O financiamento eleitoral e a maravilha da construção do direito

A aprovação, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), da proibição do financiamento privado de campanha, é um capítulo brilhante e exemplar, uma demonstração inequívoca do poder reparador do direito, da forma como os conceitos nascem, crescem, desenvolvem-se, encontram seu tempo de florescer e transbordam em decisões que mudam a história.

Dois colegas – um procurador da República, Daniel Sarmento, outro advogado, Cláudio Pereira de Souza Neto – decidem enfrentar o desafio do financiamento eleitoral de campanha, o grande instrumento de corrupção política da atualidade.

Vão até a Constituição e invocam os fundamentos: o princípio da igualdade entre eleitores, cada voto sendo um voto, não podendo ser afetado pelo poder econômico.  Depois, a igualdade entre candidatos.

A partir daí foram compondo sua partitura, analisando o financiamento privado à luz desses conceitos.

***

No início, eram eles e seus estudos.

Depois, buscaram caminhos para ampliar o debate.

O procurador representou junto à Procuradoria Geral da República. O PGR da época, Roberto Gurgel, não se interessou, mas o tema provocou debates entre procuradores, ampliando seu escopo.

O advogado foi atrás da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que encampou a tese.

No meio do caminho, debates e debates nos quais as teses foram sendo submetidas a testes, questionamentos, aprimoramentos. Das ideias originais puderam brotar outras ideias, ou novas variações, ou simplesmente se consolidar a convicção original, em uma construção coletiva conduzida pelos autores.

Amadurecida, a tese bateu no STF (Supremo Tribunal Federal).

***

Algumas ideias chegam antes do tempo, são arquivadas nos escaninhos da história enquanto aguardam que o novo tempo chegue até elas. Outras surgem no exato momento do seu tempo.

***

No início apenas os comerciantes compunham as câmaras municipais e havia o voto de cabresto. Depois, ex-escravos, mulheres, analfabetos foram entrando lentamente na cidadania política.

Nem assim houve redução da influência da plutocracia, com seu imenso poder sobre partidos, governos e política.

Mas ninguém resiste ao poder de uma ideia quando chega o seu tempo, dizem os sábios.

As teias da história, por vias retas e tortas trouxeram o financiamento de campanha para o primeiro plano. E o Supremo, que reconheceu direitos de minorias, avanços morais e científicos, julgou ser hora de estabelecer a igualdade no mercado eleitoral.

***

A decisão do STF significa um passo a mais em direção à equidade política.

A atitude de Gilmar Mendes, sentando um ano e meio em cima da representação, desmilinguindo-se em verborragia inútil visando atrasar a decisão, derramando impropérios, lembrava militantes do estado Islâmico destruindo obras de arte a marretadas.

***

Mesmo assim, Gilmar prestou um serviço inestimável ao direito.

Graças a ele foi possível valorizar o STF pelo seu oposto, ele, o juiz que jamais consegue avançar além do campo estreito dos seus próprios interesses partidários e pessoais.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • beleza de post, parabéns Nassif...

    mostra por todos os ângulos de visão do futuro que o ponto de partida de toda ótima ideia nunca deixou de ser um obstáculo que muitos consideravam intransponível

    estão caindo um por um, todos os obstáculos, para o bem da verdadeira justiça e do Brasil

  • BLOQUEIO DE SAQUE DE ALTOS VALORES

    Vamos todos nós acreditarmos que esta decisaõ s possa conter um pouco a ousadia daqueles que tentam, sem menor pudor, roubar o estado.

    Existem muitas medidas que poderiam conter a corrupção, no pais. Só depende de boa vontade. O maior volume de corrupção esta no conjunto dos municípios. Que são poucos fiscalizados. O governo federal poderia ao menos dificultar a ação desses maus feitores municipais bloqueando saques nos bancos de valores em especie, acima , talvez, R$ 5000,00, a qualquer cidadão ou empresa.Eu pergunto que justifivativa teria um individuo ou uma empresa sacar um valor em especie R$ 50 mil, R$ 100 mil, R$ R$ 200 mil. Podem acreditar movimentaçao de dinheiro de especie so um justifcativa ILICITUDE. Niguem compra um carro, um apartamento, um terreno, qualquer bem de alto valor  levando dinheiro vivo. Qualquer cidadão hoje pode abrir um conta  bancaria para receber seus recursos. o governo precisa exergar isto, pois as prefeituras e que estao saqueando a sociedade brasieira. Criam infinitas empresas com um objetivo de roubar os cofres municipais. Transferem a estas eletronicamente os recursos públicos  e esta por sua vez sacam em especie para entregar aos getores, evitando assim o rastro.

