Armando Coelho Neto
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.
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Notas esquizofrênicas sobre esquerda, direita e militares, por Armando Coelho Neto

A horda fascista está ativa nas redes, enquanto parte da esquerda está confusa entre a euforia da vitória e a ressaca do terror.

Notas esquizofrênicas sobre esquerda, direita e militares

por Armando Coelho Neto

“Mentir faz parte da guerra”. Essa fala absurda de um general pilantra e paranoico não sai de cena. Legitimar fake news é atestar o que muitos já sabiam: o ex-governo foi uma farsa, pautado pela mentira, a corrupção. A grotesca fala do general definiu os rumos da Nação, na qual só militares e especuladores se deram bem. Nem Paulo Guedes trouxe seus milhões de dólares ao pais que apregoava ir bem. Esquecer?

Também não dá para esquecer que a esquerda dita inteligente, sobretudo a replicadora de fatos, notas e apelos não necessariamente verdadeiros, alimentou uma guerra de burros (maioria de pobres) contra intelectuais (suposto privilegiados cúmplices dos ricos). Bozo encarnou o pobre burro, sem que nem todo burro fosse pobre ou que todo pobre fosse burro. Desvios de caráter à parte, claro!

Inteligentes X burros, a esquerda patinou em piadas com os erros crassos dos bolsopatas, demorando a entender que errar era método: kafta no lugar de Kafka, acepipes em vez de assecla, ventrículo no lugar de ventríloquo, rugas e rusgas, conja x cônjuge era tudo diversionismo, enquanto se urdiam tramas “nas alcovas e breu das covas”, saques, roubo, sabotagem de vacina, matança de indígenas…

Para as elites, Lula era um burro, analfabeto, um retirante sem eira nem beira. Mas, rapidamente concluíram que burros não chegam a presidente da República e não tardaram a descobrir estar diante de um estadista de projeção internacional. Portanto seus referenciais primários de inteligência caíram por terra e logo se aliaram aos laboratórios internacionais de manipulação de corações e mentes.

Lula, ainda não candidato, apelou para que parassem de chamar eleitores do Bozo de burros, que fosse adotada outra forma de lidar com eles. Na trilha inversa, a militância que já havia abandonado as bases, fechou-se em bolhas e com orgulho abraçou o oba-oba de estrelinhas, bloqueando chances ainda que mínimas de diálogo. Afinal, nem todos eram fascistas, mas também incautos e decepcionados.

Escrachado pela mídia, qualquer PowerPoint, papel em branco, ladrão chamando Lula de ladrão, pedalinho com o nome de um neto do líder; qualquer fronha bordada com o nome de Dona Marisa – agrado comum da classe média para hóspedes ganhou status de prova contra Lula. Como então desqualificar o voto de quem contra isso se revoltou? Por que incautos não depositaria esperança num falso messias?

Bom lembrar. “Forças primitivas, sexuais e agressivas estavam ocultas na mente de todas as pessoas”… E se essas forças não fossem controladas levariam os indivíduos e a sociedade ao caos, teria dito Sigmund Freud. Tais teorias há tempos são usadas pelo poder para controlar pessoas, e nesse GGN, em algumas passagens, falamos sobre o imperdível documentário “O Século do Ego” (Youtube).

Maldade organizada, a farsa-mito teve direito a uma “facada”: um cidadão qualquer rompeu todos os círculos primários e secundários de segurança (pessoal e institucional) e “atingiu” o então candidato Bozo. Se a realidade imita a arte, quem assistiu a morte de Odorico Paraguaçu (O Bem Amado, TV Globo) pode dar asas à imaginação. “Meu pai acabou de ganhar a eleição”, atestou o filho do farsante.

Com método e inteligência as forças primitivas estavam sendo bem utilizadas, na qual a esquerda estava apanhando de 7 x 1 na guerra de narrativas. O pensamento civilizado foi satanizado, e o que virava piada na esquerda era potencializado na energia reprimida com versão própria, por vezes de um Bozo vitimizando. Ainda que os urubus já estivessem aí e o Bozo tenha sido mera carniça que os atraiu, os uniu.

O golpe de 2016 foi fase um, e não se sabe quantos cheques voltaram sem fundos, o que explicaria a reviravolta. Bozo surge na fase dois do golpe, pronto para a fase três, frustrada em 08/01. Tática, trapalhada ou acaso, mescla de Turma da Mônica com Trapalhões, os ataques terroristas se deram em boa hora. Afinal, as coisas passaram a ser chamadas pelos nomes reais e receberam tratamento à altura.

O Exército (todo?) acolheu a chocadeira de fascistas. Sem pudor caiu no ridículo de aliar-se ao tosco, com parentes de generais, fanáticos orando e batendo continência para pneus, discos voadores… Falsas loiras no melhor estilo João Bosco (“lingerie, sobrancelha feita a lápis e perfume da Coty”) fizeram jograis e a imagem de um maluco preso ao para-brisa de um caminhão rodou o mundo. Viva as FFAA!

Assassinos, pastores estelionatários, empresários corruptos, terroristas, espancadores de mulheres, rufiões, praxenetas, baderneiros contratados, mais uma legião de vagabundos com ficha suja, e muitos incautos, claro (!) foram acolhidos na placenta da patriotada golpista, com a anuência de quem deveria respeitar a Constituição. Eis as forças do mal unidas, manipuladas e potencializadas.

A horda fascista está ativa nas redes, enquanto parte da esquerda está confusa entre a euforia da vitória e a ressaca do terror. É preciso subir o morro e dançar pisadinha, recuperar o espaço perdido nas comunidades e, tanto quanto possível repor a verdade. Afinal, cadelas do fascismo já foram diplomadas, não dormem nem saem do cio. Dado o puxão de orelha na esquerda, o dos militares vem a seguir.

Sem a inserção de civis nos quarteis, a mentalidade militar ficará refém do ideário mofado da velha casta, parte dela desejosa em comemorar golpes, homenagear torturadores, conceder medalhas a puxa-saco, com famas que vão de só pintar meios-fios a de haver matado mais brasileiros que estrangeiros. Tudo isso a um custo orçamentário de R$ 86 bilhões, mais que saúde e educação juntas. Basta!

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

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Armando Coelho Neto

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.

3 Comentários

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  1. Boa, caro Armando, exposição clara e perfeita de ideias muito bem fundamentadas na realidade fática! Só um pequeno reparo, talvez por dificuldade minha: como pode ser esse negócio de “empresários corruptos”? Corromper algo não é subverter, aviltar a natureza de algo? Corrupta não é a pessoa que degrada, descaracteriza seus misteres, seus valores? Não é da natureza da iniciativa privada o impulso pelo próprio e infinito poder, meter a mão grande seja onde for para na busca de atingir seus objetivos? Quanto dinheiro é suficiente? Quanto poder individual é bastante? (No caso do que é público, o poder não é individualmente do seu encarregado mas sim de quem o elegeu, a saber, o povo.) Um empresário corrupto ´seria aquele que, em vez de capitalizar os lucros para fazer sua firma crescer, os distribuísse democraticamente, será que não? Funcionários públicos – concursados, eleitos ou comissionados – que lesam os poderes econômico e político estatal para atendimento a demandas privadas sim, esses são corruptos. Mas empresários privados que lesam (ou buscam lesar) o que é público e democrático, a meu ver, são criminosos mas não corruptos. Será?

  2. Legal Armando!
    É um texto realista vc descreve o processo do GOLPE com muita propriedade que lhe é peculiar…
    Pena que as pessoas gostam de seus textos mas têm dificuldade em comentar aqui no GGN…

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