No último sábado (7), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebeu seguidores na avenida Paulista, na tentativa de conquistar a anistia para os golpistas que participaram da tentativa de golpe de Estado no 8 de janeiro e também para protestar contra a atuação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.
Bolsonaro recebeu Ricardo Nunes (MDB), candidato à Prefeitura de São Paulo. Pablo Marçal (PRTB) também compareceu ao evento, mas foi impedido de subir no trio, supostamente por ter chegado apenas no fim do evento.
Em nota, Bolsonaro afirmou que a tentativa de participação de Marçal seria uma estratégia de se aproveitar de um “palanque às custas dos outros”. O coach também aspirante ao Executivo da capital paulista lamentou o ocorrido.
A briga entre bolsonaristas e Marçal ganhou a mídia. Porém, mais do que uma polêmica entre representantes da direita, para Wilson Ferreira, mestre em Comunição Contemporânea, jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual, trata-se de mais um episódio do que ele chama de “alopragem política”.
“Agora, tem uma coisa que a gente está discutindo recentemente, que é esse conceito de alopragem política. Eu acho que esse conceito deve ser levado muito bem a sério, que eu acho que é o núcleo duro da estratégia de comunicação da chamada alt-right. Eu acho que isso está além da extrema-direita tradicional, essa alt-right, essa direita alternativa cuja origem está lá nos Estados Unidos e está conectado com essa questão da guerra híbrida”, explicou Ferreira, durante participação no programa TVGGN 20H.
O mestre explica que, no início da década de 1960, o historiador Daniel Boorstin percebeu a contradição crescente na mídia, em especial no jornalismo, entre a necessidade de um fluxo constante de informação dos meios de comunicação devido à venda de espaços publicitários. “Só que o problema é que a realidade não produz tantos acontecimentos assim”, observa o entrevistado.
Boorstin criou, então, o conceito do pseudoevento, a exemplo de seminários e conferências das quais a mídia tira manchetes, que ajuda a criar a realidade.
“O que eu vejo, voltando à questão da comunicação alt-right, que ela sacou, é que a mídia tem essa contradição, ela precisa de informação, precisa de notícia 24 horas, ainda mais agora, que estamos no tempo real, online. Então ela começou a produzir acontecimentos”, continua o mestre em Comunicação.
Ao criar eventos, o que Wilson Ferreira chama de alopragem política, a direita alternativa se sintoniza com o tempo midiático. “Porque o tempo da política sempre foi lento, a gente sabe disso. Então são conchavos, negociações, os ritos tradicionais das Casas do Congresso.”
8 de janeiro
Ao criar acontecimentos, a alt-right passa a monopolizar a pauta midiática, que era o que Bolsonaro chamava de ‘caneladas’ enquanto ainda estava na presidência.
Para Ferreira, o episódio do 8 de janeiro foi mais um exemplo de alopragem política, tendo em vista que o pedido de anistia aos golpistas entrou na pauta da Justiça e até da eleição da Câmara dos Deputados, já que os parlamentares do PL, que representam quase 20% da Casa, atrelaram o apoio ao sucessor de Arthur Lira (PP-AL) à questão da anistia.
“[O 8/1] Vejo como mais um exemplo daquilo que chamo de ‘não acontecimento’. Numa domingueira, numa tarde ensolarada, transmissão ao vivo de um golpe de Estado. Para quem estuda comunicação, acho uma coisa muito overact. A gente assistiu no domingo à tarde uma transmissão ao vivo de uma tentativa de golpe de Estado”, diz o entrevistado.
Verdadeiro golpe
Wilson Ferreira acrescenta ainda que o golpe de Estado já ocorreu, uma vez que os militares conseguiram criar um candidato manchuriano, referindo-se a Bolsonaro, e colocá-lo na presidência.
Tal feito foi possível graças ao ‘agrojornalismo’, que seria a prática de plantar notas na mídia, pautar a vida política nacional e, assim, criar uma correia de transmissão de notícias com o jornalismo.
“Aí começa a obragem política, plantar notas. Esses colunistas são ávidos por notas e eles se sentem embevecidos e orgulhosos deles terem… ‘Ah, passou a pauta para mim, (25:30) caiu no meu colo'”, continua o professor.
Por fim, Wilson Ferreira explica ainda que a estratégia da alt-right com um candidato como Marçal é explodir a democracia de dentro para fora, uma vez que ele é naturalizado e representa a ideologia woke, de pessoas que tendem a ser identitárias, censuradoras e puritanas em seu pensamento.
Enquanto isso, a esquerda segue paralisada.
Assista a entrevista na íntegra:
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Tá, a solução seria não noticiar o 8.1 e nem a reunião de 7.9 !?
Tem muito isca e coisa plantada mas estes não seriam exemplos.
Os governos autoritários resolvem isto bem dizendo o que a mídia deve considerar notícia.