O MPL e o aprendizado democrático

A prefeitura de São Paulo ainda não absorveu a perplexidade com o Movimento do Passe Livre (MPL), que colocou em confronto manifestantes e policiais.

Em sua sala, no 6a andar da sede da Prefeitura, o prefeito Fernando Haddad exibe ar cansado, de quem passou o dia dando explicações.

Tem argumentos racionais para justificar o reajuste de 20 centavos nas passagens de ônibus da capital. Mostra que estava-se sem reajuste desde 2011 e, nesse período, os salários dos motoristas e cobradores subiram muito mais que isso.

Rebate os argumentos do movimento, de que, se corrigida pela inflação desde 1994, as passagens deveriam estar custando menos. Explica que eles deixaram de considerar que não se pode comparar as duas datas apenas, porque no período foi introduzido o bilhete único, pelo qual cada passageiro anda muito mais do que antes da sua introdução.

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Discorre argumentos racionais e levanta, em sua defesa, sua abertura para os movimentos sociais. Conta que enfrentou uma multidão de 5 mil sem tetos que foram protestar na frente da Prefeitura. Subiu no seu caminhão, chamou-os para a conversa, explicou seus argumentos e foi bem compreendido.

Na sua equipe tem muitas pessoas que participaram dos protestos das diretas, das manifestações contra Collor. E que tentaram, de várias maneiras, trazer o movimento para conversar.

Mas com a rapaziada do MPL foi inútil. A prefeitura procurou os líderes do movimento para negociar e eles recusaram. Quando viu o rosto da líder na televisão, levou um susto: tinha idade (e aparência frágil) para ser colega da sua filha.

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Peço para que deixe de lado a racionalidade, os argumentos técnicos e tente discorrer sobre o sentimento que leva milhares de jovens às ruas, sem bandeiras específicas, apenas para colocar para fora sua jovem energia. São como os caras pintadas sem um Fernando Collor como alvo. Não são os 20 centavos de reajuste que os mobilizaram, mas a sede de participar, de mostrar a sua cara.

E Haddad constata que o novo movimento é composto por avatares, pessoas com perfil nas redes sociais, que, por razões diversas, conseguem conquistar a simpatia de outros ativistas virtuais.

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A maior parte não tem ideologia, não tem ideias claras sobre as bandeiras a empunhar e, quando têm a bandeira, dispõe de informação mínima sobre as circunstâncias e fatos que a determinam.

Mas querem participar. Têm o fogo sagrado, a energia vital, dos que sonham em mudar a realidade.

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Será um aprendizado recíproco.

Da parte dos jovens, aprenderão que todo ato violento tem consequência. O pavor estampado no rosto de vários deles, com a agressividade ilimitada da Polícia Militar, foi uma boa lição. O fato da manifestação ter sido aproveitada por vândalos, outra lição.

Da parte das autoridades insensíveis, a lição de que, na era das redes sociais e dos smartphones, nenhuma violência fica impune. O movimento dos jovens iria se esvaziar na 5a feira, devido à violência do dia anterior. A violência redobrada da PM reacendeu a legitimidade do movimento.

Da parte das autoridades responsáveis, um longo aprendizado para saber como atender aos impulsos de uma geração afoita, como todos os jovens, inexperiente, sem um alvo fixo para atacar. Mas portadora do futuro político do país.

Luis Nassif

1 Comentário

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  1. Sim, há que se ver o valor

    Sim, há que se ver o valor simbólico desse movimento. Ele é um sintoma. É como a febre num organismo que possue

    uma infecção reco^ndita.

    Penso que além do transporte coletivo deve-se discutir também a qualidade da escola pública. Por estes 2 funis, passa o povo, despresado

     

    pelas elites durante 5 séculos.

    Penso que devemos discutir conjuntamente a taxação das grandes fortunas, liberdade de informação para todos os atores, financiamento público de campanhas elitorais, etc.

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