A PEC 451 viola o direito à saúde e promove a segmentação do SUS

Eduardo Cunha (PMDB-RJ) recebeu R$ 250 mil em doações do setor privado de saúde
 

Nota publicada por Brasil Debate 

A PEC 451 viola o direito à saúde e promove a segmentação do SUS

Do CEBES

O Sistema Único de Saúde vem sofrendo golpes sucessivos que desviam o sentido com que foi criado de prover acesso universal a serviços de saúde de qualidade. O golpe mais recente foi a reiteração e a constitucionalização do seu subfinanciamento com a EC 86, de 2015, que dispõe sobre o orçamento impositivo e estabelece como percentual de recursos da União vinculados à saúde, 15% das receitas correntes líquidas (em cinco anos), ao invés do equivalente a 1o% de suas receitas correntes brutas como proposto pelo projeto de lei de iniciativa popular.

A EC-86/15 asfixia o SUS não só pela diminuição dos recursos federais, mas também pela criação da emenda impositiva que tira da saúde o que era para ser transferido automaticamente para os orçamentos municipais e estaduais e dá aos parlamentares o poder de devolvê-los de acordo com interesses políticos particulares. O orçamento deveria garantir o atendimento às necessidades de saúde expressas em planos de saúde e aprovados nos conselhos, e não ser objeto de negociações eleitorais ou partidárias.

Além da EC 86/15, foi aprovada a Lei 13019, de 2014, que abriu a assistência à saúde ao capital estrangeiro, numa afronta à vedação constitucional inserta no art. 199, § 3º, que proíbe tal participação por ser antagônica à definição da saúde como direito público. Este artigo 142 da lei está sendo arguido de inconstitucionalidade pelas entidades de defesa do SUS universal e igualitário.

O que fica cada vez mais claro é que está em curso uma subversão do projeto constitucional para a saúde.

Agora, está em discussão no Congresso a PEC 451, de 2014, de autoria do deputado Eduardo Cunha, que altera o art. 7º da Constituição, inserindo novo inciso, o XXXV, o qual obriga todos os empregadores brasileiros a garantirem aos seus empregados serviços de assistência à saúde, excetuados os trabalhadores domésticos, afrontando todo o capítulo da seguridade social e a seção da saúde e seus dispositivos.

Como as Propostas de Emenda Constitucional têm que ser assinadas por 1/3 da Câmara dos Deputados, está ficando evidente que entre os parlamentares há muita gente interessada no desmonte do SUS.

Tal proposta de alteração da Constituição, do mesmo modo que a Lei 13019/14, gera uma antinomia jurídica, por romper com o princípio consagrado no art. 196 que estatui ser a saúde um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que reduzam o risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

A PEC 451 viola o direito à saúde, conquistado na Constituição, ao dizer ser direito fundamental do trabalhador a assistência médica e ao afirmar ser dever do empregador. Secciona o SUS que tem como diretriz constitucional a integralidade da atenção à saúde, ao fracionar a assistência à saúde, os seus usuários e o devedor da garantia do direito à saúde que deixa parcialmente de ser o Estado.

Por esse rumo, o Brasil está desmontando o SUS e fortalecendo o setor privado dos planos de saúde, de modo pior ainda do que nos tempos do INAMPS quando o trabalhador dispunha de seguro de saúde próprio que era gerido pelo Estado. Agora o mercado opera ainda mais livremente, consolidando o tratamento da saúde como uma mercadoria.

A quem interessa fragmentar os usuários do SUS, subfinanciar o sistema, abrir a assistência médica ao capital estrangeiro, tudo numa só tacada, sem diálogo com seus usuários, os movimentos populares de saúde, os estudiosos e os pesquisadores da Saúde Coletiva, os conselhos de saúde, os trabalhadores do SUS? Certamente não é quem usa o SUS, tampouco quem quer o seu sucesso.

A PEC 451 aponta para a ressuscitação de uma situação pior do que a do antigo INAMPS ao garantir que as seguradoras e operadoras privadas de planos de saúde tenham um mercado cativo garantido pela própria Constituição. A definição da saúde como direito de todos e dever do Estado é substituída pela determinação de que, para os trabalhadores do regime previdenciário público, o direito à saúde será garantido por plano privado de saúde, remunerado pelo empregador.

Esta página foi virada na década de 80. É inaceitável a mutilação do direito à saúde e a redução do SUS a um sistema complementar aos planos privados de saúde; um sistema pobre para pobre que aprofunda as nossas já persistentes e intoleráveis desigualdades sociais.

Se tal medida prevalecer, haverá um SUS definitivamente de baixa qualidade para os que não podem pagar pela saúde – os pobres, desempregados, aposentados, viúvas, órfãos – convivendo com o resto da população empregada com acesso a planos privados caros, de categorias diferenciadas conforme for o porte do seu empregador, cuja garantia de qualidade é uma incógnita frente à frágil regulação do setor. Garantia de desigualdade de atendimento permitido pela própria Constituição, ferindo o princípio da isonomia e o da igualdade no SUS.

