#FiqueEmCasa: Monitorando as tendências de isolamento social em Pernambuco e na Região Metropolitana do Recife (RMR)

O objetivo principal desta nota é apresentar as tendências de isolamento social para o estado de Pernambuco e para a Região Metropolitana do Recife (RMR).

#FiqueEmCasa: Monitorando as tendências de isolamento social em Pernambuco e na Região Metropolitana do Recife (RMR)

por:

[1]Patricia Takako Endo (UPE)

[2]Ivanovitch Silva (UFRN)

[3]Luciana Lima (UFRN)

[4]Leonardo Bezerra (UFRN)

[5]Rafael Gomes (UFRN)

[6]Marcel Ribeiro-Dantas (Institut Curie)

[7]Gisliany Alves (UFRN)

[8]Iago Richard Rodrigues (UFPE)

[9]Maicon Herverton Lino Ferreira da Silva Barros (UPE)

Introdução

O objetivo principal desta nota é apresentar as tendências de isolamento social para o estado de Pernambuco e para a Região Metropolitana do Recife (RMR). Em 12 de março foram registrados os dois primeiros casos do novo coronavírus em Pernambuco. Conforme é possível verificar pela Figura 1, desde então o número de casos acumulados da doença para cada grupo de 100 mil habitantes (coeficiente de incidência) naquele estado cresce de maneira consistente e destacada na Região Nordeste. Até o dia 25/04, o Ceará encontrava-se na dianteira do número de casos do novo coronavírus na Região Nordeste, reunindo 33% de todos os casos por COVID-19 e 31% dos 1002 óbitos já registrados para aquela localidade.

Figura 1. Número de casos acumulados do COVID-19 por 100 mil habitantes – Região Nordeste

No caso específico de Pernambuco, de acordo com o boletim da Secretaria Estadual de Saúde (SES-PE) [1], o total de leitos SRAG (leitos ocupados por pacientes acometidos com Síndrome Respiratória Aguda Grave) no Estado de Pernambuco, em 24 de abril, era de 709 (sendo 330 leitos de UTI e 379 leitos de enfermaria), com 90% de taxa de ocupação. Estavam disponíveis 2500 testes laboratoriais por semana, disponibilizados pelo LACEN, Fiocruz e Genomika.

Diante do quadro atual da pandemia pelo novo coronavírus no estado pernambucano e do cenário futuro que se avizinha e inspira atenção das autoridades públicas, essa nota analisa uma importante medida para conter o avanço da doença no estado: o isolamento social. Conforme experiências de países que se encontram em estágios mais avançados da pandemia, a prática de isolamento social contribui para o achatamento da curva epidemiológica e a diluição do número de casos no tempo, preservando o sistema de saúde de um colapso [2, 3].

Dados

As fontes de informação de isolamento social utilizadas nesta nota são duas: (a) dados de mobilidade da Google para o Brasil [4] e unidades da federação, e (b) dados de mobilidade da startup In Loco para municípios [5]. A Google tem divulgado relatórios sobre locais visitados e capturados por dispositivos móveis para o Brasil e outras 130 localidades do mundo, que permite obter informações diárias de mobilidade categorizadas em seis grupos de locais visitados: compras e recreação, supermercados e farmácias, áreas de lazer, estações de trânsito, locais de trabalho e residências dos usuários. As análises incluídas nesta nota utilizaram percentuais de variação de cada dia entre 15 de fevereiro e 17 de abril com relação à linha base definida pela Google (3 de janeiro a 6 de fevereiro de 2020), um período em que não havia no Brasil decreto restringindo a circulação das pessoas. No caso das informações municipais para o estado de Pernambuco, foram utilizados dados da In Loco, uma startup de tecnologia que tem acompanhado a movimentação de cerca de 60 milhões de brasileiros por meio de localização de celulares. Segundo informações dessa empresa, os dados são provenientes de aplicativos parceiros instalados voluntariamente pelos usuários, que podem ou não permitir o envio de suas informações. Os dados são diários e nesta nota abrangem o período de 01 de março a 14 de abril.

Mobilidade no Estado de Pernambuco com base nos dados da Google

A Figura 2 apresenta o percentual de variação diária na mobilidade em Pernambuco de 15 de fevereiro a 17 de abril para categorias de atividades disponibilizadas pela Google.

Figura 2. Tendência da mobilidade – Pernambuco

Fonte dos dados básicos: COVID-19 Community Mobility Reports, Google [8].

