Algumas considerações sobre o dossiê do The Intercept, por Luís Nassif

 

  1. É bastante provável que a denúncia de Sérgio Moro, de invasão recente de seu celular por hackers, tenha sido uma armação dele próprio.

Há cerca de duas semanas, o repórter Marcelo Auler já tinha ouvido boatos sobre um mega vazamento dos celulares dos membros da Lava Jato. Os boatos falavam de pânico nas hostes da operaçao. A denúncia de Moro, dias antes da publicação do Intercept, inclusive levantando argumentos de “segurança nacional”, pareceu muito mais uma jogada desesperada para ligar o caso a hackers e impedir sua publicação. Evidentemente que o autor de um vazamento ilegal da conversa de uma presidente da República não teria como invocar argumentos contra o vazamento atual. Por isso a lógica da “segurança nacional” não colou.

  1. Instâncias superiores

O material expõe apenas o conteúdo das conversas em grupo.  Chama atenção, no entanto, um diálogo informal entre Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, sugerindo que o dossiê traz também conversas entre duas pessoas.

Então há possibilidade de se chegar a instâncias superiores que participavam do jogo – dos desembargadores do TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), o Ministro Felix Fischer, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e algum Ministro do Supremo Tribunal Federal, em articulações individuais.

Aí se chegaria às armações para impedir o habeas corpus que tiraria Lula da cadeia, as jogadas processuais do TRF4, garantindo a unanimidade nos julgamentos, e até os acertos entre o ainda juiz Sérgio Moro e o grupo de Bolsonaro.

  1. As delações premiadas

Outro capítulo cabeludo foram os acertos em torno do milionário mercado das delações premiadas. Uma bomba seria a reconstituição das conversas sobre as tratativas dos procuradores de buscar acordo com Tacla Duran, intermediadas pelo primeiro amigo de Sérgio Moro, Carlos Zucolotto. Ou as conversas envolvendo o advogado Marlus Arns, de estreitas relações com Rosângela Moro, que herdou as ações de Beatriz Cattapreta.

  1. As jogadas políticas

Há uma série de episódio óbvios: a manobra para impedir que Lula fosse solto por um HC; o vazamento do vídeo de Antonio Palocci na véspera das eleições; os acertos entre Moro e Bolsonaro para assumir o Ministério. E há a capa da Veja, publicada na véspera das eleições de 2014, que quase inverte o resultado.

  1. O contra-ataque

Nos próximos dias, a estratégia dos aliados de Sérgio Moro – incluindo Globo e Estadao – será insistir na apuração do autor dos vazamentos. É quase certo que tentem incluir as investigações do Supremo Tribunal Federal (STF) nas suspeitas.

É por aí que tentarão construir a contra-narrativa, para reduzir os impactos das revelações do The Intercept.

De qualquer modo, sobram duas dúvidas. A primeira, sobre como o sistema de Jutiça irá tratar de um caso exposto tão amplamente, de manipulação de investigações. A segunda, se Moro ainda é considerado servível pelo sistema.

Provavelmente, o que restará dele serão as lembranças de um personagem provinciano, alçado ao topo do mundo, mas que jamais passou de um mero instrumento de manipulação política, que se usa, se joga fora.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • Achei um pouco contraditório o seu texto, partindo da sua premissa de que os vazamentos foram orquestrados pelo "ex-juiz". Se você estiver certo, e ouço sua opinião com atenção", tudo está arquitetado para que mais uma vez o suspeito seja alçado, novamente, a guardião da moralidade e bons costumes. Logo, o sistema estaria com ele e o mesmo não teria o que temer.

    Na minha opinião, o fato de o PIG focar no vazamento e não no conteúdo já demonstra uma falha no sistema. Eu de verdade sinto um cheiro dos bRiCs (Rússia e China) nisso tudo.

    Vamos aguardar os próximos "vazamentos".
    Um abraço.

