A esquerda corajosa e o eu coxinha, por Francy Lisboa

No samba contido no álbum Divino Luz do grupo Fundo de Quintal, “voto de confiança”, há um verso que diz assim: “…Pois nem toda cara manjada tem traça ou cupim…”. Não poderia ser mais preciso. De fato, nem toda madeira à esquerda e à direita tem traça ou cupim capaz de ter suas qualidades previamente alijadas em razão do desígnio ideológico.

É extremamente importante chegar ao meio termo entre essas duas vertentes, mas de forma segura, de modo a impedir que falsos profetas do bom senso vistam-se como novos senhores da razão quando não estão mais do que, como qualquer um, fazendo política. Aqui é veementemente recusado que o contínuo ciclo de mastigação e assopro, seja feito por qualquer ator político, é condição precípua para caracterizar o estar acima das briguinhas partidárias.

Pode-se, e pode-se mesmo, concordar com argumentos de Sardenberg, Mirian et caverna, e ao mesmo tempo manter-se distantes das estripulias de quem coloca as nádegas de fora para combater a ditadura comunista instalada no Brasil, com o manjado pretexto moralista. Por exemplo, sem saber que estava lendo um texto e Sardenberg sobre a precariedade das universidades federais brasileiras, não pude deixar de concordar com diversos trechos. Isso pode ser considerado sintoma de metamorfose para uma espécie de salgado com forma de parte de corpo humano?

 Um esquerdista, exaltando seu costumaz aspecto corajoso, pode argumentar que isso é ceder ao “Capetal”, e provavelmente atribuir-me traição de princípios, como recorrentemente acusam Lula, Dilma e PT, ao ceder aos cantos da sereia do liberalismo econômico. Sim, defendo o fim da estabilidade no serviço público, em especial nas universidades. Sim, defendo o fim da necessidade de licitação para compras e obras nas federais do Brasil. Sim, minhas preces são para que a Ciência brasileira e seus atores, pesquisadores, técnicos, e estudantes, possam diminuir substancialmente sua dependência estatal, por exemplo, por meio da prestação de serviços ao setor privado, aos moldes de instituições estrangeiras que tive o prazer de conhecer.

Nesse ponto, o revolucionário vai chegar a conclusão de fato que sou covarde, sem coragem para enfrentar o Capetalismo, só eles, dotados de um futuro redentor como heróis, tem a força suficiente para vencer. O curioso é que o tal Alexis, recém-saído do cargo de primeiro ministro grego, tinha a mesma ideia. Tinha, no passado, antes de conhecer o jogo à vera e ver a enormidade de cabeças de área e zagueiros que a vida nos impõe para driblar e atingir objetivos. O mesmo vale para Lula e o PT antes do ônus do poder e, a julgar pela quantidade de viúvas que hoje habitam o espectro mais à esquerda, podemos estimar o número de corajosos nesse Brasil varonil.

Não dá para driblar todo mundo, ou seja, não dá para fazer uma revolução por minuto. Nesse ínterim, a necessidade da atividade política entra com tudo. Será preciso recuar, rever as jogadas, ceder. Nesse meio tempo, a utopia vai dando espaço à realidade e ao pragmatismo, tão demonizado pelos corajosos de hoje e de sempre. Richard Dawkins em o seu “Relojoeiro Cego” diz que somos adaptados ao pensamento medíocre, aqui no sentido de meio-termo, por não sabermos trabalhar em escalas de tempo fora da nossa perspectiva. Os corajosos fazem jus a tal percepção ao demandarem a ruptura de um sistema em doze anos.

É evidente que as probabilidades de que as restrições trabalhistas no Brasil caiam são maiores atualmente. Mas isso é apenas culpa da Direita? Será? O legado getulista foi bom no geral em termos de rede de proteção ao trabalhador, mas trouxe a estabilização no serviço público, a nossa dependência estatal. Qualquer um que fez aulas de biologia, ecologia, sabe que a tendência do mundo é a desordem, ou melhor, dizendo, ao menor gasto de energia, à preguiça. A acomodação gerada pela estabilidade empregatícia é, portanto, um fator natural.

Não se deve achar que há generalização, pois não há. Basta que a nata do funcionalismo público, e aí incluo professores universitários, pesquisadores, etc, saiam às ruas e tomem a percepção da sociedade em relação ao Estado como termômetro. Como explicar que os brasileiros apoiem mais investimentos em educação, ciência e tecnologia, mas tendam a chamar professores/pesquisadores, e funcionários públicos de uma forma de geral, de vagabundos por ocasião de greves ou notícias de demanda de aumento por parte das categorias? Talvez, fosse o caso de boa parte do funcionalismo público parar de tomar a estabilidade como direito divino tendo em vista que a maioria da população não tem esse direito e, na média, ganha menos. Isso causa inveja e revolta na maioria da população, reações comuns em qualquer ser humano, crescido na disputa capitalista.

A questão é: como combater a acomodação que leva à percepção de estado falido? A resposta mais comum é fiscalização. Mas a fiscalização é deficiente, seja por falta de dinheiro seja por excesso de espírito de corpo. Ao propor maior participação da inciativa privada e de seus mecanismos de controle contra a acomodação somos automaticamente taxados de liberal. Mas gente, do jeito que está não dá. Quem não quer cobrança que vire cobrador ao tornar-se seu próprio patrão. Não é pedir estado mínimo, isso é uma falácia tão grande quanto estado superprotetor.

Há crescente onda de bom senso contra o pensamento binário, e o sentimento de destruição do desagradável. Isso soa como salutar para o que chamamos de debate político arejado. Um dos problemas para o arejamento é a ótica do Esquerdista Corajoso, onde o demônio precisa estar completo para ser plenamente combatido, e esse estar completo é negar toda ideia que venha do pensamento contrário.

O híbrido procurado deve ser geneticamente capaz de pensar o Brasil aceitando e materializando todas as ideias para melhorar o país dentro do sistema Capitalista, não há outro caminho, pois são muitos zagueiros para driblar, e uma vez que muitos de nós reconhecemos que cortar caminho por meio do chutão para dentro da área, ou seja, fazer a revolução, não é o caminho, somos chamados de covardes, traidores da causa. Tá bom então, talvez eu já esteja na panela, fritando como  o salgado mais famoso do mundo político.

Redação

20 Comentários

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  1. Falácia

    Se com estabilidade já é grande a perseguição a pessoas que pensam de forma contrária aos dirigentes, sem estabilidade voltaremos aos tempos em que cada vez que mudava os dirigentes todos os de pensamento contrário eram demitidos.  Sua proposta é muito bonitinha, assim no texto, porém na realidade seria o caos.

  2. O Aliança assinaria diversos trechos do artigo

    Algumas coisas das quais você falou são (na minha opinião) até liberais demais para a realidade brasileira. Mas que bom que você falou! Tirando essa bobagem monumental de “coxinha” (sei que vocês precisam disso para transitar dentro da turma da esquerda), todas essas questões tem de ser levadas em conta. O que acontece hoje é que se recortarmos um trecho do que você falou, a pessoa é taxada de “coxinha”. Aliás essa turma (dos “coxinhas”) só aumenta em número nos últimos meses. Não acho que recurso “ad hominem” funcione, mas é a estratégia do governo, paciência. É um fenômeno paulista e mineiro que os petistas de forma equivocada tentaram exportar para o país inteiro.

    Quanto à questão do funcionalismo, considero que o principal culpado é o governo. Não resta dúvida que o salário médio do funcionalismo é bem maior que do setor privado e (na minha opinião) não há dúvida que a incompetência da dona Dilma (nisso você discordará) nos levou a essa situação catostrófica no descontrole do gasto público.

    A questão é que ela perdeu a liderança política que permitiria neste momento controlar as reivindicações.

    Quando o professor da Universida pública vai ao supermercado, o caixa não pergunta qual a profissão dele. Qual é a justificativa de um juiz (não é salário maior, é reajuste) ter um reajuste percentual maior do que qualquer outro servidor ?

    Mas aí você acorda, lê o jornal, e vê o presidente do STF propondo que um oficial de justiça (com todo o respeito aos servidores daquele Poder) em final de carreira ganhe absurdamente mais do que um professor de ensino médio. O que o “coxinha” de direita que acredita em ajuste fiscal deve fazer? Propor redução no próprio salário, enquanto a Presidente amedrontada faz conchavo com o Judiciário para aumentar o resto do funcionalismo? Ou então conversar com o caixa do supermercado, explicando que o Judiciário precisa ser reconhecido, e portanto que o tomate custe mais para os oficiais de justiça, mas não para ele, que não teve reajuste diferenciado?

    Com todo respeito, qualquer pessoa neste blog (incluindo o Nassif) que proponha aumento de impostos não tem noção da máquina de queimar dinheiro que é o governo federal neste país. Se considerarmos Estados e Municípios, ai o quadro é pior, é revolução francesa p/baixo. Não vi o governo (nenhum deles) nem tocando nesse assunto. Dá p/cortar 5% do gasto estatal no Brasil sem trauma p/ninguém.

    Quero que a Dilma vá até o final por um motivo diferente do seu, os eleitores dela tem que perceber que erraram. E se ela mudar de rumo e acertar? Bom, então é bom para todos nós…

    1. Mas a gente está falando de

      Mas a gente está falando de Dilma (Governo) ou do Estado? Existe um tesão em relação ao PT e a Dilma que parece fazer com que vocês misturem Governo e Estado, curisamente, aquilo de que tnato acusam a “ditadura” petista.

      O funciopnalismo público precisa SIM de um choque de realidade , mas suas distorções são fruto de longa data e que sim não foram devidamente combatidos por Lula e Dilma. Nem por isso pode-se ser simplista o suficiente para colocar tudo no colo do Governo Fedreral (como sempre).

      Perceba, e isso vale para o citado Aliança liberal com nome de “guerra” de Oneide, que muitos simpatizantes do Governo não precisam concordar com ele integralmente. Do mesmo modo, vocês não precisam temer exporem apoio a algumas decisões do PT, da Dilma, apenas para manterem – se fiéis a ideologia liberal. è tudo uma sopa, meu caro. Entende?

      A imbecialidade está no ponto de negarem o prórpio bem estar geral quando a medida for proposta pelo “inimigo” ideológico. Esse papinho mixuruca de por tudo na conta do Governmo Federal é sim sintoma coxinha, sim senhor.

      E nem adianta fazer-se de perseguido, pois de pilhagem todos aqueles que simpatizam com o Governo e com o PT já sofreram. Vai chorar na cama em relação à isso.

      1. Sei que não sou imparcial
        Sei que não é tudo imputável ao governo federal, Francy, inclusive votei no Lula duas vezes e na Dilma em 2010. A questão é que a atual administração (talvez nisto discordemos) é uma calamidade. Estou na máquina há 23 anos, e nunca vi minha instituição tão paralisada por inépcia administrativa, falta de horizonte e total descontrole da administração como atualmente, e repare que o período FHC foi uma sufoco, mas nem chega perto do que ocorre hoje.

        Não há saída sem uma reforma do Estado que privilegie eficiência e controle racional de gastos. Hoje o PT está muito mais distante disso do que qualquer outra corrente mais a direita, infelizmente. Não tenha dúvida que o PSDB no que se refere ao meu interesse material é muito pior do que o PT, mas não tenho coragem de apoiar um grupo que sabidamente está no rumo equivocado.

        Contrariamente ao “coxinhas”, se a Dilma tomar uma medida correta, é evidente que apoiarei. O problema é que ressuscitar a CPMF (que não é tão ruim quanto o empresariado prega) sem uma ajuste de gastos que mude a mentalidade da sociedade não serve de nada. Minha impressão é que vivemos um triunvirato “romano”: Dilma, Cunha e Renan. Isso é muito pouco. Sei que o Aécio e o Alckmin também não servem, só que quem está no leme é a Dilma, cabe a ela propor as soluções e lutar por elas.

        No nosso sistema, Estado e governo (infelizmente) se confundem um pouco.

        Se o Lula em 2018 prometesse a mudança que você colocou (embora ache avaliação efetiva muito mais importante do que acabar com estabilidade), haveria até uma opção. Não é o que vejo no momento, então o PT não pode continuar. Espero que 2018 chegue logo…

  3. Trilha sonora do filme do

    Trilha sonora do filme do @ptbrasil sobre a queda de Aécio @Rede45 Neves:

    ♫ Na Lava Jato tem goteiraaaaaa

    ♫ Furnas ni mim

    ♫ Furnas ni mim

  4. Mais além dos conformismos

    A autora sugere: “pensar o Brasil aceitando e materializando todas as ideias para melhorar o país dentro do sistema Capitalista, não há outro caminho”.