O Decreto Estadual Nº 48.809/20 de 14 de março de 2020 regulamentou medidas temporárias para enfrentamento da emergência de saúde pública do Estado de Pernambuco, dentre elas o isolamento e a quarentena [6], dois dias após a confirmação dos dois primeiros casos de COVID-19 no Estado. Neste decreto, ficou determinada a suspensão do funcionamento das escolas, universidades e demais estabelecimentos de ensino, público ou privados, a partir do dia 18 de março de 2020, além da suspensão de outros serviços, como o desembarque e a circulação da tripulação dos navios de carga, as operações de pouso e decolagem de aeronaves no Aeroporto do Distrito Estadual de Fernando de Noronha, as atividades de todas as academias de ginástica e similares bem como cinemas, entre outros. Como pode-se verificar na Figura 3, após a publicação deste decreto, a curva de atividades em residências foi crescente e em contrapartida, a curva de atividades em locais públicos foi decrescente. Em poucos dias, alcançou-se 20% de aumento com relação à linha base de atividade residencial, significando uma boa resposta inicial da população aos decretos e recomendações de restrição na mobilidade.

Posteriormente, considerando a necessidade de intensificar as medidas de enfrentamento ao COVID-19 e entendendo que as medidas similares estavam se mostrado eficazes, o funcionamento de todos os shopping centers e similares localizados no Estado de Pernambuco foram suspensos a partir do dia 21 de março de 2020 (Decreto Estadual Nº 48.832/20) [7]. Possivelmente, isso impactou ainda mais a tendência demonstrada pela curva da categoria “compras”, atingindo aproximadamente uma queda de 70% em relação à linha base, a partir do dia 23 de março.

O Decreto Nº 48.903/20, de 06 de abril, alterou o Decreto 48.832/20 para vedar o acesso às praias e ao calçadão das avenidas situadas nas faixas de beira-mar e beira-rio, além dos parques no estado de Pernambuco, incluindo a suspensão de atividades como caminhada e corridas na ciclofaixa e adjacentes. Porém, não é perceptível nenhuma grande alteração no gráfico (atividade de parques). No dia 15 de abril, foi decretado estado de calamidade pública para todo o estado de Pernambuco (Decreto do Executivo n° 48.943) [7].

Isolamento social nos municípios de Pernambuco

Como apresentado na Figura 3, a doença tem avançado pelo interior do Estado, demandando atenção redobrada das prefeituras para que se cumpram os decretos de restrição de mobilidade. Uma vez que os dados da Google são disponibilizados apenas em nível estadual, foram utilizadas informações da In Loco para realizar análises sobre a adesão ao isolamento nos municípios de Pernambuco.

Figura 3. Distribuição espacial dos casos confirmados de COVID-19, segundo município de residência do paciente

Fonte de dados: Boletim COVID-19 da SES-PE [1].

A Figura 4 mostra a evolução do Índice de Isolamento Social da In Loco para oito municípios do estado: Abreu e Lima, Cabo de Santo Agostinho, Goiana, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista e Recife. As informações são diárias e se referem ao período de 01 de março a 14 de abril.

Figura 4. Evolução do índice de isolamento social de oito municípios de Pernambuco referente ao período de 01 de março a 14 de abril

Fonte dos dados básicos: In Loco [5].

Conforme é possível verificar para todo o período, a capital Recife se manteve durante boa parte do período como um dos municípios com menor nível de isolamento social, junto com os municípios de Ipojuca e Goiana. Entre os municípios com maior nível de pessoas que permaneceram em suas casas, figuram Olinda e Paulista. Importante destacar que em municípios de maior porte, como Recife, é natural que antes do isolamento social o percentual de pessoas que não saíram de casa seja pequeno, em função da complexidade econômica e social inerentes aos grandes centros urbanos que induzem uma maior circulação de pessoas. Mais adiante, será analisada a situação de Recife e outros municípios da Região Metropolitana para uma análise mais particularizada.

A Figura 5 apresenta os Índices de Isolamento Social da In Loco alcançados pelos 15 municípios da Região Metropolitana do Recife (RMR), a saber: Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista, Igarassu, Abreu e Lima, Camaragibe, Cabo de Santo Agostinho, Goiana, São Lourenço da Mata, Araçoiaba, Ilha de Itamaracá, Ipojuca, Moreno, Itapissuma e Recife (capital).

