Medidas de contenção da propagação da covid-19 levam de 8 a 11 dias para terem efeito

Estratégias como quarentena e isolamento social funcionam, mas adoção rápida é crucial, mostra estudo. Medidas precoces foram bem-sucedidas na China e, principalmente, na Coreia do Sul

China isolou massiva e forçadamente toda a população, especialmente na província de Hubei; quem estava com suspeita de covid-19 ficou em lugares especialmente destinados; medidas devem ter provável impacto econômico, mas permitiram controlar a doença no país – Foto: CEphoto via Wikimedia Commons

do Jornal da USP

Medidas de contenção da propagação da covid-19 levam de 8 a 11 dias para terem efeito

Um estudo de pesquisadores brasileiros mostra que a adoção de medidas de contenção da transmissão da covid-19 são sim efetivas para frear a curva de crescimento de casos da doença, mas o sucesso depende do tempo levado para que sejam adotadas. Ao analisarem as estratégias adotadas por diversos países, eles puderam relacionar a eficiência das medidas ao quão precocemente foram tomadas e ao número de casos já detectados. A China, que investiu no isolamento em massa, e a Coreia do Sul, que realizou um grande número de testes para guiar o isolamento, conseguiram começar a “achatar” a curva em cerca de dez dias, enquanto a Itália e a Espanha, que levaram mais tempo para decretar quarentena em todo o território, ainda não apresentam resultados mais efetivos.

A pesquisa foi coordenada pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, com pesquisadores da USP, da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), da Secretaria de Estado da Saúde (SES) do Rio Janeiro, do Instituto D’Or de Ensino e Pesquisa e do Barcelona Institute for Global Health (ISGlobal), na Espanha, e gerou uma nota técnica que pode ser consultada aqui.

O estudo analisou as curvas dos países que tinham mais casos da doença para ver se as estratégias de confinamento e de quarentena tiveram efeito e em quanto tempo. “No caso da Itália e da Espanha, a análise foi feita por regiões, pois cada uma teve bloqueios diferentes, dando uma visão melhor de países mais heterogêneos, o que pode servir de exemplo para o Brasil”, diz Otávio Ranzani, pesquisador da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e do ISGlobal, um dos autores da nota técnica.

“O trabalho constatou que a quarentena tem efeito”, reitera o pesquisador. “No entanto, a velocidade do efeito depende de quando ela foi feita, tanto em termos de tempo quanto de quantidade de casos, porque se há um grande número não detectado, a doença segue se expandindo exponencialmente na comunidade.”

Coreia do Sul e China

O estudo mostra que são necessários de oito a 11 dias para as medidas de contenção surtirem efeito, e a estratégia foi bem-sucedida na China e principalmente na Coreia do Sul. “A Coreia testou muita gente, guiada também por geolocalização e focando em pessoas com maior mobilidade, como jovens, em vários postos de testagem fora dos hospitais. Quem apresentou positivo, contatos e os casos suspeitos foram isolados”, conta Ranzani. “Não houve proibição de movimentação, porém as escolas fecharam e houve uma forte sugestão para as pessoas colaborarem ficando em casa e realizando teletrabalho, podendo assim diminuir o impacto na economia.”

“A China, ao contrário, isolou massivamente e forçadamente toda a população, especialmente na província de Hubei. Quem estava com suspeita de covid-19 ficou em lugares especialmente destinados. Essas medidas devem ter um impacto econômico, mas permitiram controlar a doença”, relata o pesquisador. “Os estudos científicos que já saíram sobre a China apontam que o esquema de contenção começou a funcionar em 11 dias”.

Espanha e Itália

De acordo com o levantamento, Itália e Espanha adotaram medidas de contenção tardiamente em relação ao número de casos da doença. “Na Itália, a exceção é a região de Lodi, onde começou a epidemia no país e na qual já se nota um efeito, a curva está mudando de inclinação”, explica Ranzani.

Na Espanha, três comunidades autônomas adotaram a contenção antes, Madri, La Rioja e País Basco, porém o efeito das medidas, além do tempo, também é influenciado pelo número de casos, afirma. “As três regiões fecharam no mesmo dia do mês, porém La Rioja estava num ponto anterior na curva e tinha menos casos, mostrando que o efeito aconteceu mais cedo”, relata o pesquisador. “Madri já estava na fase de expansão exponencial ativa e o efeito ainda não estiou de forma significativa, a capital espanhola é grande, e em cidades com alta densidade demográfica a chance do vírus se disseminar mais é muito maior.”

 

Segundo Ranzani, a evolução da epidemia demonstra a importância de “aplanar” a curva do número de casos o quanto antes. “A transmissão da doença não será evitada totalmente, porém consegue-se diminuir a carga hospitalar do sistema de saúde, e isso é importantíssimo”, destaca.

“Pelo que se observou em outros países, tudo indica que a epidemia já está em grandes números para o Brasil, então é realmente aconselhável a adoção de medidas de contenção e quarentena agora ou o quanto antes possível”, recomenda o pesquisador. “Outra providência que seria necessária é a testagem de mais pessoas, mesmo de casos não graves, o que exige uma logística e investimento. É aconselhável que os testes sejam feitos fora dos hospitais porque ajuda na organização, desafoga os serviços de urgência e evita a contaminação de pessoas que não estão infectadas. Assim, podemos isolar também as pessoas que estão transmitindo, porém sem tantos sintomas. Essas são as principais medidas, além do reforço emergencial de todo o sistema de saúde.”

Mais informações: e-mail [email protected] e [email protected]

Redação

1 Comentário

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  1. No Brasil há subnotificação de casos e mortes devidos à epidemia. Receio que não consigamos obter números confiáveis, inclusive devido ao comportamento do (des)governo federal. O que fazer para combater a guerra de informação desencadeada pelo Bolsonaro?
    O jornalismo deveria obter informações sobre todos os óbitos, estratificadas por causa morte e verificar quais podem eventualmente ser decorrentes do coronavírus. Seria útil também observar discrepâncias em relação às séries históricas.

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