    • Nassif não sugeriu que os vazamentos foram orquestrados por Moro, mas que o Moro teria forjado e divulgado uma suposta invasão de seu celular, para ter uma contranarrativa que reduzisse o estrago da divulgação das conversas

      • E como o Glenn de bobo não tem nada, ele vai gotejar vazamentos em série, ora respingando numa autoridade, ora em outra. Quais fatos Moro poderá criar mais para desfocar os novos conteúdos? Nenhum!

    • É preciso orientar a bancada petista para exigir já uma investigação do suposto ataque de hackers ao celular do juiz conge. E exigir participação do PT nessa investigação . Se foi uma falsa denunciação de crime , para encobrir os crimes da milícia de Curitiba que o The Intercept trouxe à luz, desta vez o juiz conge vai pra cadeia. Mas, como disse, é preciso orientar a bancada do PT para agir, porque ali, com raras exceções, só tem faísca atrasada. Têm-se que montar um comitê com juristas e jornalistas não-reverentes para traçar a estratégia de ação, trabalhar em conjunto e orientar as ações. Sem estratégia não se consegue nem chupar um ChicaBom, como diria sir Winston Churchill!

    • "contraditório o seu texto, partindo da sua premissa de que os vazamentos foram orquestrados pelo “ex-juiz”":
      Releia: a "acusacao" RECENTE de "invasao de hackers" eh a que beneficiaria Moro.

  • Nunca me enganaram os olhos piscantes que denotavam mentira. E piscaram muito no vídeo do artigo acima. Covarde! Deplorável! JUSTIÇA!!!

  • Acredito que também exista material para desvendar essa suspeita colaboração com autoridades americanas ao arrepio da lei, a multa bilionária nos EUA e a devolução dos 2,5 bilhoes para serem administradas pela fundação lava jato.

    • Perfeito. Esse elo foi já assinalado : - O Wikileaks revelou o informe enviado ao Departamento de Estado de Estados Unidos sobre o seminário de cooperação, realizado em outubro de 2009, com a presença de membros seletos da Polícia Federal, Judiciário, Ministério Público, e autoridades estadunidenses, no Rio de Janeiro.Vê-se perfeitamente a intimidade com que a casta jurídica brasileira trata os termos do chefe imperial.

      Vai senão quando, e meio ao informe para o Departamento de Estado, entra relato de ninguém menos que Sérgio Moro, que discorre sobre os “cinco pontos mais comuns acerca da lavagem de dinheiro no Brasil”. Sem detalhes particulares sobre a exposição do chefe da “República de Curitiba”, o informe mostra que houve acalorados debates em que a equipe de treinamento ianque, virtuosos na patifaria, ensinam os pupilos brasileiros e estrangeiros os segredos da “investigação e punição nos casos de lavagem de dinheiro, incluindo a cooperação formal e informal entre os países, confisco de bens, métodos para extrair provas, negociação de delações, uso de exame como ferramenta, e sugestões de como lidar com Organizações Não Governamentais (ONGs) suspeitas de serem usadas para financiamento ilícito”.

  • Esses caras estão blindados por uma forte rede de proteção. A maior liderança política do pais foi presa sem provas, na frente de milhões de testemunhas e nada aconteceu. Rasgaram a constituição várias vezes e o Supremo concordou...ou se calou.

  • Achei um pouco contraditório o seu texto, partindo da sua premissa de que os vazamentos foram orquestrados pelo "ex-juiz". Se você estiver certo, e ouço sua opinião com atenção, tudo está arquitetado para que mais uma vez o suspeito seja alçado, novamente, a guardião da moralidade e bons costumes. Logo, o sistema estaria com ele e o mesmo não teria o que temer.

    Na minha opinião, o fato de o PIG focar no vazamento e não no conteúdo já demonstra uma falha no sistema.

    Eu, adepto de "teorias conspiratórias" penso que os bRiCs (Rússia e China) estão nessa história.

    Vamos aguardar os próximos "vazamentos".

    Um abraço.