Figura 5. Percentuais de isolamento social dos 15 municípios da RMR de acordo com o Índice de Isolamento Social da In Loco

Fonte dos dados básicos: In Loco [5].

Os valores se encontram ordenados do maior para o menor valor médio alcançado em cada período: de 01 a 13 de março, que corresponde a um dia posterior ao decreto estadual Nº 48.809/20 que regulamenta medidas temporárias para enfrentamento do COVID-19 no Estado; de 14 a 29 de março, que corresponde aos primeiros quinze dias após a entrada em vigor deste decreto, e o período de 30 de março a 14 de abril, que se refere às datas disponíveis mais recentes.

As cidades como Ilha de Itamaracá, Olinda, Paulista, Camaragibe e Recife subiram no ranking comparativo do Índice de Isolamento Social da In Loco entre as cidades da RMR, no período de 01 a 13 de março. Enquanto cidades como Abreu e Lima, Itapissuma e Araçoiaba perderam posições no ranking comparativo do Índice de Isolamento Social. As demais cidades analisadas apresentaram certa estabilidade no ranking.

Apesar das variações entre municípios, todas as cidades analisadas apresentaram um aumento no Índice de Isolamento Social da In Loco, destacando-se a cidade da Ilha de Itamaracá, com 63,62% ao final do período avaliativo. Já a cidade de Araçoiaba saiu do 11º lugar e foi para o último no ranking comparativo entre as cidades da RMR, com um índice final de 51,57%, aproximadamente 12 pontos percentuais a menos que o percentual alcançado pela Ilha de Itamaracá. De modo geral, é observado um aumento no Índice de Isolamento Social da In Loco em todas as cidades da RMR a partir do dia 14 de março, dia em que o decreto do Estado de Pernambuco entrou em vigor.

A cidade do Recife apresentou um aumento significativo no Índice de Isolamento Social da In Loco. No dia 01 de março, a Capital pernambucana possuía um índice correspondente a 25,28% de pessoas que permaneceram em suas casas, sendo considerado o pior dentre as cidades da RMR. No dia 14 de março, o índice praticamente dobrou, chegando a 50,76%, e por fim alcançou a marca de 55,27%, um valor ainda distante do ideal de 70%, e aproximadamente 7 pontos percentuais menor que o apresentado para a Ilha de Itamaracá.

A Figura 6 apresenta um panorama regional do estado de Pernambuco quanto ao Índice de Isolamento Social da In Loco. As regiões mais claras nos mapas indicam maior adesão ao isolamento social, e nessa perspectiva, percebe-se que do dia 01 de março até o dia antecedente ao decreto estadual do dia 14 de março, a média do indicador era 0,301; aumentando para 0,519 no segundo período analisado (de 14 de março a 29 de março); e conseguindo chegar a 0,533 no último período (de 30 de março a 14 de abril). A média de todo o período analisado foi 0,461.

Pode-se dizer, portanto, que na média do Estado, após o decreto houve aumento do índice de pessoas que permaneceram em suas casas, ao menos considerando o período em análise. Todavia, essa adesão não ocorreu de maneira uniforme ao nível intraestadual, o que sinaliza medidas particularizadas para que a adesão ao isolamento social atinja um nível mais satisfatório.

Figura 6. Percentuais de isolamento social dos 15 municípios da RMR.

Obs: Importante notar que há um ponto branco no gráfico, que é referente a cidade de Limoeiro. Isso deve-se ao fato da In Loco não possuir dados sobre esta cidade.

Considerações finais

Sobretudo em um cenário como o do Recife que apresenta um número bastante elevado de casos de COVID-19, a análise das tendências de circulação das pessoas em pouco mais de 40 dias de vigor dos decretos de isolamento social é de suma importância para repensar as políticas adotadas até o presente momento e planejar o cenário de curto e médio prazo de enfrentamento da pandemia.

Esta nota utilizou informações de duas diferentes fontes de dados para os níveis estadual e municipal. No geral, o Estado de Pernambuco tem se mostrado aderente aos decretos de restrições de mobilidade, porém ressalta-se uma leve tendência de crescimento de atividades não-residenciais (Figura 2) a partir do dia 13 de abril considerando os dados da Google. Especificamente sobre a RMR, constatou-se que na média, Recife apresenta o Índice de Isolamento Social da In Loco de 55,27%, sendo a 11ª cidade no ranking da RMR; a Ilha de Itamaracá apareceu em primeiro lugar, com 63,63% e Araçoiaba em último, com 51,57%.

