Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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Syngenta: China versus EUA. E o pré-sal? Por Rui Daher

Por Rui Daher

Em minha coluna para CartaCapital, dedico algumas linhas à negociação, ainda não finalizada, da suíça Syngenta, multinacional fabricante de sementes e agroquímicos, pela chinesa ChemChina. Miro em Washington e Pequim, para atirar em Brasília.

Acredito que a venda irá se concretizar, mas as preocupações norte-americanas em relação à aquisição são imensas, tanto quanto seu poder de fogo político e econômico no esforço para melar a aquisição.

Vejam aonde chegam as aflições dos EUA e entendam o caráter de uma nação hegemônica que bem assimilou o imperialismo europeu, sobretudo o britânico.

Os argumentos são agrícolas, como deveriam ser, mas se escondem atrás de posições geopolíticas, soberanas e de longo prazo. Lá não é como aqui, onde o futuro tem 24 horas.

Agroquímicos e organismos geneticamente modificados (OGM) ou transgênicos, em acepção mais conhecida, têm fabricação expressiva nos EUA (Monsanto, Dow-Dupont, FMC), na Alemanha (Bayer e Basf) e Suíça (Syngenta). Os ocidentais não causam preocupação, o antigo Império do Meio, sim.

A expansão agrícola da China não pode abrir mão da biotecnologia. Nem irá. Sua consciência ambiental não é das mais virtuosas. No mais, os chineses, embora ávidos importadores de certas commodities agrícolas, são exportadores líquidos de outras tantas.

No mesmo sentido, adquirem terras por todo o planeta. Não será para construírem resorts ou cassinos. O movimento da ChemChina em direção à Syngenta é, sim, paquidérmico.

Mas qual o receio dos EUA? Para a mídia, tergiversam. No Brasil, essa nem opina, pouco sabe, traduz o que vem do exterior, e imediatamente passa aos temas mais importantes, como a população de pedalinhos em Atibaia.

Na semana passada, o secretário da Agricultura dos EUA deixou escapar para o Financial Times: “Continuo extremamente preocupado com a maneira como a biotecnologia e a inovação estão sendo tratadas e obstruídas por um sistema na China que, muitas vezes, não se baseia na ciência e parece estar mais relacionada à política”.

Êpa, só mesmo gargalhando. Alguma nação, mais do que os EUA, põe a política acima de qualquer coisa?

A China restringe importações de soja e milho transgênicos, sobretudo dos EUA. Com o Brasil pega mais leve, embora saiba que 90% da soja brasileira é plantada com sementes OGM. Não disputa hegemonia conosco. Vez ou outra, quando com estoques altos, usa de embargos passageiros.

As alegações de Washington mostram certo desespero. Desde espionagem industrial cometida por chineses que moram nos EUA até a recusa de Pequim a novas variedades pesquisadas. A aquisição da Syngenta seria, ao mesmo tempo, uma forma de dar tempo para que a biotecnologia agrícola chinesa avance, além de ralentar o dinamismo do Ocidente.

“Se non è vero, è ben trovato”. Ou paranoia grave. A Syngenta, mesmo sendo suíça, já se dispôs a submeter a negociação à Comissão de Investimentos Externos dos Estados Unidos (CFIUS, na sigla em inglês).

Quem pode e pensa, pode.

Já quem não pensa …   

Imaginemos um país ao sul do equador, bonito pela própria natureza, que é Flamengo e tem uma negra chamada Teresa. Iria ele tão longe em suas preocupações com tal negociação?

Voltemos por um instante a Washington, DC. Desnecessário beirar a Casa Branca ou o Congresso. Sentemo-nos no gramado da Georgetown e conversemos com o universitário Jimmy Lancaster.

 – Jimmy, tivessem os EUA hegemonia na técnica de explorar petróleo em águas profundas abririam mão de participar da partilha em todos os blocos da camada pré-sal?

No way, man. But you should ask it to Mr. Obama, right now I am tuned with the “Black Keys” new album.

No Flamengo e no Morro de São Carlos, a Teresa e my friend Charles querem saber por que a influência de um Vampiro careca e de uma Loira constituída por quilos de silicones e Botox fez o Senado, por 2 votos, aprovar mudanças no sistema de partilha do petróleo extraído da camada pré-sal, um feito de técnicos brasileiros que nada têm a ver com delações. Seus prêmios restringem-se ao orgulho próprio e à luta nacional até a criação da Petrobras.