    Confesso que eu nunca me preocupei muito com o capitalismo, ou seja, com esse fatalismo de que não há outro caminho fora do capitalismo. É isso o que creio que também acaba me livrando de alguma a fixação compulsiva com o “capetal”.

    O capitalismo é um dado. Não é o capeta. (Ou seja, basta ter os pés no chão, ao invés de se fixar obsessivamente em escatologias). E, diante desse dado, ao menos a minha suspeita do que seja a invenção política me sugere que outro mundo é possível, em lugar de que não haja outro caminho fora do capitalismo.

    Questão de opção.

    Agora, tanto discurso para chegar à conclusão de que outro mundo NÃO é possível… aí eu já acho que isso é apenas conversa pra boi dormir (senão um elogio cínico à subserviência).

    [P.S.: Que não haja caminho fora do capitalismo me parece análogo a dizer que é inútil pensar em ampliação da cidadania por que não há caminho fora da sociedade individualista do privilégio, e que, o máximo que se pode fazer é remediá-la por meio de uma política de “vales” (https://jornalggn.com.br/blog/ricardo-cavalcanti-schiel/as-clivagens-politicas-em-tempos-de-colera-por-ricardo-cavalcanti-schiel). Esse foi, em última instância, o discurso do establishment petista, que agora está em curso de convulsão agonística. Creio que qualquer esquerda minimamente consequente deve começar, isto sim, pela recusa do apriorismo conformista, e não por algum bom-mocismo ingênuo diante daqueles que não hesitarão — como historicamente não hesitaram — em querer nos exterminar. Ignorar os inimigos é o caminho mais fácil para ser esmagado por eles.]

    1. Há diferença grande ntre

      Há diferença grande ntre conformismo e a corajem dos tolos que pensam que as mudanças permanentes ocorrem na escal de mandatos presidenciais. Isso está bem longe de ser conformismo, mas sim realismo. Se quiser dar chutão pra frente para cortar caminho e não precisas fazer política atrasando o caminho fique a vontade. Isso é a alma do “revolucionário”.

  5. Pensemos numa tempestade que

    Pensemos numa tempestade que se aproxima.

    O socialista/esquerdista nega a realidade da tempestade. Diz que ela não existe de fato, que é mera construção elitista, burguesa, aristocrática, para alienar e dominar as massas pelo medo. Saem, então, a destruir os abrigos que as outras pessoas construíram para si, além de, é claro, não se prepararem para as intempéries. Já o liberal/libertário concorda que há algo a que chamam por aí de tempestade, mas não sabe, não quer saber e tem raiva de quem sabe as propriedades e a origem do fenômeno, motivo pelo qual não compreende de fato aquilo com que se deparará. Crê que com um bomdebate de idéias seja possível impedir a insanidade dos socialistas destruidores de abrigos, além de manter o tempo bom e afastar os raios e a chuva. Para ambos, a tormenta chegará e, impassível, ignorará tanto o esquerdista, que seguirá bramindo que ela não existe, como o liberal, que tentará pará-la com um belo guarda-chuva metafórico de idéias.

    Enquanto isso, aquele que chamam de “conservador” e “capitalista” terá (1) admitido a realidade da tempestade, (2) compreendido razoavelmente suas verdades, sua constituição, suas variáveis, sua imanência, antes de querer reformá-la ou negá-la, e (3) terá se preparado devidamente para atravessá-la, com a humildade de quem sabe que não pode ver a existência desde fora (contrapondo-a com idéias) e a altivez de quem entende que há uma realidade anterior, ulterior e imutável ao fenômeno temporal que assola a todos.

    À tempestade também se pode chamar “vida real”.

    http://colombomendes.blogspot.com.br/

    1. Engraçado. “Acuse-os das suas
      Engraçado. “Acuse-os das suas ilegalidades”

      Trazendo a analogia da tempestade para o mundo real.
      Guido Mantega e Arminio Fraga na globonews sobre a crise mundial e sobre seus efeitos no Brasil.
      Qualquer cidadão minimamente informado sobre a crise mundial (principalmente na europa).
      Infelizmente, o que foi uma marolinha para nos a principio, se transformou em uma onda devido a nao-recuperaçao da economia europeia como esperado mas, dentre os articulistas citados, o problema sempre foi única e exclusivamente brasileiro(mesmo esse blog aqui, de esquerda creio eu, alertar constantemente inclusive sobre a guerra cambial praticada a tempo, discussoes no g7, tentativa de por a russia de joelhos, etc) até que “de repente” em uma insuspeita segunda-feira as bolsas asiaticas puxadas pela china desabam puxando as do resto do mundo com ela.
      A desonestidade intelectual é assustadora para quem nao está acostumado a lidar com coxinhas.
      Ainda nao li o texto principal, quero ler com calma, mas imagino pela leitura dinâmica que já fiz vou encontrar a velha “hoje em dia nao há mais diferença entre esquerda e direita” e o autor é “apolítico” e só votou em Aécio pela alternância de poder ou pq está enojado com a corrupção.
      Acertei?

  6. Do Proletário X Burguês ao Estatal X Privado

    O discurso de luta de classes, povo x elite, ricos x pobres, etc continua a ser invocado pelos debatedores de esquerda, mas tornou-se inatual dos tempos de Marx para cá. Incapaz de levar a termo uma revolução que efetivamente acabe com o regime capitalista, a ação dos governos de esquerda pós-queda do muro tem se cristalizado em um único efeito visível: o crescimento indefinido do Estado e as consequências econômicas e sociais daí advindas.

    Esse crescimento do Estado, de início, não o leva a uma rota de colisão com o setor privado: muito pelo contrário, motiva os empresários a obter bons contratos com o Estado. Tanto é assim que este modelo, historicamente, tem sido seguido por muitos regimes formalmente “de direita”, como o regime militar brasileiro dos anos 70. A longo prazo, porém, ele cinge a sociedade em duas categorias, que com o passar do tempo vão se tornando cada vez mais distintas: os que estão dentro e os que estão fora do Estado todo-poderoso. Passam a existir dois tipos de empresário: aqueles do círculo dos “amigos-do-rei”, que têm contratos garantidos, obras superfaturadas e empréstimos a juros subsidiados, e os outros, que lutam na selva da livre concorrência, pagam altos juros a bancos privados e não são socorridos pelo governo se vão à falência. E passam a existir, também, dois tipos de assalariado: aqueles que trabalham para o Estado, que têm estabilidade, bons salários e podem fazer greve à vontade, e os outros, que recebem baixos salários e vão para a rua a qualquer momento.

    O Estado não produz riqueza, mas coleta impostos; sua capacidade de crescer, portanto, é sempre limitada e dependente do setor privado. A fim de pagar os privilégios da casta dos servidores e empresários amigos, o Estado avança cada vez mais nos cidadãos e empresas privados, castigando-os com pesados impostos e regulamentações, e fatalmente levando à estagnação da economia. É quando chega nesse estágio que o governo esquerdista mostra abertamente que sua luta não é a favor dos pobres, mas a favor de seus servidores e apaniguados, aos quais procura de todas as maneiras preservar dos efeitos da crise e lançar a conta sobre todos os demais que estão fora do guarda-chuva estatal. Exatamente o que está acontecendo nesse momento.

    Cientes de seu exclusivismo, os funcionários do Estado cada vez mais tendem a cerrar fileiras com o governo, e seus sindicatos tornam-se meros porta-vozes dos governantes. O momento da revolução que põe fim ao capaitalismo também é o momento em que essa casta de funcionários, ou ao menos os mais importantes, torna-se a nova nomenklatura do regime juntamente com os antigos empresários amigos-do-rei, que são devidamente expropriados mas recebem altos postos que lhes permitem preservar sua vida de luxos. É nesse momento também que a massa dos antigos funcionários das empresas privadas é reduzida à miséria, tangida a trabalhar para o Estado, o único patrão, em troca do que o Estado estiver disposto a pagar-lhes. Foi assim em todos os países que entraram no comunismo. Mas na época atual, pós queda do muro, queda da URSS e ex-países comunistas virando capitalistas, esse momento parece ter sido postergado indefinidamente, causando o prolongamento indefinido da penúria econômica consequencte do sangramento dos setores produtivos por um Estado voraz e improdutivo.

