 42% nas classes D/E e 21% nas A/B. A proporção ajuda a explicar os gastos com eletrodomésticos e eletroeletrônicos que, neste ano, devem somar R$ 51,2 bilhões. Desse total, a classe média responderá por 48% das compras (R$ 24,6 bilhões), contra 30,7%, (A/B) e 21,3% (D/E).
Dos R$ 48,9 bilhões de reais previstos para serem gastos neste ano com produtos de higiene e cuidado pessoal, R$ 24,3 bi (49,7%) serão da classe C, contra 30,5% das classes A/B e 19,8% da população D/E.
Meirelles explica que a abertura do mercado de trabalho é a justificativa racional que a mulher de baixa renda precisava para realizar gastos com produtos de beleza. “A questão é que antes investir na vaidade, na cabeça dela, era tirar dos filhos ou do marido. Mas, hoje, ela está colocando dinheiro dentro de casa e sabe que para sair do bairro tem que se mostrar mais bonita porque assim tem mais chances no mercado de trabalho, lembrando que muitas delas trabalham com atendimento ao público”.
A participação de serviços no total de gastos da classe C também mudou nos últimos anos. Em 2002, 49,5% de cada 100 reais gastos pelo grupo foram com serviços, contra 65,2% da média atual. “Gasta-se mais com serviços do que com comida. Isso aponta para o aumento do consumo de energia elétrica, porque são mais eletroeletrônicos em casa, banda larga, telefonia, televisão por assinatura”, completou Meirelles.
O carrinho de compras mudou
De 2002 a 2010 o número de produtos no carrinho de compras dos brasileiros da classe C subiu de 28 para 40. Nas classe D/E o salto foi de 21 para 39 produtos, e entre a população A/B, de 35 para 43.
Renato Meirelles, Diretor do Data Popular Foto: DivulgaçãoDiretor do Data Popular afirma que classe C saltou de 42 milhões para 104 milhões, representando hoje mais da metade do país Foto: Divulgação
“As classes AB, C e DE consomem praticamente as mesmas categorias de produtos. Isso é democratização do consumo. E diferente do que se pensa não é verdade que a classe C só compra produtos frágeis e baratinhos”, pontuou Meirelles.  Os chamados produtos ‘low’ do gráfico são aqueles que custam até 10% mais barato, os ‘premiums’ que custam até 10% mais”.
O porta-voz do Data Popular explicou que quanto menor a renda do indivíduo maior é a quantidade de produtos de preços médios comprados, ou seja, de 100 produtos, a classe A compra 37 da categoria ‘low’, enquanto pessoas da categoria econômica C compram 34 produtos de baixo preço a cada 100 incluídos no carrinho.
“Tem duas razões: primeiro, a elite compra barato tudo aquilo que ela não põe a mão. Então economiza no detergente, no sabão em pó, mas gasta 50 reais num vinho. Segundo, porque as classes C e D/E não podem errar, optando por marcas conhecidas, que eles confiam, e valem o quanto custam”, explicou.
O empoderamento de renda por parte da população tem feito com que o consumidor comum se torne mais crítico. Na avaliação de Meirelles quem passa a ter um emprego formal, com convênio médico da empresa, por exemplo, não aceita mais ficar na fila do SUS. Logo, completou, está havendo uma mudança de padrão de consumo. “Já foi o tempo de que dentadura atraia o eleitor. Hoje, subsídios para o [Programa] Minha Casa, Minha Vida, o Plano Nacional de Banda Larga, são fatores que influenciam muito mais do que qualquer outro tipo de política assistencialista e de inclusão”, disse, ao analisar a atual situação econômica interna com a dos anos 1980 e 1990, quando o índice de inflação chegava a 80% ao mês. Nessa época, ao receber o salário o trabalhador e a dona de casa não tinham tempo de pesquisar preço ou marca porque “um saco de arroz que custa dez dinheiros no início do mês, no dia 30 já estaria custando 18 dinheiros”.
“As pessoas dão pouca importância para isso, mas do ponto de vista das relações de consumo o empoderamento do consumidor passa a ser maior a partir do momento que ele tem tempo de comparar preços, marcas e lugares”.
C, o otimista
O nível de pessoas otimistas na classe C cresceu de 65% para 80%, entre 2002 e 2011. Entre a chamada “elite”, (leitura para classes A/B) a proporção de otimistas subiu de 53% para 59%, e entre o grupo de renda D/E, de 60% para 78%.
“A classe C é a mais otimista porque foi a que melhorou mais de vida. Ela teve uma vitória recente. E o que algumas pessoas se esquecem de falar é como o fator otimismo tem influência no conjunto de ações para as pessoas continuarem a melhorar de vida”, destacou Meirelles.
Outra pesquisa feita pelo Data Popular com pessoa otimistas e pessimistas da classe C revelou que 59,3% dos otimistas queriam prestar concursos públicos, contra 27,7% dos que se colocaram como pessimistas e, ainda, que  65,3% dos esperançosos pretendiam abrir o próprio negócio, ou seja, são mais empreendedores, contra 29% dos pessimistas. Para concluir, 79,9% dos otimistas pensavam em realizar algum curso profissionalizante, frente a 40,8% dos negativistas.
A influência dos jovens na família
A população jovem de grupos de menor renda tem mais peso nas decisões familiares. Na classe A, por exemplo, 47% da população têm mais de 40 anos de idade. Esse número cai para 34% no grupo C, e para 29% no D. Além disso, se um pai de família da classe A coloca 100 reais dentro de casa, o filho contribui com 11 reais. Em contrapartida, os filhos da classe C contribuem, em média, com 53 reais em vista dos 100 reais trazidos pelos pais. Outro dado importante, é que 68% dos jovens da classe média estudaram mais do que seus pais, enquanto na classe A apenas 10% estudaram mais do que seus progenitores.
“O fato é que bônus demográfico, que é a maior concentração de gente em idade economicamente ativa, já passou na classe A, está entrando na classe C, e daqui a dez anos estará entrando na classe D”, indicou Meirelles.
Além de jovem, a maior parte da população é negra. O grupo de negros e/ou mulatos em A é de 15%, na classe B, a proporção aumenta para 23,4%, na classe C, 49,1%, em D, 60,8% e na E, 69,3%. A renda média da população negra aumentou 222% desde 2002, e hoje respondem pela movimentação de R$ 546 bilhões/ano no mercado interno.
Meirelles destacou que o Nordeste é a região onde a classe C mais cresceu nos últimos anos (+50%). A mesma faixa de renda cresceu mais no interior do país (+ 36,4%) do que nas regiões não metropolitanas (+28,3%) e metropolitanas (+19,7%). A região do Sul soma a maior proporção de pessoas desse grupo (64%), e tem como característica própria, ter um ano a mais de estudo, em relação ao total da classe média brasileira, além de ler mais jornal e acessar mais a internet.
Redação

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