As forças por trás do jogo político, por Antônio Uchoa Neto

Na democracia, questões políticas e econômicas dependem de forças influenciáveis ao grande capital, como mídia, Forças Armadas e Judiciário

Bolsonaro x Lula
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil – Daniel Pinheiro/Agência Brasil

Comentário no post Xadrez da ultradireita e de Lula, a última esperança liberal, por Luis Nassif

Por Antônio Uchoa Neto

Pequena reflexão domingueira, pré-cerveja:

“Em uma ditadura, o jogo político e econômico depende da cabeça do ditador. Em uma democracia, depende de um conjunto de forças historicamente suscetíveis à influência do grande capital: mídia, Judiciário e Forças Armadas.”

Ou eu muito me engano, ou o Nassif fez uma sucinta descrição do modelo de governo vigente no mundo ocidental acima da Linha do Equador, estabelecido no final do século XVII, na Inglaterra, e vigente até hoje: o Rei virou peça decorativa, e o Parlamento segue as ordens do Banco da Inglaterra.

Mais ou menos 100 anos depois, os franceses – que nunca suportam estar atrás dos ingleses, em qualquer campo (os ingleses ganharam um título mundial de futebol? eles já ganharam dois!) – fizeram alguns ajustes nesse acordo, cortando cabeças a torto e a direito (e a rei, também, sem retorno), mas sem alterar-lhe a feição principal, mas obtendo muito mais sucesso na exportação do modelo – um deles, o principal, adotado praticamente de forma simultânea, nos EUA.

Inevitavelmente, como sempre havia sido na história europeia, as guerras e morticínios continuaram; apenas, não mais para servir supostos caprichos de monarcas ensandecidos ou simplesmente tolos, mas de forma, digamos, pragmaticamente econômica: guerra dá lucro, e é preciso que estes lucros se distribuam de forma razoavelmente equitativa, o que se consegue emprestando dinheiro para ambos os lados em guerra.

Os banqueiros, em lugar de fazer negócios com reis imprevisíveis, fazem com parlamentares – que sabem, como poucos, pesar os prós e contras de suas ações, em outras palavras, as possibilidades de lucros e prejuízos delas decorrentes.

Evidentemente, esse modelo tinha que chegar a um limite: isso aconteceu em 1945. Já não havia chão para tanto sangue. Consequência visível: o fim da Europa como centro do mundo, a ascensão americana – com um providencial inimigo orwelliano, a URSS (hoje, a China), o fim do domínio colonial de tipo militar e sua substituição por um domínio puramente econômico e financeiro, e a exportação da guerra para outros teatros de operações, etc.,etc.,etc.

Isso é história conhecida. Tudo isso leva a Lula, como diz o Nassif, como última esperança liberal. LIBERAL. Alguma surpresa? Do tratado da Vestfália, em meados do século XVII, até hoje, as lutas internas européias, desdobradas em lutas externas americanas, determinam a História do Mundo; e em que sentido essas lutas se desdobram? Ocupação e exploração de terras alheias, a qualquer custo. A reboque, exploração financeira mediante dívidas, colonialismo sem ocupação. O que mudou?

O acordo de Bretton Woods não passou de um freio de arrumação, quase uma obrigação moral; sim, é possível supor que, em 1945, uma obrigação moral ainda constasse do universo mental dos países ricos, principalmente depois de duas carnificinas generalizadas. Simplesmente, as guerras deixaram o teatro de operações europeu e foram deslocadas para shitholes como a África, o sudeste asiático, e afins (nós, em Latinoamerica). Desculpem a linguagem grosseira, mas é isso que somos para eles: fossos sanitários. Se há de ser necessária a morte de milhões, que seja por lá, e não aqui.

Só mesmo a nova encarnação terrena do satanás, Vladimir Putin – um bárbaro não-europeu, na verdade – para trazer a guerra de volta ao solo europeu. Europeus só toleram ser mortos por europeus, é claro. E manipulados, só pelos americanos, que fique bem claro.

Bom, tudo isso para dizer que nada mudou. A não ser isso: um latino-americano, suposto comunista sanguinário, radical extremista, na verdade um social-democrata moderado, virou a grande esperança liberal. Liberal! Jesus Cristo!

Sendo assim, Bolsonaro deve ser a Grande Esperança Branca. A Grande Esperança Supremacista Branca, melhor dizendo.

Não vou pedir para pararem o mundo, porque não há onde descer.

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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