Há uma esperança…, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Todavia, o Tribunal não pode se desviar do caminho que leva ao retorno da normalidade sacralizando algumas exceções para agradar a imprensa.

Há uma esperança…, por Fábio de Oliveira Ribeiro

“Como em qualquer disputa, em uma discussão o que está em ação não é o desejo pela verdade, mas o desejo pelo poder. E o ser humano, que não é um ser especialmente nobre, revela seu lado mais sombrio: a vaidade e a hipocrisia triunfam.” Karl Otto Erdmann

Ontem, por ampla maioria, o STF  decidiu conceder um Habeas Corpus reconhecendo a nulidade de uma sentença lavajateira. Essa decisão vai reverberar em várias outras condenações proferidas por Sérgio Moro e confirmadas pelo TRF-4.

Três votos chamaram muito minha atenção.

Fachin proferiu um voto extremamente longo para tentar justificar o injustificável. Luis Fux “matou no peito” e acompanhou o relator falando durante bastante tempo. Após ser derrotado e querendo salvar seus pupilos, Luís Barroso tentou estabelecer um marco temporal para separar processos nulos de condenações nulas supostamente válidas.

Fachin e Fux negaram validade e eficácia aos princípios constitucionais do devido processo legal e do direito à ampla defesa substituindo-os por simulacros retóricos que precisaram ser objeto de votos cansativos e intermináveis. Barroso preferiu fazer uma distinção entre dois períodos temporais: num deles os princípios constitucionais teriam valor no outro valeria uma exceção.

Fachin e Fux presumiram que quem profere votos mais longos tem mais razão. Barroso presumiu ser possível transformar a derrota em vitória mediante a criação de uma distinção bizantina.

Usar uma cunha temporal para derrubar a tese de nulidade em alguns casos é uma aberração jurídica. Todos os réus devem ser tratados de maneira igual não havendo justificativa para distinções pessoais na aplicação dos princípios constitucionais do Direito Penal quando os casos são semelhantes.

A perfeição técnica de uma decisão judicial, sua adequação ao texto constitucional que foi interpretado e/ou aplicado, nunca depende do tamanho da decisão proferida pelo juiz. Quem fala mais não tem necessariamente mais razão. Muito pelo contrário, se um juiz precisa se demorar usando artimanhas retóricas para justificar a não aplicação da Lei ou a sua aplicação seletiva é muito provável que ele esteja agindo de má-fé. Especialmente se ele mesmo decidiu um caso análogo de maneira distinta no passado.

O processo penal não foi concebido para possibilitar a aplicação da dialética erística de Arthur Shopenhauer [como desejam Fux, Barroso e Fachin] e sim para garantir ao réu que ele não será esmagado pelos agentes estatais encarregados de acusá-lo, julgá-lo e fazê-lo cumprir a pena. A situação do réu é sempre desvantajosa. Devido processo legal, direito de defesa, oportunidade de produzir provas, presunção de inocência, imparcialidade judicial, publicidade de todos os atos processuais, etc… não são armas e sim escudos que foram colocados nas mãos do réu, pois ele não tem os mesmos recursos econômicos e administrativos que o órgão de acusação.

Comecei esse texto citando a introdução de Karl Otto Erdmann ao livro de Arthur Shopenhauer (38 estratégias para vencer qualquer debate, Faro Editorial, São Paulo, 2014, p. 9). Tudo que fiz aqui foi tentar refutá-la. Num debate jurídico o que deve prevalecer é a boa fé e não a hipocrisia e a vaidade. Os juízes não deveriam desejar manter este ou aquele réu preso por razões políticas e sim atribuir validade e eficácia ao texto da Constituição Federal em todos os casos processos que são obrigados a julgar. O poder outorgado a eles não é um fim em si mesmo, nem tampouco se origina e suas augustas pessoas.

Ontem o STF começou a demolir o predomínio da jurisprudência erística lavajateira. Todavia, o Tribunal não pode se desviar do caminho que leva ao retorno da normalidade sacralizando algumas exceções para agradar a imprensa. Quem decide os processos criminais em última instância é a maioria do Tribunal e não a Rede Globo ou o ministro que é dono do escritório de advocacia que defende o clã Marinho.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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