No Brasil e no mundo, vários governos estão anunciando (ou pensando na possibilidade de aprovar) medidas de reabertura de alguns de seus serviços considerados não essenciais, e portanto considera-se as fontes de informações utilizadas nesta nota de grande auxílio às autoridades públicas. Cumpre destacar as limitações inerentes aos dados (que são constituídos basicamente por registros capturados por meio de dispositivos móveis), como a cobertura da população total. Dessa forma, pode-se considerar a atualização das informações em menor espaço de tempo, e o nível de desagregação das informações para revelar importantes heterogeneidades, sobretudo, nas escalas intramunicipais. Nesse sentido, recomenda-se que as análises destas informações sejam realizadas em conjunto com outras fontes de dados, tais como, índices de mortalidade e contágio, características socioeconômicas e demográficas dos locais com menor ou maior nível de adesão ao isolamento social.

Referências

[1] Secretaria de Saúde de Pernambuco, “Boletim Covid-19 – Comunicação SES-PE”, Secretaria de Saúde de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil, Rep. no. 25/04/2020., Abr. 25, 2020. [Online]. Disponível: https://bit.ly/3aDYSKO Abr. 25, 2020).

[2] Ashleigh R. Tuite, Victoria Ng, Erin Rees, and David Fisman. “Estimation of COVID-19 outbreak size in Italy.” The Lancet infectious diseases (2020).

[3] Darlan Da S. Candido, Alexander Watts, Leandro Abade, Moritz UG Kraemer, Oliver G. Pybus, Julio Croda, Wanderson Oliveira, Kamran Khan, Ester C. Sabino, and Nuno R. Faria. “Routes for COVID-19 importation in Brazil.” Journal of Travel Medicine (2020).

[4] Google. “Google Community Mobility Reports”, COVID-19 Community Mobility Reports. https://www.google.com/covid19/mobility (Abr. 25, 2020).

[5] In Loco. “Cientistas de dados na luta contra a COVID-19”, Cientistas de dados na luta contra a COVID-19. https://content.inloco.com.br/blog/cientistas-de-dados-na-luta-contra-a-covid-19 (Abr. 25, 2020).

[6] Alepe Legis. Legislação do Estado de Pernambuco. Decreto (2020, mar. 14). 48.809, Decreto No. 48.809 de 14 de março de 2020. [Online]. Disponível: https://legis.alepe.pe.gov.br/texto.aspx?id=49417&tipo= Abr. 25, 2020).

[7] Alepe Legis, “Alepe Legis – Portal de Legislação do Estado de Pernambuco”, Covid-19. https://legis.alepe.pe.gov.br/covid-19.aspx (Abr. 25, 2020).

 

[1] Professora adjunta da Universidade de Pernambuco (UPE) e membro permanente do Programa de Pós-Graduação em Engenharia da Computação (PPGEC/UPE).

[2] Professor adjunto do Instituto Metrópole Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (IMD/UFRN) e vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica e de Computação (PPgEEC/UFRN).

[3] Professora adjunta do Departamento de Demografia e Ciências Atuariais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DDCA/UFRN) e vice-coordenadora do Programa de Pós-graduação em Demografia (PPgDEM/UFRN).

[4] Professor adjunto do Instituto Metrópole Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (IMD/UFRN) e membro do Programa de Pós-graduação em Tecnologia da Informação (PPgTI/UFRN).

[5] Professor adjunto do Departamento de Informática e Matemática Aplicada da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DIMAP/UFRN) e doutor em Engenharia Elétrica (UFRN).

[6] Pesquisador no Institut Curie (UMR168), Mestre em Bioinformática (UFRN) e doutorando na L’école doctorale informatique, télécommunications et électronique (EDITE) da Sorbonne Université (Paris).

[7] Graduada em Ciências e Tecnologia e em Engenharia de Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e mestre em Engenharia Elétrica e de Computação (UFRN).

[8] Doutorando em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e mestre em Engenharia da Computação pela Universidade de Pernambuco (PPGEC/UPE).

[9] Doutorando em Engenharia de Computação da Universidade de Pernambuco (PPGEC/UPE) e mestre em Informática Aplicada e Graduado em Sistemas de Informação pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

Redação

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