  • Confiscar os passaportes e celulares do juiz e dos membros da lava-jato é medida necessária e urgente, separá-los de qualquer convívio para que não combinem versões ou se valham do cargo público para benefício próprio causando mais danos a República.

  • Também acho que é mais uma mentira essa conversa de que teve o telefone hackeado... Mais: mentira de quem sabe como ocorreu o tal vazamento; é provável que tenham esfregado na cara dele, tendo ou não já mandado pro The Intercept.

    Não espero nada das cúpulas do judiciário, mesmo estando mais que provado que se tratou de uma farsa transformada em novela das oito que arrastou uma multidão de trouxas. Isso tudo já era mais sabido na Paça Dos Três Poderes. Não será surpresa alguma se "minimizarem" o fato, a famosa "fuga pra frente". E aí, a situação que resta é só uma: ou cortam a cabeça da Lava Jato, ou ela se fortalece.

  • estamos em mais um daqueles momentos, como o Golpeachment e a prisão de Lula, nos quais a crise abre a possibilidade de no intenso momento do agora nascer o futuro. dentre todas as suas bifurcações, qual futuro se materializa?

    - Lula Livre;
    - Moro e Dallagnol na cadeia;
    - nulidade das Eleições de 2018 e novas eleições em 90 dias.

    compromisso do novo Presidente (Lula) com:

    - dissolução do atual Congresso e o STF;
    - convocar Assembléia Nacional Constituinte, livre, aberta e garantida por participação popular direta;
    - Democratização do Judiciário.

    observações:

    - a defesa de Lula pode, e deve, pedir a anulação dos processos do triplex e do sítio;

    - contudo, Moro e Dallagnol não podem ser processados com base no material divulgado, pois como foi obtido através de hackeamento não são lícitos;

    - porém, se tratam de evidências mais do que suficientes para um inquérito legal, do qual surgirão as provas legalmente obtidas para colocar atrás das grades a Lava Jato & Associados;

    - mesmo que o Presidente da República não possa dissolver o atual Congresso e o STF, uma Assembléia Constituinte pode, e deve, fazê-lo, posto que cabe a ela constituir novos poderes, sendo inclusive os atuais ilegítimos;

    - quanto a Lula, é inevitável que seja dele a principal capitalização política tanto do atual cenário, quanto de todos os seus desdobramentos;

    - a volta de Lula é inexorável. faz parte do processo histórico brasileiro. para o bem e para o mal. como o Getúlio de 1950, Lula tem um novo encontro marcado com a História;

    - muito embora Lula jamais proponha mudanças radicais, é o próprio processo político quem demanda esta radicalidade. ou virá pela Esquerda, com Lula ou não. ou pela Direita, como por ora tem sido.

    - a Assembléia Constituinte deve romper com o vencido paradigma da representatividade e se dar, portanto, através de um processo direto de referendo popular, nas apenas para legitimar o texto final mas para o elaborar coletivamente;

    - só povo na rua derruba a Bastilha.
    .

    • fica por provar que foi hackeamento
      o próprio telegram insiste em que não houve tal
      até pode ser cogitado vazamento [traição!] de alguém que participa dos grupos
      ouras hipóteses podem ser um par de ações possíveis que não seriam atos de um hacker
      nem o jornalista, nem o jornal são obrigados a se manifestar sobre isso

  • Há que se considerar que apenas uma pequena parte dos documentos veio à luz. Quem (juiz, general, político, mídia) estiver apenas minimamente envolvido ou esteja fora dessa conspiração, só tem pela frente a opção pela legalidade. Quem cometeu apenas um pecadilho não pode tramar contra ofensiva porque será desmoralizado. O complô "grande acordo nacional" foi com os militares, com o congresso, com o departamento de estado USA, mídia PIG com tudo, não nos esqueçamos.
    ....Érika Marena será julgada pelos crimes contra o Cancellier?

    "Submetido a um tratamento medieval, Cancellier foi algemado pelas mãos e pelos pés, metido num uniforme de presidiário e revistado nu. "

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