
Merval e as coxas de Lula
Por Eliara Santana*
Há uma semana, comentei sobre o simbolismo – ou simbolismos – da linda foto de Lula e Janja sob o luar numa praia do Ceará. A foto nos toca por exaltar tudo aquilo de que temos muita saudade no Brasil da pandemia sem fim e do presidente incomível e descontrolado: afeto, alegria, praia, tranquilidade, disposição. Claro, a excelente forma física do ex-presidente não passa despercebida: aos 75 anos, Lula exibe coxas malhadas, difícil de ver em pessoas até mais jovens, especialmente na pandemia. Ou seja, está feliz e com capacidade física invejável para voltar ao Planalto.
Hoje, em sua coluna no Globo, Merval Pereira descobriu as coxas de Lula e deixou vazar o incômodo que a foto causou e está causando em várias hordas. O colunista se propõe então a elucidar para os não iniciados a “história política da foto”. Diz ele:
“Ricardo Stuckert estava lá, como está sempre há anos, acompanhando Lula. Mas o que estaria fazendo naquele momento de intimidade o fotógrafo oficial de Lula? Política, claro, para divulgar a boa forma física do ex-presidente, que aparecera em fotos anteriores com a fisionomia carregada, a cabeça branca”.
Merval poderia – e até acho que deveria sim – falar do significado político da foto. Como eu disse, ela ressalta a ótima disposição do candidato até o momento com o maior índice de intenção de votos para a eleição de 2022, um candidato de 75 anos que passou mais de um ano preso injustamente. Ao invés disso, ele reduz o significado político da foto a uma tentativa de dar um up na imagem de Lula, que tinha aparecido anteriormente com a fisionomia “carregada”.
A análise política da foto by Merval Pereira tem trechos ainda mais interessantes: “E não foi só sua coxa musculosa que chamou a atenção dos fãs. Estava de sunga, e houve até quem comemorasse, sob ela, o pressentido bilau do Lula. Essa demonstração de virilidade senil claramente não foi planejada, mas a certas fãs é um detalhe fundamental do mito”.
A partir dessa construção que ressalta o “pressentido bilau do Lula”, Merval passa a fazer um exercício textual mirabolante para falar de populismo e mitos populistas e ligar as coxas e o bilau de Lula a Putin, a Collor de Melo e até a Jair, o incomível. Coloca todo mundo, os que têm e os que não têm coxas pra mostrar, no mesmo balaio de gatos dos “mitos populistas”. E indaga, com aquele ar elitista de “cansei do Brasil”, “será que não vamos nos livrar desses mitos populistas?”. É uma construção tão pobre e sem criatividade que fiquei pensando se Merval pediu ao tio do churrasco para escrever em seu lugar.
Não contente com o resultado, Merval prossegue na salada, ligando Lula a Bolsonaro e misturando as coxas do ex-presidente com a regulamentação da mídia. E claro, em nome da pretensa preocupação com a volta do “populismo”, solta um recadinho para causar terror afirmando qeu qualquer um dos dois que voltar, Lula ou Bolsonaro, vai “dobrar a aposta”.
Não vou comentar a desonestidade dessa construção argumentava pífia e escandalosamente pobre, vazia de argumentos. Meu desejo é de que Lula dobre mesmo a aposta: ao invés de tirar 40 milhões de brasileiros da pobreza, tire 80 milhões; que triplique o número de universidades e institutos federais; que torne o SUS uma potência; que trabalhe para o brasileiro voltar a ser feliz fazendo churrasco de picanha e tomando cerveja de qualidade.
E que Merval cogite parar de escrever tanta bobagem e vá para a academia. De ginástica, não de letras.
*Eliara Santana é uma jornalista brasileira e Doutora em Linguística e Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), com especialização em Análise do Discurso. Ela atualmente desenvolve pesquisa sobre a desinfodemia no Brasil em interlocução com diferentes grupos de pesquisa.
Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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