Se não vetado pela presidente, o novo marco legal tira a obrigatoriedade de a estatal participar em todos os blocos de partilha. Depois da Lava Jato, ela não disporia mais de fundos para seguir na exploração. Ladrões confessos, corruptos e delatores, guiados por um juiz vaidoso e provinciano, destroem o maior patrimônio do País, açodados pelas folhas e telas cotidianas como fossem heróis.

O pré-sal é assunto de futuro e soberania. Não pode ser atravessado por Cunhas tipo impeachment, secular corrupção, favorecimentos de empreiteiras, caixas 2 de campanhas eleitorais, antenas de celular e pedalinhos.

Pergunto: diante desse quadro, seria este o melhor momento para vender nossas conquistas? Ou as coxas grossas do Congresso acreditam que as cotações internacionais do petróleo não são cartelizadas e permanecerão assim eternamente baixas?

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

16 Comentários

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    1. Marcos,

      quando aqui se faz tais análises nem pensamos que possa se interessar, quanto mais entender. Como diz o comentarista posterior a você, que certamente não é Bobo, essa tecnologia precisou de décadas para ser desenvolvida. Depois dizem que commodities não agregam valor. Valor indireto também vale. Abraços.

  1. Vamo ver quem produz a

    Vamo ver quem produz a primeira tech de exploração em águas profundas no exterior pra pegar a espionagem politico-industrial dos EUA.

  2. Estamos f…!
     
    Se correr, o

    Estamos f…!

     

    Se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho estraçalha.

    A China passará a mão na Syngenta. À China, mais do que aos Estados Unidos interessa a “província agrícola” Brasil. Bem mais abundante e menos problemática do que administrar milhares de tribos africanas da África tropical e subtropical. Os Estados Unidos passarão a mão na Pre-Sal. E aí onde nossos problemas começam e ficar ainda piores do que sempre foram: Se conseguido com a China uma negociação em torno do óleo do Oriente Médio, os Estados Unidos “nos venderão” aos chineses sem a menor cerimônia, com óleo e tudo. E aí, deixaremos de ser colônia americana pra sermos colônia chinesa, sob altíssimo risco de eliminação a médio prazo. Afinal, gente pra “colonizar” o Brasil é o que não falta na China; e, acredite, tragédias não previstas podem acontecer; as previstas… vão acontecer! Como é triste se não ter uma elite que se dê ao respeito!

    1. José Bispo,

      assino embaixo desta sua frase: “Como é triste se não ter uma elite que se dê ao respeito!”

      Essa elite pensa que acumulação de capital é cofrinho em forma de porquinho. A inteligência dela não passa disso. Abraço

  3. Perfeita análise

    Ruy Daher é um dos mais cultos e excelentes comentaristas do blog.

    Sempre lei seus artigos, pois, para mim, é uma aprendizagem.

    Infelizmente, o povo brasileiro,  com a arte de manipular do PIG brasileiro, está cada vez mais pensando como uma manada brava ou alienado, fácil de ter a soberania de nosso País sequestrada para os EEUU.

    Assim, os assuntos de nossas notíciais são ditadas pelo imperador – que manda efetivamente em nosso País –  manda prender e prende quem quiser e hora que quiser e onde for –  e que é apoiado pelo PIG e políticos sem qualquer amor à Pátria,desprovido de ideais e amantes do poder e do dinheiro.

    Com isto tudo, não estamos mais refletindo e pensando com problemas tão importantes, como este grande articulador nos colocou neste texto.

    Parabéns Ruy.

     

     

    1. Obrigado, Dude

      sobre o reinado brasileiro estar se concentrando em eliminar política econômica distributivista, sugiro ler a “brincadeira trágica” que postei depois deste artigo sobre a Syngenta. Abraço

  4. Traidores e entreguistas.

    O PSDB, o DEM e a PF representam os interesses dos Estados Unidos.

    Basta ver os projetos de lei e as atitudes tomadas.

  5. Comendo pelas beiradas

        Desde que em 2006 a ChemChina adquiriu a francesa Adisseo Group ( lider em alimentação animal ), suas demais aquisições,Divisões de plásticos da Rhodia, divisão da máquinas injetoras da Krauss Maffei, a Pirelli, e jogando junto com outras empresas chinesas, como a Geely e Duofeng, adquirindo participações expressivas na Volvo e Peugeot , que o vértice de expansão destes grupos estatais chineses era a Europa.

          Outra aquisição inteligente, area de pesticidas e tecnolgia agricola, foi em 2011 da israelense Adama ( no Brasil : http://www.adma.com/brasil )

         E tambem querem “controlar ” parte do mercado das tradings, com a associação estratégica, ao adquirir 12% do Grupo suiço Mercuria ( especializado em energia ).

        http://www.mercuria.com/media-room/business-news/mercuria-welcomes-strategic-investiment-chemchina

         Claramente a China,que  aprendeu bastante com ingleses/americanos, possui um projeto de Estado, sabe muito bem o que quer.

