Cruzar os braços também é movimento, por Ricardo Cappelli

Na guerra, todos os movimentos devem ser medidos. Cruzar os braços também pode ser um deles.

Reprodução – Para os Curiosos

Cruzar os braços também é movimento

por Ricardo Cappelli

O Capitão nunca foi o candidato da “Aliança do Coliseu”, coalizão liderada pela Globo com setores antinacionais da burocracia estatal com o objetivo destruir a política e qualquer cheiro de projeto nacional de desenvolvimento.

O presidente foi um surfista da onda levantada pela Aliança. Quanto mais a “República de Curitiba” e o JN detonavam a política, mais o “outsider” fortalecia seu posicionamento de candidato anti-establishment pela direita.

Eleito, foi útil para o presidente colocar como seu auxiliar uma pessoa que gozava de prestígio popular superior ao seu. Para Moro, o ministério era a ponte para o STF ou mesmo para a sucessão.

A Aliança seguiu unida. Toda vez que o ministro se via em apuros, surgia uma entrevista especial no Fantástico para defendê-lo.

Quando Bolsonaro partiu para cima da Globo, circulou que a equipe de Moro era a fonte de vazamento do COAF sobre Flávio Bolsonaro, munição que alimentava a bateria da emissora contra o Capitão.

A grande mídia dizia que o governo possuía alguns pólos, formados por “ajuntamentos”. Na política como no amor, casamentos de conveniência são contratos sem juras de fidelidade.

Os generais da reserva foram os primeiros a serem abatidos.

Olavo de Carvalho e Carlos Bolsonaro trataram da infantaria.

Quando as defesas já estavam deterioradas, o Capitão demitiu e fez chacota. Teve de tudo, até “general melancia”.

Há quanto tempo não se ouve uma palavra de Mourão?

O segundo pólo seguia liderado por Moro. Até que veio a Vaza Jato. O enfraquecimento do ex-juiz quebrou sua “sacralidade” e abriu uma oportunidade. Bolsonaro não deixou passar.

O poder é cruel, não perdoa. Ao vestir em Moro, visivelmente constrangido, a camisa do Flamengo num estádio de futebol, o Capitão dizia com todas as letras: “amigo, agora você depende de mim, recolha-se ao seu lugar”.

Daí pra frente foi um show de sadismo. Desmoralizou o ministro decretando que o projeto dele no Congresso não era prioridade. Mandou-o fazer troca-troca com Ricardo Salles. Debochou da assinatura dele transformando-a em Lula Livre.

E seguiu em marcha batida. Retirou de Moro ou da tal “lista da corporação” qualquer influência sobre a indicação do próximo PGR. Extinguiu o COAF e removeu seus “ossos” da Justiça para o Banco Central. Fez do ministro “Rainha da Inglaterra” intervindo na PF e na Receita.

Dos três núcleos de poder que rondavam o Planalto, apenas Guedes continua vivo.

Na ânsia de retomar a iniciativa, parte da esquerda resolveu se intrometer na briga. Pra defender quem? Corporações que operaram pela construção do arbítrio? Moro? A Globo?

Em agosto de 1944, durante a Segunda Guerra, estourou a Revolta de Varsóvia, um levante polonês contra a ocupação nazista. Os nacionalistas poloneses também eram anticomunistas.

Apesar disto, eles contavam com o apoio do exército vermelho contra os alemães.

A poucos metros da batalha, Stalin decidiu cruzar os braços. Deixaria os dois se enfrentarem. Mais tarde ocuparia a Polônia como um todo, enfrentando apenas o vitorioso já desgastado pela batalha anterior. Foi o que aconteceu.

Na guerra, todos os movimentos devem ser medidos. Cruzar os braços também pode ser um deles.

Redação

5 Comentários

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  1. Se esse “troço” de alcântara passar no congresso, o Brasil para mim também passa!
    Vou procurar um lugar, um outro país para chamar de meu…

  2. Derrubar Bolsonaro pra colocar o general Mourão é o mesmo que trocar 6 por meia dúzia. Ambos têm como herói o torturador Coronel Brilhante Ulstra. Ambos são entreguistas e subservientes ao EUA. Ambos são inimigos do Estado Democrático de Direito e da Constituição de 88. Ambos têm valores fascistas.
    Referir-se a Bolsonaro e Mourão como AMBOS tem uma sólida razão de ser.

