Cercados e coagidos, por Janio de Freitas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

da Folha

Cercados e coagidos, por Janio de Freitas

Soltura de presos da Lava Jato demonstra que coerção não é um recurso legítimo para obter informações

O reconhecimento, por condutores da Lava Jato, de que a meia libertação de nove dos seus presos vai dificultar novas adesões à delação premiada não precisava de detalhamento para revelar a sua índole. Ainda assim, ao menos um dos condutores quis frisar que, até a decisão do Supremo, “a liberdade era um trunfo que a gente tinha para convencê-los a falar mais. Agora, teremos que repensar”.

Toda coerção é violência. Por isso coagir não é um recurso legítimo. Seja de obter informações, ou do que mais for.

Toda coerção provém da visão deformada que o autor tem do seu poder, exacerbando-o. Ocorra isso por circunstâncias em que o coagido não tem condições de reagir à altura, ou como manifestação de uma personalidade patológica. Neste ou naquele caso, a posição enfraquecida de um e a posição privilegiada de outro compõem sempre uma situação de covardia, além de física, moral.

O essencial em tal questão foi levantado, com o percurso próprio e melhor estilo, pelo ministro Teori Zavascki como relator do habeas corpus que levou à meia liberdade dos nove. Ao reconhecer que o juiz Sergio Moro não apresentara evidências de risco de fuga ou perturbação de investigações por parte dos presos, além da extensa prisão preventiva de quase meio ano, assim o ministro sintetiza a proposta de volta ao rigor legal:

“A credibilidade das instituições somente se fortalecerá na medida em que forem capazes de manter o regime de estrito cumprimento da lei”.

Aí está um aprendizado que os brasileiros precisam fazer. Caso haja real desejo de chegar a um regime de fato democrático. Estamos cercados de coerções e outros autoritarismos e prepotências por todos os lados. Mas, se não forem fatos gritantes como a arbitrariedade policial ou o juiz que prende quem deve multá-lo, ou nem se percebe a predominância do autoritarismo, ou é aceito como natural.

Do próprio Congresso vem mais uma demonstração nesse sentido. Surgidos dois documentos feitos em computador do seu gabinete, suspeitos de conterem coerção para reativar subornos de duas empresas, a providência imediata de Eduardo Cunha é valer-se da presidência para a demissão sumária do diretor de informática da Câmara. Como complemento, diz que os documentos configuram uma conspiração em represália à disciplina que, dias antes, teria imposto à seção de informática.

Nas várias suspeitas que o atingem há muitos anos, é inegável que Eduardo Cunha tem sempre uma resposta pronta e articulada. O problema é que, de tão prontas e articuladas para transferir a suspeita, as explicações se tornam elas mesmas suspeitas de álibi construído.

À reprise foi agora acrescentada a prepotência. Nas circunstâncias e por ser sumária, a demissão do funcionário implica acusação grave. Sem a devida apuração, necessária também por lei. Mas, apesar de sua motivação e desregramento, sem reação do conjunto de deputados e do corpo de funcionários. Embora até as suspeitas suscitadas pelos documentos e por sua origem persistissem vivas.

A Lava Jato “tem que repensar”. Pode ser um bom começo. Prender criminosos precisa ser um ato só da legalidade e da democracia.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

13 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Muito me surpreendeu Gilmar

    Muito me surpreendeu Gilmar Mendes ter seguido o relator votando em favor do HC para esses empresários. Será que está fazendo alguma jogada com os homens pela condição deles? Digo isso porque, com quase toda a certeza, se Teori Zavascki fizesse o mesmo em relação a João Vaccari, que também está preso de forma arbitrária, duvido muito que gilmar Mendes votaria com o relator. 

    Enquanto um bandido, salafrário, como Roberto Costa, por estar delatando todo mundo, aumentando a lista a cada dia, se encontra lépido e fagueiro, ate com direito a jantar numa churrascaria na companhia de policiais federais, João Vaccari prosseguirá preso, e perseguido pela mídia, tal como fizeram com Dirceu e Genoíno. O homem não sai da televisão. Todos os dias o nome dele aparece nas rádios e a a cara dele no vídeo. 

    Teori Zavascki está nos devendo algumas explicações. 

    1. Zavaski votou a favor do

      Zavaski votou a favor do habeas corpus por respeito à presunção de inocência, e Mendes, por se tratarem os suspeitos de representantes do poder econômico.

    2. Maria, acho que o min.

      Maria, acho que o min. Zavascki precisaria ser provocado pela defesa. Ou então o período de prisão do Vaccari não extrapolou o tempo regulamentar. Ou…

  2. JUSTIÇA BRASILEIRA

    Muito bom!.  E bem lembrado quanto a demissão do Funcionário pelo ditador Eduardo Cunha: cadê a Associação dos Funcionários, cadê a reação dos Deputados do PT, PSOL e outros?.

    1. Se esse Cunha demitiu

      Se esse Cunha demitiu sumariamente, então não era concursado, provavelmente um contratado ou comissionado. Resta saber se demitiu mesmo ou tirou a gratificação. Essas coisas são enroladas. Mas o que não é enrolado atualmente ?

    2. O PSOL quer mais é que o PT

      O PSOL quer mais é que o PT desapareça prá ficar no lugar dele. Tá tudo combinado. TODOS os partidos querendo ficar no lugar do PT. Viva o PT! Olha que nem do PT eu sou, mas é o melhor partido do país.

  3.  “a liberdade era um trunfo

     “a liberdade era um trunfo que a gente tinha para convencê-los a falar mais. Agora, teremos que repensar”.

    Em outras palavras, a nossa intenção era deixar os empresários presos até que acusassem formalmento o Lula/Dilma/PT.

    Agora temos que repensar como nós vamos f… essa raça.

    Não vamos desistir, e tem mais, às favas com o escrúpulo.

     

  4. O carioca esperto Filho a

    O carioca esperto Filho a Cunha não vai durar muito. Ele é guloso demais, vingativo, ditador, perseguidor, extorquiador, ameaçador, chantagista e por cima de tudo isto é miope. Nenhum grande politico durou muito, com estes caracteristicas brabas.

  5. Cercados e coagidos

    Mais uma vez estamos ficando nos, progressitas. O resto esta meio que se lixando por direitos individuais, demissão autoriataria, estado de direito e o escambau, tudo aquilo que coloca um minimo de civilização nessa selvageria. 

  6. Tudo muito bem em termos de

    Tudo muito bem em termos de defesa de direitos,  mas até onde fui é que a meia liberdade – como tão bem rotula o Jânio de Freitas – concedida pelo supremo não altera o status de preso, e sim o de prisão, que passa a 5 estrelas.

    Em resumo, o cidadão continua “preso”, mas em lugar de usar um vaso sanitário no meio de uma cela comum a outros presos, pode esperar o mordomo repor o papel higiênico. Bem, é uma senhora garantia de direitos.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador