Por que me orgulho de ser brasileiro, por Sebastião Nunes

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Passei dos 75 anos. Isto significa que já vivi três quartos de século. Descontados os 15 primeiros anos, de inocência, completei 60 de vida política, ou seja, como cidadão da “polis”, plenamente responsável pelos meus atos.

HISTÓRIA ANTIGA

No dia em que Getúlio se matou, eu, dolorido, sofri o drama, cada minuto daquele crime. O líder da oposição era Carlos Lacerda, o Corvo, o mesmo que, dizem, mandava jogar mendigos no Rio da Guarda, quando governador do Rio.

Vivi a eleição de Jânio Quadros e sua renúncia, incompreensível na época. Conheci a covardia, o medo, a delação e a conspiração e o terror quando João Goulart, que o sucedeu, foi deposto em 1964. Por trás do exército, manobravam a oligarquia nacional, o poder imperial dos EUA e a ganância dos poderosos.

TEMPOS DE GUERRA

Entrei na faculdade de direito da UFMG também em 1964. Dois anos depois, liderei um protesto contra a presença, em nosso restaurante, de Pedro Aleixo, então vice-presidente “eleito” da ditadura, que almoçava com Lourival Vilela, nosso diretor. Lourival, bom sujeito e meu amigo, veio até onde a gente berrava e pediu:

– Tião, não faça isso. Deixa o homem em paz!

Não deixamos, e eles se retiraram, sem terminar o almoço.

Até 1968, quando me formei, corri, suei, distribuí manifestos, produzi e preguei cartazes, pichei muros, escrevi panfletos e poemas revolucionários.
NASCE A ESPERANÇA

Não comentarei os chamados “anos de chumbo”. Direi apenas que em 1971, quando a repressão crescia, levei numa madrugada meu irmão Etelvino para o Rio de Janeiro, deixando-o num apartamento vazio na Tijuca. Só soube dele quatro anos depois, já morando no Maranhão, Hoje é um dos dirigentes estaduais do PCdoB.

Veio a abertura e a eleição de Tancredo, que morreu sem tomar posse. Vieram vários governos que tatearam e tentaram sem conseguir nada, ou quase nada. FHC, depois de manipular a reeleição, tentou privatizar o país, e quase conseguiu.

Então veio Lula, e tudo mudou.

A VOLTA POR CIMA

O primeiro passo foi liquidar a ALCA, que pretendia transformar toda a América Latina num vasto quintal dos EUA. O segundo foi abortar as privatizações em massa. O terceiro foi iniciar a lenta, penosa, árdua e difícil batalha pelos miseráveis, com o Bolsa Família, que a direita nunca engoliu. Porque a direita não admite que pobre tenha direitos, a não ser o de trabalhar como burro e morrer de fome.

Lula foi teimoso, inflexível. Como sua genialidade política, com sua intuição e seu carisma, deu muito nó em pingo d’água.

Comeu o pão que o diabo amassou, sendo o mais amargo deles o chamado Mensalão, modelo político-operacional existente desde o Brasil-colônia, que atravessou império e república sem deixar marcas, mas que a direita alvoroçada só passou a enxergar quando membros do PT decidiram usar o modelo.

COMBATENDO AO SOL

Não se governa sozinho. O presidente não é um todo-poderoso. Para atuar e exercer seu mandato, precisa de apoio. E o apoio vem de quem, se é que vem? Do Congresso (Senado e Câmara), do judiciário e da mídia, principalmente da televisão e do rádio, únicos veículos verdadeiramente de massa. Ah, sim, agora temos a internet!

Foi preciso costurar alianças. Com quem? O mais notório partido disponível e onívoro, metido em qualquer barganha, sempre disposto a abocanhar gordas fatias do poder, é o PMDB, saco de gatos nascido do outrora glorioso MDB.

Mas dois partidos não bastam, ou não se aprova nada, que o Congresso não deixa, bloqueando, discutindo vírgulas, botando senões, criando barreiras.

O NOJO À TONA

Um desses partidos aliados indicou o famigerado Paulo Roberto Costa, para diretor na Petrobras. De 2004 a 2012, manobrando na sombra, praticou um rombo estimado em R$ 10 bilhões, beneficiando dezenas de canalhas de seu porte.

Destituído por Dilma, que não gostava dele, Costa aceitou, diante do risco de condenação pesada, a nojenta delação premiada. E denunciou, ou inventaram que denunciou, muita gente graúda. A grande mídia deitou e rolou, como em toda véspera de eleição majoritária: “A Petrobras é um ninho de ratos”, decretou ela.

