Fernando Horta
Somos pela educação. Somos pela democracia e mais importante Somos e sempre seremos Lula.
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Sem rumo, por Fernando Horta

Sem rumo

por Fernando Horta

Entre 2013 e 2016 parece ter se consolidado no Brasil a ideia de que nada estava certo. Nem social, nem economicamente. Também nada certo politicamente … enfim, tudo – absolutamente tudo – estava errado. Surgiram propostas de reformas qualquer assunto. Dilma mesmo se elegeu com propostas de reformas políticas, tributárias e etc. A FIESP tinha outro grupo de propostas, e praticamente todo agente político do país também tinha. Curiosamente, apenas o judiciário e a mídia não entraram neste “desarranjo consensual”. Não havia proposta para estes grupos, e isto é uma boa dica sobre de onde partiram as ideias de que tudo estava errado.

Foi um consenso estranho, lançado aos poucos junto com o tal “Padrão Fifa”. Padrão este que, depois soubemos, o Brasil sempre teve. Aliás, é provável até que tenhamos sido nós que o exportamos para a FIFA, vide João Havelange. Consensos como este, que pregam a imprestabilidade das instituições de um país, costumam emergir após grandes hecatombes, revoluções ou guerras. Podemos ver isto acontecendo na França do Absolutismo (final do século XVIII), na Europa do entre-guerras e em pouquíssimos outros lugares. Nem na Alemanha, saindo do nazismo, ou no Japão após a Segunda Guerra Mundial este entendimento de “terra arrasada” vingou. Há sempre uma luta daqueles que vivem o seu tempo e o seu espaço pela manutenção das coisas, ainda que de forma fragmentada, reconhecendo os pontos positivos.

Isto não aconteceu no Brasil.

O brasileiro passou a atacar-se todo dia, a toda hora e por qualquer motivo. Numa situação semelhante à desordem biológica chamada Lupus. No Lupus, após um momento de stress psicológico ou biológico, o corpo passa a não reconhecer a si mesmo e se auto-destrói. De 2013 a 2016 (quiçá com resquícios ainda hoje) o Brasil se auto-destruiu. Nada prestava (com exceção da mídia e do judiciário, como já disse). Da educação ao pré-sal, da política às Olimpíadas. Tudo deveria ser negado, modificado ou simplesmente desfeito. Foi um consenso deveras acachapante.

É preciso, no entanto, entendermos que os diversos grupos sociais que chegaram a este consenso, o fizeram por diferentes motivos. Ora, se eu e você concordamos que uma comida está ruim, é muito provável que o façamos por motivos diferentes. Eu acho que esta faltando sal e para você ela poderia ser mais cozida, por exemplo. O fato de concordarmos com o veredito não implica que o façamos pelos mesmos motivos.

Aqui está um ponto importante para o entendimento do mal súbito que acometeu o país nos últimos anos.

Nesta percepção de que nada prestava, podemos ver claramente três grupos sociais que fizeram coro pelo “tudo errado”, mas que diferem essencialmente do QUE efetivamente estava errado. E diferem ainda – imaginem – de como seria o “certo”.

De um lado estão as elites brasileiras que, como sempre, convenceram-se da necessidade de afastar as “clases peligrosas” do poder. Um dos maiores medos na História da América Latina vinha das elites, sempre em menor número, que viam os negros, os indígenas e os pobres como um “elemento desestabilizador”. O “haitianismo” me parece que foi a versão do século XIX do medo que Lula inspira no Brasil de hoje. O líder negro Toussaint precisou matar uma boa quantidade de homens brancos e declarar a independência do Haiti (em 1804) para provocar pesadelos semelhantes aos que Lula provoca na elite brasileira por ter dado de comer a 40 milhões de brasileiros.

De qualquer forma, para a elite brasileira é essencial afastar pobres, negros, desdentados ou malcheirosos de qualquer possibilidade de assumirem o poder. De novo. Para isto vale derrubar o PIB, criar uma justiça medieval, e soltar na sociedade os velhos monstros do racismo, do fanatismo religioso e da intolerância social.

