Urubus no Equador, epicentro do horror do coronavírus na América Latina

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Mais de 770 corpos foram retirados das calçadas e 630 de hospitais. Sem espaço em cemitério, corpos são incinerados pelas famílias. Urubus sobrevoam os céus

Com falta de caixão, funcionários retiram um cadáver da calçada de Hospital em Guayaquil, Equador – Foto: REUTERS, STRINGER

Jornal GGN – “Vejo urubus no céu de Guayaquil (Equador) e à tarde a fumaça dos corpos sendo queimados em um dos cemitérios da cidade. Agora, estou vivendo em um filme de terror, apocalíptico.”

A fala é de um brasileiro, ao G1, que vive há anos na cidade equatoriana Guayaquil, que apesar dos esforços do presidente Lenín Moreno em abafar a repercussão do coronavírus no país, paralisou o mundo, tornando-se o palco mais drástico até agora do Covid-19 na América Latina.

O GGN foi o primeiro veículo brasileiro a estampar as imagens (aqui) de denúncias que percorreram as redes sociais, no início deste mês, e que impactaram a região. O Equador é hoje o quarto país da América Latina com mais casos de coronavírus, com 8.225 confirmações, e o terceiro no ranking de mortes, com 403, em números oficiais distantes da realidade.

Fica atrás do Brasil (30.425 casos), do Peru (12.491), que alavancou bruscamente o número de infectados nos últimos dias, e do Chile (8.807). Entre as vítimas fatais, a maior concentração da região está no Brasil, com 1.924 mortos, seguido do México, com 449 falecidos.

Mas o país de somente 17 milhões de habitantes viu seus sistemas de saúde e funerário colapsados, com centenas de cadáveres contagiados nas ruas, sem lugar em hospitais ou em cemitérios. “Não há espaço nem para vivos, nem para mortos”, resumiu a prefeita de Guayaquil, Cynthia Viteri, em uma de suas manifestações. A prefeita chegou a lançar uma campanha em memória aos mortos que continuavam aguardando ser retirados de suas casas:

https://www.facebook.com/CynthiaViteriJimenez/videos/221362525632062/

Em meio à pressão da população, de governos locais e sob os olhos do mundo, ainda caíram dois ministros do governo de Lenín Moreno, a da Saúde e o do Trabalho, Catalina Andramuño e Andrés Madero, respectivamente. Nos últimos dias, a população narrava os impactos da devastadora crise sanitária também no abastecimento, gerando a falta de alimentos nas cidades, e obrigando ações emergenciais.

O impacto desta crise na popularidade do presidente do país o pressionou a anunciar a redução de seu próprio salário e do gabinete de governo, neste último domingo. No mesmo dia, Moreno anunciava a remoção de centenas de corpos das vítimas fatais do coronavírus, de suas casas em Guayaquil, aonde os familiares aguardavam por até uma semana para serem levadas.

Os números tratados por Lenín Moreno superam os 700 corpos retirados. Especificamente, 771 dentro de casas e 631 de hospitais. Com o colapso do sistema sanitário, o país perdeu as contas sobre quais destes cadáveres eram vítimas diretas do Covid-19. Sabe-se apenas que a província aonde está localizada a cidade de Guayaquil, Guayas, é o epicentro da pandemia no país, concentrando uma estimativa de 72% dos infectados no Equador.

Há relatos de famílias que não encontraram parentes que morreram em hospitais. E familiares tendo que incinerar os mortos pelo Covid-19 nas ruas de suas casas.

https://twitter.com/SilvieChavez/status/1245182164150505472

 

Os corpos nas ruas e casas provocaram outro fenômeno na cidade: urubus rodeando os céus de Guayalquil. As imagens que foram registradas por um brasileiro que vive no país e encaminhadas ao G1 também foram vistas e divulgadas pelos cidadãos nas redes sociais, conforme o GGN mostra abaixo:

https://twitter.com/Lenarest1975/status/1245572189216096261

Escancarando que os números oficiais não condizem com as cenas de guerra vividas no Equador, autoridades ainda esperam mais 3,5 mil mortes nas próximas semanas na província de Guayas.

Publicada originalmente em 16 de abril de 2020

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

3 Comentários

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  1. Número oficiais: nunca se mentiu tanto neste planeta. Inclusive por aqui.
    Aliás, o ex-ministreco sem-saúde discursou, discursou e discursou, mas, de prático nada fez em relação aos testes e outros encaminhamentos.
    País de merrecas é isto.

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