    1. Júnior,

      isso porque no Ocidente se fala em crise chinesa. Não despertaram para que a desaceleração do crescimento era necessária e está sendo controlada. Abraço

    1. Pegando um gancho: um ótimo

      Pegando um gancho: um ótimo texto também é “Hora de passar o bastão” de Antonio Luiz M. C. Costa e publicado na Carta Capital nr. 890, de 02.03.2016. É sobre a Bolívia e mostra o interesse dos USA naquele país. É importante porque muitos brasileiros acreditam que os USA não se interessam pelo Brasil. Se eles dão tanta importância à Bolívia, país pequeno e pobre, é claro que se interessam, e muito, pelo Brasil. Não consegui postar neste site do Nassif. Se alguém se interessar e souber postar, acho que é válido.

      1. Flávio,

        além de assinante, escrevo no site da Carta. Há duas semanas não recebo a revista. Mas vou correr atrás. Seu gancho é interessantíssimo. Abraço

    2. Altamiro,

      valeu e pode acreditar que o negócio é sério e nós aqui, Três Poderes e, principalmente, o Quarto, entregando nosso patrimônio de bandeja (não é apenas a BR, não). Abraço

  6. AQUI, COMO FARSA? NÃO. AQUI, COMO FARRA.

    http://www.focus.de/politik/deutschland/spionage-und-sie-lauschen-doch_aid_188212.html

    Lá pros fins de 2001, mundo pós 11 de Setembro, um parente joga no meu colo a edição da revista alemã FOCUS que apresentava essa reportagem.

    ‘Repare na data da revista’, ele me disse. Guardem bem a data da reportagem. Tem um trecho especial pra nós brasileiros. E reparem também a quantificação dos recursos desviados para espionagem corporativa/econômica. Nunca vou me esquecer quando ouvi falar do ‘Echelon’ pela 1ª vez.

    Tradução google com correções parcas e porcas pois meu alemão está muito enferrujado.

    *************

    E AINDA BISBILHOTAM

    FOCUS MAGAZIN – Nr. 23 – 2001

    Sábado, 02/06/2001, 00:00 – da Autora Online da FOCUS: Christiane Schulzki-Haddouti

    Um comitê do Parlamento Europeu confirma a existência do gigantesco sistema de espionagem Echelon.

    Para fazer a pergunta crucial para os amigos americanos, a Comissão Especial do Parlamento Europeu viajou aos EUA, em meados de maio, para uma conversa pessoal. Em vão, como se viu: ministérios dos EUA e agências de inteligência cancelaram todas as datas abruptamente. Esnobados, os parlamentares voaram de volta e publicaram quarta-feira passada em um relatório abrangente a sua interpretação da resposta americana: em princípio, sim.

    A questão embaraçosa: Estados Unidos e Reino Unido operam espionagem de mercado/industrial contra seus parceiros europeus? Durante anos, sempre novos detalhes sobre uma rede de vigilância global chamado Echelon vêm à luz. Do aspirador de dados, via satélite, links de rádio e pontos nó da Internet que arranca informações, também fazem parte, ao lado dos Estados Unidos e do Reino Unido: Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

    O sistema de escuta antes secreta, cujos principais centros devem estar na cidade bávara de Bad Aibling e na Britânica Menwith Hill não é utilizado apenas contra países hostis ou terroristas, fornece pesquisa abrangente do jornalista britânico Duncan Campbell. Em nome do Parlamento Europeu, Campbell já havia apresentado um relatório Echelon (FOCUS 22/99). O segundo relatório, que desde janeiro entregou à Comissão, ele publicou na Internet em fins de maio.

    Campbell estima que “cerca de 40 por cento das atividades de inteligência dos EUA são de natureza economica”. Informações da CIA fluíam, por suas conclusões, regularmente para uma divisão especial do Departamento de Comércio dos EUA. Centenas de empresas norte-americanas devem ter com o seu apoio recebido contratos no exterior. Com várias importantes informações de bastidores, o projeto Echelon teria decidido em favor de empresas norte-americanas as negociações:

     – Em 1994 a americana Raytheon Corporation ‘catou’ da francesa Thomson-CSF no Brasil um contrato no valor de US$ 1,6 bilhão.

     – O consórcio Europeu Airbus perdeu em 1995 um contrato na Arábia Saudita no valor de seis bilhões de dólares contra a Boeing e a McDonnell Douglas.

