Carta aberta aos Ministros do Supremo, por Luís Nassif

O jogo da Lava Jato está decidido. No caso dos inquéritos e processos da primeira fase – contra o PT e o PMDB – dê-se continuidade e abram-se quantas representações forem possíveis com base em qualquer tipo de indício – como demonstrou ontem a 11a Vara Federal do Distrito Federal.

Em relação à fase tucana, duas formas de anulação.

Na fase dos inquéritos, direcionamento para Policiais Federais do grupo de Aécio Neves.

No âmbito do Supremo, a distribuição dos inquéritos e processos para o Ministro Gilmar Mendes, através da inacreditável coincidência de sorteios,

Depois dos processos de Aécio Neves, José Serra e Aloysio Nunes, hoje Gilmar acabou sorteado para relatar também o do senador Cássio Cunha Lima.

É uma sucessão de coincidências.  

E vamos falar um pouco de escândalos e da capacidade de gerar indignação.

Escândalo é uma das formas de controle da sociedade sobre autoridades, desde que gere indignação. A maneira de reagir ao escândalo, de avaliar objetivamente o escândalo, mostra o grau de desenvolvimento de uma sociedade e, especialmente, da sua mídia.  Em sociedades permissivas, os escândalos produzem pouca indignação.

Quando se cria um escândalo em torno da compra de uma tapioca com cartão corporativo e se cala ante o fato de um presidente ser denunciado por crimes e se manter no cargo, algo está errado, como observou recentemente Herta Däubler-Gmelin, que ocupou o cargo de ministra da Justiça na Alemanha entre 1998 e 2002. Ela lembrou o caso do presidente Christian Wulff, que renunciou devido a um depósito de 700 euros em sua conta.

Por aqui, há tempos a mídia aprendeu a conviver com o escândalo seletivo e fugir dos escândalos essenciais. Com isso, um dos freios centrais de uma democracia, contra abusos de autoridades  – as reações públicas a atitudes escandalosas – perde a eficácia.

Só um notável entorpecimento moral para explicar a falta de reações dos Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) às atitudes de Gilmar Mendes.

Tanto no STF quanto no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é idêntica a (não) reação a Gilmar. Para não ter que enfrentá-lo, colegas inventaram o álibi da excentricidade. Ele é excêntrico, ninguém leva a sério, logo a melhor política é ignorá-lo.

Pessoal, não dá mais! Esse álibi para a não-ação não cola.

Admitir que um Ministro do STF fale o que Gilmar falou sobre o Procurador Geral da República, aceitar que ele visite um presidente da República que está sendo processado e o aconselhe, a sucessão de processos sorteados para ele, os patrocínios aos seus eventos por corporações com pleitos no Supremo, é de responsabilidade pessoal de cada Ministro do Supremo.

Não há biografia que resista, por mais elaborada que seja, à tolerância a um Gilmar. Cada vez que Gilmar extrapola, e Celso de Mello se cala, o silêncio não é um grito, nem solidariedade corporativa: é sinal de medo, de falta de solidariedade e respeito para com o país, porque é o país que sai humilhado e se rebaixa ao nível das nações onde impere a ausência de qualquer regramento. E não se compreende um Ministro indicado para a mais alta corte do país, que não saia em defesa dela, quando exposta a atos que a desmoralizam.

Celso de Mello tem medo, assim como Marco Aurélio de Mello, Ricardo Lewandowski, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, a presidente Carmen Lúcia,  Luiz Fux, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Rosa Weber.  E não adianta tirar o corpo: Gilmar desmoraliza todo um país, mas é um problema do STF e de responsabilidade individual de cada um dos Ministros, porque os únicos em condições de contê-lo.

Com esse silêncio ensurdecedor, o que fazer?

Vocês, senhores Ministros, obrigam pessoas sem nenhum poder de Estado, a externar em um blog a indignação ante a falta de reação aos abusos e de desrespeito ao país, ficando exposto a processos e retaliações de Gilmar. Nós estamos pagando, com as ações abertas por Gilmar, para cumprir uma tarefa que deveria ser dos senhores.

Esperamos que, passada a fase do espanto ante Gilmar, possa se esperar dos senhores uma atitude à altura do poder que representam e do país que deve merecer seu respeito.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • Esta vendo ai Dr.Clever
    Esta vendo ai Dr.Clever Mendes de Oliveira por que esses pulhas nao merecem o respeito que o senhor os reverencia.Seria tambem por medo Dr.Clever?Nenhum daqueles cretinos valem o dedo mindinho de Nassif.

  • Erro no texto (nome da sigla)

    Nassif, há um erro no primeiro parágrafo: você fala da primeira faze na operação que teria atingido "PT e PSDB", quando parece claro que vc estava se referindo ao "PT e PMDB"

     

    Abraço 

  • Esta vendo ai Dr.Clever
    Esta vendo ai Dr.Clever Mendes de Oliveira por que esses pulhas nao merecem o respeito que o senhor os reverencia.Seria tambem por medo Dr.Clever?Nenhum daqueles cretinos valem o dedo mindinho de Nassif.

  • Nassif, prepare-se não para

    Nassif, prepare-se não para mais um processo de Gilmar, mas dos outros 10 ministros. Esse é o nível baixíssimo dos que representam as três esferas de poder do Brasil. Toda vez que Gilmar fala e faz o que bem entende, me lembro da ministra do Supremo Americano, Ruth Ginsburg, que antes da eleição americana, disse que Trump era uma fraude (provavelmente o adjetivo mais ameno que esse palhaço laranja ouviu rs ) foi pedir desculpa por ter dito isso. Enquanto isso, Gilmar Boca Mole só não xingou, diante a TV, seus desafetos de FDP. Mas falta pouco pra isso. 

    Mas isso não é inédito no nosso supremo. Quando a coisa aperta, o jogo é pra valer e não amistoso de final de ano, a instituição se acoelha. Foi assim em 64, que docilmente endossaram o golpe dado por militares. Agora, a  única diferença é que o golpe é civil. 

     

     

  • A Que Ponto Chegou o Supremo Tribunal Federal

    Apoio plenamente a sua indignação, Nassif! É um absurdo o estado de deteriorização moral a que chegou o nosso STF. Não representam mais a guarda da nossa constituição. A postura acovardada, ante Gilmar Mendes, de seus pares revela o estado a que chegou a Justiça brasileira. A mudança virá da população, que não mais assistirá a isso inerte.

  • O Sr Gilmar Mendes, em lugar de...

    O Sr Gilmar Mendes, em lugar de ministro do STF, é na verdade o plenipotenciário do tucanato junto ao mesmo com a missão de defender e decidir, de modo exclusivo, incontestável e soberano, sobre quaisquer interesses desse grupo, pois para isso foi por ele entronizado ali.

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