     

     

     

     

     

    • alugamos um carro e, ao

      alugamos um carro e, ao devolvê-lo na ferroviaria de roma, os quatro viajantes  decidimos que era melhor pagar em moeda que ainda tinhamos no final da viagem. O preço era de 1000e poucos euros , não chegando a 1100 euros.

       

      o atendente da loja recusou receber em moeda e nos disse que acima de 1000 euros não era permitido fazer pgamentos cash na italia. Isso ocorreu em 2014. Não sei se esta informação de proibição total no país procede, ou se ainda está mantida, mas achei uma forma muito intereessante de coibir possiveis ilicitos financeiros.

    • SFC

      A Controladoria Geral da União foi criada ainda em 2001 e teve sua estrutura e competências aumentadas nos anos seguintes. Muitos dos "escândalos" que são divulgados na imprensa e se transformam em denuncias do MP são originaados em auditorias da CGU, óorgão integrante de Sistema de Controle Interno.

      Isso no tocante á administração pública.

      Por outro lado, tenho reservas em relação à proibiçao de saque. Abstraindo o voto da Ministra Carrmem Lúcia, acho que a Receita tem todos os instrumentos para saber como o dinheiro foi auferido. Como ele é gasto, aí acho demais tentar controlar. Eu, pessoalmente, já precisei muitas e muitas vezes de dispor de dinheiro em espécie, em notas trocadas, pra pagar diárias e alimentação de equipes de trabalho de trinta, cinquenta pessoas...

      • Controle de saque.

        De fato companheiro radicalizar, não seria ideal. Eu ate sugeri valor máximo diário de R$ 5 mil e alertei da facilidade de qualquer cidadão hoje possui um conta bancária. Existe um resolução no banco central em que exige que banco abra conta, disponibilizando serviços essenciais,sem custo  para o correntista. Ale[em de outtras medidas, com por exemplo  regulamentar o servico de maquinetas de cartao de debito e credito permitindo popularização deste tipo de serviço, afim de que todas comercios possam utilizar , evitaria em muito a circulaçãode dinheiro em especie, 

         

        Te agradeço pela comentarios e contribuição

        • Controle

          Há quem diga que bom mesmo seria implantar um chip em cada cidadão. Assim, não precisaríamos de dinheiro em espécie e o controle seria  total, não é mesmo?

  • E o homem é danado de bom...

    Brasil precisa desenvolver advocacia de interesse público

    Foi como promessa de ano novo. No dia 31 de dezembro, Daniel Sarmento decidiu deixar o Ministério Público Federal depois de 19 anos como procurador regional para dedicar-se à advocacia. A partir de agora, dará expediente no escritório que leva seu nome – Daniel Sarmento Advogados – localizado no centro do Rio de Janeiro.

    “Durante quase vinte anos, fui membro do Ministério Público Federal, do que muito me orgulho. No MPF, pude atuar em questões instigantes, junto a colegas e servidores competentes e comprometidos com o interesse público”, afirmou. “Senti, porém, a necessidade íntima de buscar novos desafios e caminhos profissionais. No final de 2014, pedi exoneração do cargo de Procurador Regional da República, e a partir deste novo ano, ao lado da vida acadêmica, pretendo também exercer a advocacia privada e a consultoria na área de Direito Público.”

    Veja mais em: http://jota.info/entrevista-daniel-sarmento

  • Caracas!
    Eu sinto muita emocao com aprovacao pelo STF e acredito que estamos e vamos avancar. Ditadura nunca mais!
    Estamos vivendo estes ultimos 10 anos uma guerra silenciosa da sociedade civil. A crise de 2008 deu uma guinada de 180 graus e lentamente a social retorna ao seu lugar. Rapido e seus direitos.
    Temos muito que festejar.
    E amanha o Gilmar tem que ser lembrado e sabido o que nao se pode fazer e dizer de um membro da suprema corte do Brasil.
    Ha lembrando que o que fez criou uma regra para prazo de vista e ou voto. Dos erros do safado se criou lei.
    O importante e nao existir desigualdade!
    Viva eu viva tu VV VIVA O BURACO DO TATU!

  • Ontem eu ouvi um midiota

    Ontem eu ouvi um midiota deitando falação com toda aquela besteiraiada com que a mídia doutrina seus zumbis de estimação. A proibição das doações de empresas colocou em apuros aquele povinho que compra trens, ambulâncias (e outros veículos) ou contrata obras e serviços superfaturados para depois receber "doações" destas empresas em suas campanhas. Quais foram mesmo as empresas que doaram um montão pro PSDB aqui em SP? Bom, "isto não vem ao caso". Agora o próximo passo no sentido de valorizar o voto do cidadão comum é descer o pau na mídia, porque esta vai continuar fabricando midiotas aos montes que vão às urnas e dão tiros contra os próprios pés.