O triângulo que está sendo construído do baixo financiamento, capital estrangeiro na assistência de planos de saúde e obrigatoriedade de todos os empregadores garantirem um plano de saúde para seus trabalhadores, visa a atacar o coração do SUS: sua sobrevivência econômica; a integralidade da assistência; o acesso universal e o crescimento do espaço para o capital privado, incluindo o estrangeiro, atuar no setor, fazendo dos serviços de saúde apenas um negócio lucrativo.

As entidades signatárias se manifestam contra todas as iniciativas que comprometem os preceitos Constitucionais que garantem o direito à saúde e o dever do Estado, e a consolidação do SUS: universal, igualitário e de qualidade.

Conclamam o povo brasileiro e todos os que hoje se mobilizam em torno da 15ª Conferencia Nacional de Saúde a debater e lutar pela manutenção do direito à saúde e do SUS, tal como definido pela Carta Magna e que foi resultado de grandes lutas, cujo ápice se deu na 8ª Conferência Nacional de Saúde.

Repudiamos veementemente todas as iniciativas que no Congresso Nacional atentam contra a democracia social, a dignidade das pessoas e os interesses populares em relação à saúde.

Entidades signatárias:
ABRASCO – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
ABrES – Associação Brasileira de Economia da Saúde
AMPASA – Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde
APSP – Associação Paulista de Saúde Pública
CEBES – Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
IDISA – Instituto de Direito Sanitário Aplicado
REDE UNIDA – Associação Brasileira Rede Unida
SBB – Sociedade Brasileira de Bioética

 

Redação

8 Comentários

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  1. Rematada estupidez que a

    Rematada estupidez que a bancada da saúde, dos evangélicos, da bala e do agronegócio estão se esforçando para aprovar. Se isso acontecer, duvido que no futuro seja revertido. Triste país, que caminha para ser um país onde as seitas vão predominar, enquanto fica-se discutindo as propinas da Petrobrás, que também tem muita gente boa querendo botar pra quebrar.

  2. Da série perguntar não ofende

    Isto não vai aumentar o temido custo Brasil? Que, de tão penoso para os pobres empresários carentes, parlamentares e jornalistas caridosos volta e meia sugerem retirar “penduricalhos” da legislação,  como direito à férias,  13ro., licença maternidades e outras superfluidades que, eliminadas, garantiriam a competitividade da laboriosa clase empresarial nacional. Pena que os comunistas usuais, com seu bolivirianismo rubro põe obstáculos aos verdadeiros patriotas.  Como se espera que vá se opor a esta ingênua pec.

  3. A ratazana que virou
    A ratazana que virou primeiro-ministro indicado pelo Congresso nesse parlamentarismo parido de ultima hora pela Globo continua nadando de braçada no sentido de destruir feito traça esse pais. Precisamos interromper o avanço destes bandidos salafrarios. Não pofemos permitir que avancos conquistados com muita luta sejam interrompidos pelo crime organizado que hoje domina um Congresso que achou por bem e ao bel prazer dos bilionários Irmaos Marinho que pelo que temos presenciado mandam nas Instituições…que sentido teve termos eleito uma Assembleia Nacional Constituinte para que fosse redigida e promulgada a Constituição Cidadã que agora vemos ser rasgada pelo crime organizado representado no Congresso Nacional com poderes constituinte e de primeiros ministro…

  4. Colocamos (mais) um bandido no Congresso

    e estamos esperando que ele haja como santo? Já basta o Youssef e o Costa… O Cunha é o mais explicito dos picaretas que frequentam brasilia, ele chega a ser cristalino nos seus interesses, afinal de contas, não é todo mundo que tem amigos como PC Farias e Abadia e defende o dia do orgulho hetero com tanto orgulho.

  5. Pelo visto, é serviço

    Pelo visto, é serviço completo. Como resultado da Lava Jato, as empresas nacionais saem do setor da construção civil , abrindo espaço para estrangeiras. Muda-se o regime de exploração do pré-sal, caindo tb o conteúdo nacional.

    Em outro front o SUS  é atacado, criando-se mecanismos para privatização da saúde,  sem esquecer dos estrangeiros nessa área. 

    Enfim, desmonte total do jeito que o diabo gosta. E com um Congresso muito “sensível” aos apelos do mercado, pricipalmente o externo.  Tudo simplificado, rápido, sem as demoradas discussões de acordos comerciais.

    Nesse quadro que vai se descortinando, difícil não lembrar dos alertas do Nassif quanto às maquininhas de votação. A imaginação vai longe, embora sem entender um “complicador” de última hora.

  6. QUEM VIVEU QUANDO NÃO EXISTIA O SUS NÃO VIVEU O CAOS

    É IMPOSSÍVE PARA A MAIORIA DAS BRASILEIRAS E BRASILEIROS  UM CENÁRIO EM QUE SE TORNASSE REALIDADE ESSAS MEDIDAS EM QUE O SUS DEIXARIA DE EXISTIR. O BRASIL SOFRERIA UM DOS SEUS MAIORES RETROCESSOS NO ÂMBITO DE  POLÍTICAS PÚBLICAS !!!

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