O Golpe, os fundos de investimento e a falência do capitalismo

Por Romulus

Comentei em post da segunda-feira o sonho erótico de Paulo Leme, do Goldman Sachs:

A perspectiva de privatização selvagem de ativos nacionais subavaliados e de desnacionalização de setores estratégicos como a engenharia e o etanol brasileiros.

No mesmo dia assisti a uma reportagem muito oportuna no Jounal de 20h da France 2. Ela trata da divulgação de um estudo, conduzido por pesquisadores da prestigiosa Science Po, que analisa a remuneração recorde paga aos administradores dos fundos de investimento de Wall Street.

208 anos

O estudo revela, por exemplo, que o CEO mais bem pago da França, o brasileiro Carlos Ghosn, CEO da Renault, teria de trabalhar 208 anos (!) para igualar o que ganha o administrador de fundos mais bem pago de Wall Street – 1.5 bilhão de euros em apenas um ano!

Como observa o pesquisador sênior do estudo, essa distorção representa em certa medida a falência do capitalismo. Isso porque é o dinheiro “gerado” em cima do dinheiro, em operações de pura especulação que nada produzem.

Ninguém ignora o papel relevante do setor financeiro para o capitalismo, promovendo a reciclagem da poupança. No entanto, o seu inchaço atual – e dos seus ganhos –  é claramente uma distorção deletéria. O que é mais grave, esse inchaço não é conjuntural, mas sim estrutural. Vem crescendo desde a Reaganomics e do Thatcherismo, de mãos dadas com o aumento da concentração de renda e a captura do Estado pelo 1%.

O site do telejornal francês traz o seguinte resumo da reportagem:

Eles estão à frente dos fundos de investimento, os fundos que gerem centenas de bilhões de dólares depositados por investidores de todos os tipos. Seus ganhos são impressionantes. Em 2015, Jim Simons, chefe da Renaissance Technologies, estava no topo do pódio, com 1.5 bilhão de euros de receita. O mesmo que Ken Griffin, CEO da Citadel.

170.000 euros por hora

1.5 bilhão significa quatro milhões por dia, ou 170.000 euros por hora. Este salto dos administradores dos fundos os coloca bem à frente dos CEOs de empresas tradicionais. Carlos Ghosn, chefe da Renault, cuja remuneração causou polêmica, teria que trabalhar 208 anos para atingir o mesmo.

* * *

Queremos essa turma assumindo ativos relevantes da Petrobras, a engenharia e o etanol nacionais e o que mais puderem vender na xepa pré-programada do golpe?

Os abutres estão afoitos…

A esse propósito:

* * *

Abutrômetro” apita: abutres sentem cheiro de sangue no golpe

(Post de 6//6/2016)

O amigo Ciro d’Araújo chama a minha atenção para uma entrevista publicada na segunda-feira no Estadão. O jornalão foi ouvir o que Paulo “Lulômetro” Leme (lembram?), do Goldman Sachs, tinha a dizer sobre a crise brasileira e o momento atual.

Já escrevi no passado sobre a desfaçatez da classe política brasileira e do PMDB em particular. Ainda em março constatei que as instituições brasileiras “não contavam com o cinismo do PMDB”. Mas a desfaçatez agora é outra, não menos escandalosa. Aliás, as duas andam de mão dadas – dadas não… dadíssimas!

Trata-se da desfaçatez dos abutres diante da carne fresca que lhes oferece o PMDB do golpe. Mostram-se prontos a hipotecar o seu (volúvel) apoio, desde que a carne suculenta não tarde. Não aceitam esperar sequer o tempo político que a prudência e a malícia recomendariam, com vistas a consolidar o golpe.

Não…

O subtexto da entrevista de Paulo Leme ao Estadão – mais importante que o próprio texto – é o seguinte, para quem tem ao menos dois neurônios e acompanha o noticiário político:

– Nós, abutres, já estamos sentindo novamente o cheiro de sangue. Mas dessa vez o sangue é de vocês, golpistas! Deem-nos agora – e não depois – o esperado. Pois pode ser que não haja “depois”…

Não falei ainda na semana passada que abutre não tem amigo?

Olha aí!

Abutre come cordeirinho, mas também devora cobra criada.

Eta, bicho oportunista…

Ver a claridade da lesa, sem precedentes, ao Estado e ao seu patrimônio; ao povo e aos seus direitos econômicos e sociais; e ao país, em seu projeto de futuro, causa exasperação.

E o que resta a quem ainda se importa com o Brasil – e com os brasileiros que nele residem e não em NY?

Bem… resta rezar para que:

(i) o revés do golpe na sociedade e na classe política continue à toda. Nisso podemos contar com a incompetência de Temer e dos seus co-conspiradores;

(ii) esse revés crie o ânimo necessário para as ilhas de decência no Senado, no STF e na PGR oporem-se à consolidação do golpe; e

(iii) a Presidente Dilma, o seu staff, Lula e o PT entendam a gravidade do momento para o projeto nacional do Brasil e coloquem-se à altura. Que deem tudo de si para derrubar o golpe e frustrar seus patrocinadores, em benefício do Estado, do povo e do projeto de país.

* * *

Trechos da entrevista de Paulo Leme ao Estadão:

PL: Vamos dividir o setor privado que está com complicações em dois grandes blocos. Um inclui empresas ligadas à Lava Jato – empreiteiras, construtoras – e empresas de açúcar e álcool, que vinham com problemas. O outro inclui empresas de setores que foram afetados pela profunda recessão. O bloco da Lava Jato tem comprador, mas algumas operações se dissipam quando passam pelo compliance (avaliação mais rigorosa dos ativos). A complexidade da legislação e o tempo gasto com temas jurídicos interferem. É preciso aperfeiçoar a questão jurídica. As empresas precisam pagar o que devem, ser punidas, mas num prazo mais rápido. É preciso agilizar a tramitação do acordo de leniência.

(…)

Há compradores para essas empresas, mas quando eles se debruçam sobre a empresa e sobre a lei identificam vários riscos. Quem adquirir pode ficar com uma herança aí.

(…)

Os bancos estão com uma exposição muito grande ao setor privado. É muito difícil que haja uma fonte de financiamento privado via crédito dos bancos. O financiamento precisa ser externo. E há interesse muito grande do investidor estrangeiro.

(…)

ESP: E como o sr. viu a largada, que em duas semanas incluiu a queda de dois ministros?

PL: A largada foi complicada. Parecia um grande prêmio da Austrália, em que alguns pilotos já sobram. Mas, numa primeira etapa, vimos em que direção geral o governo Temer quer ir em termos de tamanho do Estado, de ajuste e de crescimento. Foi bem recebido. Na segunda parte, a de liderança, fez excelentes escolhas: profissionais com experiências, vivências nos setores em que vão atuar. Mas o tempo é curto. O capital inicial de boa vontade se evapora facilmente. É fundamental passar para a terceira fase, a de formulação mais ampla. Não basta dar uma medida pontual. A consolidação da credibilidade – um dos insumos para gerar expectativas positivas e crescimento – depende de previsibilidade. O empresário não investe sem isso. A fixação do teto de gastos é uma excelente medida, mas não me diz muito sem informações como onde estamos, qual o tamanho do problema, qual a velocidade em que vou avançar, para onde quero reduzir a dívida pública e, o mais importante de tudo, quem vai pagar a conta? Estão dizendo, mas de forma muito velada. Precisam deixar mais claro ainda. Não dá para tentar proteger a sociedade. (…) Aí, será preciso passar para a quarta etapa, a da implementação. Só depois vai ser possível destravar o processo decisório dos investidores.

(…)

A dívida bruta está perto de 70%, deve ir a 80%, mas eu quero baixar para 55% em cinco anos. O governo precisa de receitas extraordinárias nessa transição, vai fazer um programa de privatização, de concessões. Mas quais são as empresas?

(…)

ESP: Tem um prazo para o governo apresentar esse diagnóstico? Um mês?

Precisa ser rápido. Não temos meses. Estamos falando de semanas e já se passaram três semanas.

ESP: O governo parece acreditar que já fez o diagnóstico. Projetou um rombo, lançou medidas. Mas o sr. está dizendo que são insuficientes.

PL: Sim. Muito. Sei que é colocar pressão, mas é uma pressão saudável. Na coletiva de Temer (quando empossou os presidentes de estatais na semana passada), ele abordou de maneira elegante, suave, que os desafios são grandes. Ora, eu já sei disso. Precisa ser mais claro. (…) E o governo precisa de capital estrangeiro. A boa notícia é que ele está interessado, mas precisa saber qual o programa para dimensionar os riscos e os retornos.

* * *

Precisa explicar mais?

É de cair o queixo…

Como disse em “Parente é Serpente: golpe ataca Petrobras e Pré-sal (2):

Abutre come a tudo e a todos. Até mesmo serpentes – e parentes!

Veneno para o abutre é só um temperinho para deixar a carne picante.

Abutre não tem amigo.

Quando sente cheiro de carniça…

Redação

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