Caminhada do Silêncio lembra vítimas da ditadura militar e do Estado brasileiro

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Coletivos que representam minorias vão integrar protestos; “quando um branco morre, vira ONG; quando um preto morre, vira estatística”

Foto: Reprodução – Núcleo Memória

A Caminhada do Silêncio que marca os 58 anos do golpe militar não irá lembrar apenas as vítimas da ditadura militar brasileira, mas também para as vítimas da política do Estado brasileiro.

“Esse ano, com essa possibilidade de refluir a onda, achamos que era muito importante trazer esse tipo de manifestação de volta, para que as pessoas tenham chance de sair na rua, de manifestar, de mostrar, chamar a atenção para os milhões e centenas de milhares de mortos das mais diversas situações”, disse a procuradora Eugênia Gonzaga, uma das organizadoras da Caminhada do Silêncio, em entrevista à TV GGN 20 horas.

“Nesse ano, a caminhada quer chamar a atenção para o golpe militar de 31 de março, para que não se esqueça, para que não se repita”, diz Eugênia. “E lembrar que a maioria das mazelas que vivemos tem sua origem no golpe militar”.

E diversos coletivos irão integrar os protestos contra a ditadura e a violência do Estado brasileiro, como aqueles ligados à religiões afro-brasileiras, à população negra e ao povo em situação de rua.

A Ìyáloriṣà Adriana t’Ọmọlú, professora, pedagoga aposentada e matriarca da Unidade Territorial Tradicional Ile Àṣẹ Ọmọlú Àti Òṣún, lembra que, na história da ditadura, não se tem registros sobre o extermínio da população preta – “não tem recorte racial e, se a gente olhar para as mulheres negras, piorou”.

Segundo a iya Adriana, “existiu uma ordem de que as notícias não trouxessem, que a mídia não trouxesse notícias sobre o Esquadrão da Morte, sobre os índios, sobre os movimentos negros, sobre a discriminação racial”, pontua a ialorixá, ressaltando que os atos institucionais publicados em 1969 não detalham nada.

A professora afirma que filmes como Cidade de Deus ajudam a retratar a situação do povo preto na época da ditadura brasileira – que não é muito diferente do que ocorre atualmente, excluindo dessa população inclusive o direito de ser gente.

“’E eu vou te matar, eu vou estuprar as mulheres da mesma forma que eu estuprei as mulheres não negras que eram consideradas subversivas, e continua fazendo com as mulheres negras, assim como o extermínio da população negra continua firme e forte (…)”, ressalta a ialorixá.

Movimento negro na ditadura militar

A iya Adriana ressalta que, mesmo com a repressão militar, o movimento negro acontece na ditadura. “É importante dizer que as mulheres pretas, homens pretos nunca deixaram de lutar, que os homens e mulheres pretos nunca deixaram de denunciar. E nunca deixaram de morrer – a vala de Perus que o diga”, ressalta a ialorixá.

E a ação do Estado contra a população preta se faz presente até hoje. “O sumiço dos nossos meninos pretos, o aumento de estupros, de mortes de mulheres negras, do avanço da violência de gênero – e a gente sabe que, quando a gente faz o recorte racial, a maioria das mulheres que morrem são pretas, não me deixa mentir”.

A ialorixá afirma ainda o aumento, com o aparato do Estado, da invasão às casas religiosas de matriz africana , e que a maioria das casas invadidas são de matriarcas negras.

“Então, caminhar nós estamos caminhando há muito tempo. Marchar, nós estamos… (…) A gente tá gritando o tempo inteiro, a gente está em luto o tempo inteiro – luto de luta, e luta de choro. As Mães de Maio que o digam, as mães dos meninos e meninas da Candelária que o digam”, afirma a Iya Adriana.

“Mas não há movimento que faça essa denúncia. Eu não vejo a elite brasileira, não negra, cheia, lotada de privilégios, falar desses números. Quando um branco morre, vira ONG. Quando um preto morre, vira estatística. Isso é fato”, ressalta a ialorixá.

Uma vela acesa para iluminar a população de rua

Anderson Lopes Miranda, ex-morador de rua em São Paulo e integrante do Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua- MNLDPSR, destaca o grande preconceito existente em cima da população em situação de rua – muitas vezes chamada de “vagabunda”.