    1. Discordo. Se Mourão assume após Bolsonaro ser derrubado, assume em condição de fragilidade política total. A questão não é só o caráter político de ambos (no essencial, farinha do mesmo saco), mas em que condições políticas governam. A crise política já é profunda, o país está polarizado, o governo é contestado. Agora, imagine se cai o presidente. Isso aqui vai sair do controle da burguesia, e é exatamente isso que eles não querem.

      Pense um pouco: a imagem que Mourão construiu (o razoável) é infinitamente melhor que a de Bolsonaro. Então porque não tirar esse sujeito indesejável de cena e colocar o bem-aceito nos círculos da elite? Porque isso AGRAVA a crise do golpe, pois Mourão não tem nem o apoio popular mínimo que Bolsonaro tem. Por isso, um governo Mourão não é igual a um governo Bolsonaro, é um governo muito mais frágil, em situação política muito mais delicada.

      O que é bom para a esquerda, que no ímpeto de derrubar um governo bota todo o regime político em xeque. Política é contexto, por mais que Mourão se assemelhe a Bolsonaro, o próprio fato de Mourão ser herdeiro do desastre do antecessor, ainda por cima sem base social, agrava muito o jogo da burguesia.

      Conclusão: é desejável, sim, derrubar Bolsonaro mesmo que resulte num governo Mourão. Depois se derruba o Mourão, se exige novas eleições, etc. Mas derrubar Bolsonaro é uma etapa inadiável.

  3. Para quem desejava Ciro Gomes na Presidência, nada mau. É isso mesmo. Dá ânsia e muita angústia, ver tanta sacanagem contra os que vivem como assalariados ou de biscates, da verdadeira escalada do neoliberalismo, retirando as ainda poucas perspectivas de melhoras, reduzindo o aparelho de estado para atendimento dos mais pobres, que já impacta, fortemente, também, vários estratos das classes médias; da entrega de nossas riquezas ao grande capital (brasileiro e estrangeiro), que estão ganhando rios de dinheiro com os altos juros praticados na ponta, na Bolsa de Valores (mais de 100.000 pontos), no alto dólar e aplicações financeiras, todos ficando ainda mais ricos e concentrando a renda do país, estando as forças ditas progressistas longe de partir para um enfrentamento mais direto, com manifestações constantes e sistemáticas, não apenas contra Bolsonaro que não passa de um ridículo e útil joguete na mão do comando do golpe que eclodiu em 2016, com apoio e orientação do EUA e em seu favor, afastando Dilma Rousseff e o PT do poder, prendendo o Presidente Lula e em 2018 (ainda mantido encarcerado), mas contra os golpistas e suas estruturas de poder, que se dá com beneplácito das Forças Armadas (únicas do mundo entreguistas e atendendo soberania diversa do país onde opera), do Judiciário secundado pelo Ministério Público, de parte dos parlamentos, com a mídia (Rede Globo à frente), que procura um discurso dúbio de apoio e críticas não ao essencial, como ao plano econômico neoliberal que está em franco desenvolvimento, sendo implantado pelo Paulo Guedes, economista que tem no currículo ter sido membro da equipe econômica do sanguinário ditador chileno, Augusto Pinochet, que infelicitou o Chile. Não partir para o enfrentamento direto, está dificultando o uso do aparelho repressivo montado pelo também sanguinário, Sérgio Moro, hoje no Ministério da Justiça e Segurança Pública,que comanda, junto com as Forças Armadas. Enfrentá-los, agora, seria fazer o que desejam, oferecendo álibis para os desacertos da economia comandam, que já começam a trazer desentendimentos entre os golpistas e suas bases de apoio. Já se vê alguns ratos largando a nau desvairada do Bolsonaro. Cruzar os braços no sentido de não fazer o que os golpistas desejam e induzem para que seja feito, parece o certo. Nada de pacto, nada de arreglar com os golpistas. Que se resolvam. Quem sabe, antes não fazem como Macri, e optam por fazer brotar o dinheiro que falta, mantido represado, para aliviar a luta pela sobrevivência da maioria? Pelo que já se sabe sobre o golpe e seus apoios na Lava Jato, Lula livre e Diretas em todos os níveis, já.

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