A classe média brasileira vive não um problema real e material, mas um problema de percepção. Não é que ela não gostasse do Brasil como ele estava, mas não suportava a ideia de onde o Brasil poderia chegar. O crescimento do poder aquisitivo e o pleno emprego que atingimos em 2014 estavam muito bons, mas o caminho para um país mais igualitário não poderia ser aceito. A “livre concorrência” e a “meritocracia” sempre assustaram as classes médias brasileiras, se não fossem “entre iguais”. Parte desta classe média está se sentindo traída com Temer. Ela queria o país que o PT construiu, mas sem o PT. Ela queria congelar o país em 2014. Pleno emprego, rendacrescendo, mas sem esta bobagem de “bolsa família”, de universidade para todos e de que pobre finalmente poderia ter casa. Isto IRIA LEVAR a um sério problema social, pensavam.

Do outro lado desta balança estava uma parte da esquerda que não concordou com o governo Dilma. Estava errado. Levy, evangélicos, Kátia Abreu não estavam nos planos desta esquerda. A mudança – se é que aconteceria – seria longa demais. A esquerda já não confiava no “reformismo” de Dilma. O interessante é que, apesar de concordar com os dois primeiros grupos de que “estava errado”, esta esquerda desencantada queria o mesmo caminho de Dilma (ou quase) só que mais rápido! Ela não imaginava que ao fazer coro pelo “fora Dilma” o país fosse entrar neste retrocesso tremendo.

O Brasil não se acerta exatamente porque o consenso que tirou Dilma foi pontual e fabricado. Após a queda da presidenta, ninguém mais sabe para onde o país vai. Nem mesmo a direita que parecia monolítica sabe. Hoje MBL, PSDB, Bolsonaro, Doria, Alckmin e todos os outros batem cabeça. Uns querendo puxar o tapete dos outros. Neste caos institucional quem tem poder o exerce e o resto que se dane. Juízes mandam prender, delegados passam por cima de qualquer presunção de inocência e caminhamos para um “salve-se quem puder”.

Neste caminho insano perdemos gente boa. Professores estão se suicidando no RJ, por não receber seus salários. Temos inocentes presos, temos procuradores procurando prêmios, juízes querendo ser artistas de filmes e reitores que nos alertam sobre este caos com seus últimos suspiros. Luiz Carlos Cancellier de Olivo que nos perdoe. E que os que ainda vivem possam reverter este insuportável caos antes que mais gente se perca.

 
Fernando Horta

Somos pela educação. Somos pela democracia e mais importante Somos e sempre seremos Lula.

11 Comentários

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  1. O irônico é que a elite podre

    O irônico é que a elite podre que sustenta Temer e Gangue e patrocina a caça ao Lula é a mesma que com Lula nunca ganhou tanto dinheiro [ o próprio Lula disse que os bancos nunca ganharam tanto dinheiro quanto na gestão dele ]. Se Lula tivesse feito realmente uma quebra nessa sociedade de castas que é a brasileira, tivesse passado uma lei de mídia (ao contrário, a imprensa golpisa nunca teve tanto verba estatal ) até teria lógica essa tentativa de destruí-lo. Mas que nada. Lula fez um governo que se preocupou em dar o mínimo para uma população equivalente à Argentina e fez com que a classe trabalhadora tivesse ganhos que há décadas ela não tinha – mas sem mexer na verdadeira cláusula pétrea da sociedade brasileira que é a desigualdade de renda pornográfica. Pra mim o maior exemplo disso foi o crédito estudantil pro ensino superior gratuito = isso fez com que milhões de famílias tivessem um membro seu formado, o que é um ganho enorme pro país. Mas aí você vê o que as universidades fizeram de cambalacho pra jogarem todos no crédito estudantil (mesmo os que não precisavam – conheci um que o pai tinha 3 lojas de material de construção e conseguiu crédito total ) e você vê o baixo nível educacional que tem a maior parte dessas faculdades. Ou seja, no início parece um esquema de ganha-ganha entre estudante e faculdade, mas no longo prazo você vê que as universidades ganharam muito mais quando comparado com a qualidade do ensino que ela deu a esses estudantes.  Como disse André Araújo, os que estão no poder estão construindo um Brasil pra no máximo 1/5 da população. O resto que se vire, é lançado a própria sorte. 

  2. Não dá para ser otimista. Se

    Não dá para ser otimista. Se em uma nação do primeiro mundo, como a Estadunidense, a elite esclarecida apóia todas as guerras e eleva o capital à condição de deus, que podemos esperar de uma “elite” vagabunda como a brasileira. 

  3. Reconciliação

    Não sei por que tudo que leio hoje me faz pensar e entoar as canções de Chico Buarque Brasileiro de Hollanda.

    Sua música Caravanas, não apenas pelo título, mas pela descrição que não se sabe se do Rio antigo ou de amanhã, 

    toca no mesmo ponto muito bem abordado no artigo: qualquer coisa que se aproxime do acerto de contas do país com sua

    história e que, necessariamente, passe por ou leve à superação das relações e estruturas construídas sobre o torso d@s

    escrav@s e índi@s e pobres de qualquer raça ou etnia, apavora tanto as elites quanto, quem diria, o povo, inimigo de sua

    própria história pela lavagem cerebral e 

    cultural feita como amansamento por essas mesmas elites que o desprezam. A maneira como se discutiu a Lei dos direitos

    d@s empregad@s doméstic@s – como já se observou sobre o tema por muitos ângulos-, talvez por ser o que mais se

    aproxima desta realidade, revelou muito do que há de reprimido nestas relações e estruturas: consciência temerosa e

    silenciosa, ressentimento, ganância, mesquinharia, sentimentos genuínos de respeito mútuo, proximidade física e até afetiva

    diante de um abismo social e econômico que parece insolúvel. Não será sem dores e dilemas que se resolverão os

    problemas da base sobre a qual este gigante cambaleia. Será este o motivo de ser evitado a tanto custo?

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=6TtjniGQqAc%5D

     

    SP, 04/10/2017 – 17:39

     

     

     

  4. Quem comanda?

    Parece que já ficou claro que a direita que manda verdadeiramente neste momento não é a deste país por mais retrógada e egoista que esta seja, mas sim a internacional que está manipulando as cordas bem azeitadas dos seus fantoches nacionais. Foi ela que organizou e financiou o caos que vivemos, como fez nos útimos anos na desorganização total e macabra de inúmeros países destroçados nas suas estruturas políticas, financeiras, populacionais e geográficas. Aí reside o estupor atual. A esquerda não está conseguindo analisar simples métodos fascistas de ação tão presentes agora porque nunca acreditou que existissem por aqui. A situação em Santa Catarina que o diga. Pior, não consegue fazer análise concreta da conjuntura mundial  e o papel reservado pelo império ao nosso país como mero fornecedor do que vai precisar em determinado momento do caos que está armando. 

    1. Sem rumo, por Fernando Horta

      -> mas sim a internacional que está manipulando as cordas bem azeitadas dos seus fantoches nacionais.

      -> Pior, não consegue fazer análise concreta da conjuntura mundial  e o papel reservado pelo império ao nosso país como mero fornecedor do que vai precisar em determinado momento do caos que está armando.

      o Golpe de 2016, como todo fato social complexo, tem muitas causas entrelaçadas. contudo, a determinante é justamente o maior e inegável êxito do Lulismo: uma política externa alinhada com o projeto de tornar o Brasil um fundamental tijolo dos BRICS. o Império jamais poderia aceitar impunemente um mundo multipolar, no qual o Brasil teria papel de destaque, daí a afirmação de Janot: “A Lava Jato é muito maior do que nós”. sem compreender este decisivo fator geopolítico mundial, não se pode estabelecer a estratégia eficaz para a superação do golpe;

      p.s.: uma pergunta: por que são os chineses comprando as usinas hidrelétricas e os noruegueses o pré sal? por que não o Império via corporações trans nacionais sediadas nos EUA?

      .

  5. Sem rumo, por Fernando Horta

    após a brutal queda no deserto do real, depois dos 13 longos anos de Alzheimer político, quase toda a Ex-querda ainda não conseguiu encontrar qualquer rumo.

    sugestão de leitura: dois lançamentos recentes.

    – “Só mais um esforço”, Vladimir Safatle;

    – “A Rebeldia do Precariado”, Ruy Braga.

    .

  6. PerfeitoFaltou acrescentar à
    Perfeito

    Faltou acrescentar à lista do autor os formadores de opiniões, falo da imprensa que se diz independente, e dos que fizeram coro contra Dilma ajudando na formação do “consenso estranho padrão FIFA”.

    Essa mídia não percebeu que as críticas insistentes ajudaram a formar a irresistível condição da derrubada da “incompetente Dilma” como alguns independentes chegaram a denominá-la.

    Lamentável

  7. Ao sonho que não se submete.

    Aos estudantes, aos amigos e familiares de Luiz Carlos Cancellier de Olivo

    NÃO APRENDO A LIÇÃO – Thiago de Mello

    A lição de conviver,

    senão de sobreviver

    no mundo feroz dos homens,

    me ensina que não convém

    permitir que o tempo injusto

    e a vida iníqua me impeçam

    de dormir tranquilamente.

    Pois sucede que não durmo.

     

    Frente à verdade ferida

    pelos guardiões da injustiça,

    ao escárnio da opulência

    e o poderio dourado

    cujo esplendor se alimenta

    da fome dos humilhados,

    o melhor é acostumar-se,

    o mundo foi sempre assim.

    Contudo, não me acostumo.

     

    A lição persiste sábia:

    convém cabeça, cuidado,

    que as engrenagens esmagam

    o sonho que não se submete.

    E que a razão prevaleça

    vigilante e não conceda

    espaços para a emoção.

    Perante a vida ofendida

    não vale a indignação.

    Complexas são as causas

    do desamparo do povo.

    Mas não aprendo a lição.

    Concedo que me comovo.

     

  8. caminho definido

    A direita sabe exatamente o que quer e para onde levar o Brazil: para o modelo americano, de desregulamentação da economia, de entrega total do comando da economia aos banqueiros, de eliminação de direitos trabalhistas e previdenciários, de privatização generalizada. Esse é o projeto que já está acontecendo, não é futuro. Quem será o próximo mandatário é o de menos, desde que garanta a implantação do modelo americano, vendido como sonho para a classe mérdia que se encanta com Miami.

  9. A reunião
    Para mim, leigo em economia, o plano elaborado pelos “irmãos” do Norte é simples. Eles se perguntaram: Que país no mundo tem 100 milhões de pessoas aptas a trabalhar, não é socialista, não é muçulmano, não há movimento separatista (ainda), possui uma força armada pronta para conter disturbios e não dá valor às suas riquezas? E eles sabiam a resposta: O Brasil. Então, o que falta para transformá-lo em mero abastecedor do que não produzimos ou do que temos pouco? Falta adquirirmos uma parte de suas empresas indústrias, comerciais e prestadoras de serviços bem como parte das terras. Então, o que estão esperando, mãos à obra. Dinheiro não é problema já que somos o único dono da máquina que fabrica a moeda que eles têm que aceitar. Não se esqueçam que temos grandes “amigos” naquele país. Eles nos ajudarão nessa tarefa, contem com eles. Relativamente eles não são caros, tendo em vista os ganhos que obteremos. Vamos treinar pessoas situadas em postos chaves para, posteriormente, decidirem a nosso favor. Outra coisa, não esqueçam das modificações nas legislação trabalhista, previdenciária, sociais, petróleo e outras, de acordo com nossas necessidades.Será que a reunião descrita acima aconteceu ou eu apenas sonhei? O que estou vendo acontecer aqui é o resultado dessa reunião. Nada mais que isso. 

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