Vamos Separar o Agro do Ogronegócio? Chama a Constituição Federal que tem remédio, por Carlos Mário Guedes de Guedes

Os bloqueios de estradas e os atos que beiram o terrorismo têm sido financiados por verdadeiras organizações criminosas

Foto PRF

Vamos Separar o Agro do Ogronegócio? Chama a Constituição Federal que tem remédio

por Carlos Mário Guedes de Guedes

A sociedade assiste a manifestações antidemocráticas, violentas e inconcebíveis que pedem a revisão do resultado das urnas; não aceitam a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva para a Presidência do Brasil. Mas este é o único resultado que não aceitam, porque Governadores, Senadores, Deputados eleitos podem tomar posse tranquilamente, mesmo que tenham recebido votos nas mesmas urnas.

Os bloqueios de estradas e os atos que beiram o terrorismo têm sido financiados por verdadeiras organizações criminosas, mas que por vezes têm suas receitas baseadas em atividades lícitas e legais no país. Recentemente, o Ministro Alexandre de Moraes (STF) bloqueou recursos de grandes corporações agropecuárias brasileiras[1] que, comprovadamente, contribuíram para viabilizar os atos antidemocráticos.

A pergunta que fica é: se são recursos oriundos da exploração agropecuária, direcionados para o financiamento de um golpe contra a democracia, isso não é claro descumprimento da função social da propriedade[2], previsto no artigo 186 da Constituição Federal do Brasil (CF88)? Na minha opinião é um sonoro SIM. Já passou da hora de demonstrar que, contra a doença do golpe, nossa Constituição tem remédios firmes e que devem ser aplicados.

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O artigo 186 da CF88, no Capítulo III – Da Política Agrícola e Fundiária e Reforma Agrária, tem a seguinte redação:

 “A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores”.

Atualmente, apenas o quesito do aproveitamento racional e adequado está regulamentado. Os índices mínimos de produtividade parcial da terra, que teriam de ser a métrica do cumprimento do quesito, não são atualizados desde a década de 1970, mesmo com todo o desenvolvimento tecnológico presente na agropecuária nos últimos 50 anos. O resultado é que sem atualização dos índices não se separam os produtivos dos improdutivos, e a renúncia fiscal no Imposto Territorial Rural – ITR ultrapassa os R$ 10 bilhões por ano[3].

O ponto central aqui é que práticas realizadas por estes proprietários de terras não são devidamente punidas e os efeitos negativos decorrentes disso enfraquecem a democracia, apesar da previsão Constitucional. A prática de assédio eleitoral aos funcionários das propriedades[4], o uso das receitas da exploração das propriedades para financiar atos antidemocráticos acompanham outros descumprimentos recorrentes, como o desrespeito ao Código Florestal, o desmatamento ilegal e a deriva de agrotóxicos[5] em outras propriedades.

Chegou a hora de exigir a regulamentação e o devido cumprimento da Constituição. Criar uma “lista suja” que informe aos importadores de grãos e carnes do Brasil e aos consumidores do mercado interno quem são as verdadeiras “maçãs podres” do agronegócio[6], e preservar a segurança jurídica e os negócios de quem quer produzir em paz e prosperidade.

Vamos construir uma Política Nacional de Governança Responsável da Terra, e chamar quem tem compromisso com a democracia e com o desenvolvimento do rural brasileiro para instituir uma Mesa Nacional de Diálogo. Chegou a hora de separar o Agro do Ogronegócio[7]. A Constituição Federal tem remédio para isso!

Carlos Mário Guedes de Guedes – Economista, Mestre em Desenvolvimento Rural, Analista do INCRA, foi Presidente do INCRA entre julho de 2012 e março de 2015.


[1] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2022/11/17/moraes-determina-bloqueio-das-contas-de-43-pessoas-e-empresas-suspeitas-de-financiarem-atos-antidemocraticos.ghtml

[2] https://www.conjur.com.br/2015-dez-06/estado-economia-propriedade-nao-cumpre-funcao-social-nao-protecao-constitucional#:~:text=%5B4%5D%20Artigo%20186%20da%20Constitui%C3%A7%C3%A3o,recursos%20naturais%20dispon%C3%ADveis%20e%20preserva%C3%A7%C3%A3o

[3] https://www.escolhas.org/tcu-concorda-com-necessidade-de-atualizacao-do-itr-congelado-ha-40-anos/

[4] https://valor.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/10/28/quem-sao-empresarios-do-agro-denunciados-por-assedio-eleitoral-em-mato-grosso.ghtml

[5] https://www.brasildefato.com.br/2022/06/30/deriva-aerea-de-agrotoxicos-assentados-propoem-poligonos-de-exclusao-no-rs

[6] https://csr.ufmg.br/radiografia_do_car/wp-content/uploads/2020/08/As-macas-podres-do-agronegocio-brasileiro.pdf

[7] https://www.ihu.unisinos.br/603396-ogronegocio-aprosoja-atende-a-bolsonaro-e-rejeita-de-vez-sustentabilidade-artigo-de-marcio-santilli

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