  • Quem votou no Zé Serra nem sabe que votou foi na Chevron...

    No início apenas os comerciantes compunham as câmaras municipais 

    ..... o problema é a falsificação, ou seja, votarmos numa pessoa física quando na verdade estamos votando numa pessoa jurídica: não me diga que quem votou no Zé Serra não sabia que na verdade estava votando na Chevron. Sejamos honestos e digamos: .(ah, me esqueci o que eu dizer...fugiu...)

    façamos um inventário e olhemos com lupa o passado...que, num futuro distante, quando a poeira assentar, que possamos nos sentar para conversamos sobre isso: pq uma Chevron não participa, ela mesma, do parlamento, e não através de um empregado como Zé Serra...

    se os comerciantes se fizessem presentes nas câmaras através da eleição de suas empresas pelos habitantes da cidade...assim as pessoas jurídicas teriam assento nas câmaras e de forma transparente: elas mesmas e não através de pessoas físicas corrompidas. O eleitor votaria duas vezes: numa pessoa física e  jurídica. Se a Casas Bahia fosse eleita seria feito um sorteio dentre seus funcionários, do gerente ao faxineiro, sendo que o nome sorteado representaria a empresa na câmara municipal. A partir daqui se desencadearia toda uma sequência de sorteios tais como:

    1- Sorteio dentre os componentes da Câmara Municipal para a escolha de um nome que integrará o  parlamento estadual que, por sua vez sorteia, dentre eles, um para fazer as vezes de Poder Executivo Estadual(província).

    2- Sorteio dentre os componentes da Câmara Municipal, de um segundo nome, este para integrar o parlamento federal que, uma vez formado sorteia, dentre eles,  um nome para a escolha do chefe do executivo federal

    3- Sorteio dentre os componentes da Câmara Municipal, de um terceiro nome, este para fazer parte do ParlaSul ou outros regionais como o Parlatino e mesmo para o Parlamundi, os quais escolheriam, dentre eles, por sorteio, os chefes dos executivos para estes nives de governo...e pq não o mesmo procedimento para a formação de governos interplanetários, claro, mas isso é para daqui a algumas centenas de anos, talvez milenios...
     

    http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01881998000200011   

  • Faculdades de Direito

    Este texto deveria ser enviado para todos os cursos de Direito do país. Os estudantes estão precisando de um alento assim para a valoração de seu curso. 

  • SÓ POR DEUS!

    Qualquer pessoa tem o direito constitucional de ser contra ou a favor de um fato, mas tem que respeitar o pposicionamento dos outros. O mesmo se diz de um juiz em questões postas à sua decisão,  mas não é assim que pensa Gilmar Mendes. 

    Depois de ser voto vencido no STF sobre o financiamento empresarial de campanha política, Gilmar Mendes afirmou para Eduardo Cunha que vai reabrir o processo, sob alegação de que a decisão majoritária dos Ministros não tem valor jurídico,  porque os votos não foram modulados, ou seja: que a decisão de proibição de financiamento empresarial de campanha política somente teria valor da data do julgamento em diante.

    Ainda em sua manifestação treslocada, GM disse que, se a modulação não for feita, o mandato de Dilma seria ilegal, porque financiado por fonte vedada pelo STF. 

    Será que o ministro-político (ou será político-ministro?) se esquece de que, quando da campanha passada, não havia vedação legal para financiamento empresarial de campanha? E que uma decisão judicial não pode prejudicar ato jurídico perfeito, como foi o caso dos financiamentos privados das eleições passadas? 

    Esse tal GM não respeita nada e nem ninguém, quer levar tudo no peito e mandar em tudo e em todos, como se estivesse tratando com seus capangas, como bem afirmou JB.

    Quando vão colocar um freio neste sujeitinho?

    • GILMAR - O PROTETOR DE DILMA

      Bem, lembrado, depois de arrebamhar peritos e auditores para fustigar as prestaçao de contas da Dilma, o Gilmar passou a bradar que a campanha foi irrigada pela "propina" e agora esta temeroso que, subsistindo o julgamento, a eleição da mesma, bem como a campanha do próprio adversários, por terem recebido doações empresariais sejam tidas como ilegais, rs rs rs, uma piada desse prepotente falastrão. 

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