Duas ideias estão por trás disso: destruir a maior empresa nacional e derrotar a presidente Dilma. Para botar quem, no lugar dela? A grande imprensa ainda não se decidiu por Aécio ou Marina. Espera para dar o bote da conversão instantânea, isto é, espera para saber quem terá mais chances de derrubar o PT, o grande inimigo da direta nacional nos últimos 12 anos. Como Getúlio foi inimigo do Corvo.

MEU ORGULHO

Nunca me deixei cegar. Sei que o Mensalão foi uma farsa muito bem montada. Sei que existe corrupção desde que o mundo existe, e nunca foi tão combatida aqui quanto nos governos Lula-Dilma. Se os acusados não estão na cadeia, culpa de quem? Do judiciário e seus infinitos recursos sobre recursos sobre recursos.

E culpa também do Congresso, que trava qualquer tentativa de reforma política. Mesmo os simplórios conselhos populares, ideia simples de participação popular, não avançam de jeito nenhum. Deputados e senadores morrem de medo do povo.

Estou vivendo meu último quarto de século. Vi muito, vi até demais. Mas não gostaria de ver um presidente entregando a carne dos pobres aos banqueiros.

Publicadon no jornal O Tempo

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

13 Comentários

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  1. faltou mencionar Sun-Tzu

    Desinformação : Ação ou efeito de desinformar.

    Informação inverídica ou errada que é divulgada com o objetivo de induzir em erro.
    Falta de conhecimento; ignorância: a desinformação sobre métodos contraceptivos é perigosa.

    O uso de informações falseadas é conhecido nas artes militares desde que o mundo é mundo. “A arte da guerra consiste substancialmente de engodo”, dizia Sun-Tzu no século V a. C.

    Exemplos de informação falsa usada fora do campo militar estrito aparecem, aqui e ali, na história mundial. Calúnias contra judeus e protestantes nos países católicos, contra os católicos e judeus nos países protestantes foram muitas vezes premeditadas para justificar perseguições.

    Os revolucionários de 1789 montaram uma verdadeira indústria de informações falsas para jogar a opinião pública contra o rei e, depois, para induzi-la a apoiar as medidas tirânicas do governo revolucionário.

    O exemplo mais célebre foi a “Grande Peur”, o “Grande Medo”: informações alarmistas espalhadas pelo governo, que, anunciando o iminente retorno das tropas reais – impossível, àquela altura – desencadeavam explosões de violência popular contra os suspeitos de monarquismo; explosões que em seguida o próprio governo mandava a polícia controlar, brilhando no fim com a auréola de pacificador. A história das revoluções é a história da mentira.

    1. De História. o amigo…

      … sabe pouco – imagino que deve conhecer a História lendo veja e seus escritores recomendados… pois o amigo nunca ouviu falar da Vendée ou da coalizão monarquica que invadiu a França para restabelecer a monarquia?

  2. No cerne

    Obrigada, Sebastião Nunes. Seu relato, com toda sua experiência, é importante para nos, mais jovens, que tentamos nesses anos do PT no governo federal levar mais esclarecimento a tanta gente que não entende o que esta acontecendo no Pais e que acaba aclamando gente como Joaquim Barbosa e levando adiante bandeiras do neoliberalismo sem a minima ideia do que seja de fato. Eh uma luta ardua contra a desinformação perpetuada pela velha imprensa em todos essas décadas até os dias atuais.

     

  3. Sebastião Nunes

    Fora poucos anos de diferença, e experiêcia em outros ambientes também estou chegando a 3/4  de século de vida. O que você declara como sendo seu temor , confesso que também é meu. Custei muito para ver nesse país governos priorizando a atenção aos desvalidos e miseráveis , e neste ponto não existe nenhuma motivação para retrocesso, mas o mundo nos mostra esta possibilidade ocorrer com frequência elevada . 

  4. Texto

    Texto muito legal Sebastião. Creio que caminhamos com fé e otimismo para uma nova gestão Dilma. Acredito que este segundo mandato será bem melhor que o primeiro. Abraços.

  5. gente que se esmera 
    em

    gente que se esmera 

    em preDOMINAR COM CITAÇÃO

    odeia a proximidade

    de INCORPORADA SENSAÇÃO

     

    também vivo há 3 X 25 anos

    convivi com as lembranças de sebastião

    apenas vim

    de salões colonizados

    padronizados

    anti-trabalhistas

    pra rua combater a ditadura

     

    apoiei o pt

    desde as soluções collor + fhc

    parece que o partido

    é detestado guerreiramente pela MINORIA

    justamente pela demorada aceitação

    mantida pela MAIORIA

     

  6. Texto excelente e maduro!!!

    São de testemunhos como este, que o Brasil está precisando!