“Eu sou o Anderson, tenho 46 – vou fazer 47 anos. Fui estuprado aos 13,14 anos no Vale do Anhangabaú por um policial militar. Participar dessa Caminhada do Silêncio é retratar o quanto a gente ainda é estuprado – homens, mulheres, crianças, adolescentes em situação de rua”.

“Eu queria lembrar do governo (de Carlos) Lacerda, no Rio de Janeiro, começando com a vinda da Rainha Elizabeth, quando o governo mandou exterminar catadores e moradores em situação de rua para a Rainha passar no Rio de Janeiro”, diz Anderson, citando ainda o documentário Topografia de um Desnudo, de Tereza Aguiar.

Outros casos envolvendo a violência contra a população de rua foram a chacina da Candelária, a chacina da Praça da Sé – “quem matou a população de rua em 2004? Guardas municipais e policiais militares (…)” – e o massacre de 2007 na zona norte de São Paulo onde, segundo Anderson, “a Rota foi lá e exterminou a população de rua”.

Anderson Lopes cita ainda a vala de Perus, onde pessoas em população de rua também foram enterradas sem identificação. “Eram pessoas que não aceitavam, à época, a Lei da Vadiagem, que está voltando para a população em situação de rua. Governos de direita exercendo Lei de Vadiagem e não gera trabalho“.

De acordo com Lopes, três movimentos da população de rua (dois nacionais e um estadual) estarão presentes na Caminhada do Silêncio.

“A Caminhada do Silêncio. Mas não é silêncio por silêncio, é lembrar dos nossos entes, muitas pessoas em situação de rua morreram de covid (….) “Para nós, a Caminhada do Silêncio acendeu uma vela para que essa vela não se apague na mente e no coração (…)”

“Tem uma frase muito importante que nós, da rua, dizemos: ‘olhe nos meus olhos. Eu sou ser humano. Eu não preciso só de sopa, de pão. Eu preciso de conversa, de olhar, de carinho, de cuidado’ (…) Nós precisamos que o Estado pare de nos criminalizar”, diz Lopes.

Veja as entrevistas completas da Ìyáloriṣà Adriana t’Ọmọlú e de na íntegra da TV GGN 20 horas. Clique abaixo e confira.

Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

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  1. Caminhada do Silêncio é toda hipocrisia acobertando e apoiando o Revisionismo Histórico enquanto esconde o Projeto de Poder das Elites do Estado Ditatorial Caudilhista Absolutista Assassino Esquerdopata Fascista implantado em 1930, arquitetado por 3 Fascínoras Ditadores: Fascista Getulio Vargas, Nazista Gaspar Dutra e Stalinista Luis Carlos Prestes. Esconde a Indústria da Miséria, do Atraso, do Lesa-Pátria, do Analfabetismo, da Censura, dos Centros de Tortura, Prisões Políticas e Cemitérios Clandestinos de FILINTO MULLER. Esconde o STF que autoriza o Envio de Cidadãos Brasileiros para Campos de Concentração e Crematórios Nazistas. Esconde Tancredo Neves, Ministro da Justiça do Nepotismo Fascista cumpliciando e autorizando tudo isto. Esconde os Coronéis, Jagunços, Assassinos entre Gregório Fortunato, Bejo Vargas, José Ferreira Gomes,Filinto Muller, Lutero Vargas, Tenório Cavalcanti, Alcino João do Nascimento,…Esconde o Nepotismo do fascista entre Familiares Jango, Tancredo Neves, Ivete Vargas, Aécio Neves, Leonel Brizola,…Então vamos começar a revelar a Verdadeira História Brasileira depois de 92 anos? Aproveitemos a volta de um Paulista para Nos libertar das Mentiras, Ditadura, Fascismo e Revisionsimo Histórico. O Brasil de volta às mãos do Povo Brasileiro depois de quase 1 século. Tortura, Revisionismo, Nepotismo, Fascismo, Esquerdopatia, Estado Absolutista, Bandidolatria, Cleptocracia NUNCA MAIS !!! DO POVO PELO POVO PARA O POVO !!!!

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