Balanço apressado do primeiro turno, por Luis Felipe Miguel
Não dá para dourar a pílula: o resultado das eleições de ontem foi muito ruim para os partidos à esquerda no Brasil.
O PT ampliou o número de prefeituras que conquistou, mas em geral em municípios menores, muitas vezes com candidatos sem afinidade com o partido.
Nenhuma das capitais que decidiram no primeiro turno ficou nas mãos do PT ou do PSOL.
Em Curitiba, o PT escolheu apoiar o candidato do PSB, um sujeito “centrista “, que até o golpe contra Dilma tinha apoiado. Mesmo com uma campanha de voto útil, ele não chegou no segundo turno, que vai ser disputado entre o candidato oficial de Bolsonaro, coligado com o PL, e uma bolsonarista ainda mais tresloucada, que recebeu sinalizações de simpatia de Jair na reta final e chegou em primeiro lugar.
Acho difícil que para o eleitor curitibano reste outra alternativa que não anular o voto no segundo turno.
Em Porto Alegre, por pouco Sebastião Melo não se reelegeu já no primeiro turno – ficou com 49,7% dos votos. Chocante, tendo em vista que sua gestão desastrosa contribuiu, e muito, para a destruição da capital gaúcha nas cheias do início do ano. Os erros do PT na campanha, começando com a escolha da candidata, ajudam a explicar o resultado.
O segundo turno é a chance – pequena – de reverter esse quadro e impedir que Melo tenha sua negligência e incompetência criminosas premiadas com um novo mandato.
Em Belém, Edmilson Rodrigues conseguiu a façanha de ser o candidato à reeleição que ficou fora do segundo turno, com menos de 10% dos votos. Não dá para colocar tudo na conta do boicote da classe dominante ou da má vontade dos meios de comunicação. É preciso discutir os problemas da administração na capital paraense, que levaram a esse resultado.
Ao eleitor belemense, resta votar em Igor Normando, cria do clã Barbalho, representante da velha política fisiológica, para evitar uma vitória de um assassino confesso, o deputado Eder Mauro, que encarna a brutalidade orgulhosa da extrema-direita.
Em São Paulo, a eleição mais dramática. Fico feliz de ter errado meu vaticínio de que Pablo Marçal chegaria no segundo turno.
Mas foi por pouco, muito pouco. É chocante pensar que 1.719.274 paulistanos julgaram que aquele camarada devia governar sua cidade.
Boulos entra no segundo turno em grande desvantagem. Terá três semanas para fazer o que não fez até agora: politizar o debate e mostrar as diferenças de projeto.
Tarcísio se cacifa, com a vitória de Nunes no primeiro turno. E Jair certamente tentará agora abraçar a campanha, depois de ter oferecido um apoio no máximo titubeante, a fim de chamar para si a eventual vitória no final do mês. Mas saiu desgastado, também com a derrota de Ramagem no Rio de Janeiro.
O grande vencedor das eleições, dizem os jornais, foi o PSD, que aliciou todo o tipo de gente, pelo Brasil, e fez o maior número de prefeitos. Um triunfo do oportunismo mais deslavado, mas que não constrói uma opção política nacional. Serve apenas para Kassab vender mais caro seu apoio em 2026.
Já a extrema-direita confirmou ser o polo de oposição ao petismo, com o PSDB varrido do mapa, e obteve vitórias importantes em cidade grandes.
À esquerda, infelizmente, nenhuma lição será aprendida. Em vez de reforçar uma marca ideológica própria, certamente o governo Lula entenderá que o resultado das urnas exige mais “moderação” e dar mais espaço para o Centrão.
Exatamente o caminho que tem levado a tantas derrotas.
Luis Felipe Miguel é professor do Instituto de Ciência Política da UnB. Autor, entre outros livros, de O colapso da democracia no Brasil (Expressão Popular).
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