     Mais de meio século de vida vivida, na politica nacional e nas artes.

    Quisera que muitos fossem honestos pelo menos à metada, para então poder esclarecer os restantes de quanto é importante a noção de justiça, igualdade e humanidade.

    Mas os abutres da Banca, aliados aos cafajestes que se locupletam com as riquezas nacionais, que deveriam ser de todos, vivem a manipular os incautos, para retornarem com sua sanha devoradora!

    Mas, espero que não retornem nunca, e as camadas beneficiadas, principalmente com a acesso aos níveis universitários, saibam propagar o que foi a politica de distribuição social nos governos do PT!

  7. “ORGULHO DE SER BRASILEIRO”

             “ORGULHO DE SER BRASILEIRO” 

    Ao  longo dos anos fomos levados a um cativeiro e ficamos restritos a  engorda do medo  de arriscar,  desafiar,  e  “sair  à luta”, de forma criativa, civilizada e democrática. Não falo de confrontos falo de criatividade e de uma consciência de cidadania, assim como; “o panelaço de  São Paulo e em outras capitais”,  e-mails às parlamentares,  “deboches na rede social” , no mundo corporativo, em famílias e na religião. .  

    Esta nova geração tem demonstrado que devemos acreditar no futuro e apoiá-los no presente, é só ver a coragem dos novos delegados, promotores, juízes, nossos filhos e novos empreendedores, que em conjunto com atitudes individuais, estão transformando a virtude do  caráter em sinônimo de brasilidade.   

    “Países Desenvolvidos”

    Em um País admirado como a Austrália o ministro é acusado de ter feito acordo com os traficantes de imigrantes;

    Porque europeus estão sendo recrutados pelo Daesh, que não são mulçumanos e sim terroristas que travam uma guerra, por interesses políticos econômicos,

    Sem falar nos Skinhead, Nazistas e no Fascismo, ainda presentes, se não abertamente, disfarçados pela ditadura da informação.

    E agora poderíamos falar muito sobre os E.U. A, que até elegeu um Presidente negro, porém, talvez seja o maior exemplo da ditadura  do poder cultural, econômico e se não conseguir impor, por estes meios,  utilizam a força, inclusive contrariamente a deliberações da ONU.

    Se hoje fossemos uma destas potências, seríamos felizes? Acho que não, estamos com a oportunidade de poder quebrar todas estas convenções, e superar a “Ditadura do poder”, onde as decisões são feitas  em nome da nação, da empresa e da religião, e na ora final, existe a troca de interesses,… e ainda cantam o hino nacional…..pode?

    Agora podemos pensar friamente, o que fazem os bastiões da democracia e os “pobres coitados” Ingleses, americanos, judeus e russos…

    Uruguai, Paraguai ,Chile, EUA e países europeus “LIBERARAM A MACONHA” e  o casamento homossexual. É moda discutir a maioridade no Brasil. Será que é bom para nós? Não temos coisas mais importantes para discutir? como saúde, educação e a própria segurança?. Discutimos muito a conseqüência e não causa.

    Parece-me que estes países com todo o pseudodesenvolvimento não são dignos de serem exemplos,

    “Corporativos”

    Neste ambiente a mentira, no sentido amplo, é aceita como normal e o nível de dependência do poder é extremo, que nos sufocam nos levam a uma passividade, baixa iniciativa e delegação para cima,

    Considero que o Feedbacks “claros”, regras de performance e até a meritocracia, são ferramentas do autoritarismo corporativo, assim como as invenções da moda; “Geração Y”, a cultura do compartilhamento de taxi, roupa.   Pergunto?  Quantos empregos estamos gerando?, Cadê a preocupação com as necessidades básicas da população? será que isto não é o mais importante?

    Se todos forem protagonistas, quem será o espectador? Entendo cada um “no seu quadrado” sendo protagonista e ao mesmo tempo sendo espectador, isto é a unidade de valorização da pessoa, e por conseqüência do profissional e do cidadão, ou melhor, primeiro do cidadão e depois do profissional;

    Será que não é o momento de utilizarmos a nossa flexibilidade e a própria indisciplina, para sairmos desta ditadura da modernidade, instituída pelo sistema?

    Este relacionamento esta  nas famílias, religiões e nas empresas,

    Acredito que o brasileiro pode servir de exemplo… a vitória da flexibilidade ,   do jeitinho há moda antiga, da compreensão,  da não violência, onde o mais importante é a consciência. 

     

    Marcos Faria Nicodemos

    Consultor, pós-graduado em finanças pela PUC-RJ

     

     

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