    A luta atual não é mais Ricos X Pobres, e sim Estado X Cidadãos Privados. Ou por acaso não existem por aí banqueiros e empresários que tiveram lucrosfabulosos sob o governo petista, bem como camelôs que engrossam as passeatas anti-Dilma porque estão descontentes com a alta do dolar que os dificulta adquirir mercadorias made in China?

  7. Com todo o respeito ao autor

    Com todo  respeito ao autor do texto.

    Parei de lê aqui : “Pode-se, e pode-se mesmo, concordar com argumentos de Sardenberg, Mirian et caverna”

    Não adianta, a minha cara de madeira esquerdista está toda tomada de cumpim.

    Mas com um detalhe, continua em pé e vibrante, e altamente repelente à coxinha.

  8. Opa! Peço desculpa pelo que
    Opa! Peço desculpa pelo que disse antes. O texto é bom e tem um viés diferente dobque pensei. Equilibrado.
    Parabéns

  9. Realmente muito bom o
    Realmente muito bom o texto.
    Mas, como o próprio autor denuncia, o pensamento reducionista não se resume à esquerda apontando qualquer insatisfação ao governo (não ao estado, como bem fez em separar e como uma pesquisa divulgada aqui antes sobre os coxinhas da paulista que a maioria queria um estado provedor – desde saude a transporte publico- apesar de revoltados com o “comunismo” do Pt).
    No meu ponto de vista a esquerda tem uma maior diversidade de idéias e no entanto é/foi/será sempre reduzida pelos mais afoitos a alguem de camisa vermelha, fumando charuto, de barba (ou não adepta da depilação), com um fuzil nas costas, querendo tirar dinheiro da classe média pra distribuir aos mendigos e por um sem terra/sem teto para morar em sua propriedade.
    Justiça social não é dividir o fruto do trabalho de todos em partes iguais e redistribuir. Justiça social é dar oportunidades à todos. Não esse simulacro de meritocracia pregado pelo atual sistema economico.

  10. Sem partido, ok. Mas sem… ideologia?

    Está sendo mais comum o “apartidário”, um conservador enrustido, do que o conservador reacionário assumido. Talvez seja fruto do petismo e sua tentativa de conciliação de classes, o que está sendo verdadeiro tiro no pé: no que o PT transformou proletário em classe média, perdeu eleitor: é que classe média não vota no PT. E conheço um monte de gente pobre que inveja o que acredita ser privilégio dos “coxinhas”…

    Só resta lamentar: antigos proletários que foram alçados à “classe média”, caso os ares republicanos voltem a soprar a favor do conservadorismo, com certeza perderão poder econômico e político. Mas talvez continuem contentinhos por um tempo, manterão pendurada a medalha de classe média na parede de suas salas.

    ***

    Não que, por exemplo, se Aécio tivesse levado a presidência nas eleições passadas, interrompesse programas sociais de construção de moradias – hoje chamado “Minha Casa, Minha Vida” -, de distribuição de renda – hoje, BF – ou de Saúde. Mas com certeza daria um jeito de enfiar atravessadores privados entre o estado e os beneficiários. E até cair tanto a abrangência desses programas quanto suas qualidades seria questão de tempo somente. Mesmo assim esse ex-candidato – tanto quanto qualquer outro da mesma ideologia e não necessariamente do mesmo partido – ganharia as manchetes da mídia como “amigo do povo”. No entanto, em lugar de anunciar o número de pessoas atendidas pelos benefícios, alardearia o dinheiro que esses programas custariam aos cofres públicos.

    Falta educação, consciência de classe… cidadania.

  11. Francis, nem li tudo. Que tristeza…

    Acho que essas bolsas no exterior tem mesmo esse efeito. Isso que vc propoe seria o fim da mínima autonomia que ainda há (e já é mínima) para a realizaçao de pesquisas. Só seriam feitas pesquisas lucrativas, o interesse social iria para o escambau.

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