2022 será o ano da virada?, por Carmem Feijó e Fernanda Feil

Quais pontos positivos para retomada no futuro próximo? Certamente o avanço da imunização da população contra a Covid-19 permite que as atividades voltem a funcionar normalmente.

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Democracia e Economia – Finde

2022 será o ano da virada?

por Carmem Feijó e Fernanda Feil

A economia brasileira tem incorrido em baixas taxas de crescimento, por vezes com crescimento negativo, desde o fatídico 2015 – ano da virada neoliberal e ameaça de golpe de Estado. Desde então, não só o país não conseguiu recuperar sua trajetória de crescimento, como o discurso – e as políticas econômicas – apontaram na direção de avançar reformas neoliberais. Muitas dessas acabaram sendo aprovadas – em especial a trabalhista e a da previdência. Seriam reformas que fariam com que o crescimento viesse de forma sustentável. Não veio.

Em 2021 a economia brasileira recuperou o nível do PIB pré-pandemia, porém não recuperou o nível pré crise de 2015-2016. Para o ano que se inicia, os prognósticos são de crescimento em torno de 0,36%, de acordo com o Boletim Focus – Relatório de Mercado de fim de dezembro. Esta projeção sinaliza uma economia em recessão.

A face mais dramática do quadro de baixo crescimento por tempo prolongado é a deterioração do mercado de trabalho onde se registram elevados índices de desemprego e informalidade. Desde 2016, a taxa de desemprego situa-se acima de 10%, e , segundo o IBGE, no terceiro trimestre de 2021, 40,7% da população empregada estava na informalidade, percentual que vem aumentando desde 2020 (38,4% registrado no terceiro trimestre de 2020).

Quais pontos positivos para retomada no futuro próximo? Certamente o avanço da imunização da população contra a Covid-19 permite que as atividades voltem a funcionar normalmente. Porém, há muitas fragilidades para uma retomada. A inflação em alta deprime o poder de compra das famílias, que por sua vez estão com níveis elevados de envidamento – 59,9% em agosto de 2021, segundo o Banco Central do Brasil. Para piorar o comprometimento da renda familiar, o endividamento está concentrado em dívidas de curto prazo com elevadas taxas de juros, como cartão de crédito. Assim, apesar da demanda reprimida pela pandemia, o consumo das famílias, segundo as contas nacionais trimestrais, reage devagar.

Quanto à alta dos preços, a política monetária sob o regime de metas de inflação é pouco instrumentalizada para combater inflação de custo. As pressões de preço pela alta das commodities e dos combustíveis, agravada pela crise hídrica, demandam o uso de outros instrumentos para além da elevação da taxa básica de juros, que ademais impacta negativamente a retomada do ritmo de atividade econômica.

A recuperação dos investimentos produtivos, que poderiam ter no investimento público um importante indutor do investimento privado, encontra como limitador a política fiscal, engessada pelo teto dos gastos públicos. O Observatório de Política Fiscal do IBRE aponta que o recuo dos investimentos públicos a nível federal não cobre nem mesmo a depreciação do estoque de capital pré-existente desde 2015. Por fim, a retomada do crescimento pelo setor externo tem pequeno poder dinamizador atualmente, considerando a especialização de nossa pauta exportadora em commodities.

Mas nem tudo está perdido. 2022 pode ser o ano da virada. As eleições abrem espaço para discussões acerca de qual país queremos. A construção de uma frente ampla – não apenas com aliados políticos de longa data, mas também os da oposição com compromisso com a democracia – deveria ser o foco dos debates com a sociedade. Avaliamos que o Brasil está em uma encruzilhada. A economia está na UTI, o país perdeu credibilidade externa, as expectativas dos agentes econômicos estão deterioradas, a sociedade está anestesiada e a devastação ambiental atinge níveis do começo desse século.

Uma frente ampla democrática deveria, acima de tudo, pensar em como o Brasil irá se recuperar dos oito anos de políticas econômicas neoliberais. Sugerimos, um debate sobre uma nova convenção de política econômica, distinta da agenda liberal perseguida desde 2015. Esta nova convenção deveria ampliar o espaço para a implementação de políticas de desenvolvimento com foco em recuperar o mercado de trabalho, reduzir a pobreza, aumentar o investimento em infraestrutura física e humana e trabalhar na agenda da transição verde. Ou seja, uma convenção desenvolvimentista, construída a partir de uma frente ampla democrática, implica gerar um estado de confiança para guiar expectativas percebidas como criadoras de oportunidades para o investimento privado produtivo em contraposição a ganhos de curto prazo que alimentam o rentismo. Ademais, a crise climática, amplamente debatida nos fóruns internacionais, implica, necessariamente, na mudança da forma como produzimos e consumimos. Se, por um lado, isso pode representar um grande desafio, por outro é uma grande oportunidade para uma agenda desenvolvimentista com vistas à implementação de um projeto reconstrução do país para garantir o crescimento inclusivo e ambientalmente sustentável.

Vale mencionar, por fim, que o avanço do debate internacional mostra que duas crises de vulto – a grande recessão de 2008 e a crise da pandemia desafiaram a capacidade dos mercados auto-regulados retornarem a uma posição de equilíbrio ´natural´. O antigo dogma do consenso macroeconômico, baseado no predomínio da política monetária sobre as demais políticas e uma agenda de reformas liberais, vem sendo substituído por discussões sobre a importância de políticas industriais e dos investimentos públicos para sustentar o crescimento da produtividade e agora com o foco também na crise climática. Precisamos redescobrir nossa capacidade de crescer e nos conectar ao debate internacional urgentemente, para evitarmos mais uma década perdida.

Carmem Feijó – coordenadora do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento – Finde – e professora titular da UFF

Fernanda Feil – pesquisadora do Finde e do pós doutorado da UFF

Finde – O grupo de pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores da UFF e de outras instituições, interessados em discutir questões acadêmicas relacionadas ao avanço do processo de financeirização e seus impactos sobre o desenvolvimento socioeconômico das economias modernas. (FINDE | Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento do PPGE/UFF)

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

1 Comentário

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  1. Sim. 22 será ano da virada.Lula e Geraldo eleitos e avião cai com Lula num “acidente”. E defensores dessa chapa vão se espantar com capacidade de noss a “elite” em dar golpes. E nós vamos continuar BA lama por nais algumas gerações. Simples assim.

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