     – Em 1996 ganharam as companhias de energia dos EUA Enron, General Electric e a Bechtel um acordo de 2,5 bilhões em Dabhol, Índia – como nos outros casos, supostamente graças ao apoio da Echelon.

    Em quatro bilhões de dólares Duncan Campbell estima o dano pelo sistema de espionagem apenas contra a Alemanha. A França teve, na sua opinião, de renunciar receitas de exportação de até 17 bilhões de dólares.

    “Nenhum desses casos foi plenamente provado”, disse o relator da Comissão Especial, Gerhard Schmid ( SPD ). No entanto, está exposto “o risco de espionagem industrial”. O ex-diretor da CIA James Woolsey já havia admitido à comissão que os EUA monitoram especificamente as comunicações de empresas individuais, para “prevenir a corrupção e distorções de mercado em detrimento de empresas americanas”, . No seu relatório final Schmid marca tais escutas telefonicas como “contrárias aos direitos humanos”, se antes não haviam suspeitas concretas disponíveis de suborno. Às empresas e aos cidadãos, aconselha “com urgência” para criptografar suas comunicações.

    As empresas vêm à atenção do Echelon quando elas enviam seus dados em conexões internacionais. Mesmo videoconferências em empresas multinacionais realizadas via satélite ou cabo podem ser detectadas.

    Se a Alemanha e o Reino Unido oferecem aos EUA o seu território para instalações da Echelon, as atividades de espionagem deveriam “se conciliar com a Convenção Europeia dos Direitos Humanos”, disse o relatório. Nem a Alemanha nem a Grã-Bretanha têm tentado até agora. Para Schmid é claro: Se a própria Grã-Bretanha participa ativamente da espionagem, “viola a lei da União Européia”.

    Os benefícios de mais um relatório de investigação deliberativa permitem ao jornalista Neo Zelandês Nicky Hager, que tinha descoberto a dimensão global do aspirador de dados em 1996, em primeiro lugar, acima de tudo “- dizer que Echelon realmente existe – e avisar para auto-proteção. Sensibilização do público para essa monitorização sistemática é o primeiro passo para a criptografia de rotina de todas as comunicações”.

    *Cooperação: Jochen Wegner

    AMIGOS ESCUTAM JUNTO

    Em junho de 1948, os Estados Unidos, Grã-Bretanha, Austrália, Canadá e Nova Zelândia assinaram um acordo de audição ultra-secreto.

    Dez estações de intercepção ao redor do globo filtram a comunicação de acordo com o relatório da Comissão Especial. Outras fontes falam de muitos mais instalações.

    Links de satélite foram previamente monitorados com pratos de 30 metros. Hoje são suficientes antenas com cinco metros de diâmetro.

    *************

    Data da reportagem: 02/06/2001. 40% dos recursos de inteligência desviados para espionagem industrial. E dali a alguns meses o ataque às torres gêmeas. Estavam muito preocupados com a última licitação internacional.

    Agora, relembrando alguns acontecimentos dos últimos anos:

    02/2008 – Descoberto container com laptops e outras mídias com dados da Petrobrás no porto de Santos.

    09/2013 – Descobre-se que os americanos espionaram também líderes de países ‘amigos’. Inclusive Dilma.

    09/2013 – Com documentos de Edward Snowden, descobre-se mais espionagem da NSA contra a Petrobrás.

    2013/2014 – Estoura o ISIL no oriente médio.

    2014/2015 – Operação Lava Jato, tocada por um juiz filho de fundador do PSDB, com parte da formação em Harvard, e cursos promovidos pelo departamento de estado dos EUA.

    2015 – Ainda com base em documentos de Snowden, a confirmação do nome ECHELON, uma parte no sistema de espionagem global.

    40% de recursos para espionagem industrial devem ter ficado pra 2001. Se não perceberam o ISIL, imagino em que nível devem estar.

    É oficial. É um relatório do Parlamento Europeu.

    A história se repete…
     

     – Lembro de propaganda da FOCUS que por algum acordo serviu de modelo à ÉPOCA. Basicamente um dos editores em reunião, falando, ao final: “Fakten, fakten, fakten.”

     – Lembrando de que acordo com documentos de Snowden há uma estação Echelon em Brasília.

     – Alguns exemplos do que se faz com espionagem corporativa lá fora:

    http://www.therichest.com/rich-list/10-of-the-most-infamous-cases-of-industrial-espionage/?view=all

    1. Excelente matéria, Alex

      Desconfiava, mas não conhecia os detalhes. Como você diz, aqui se leva a tragédia na farra. Obrigado pela dica. Abraço

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