Vai, malandro, por Sergio Saraiva

Por Sergio Saraiva

1º de abril

O artigo de José Padilha na Folha veio no dia certo – 1º de abril – o dia da mentira.

Poderia parecer inútil tecer qualquer comentário sobre “O mecanismo agradece”. Foi escrito com malícia. A começar pelo trocadilho sarcástico do título. Que paradoxalmente é a única coisa verdadeira no texto, além do involuntário da data em que é publicado – primeiro de abril – o dia da mentira.

Ocorre que o texto de Padilha é uma ode à hipocrisia e não poderia ficar sem o devido elogio.

O mecanismo pode ser resumido na “frase-maldição” da Folha de S. Paulo: “é possível contar um monte de mentiras dizendo apenas a verdade”.

O diabo ri dos seus serviçais – colocou Padilha e Folha juntos em um dia 1º de abril  – o demônio é o pai da ironia.

1º de abril – dia em que, no passado, se comemorava a “Revolução de 31 de Março” – a ditadura que nos salvou da corrupção… e do comunismo. O mecanismo agradece.

Mas vamos ao mecanismo.

Padilha brinda-nos com uma análise sociológica. FHC não faria melhor.

“No Brasil, a corrupção … é o mecanismo estruturante da política e da administração pública, um mecanismo que opera … no Executivo e no Legislativo, e também nas cortes judiciais constituídas por indicações políticas”. 

Não fica ninguém de fora – são todos corruptos. Menos a Lava Jato – ela não pertence às cortes judiciais constituídas por indicações políticas”. Repare-se a sutileza.

Moro e Aécio

Esse é o mecanismo; declarar batendo no peito: “não tenho corrupto de estimação”. Nas palavras de Padilha: ” o mecanismo não tem ideologia; ele opera nos governos de esquerda e de direita”.  Mas só investigar um dos lados – e investigar com requintes de crueldade.

Que a Lava Jato tenha se delimitado à corrupção a partir de 2003 – início dos anos petistas no governo federal – e se recusado a investigar as denúncias sobre a corrupção em governos anteriores não parece estranho a Padilha. Nem poderia, ele usou o mesmo truque. Trouxe os escândalos dos governos FHC para dentro do governo Lula – “liberdade poética”. A Lava Jato foi menos cínica – fingiu que não viu.

Padilha não nos permite ilusões: “ora, é inegável que o mecanismo opera no Brasil, e é inegável que os grupos políticos de Temer e de Lula se beneficiaram dele”.

Está faltando alguém em Nuremberg. Onde estão os governos tucanos? Não estão na Lava Jato e não estão na série do Padilha.

Mas Padilha não seria tolo de não ter uma resposta para isso: “se a nova lei de delações premiadas tivesse sido sancionada com o PSDB no poder, os políticos denunciados teriam sido Aécio, Serra e FHC. Mas, como a lei foi sancionada com PT e PMDB no poder, os políticos denunciados foram Palocci, Lula, Cunha, Cabral e Temer”.

Simples assim. Não incomoda a Padilha que a corrupção dos peessedebistas fique sem investigação até que chegue à prescrição. Esse, aliás, é o mecanismo – e o mecanismo agradece. Não ocorreu a Padilha que os “proprietários” sempre pecisarão de capatazes fiéis e que os tucanos – todos sabemos – são bons gerentes? Padilha não e tão ingênuo. Padilha é tropa de elite.

O mecanismo agrade e ri.

“… foi o fato de uma pessoa sem nenhuma experiência política ter chegado à Presidência – [que permitiu que a Lava Jato acontecesse]. Só pode ter sido por falta de traquejo que Dilma Rousseff sancionou, em 2013, uma emenda à lei de delações premiadas que permitiu que acordos de delação fossem celebrados com doleiros, empreiteiros e administradores públicos”.

Ri da ingenuidade dos governos petistas – de Dilma em particular – só os tolos são honestos.

Esse é o mecanismo do Padilha – e é o que temos para hoje.

Poderia aqui citar outro mecanismo – o mecanismo que permitiu o golpe que tirou do poder um governo eleito democraticamente e colocou no lugar títeres patéticos. Tirou do poder um governo que, por liderar um novo polo de poder político na América, incomodava os interesses dos patrocinadores de Padilha. Um mecanismo que destruiu as engenharias naval e de construção pesada brasileiras – com vantagens óbvias para as americanas – investiu contra nossos mais pujantes setores econômicos – as indústrias alimentícia e petrolífera – com vantagens óbvias para as americanas – e contra nossos setores de tecnologia de ponta – o nuclear, incluse. Internacionalizou nossas riquezas naturais – o patrimônio que deixaríamos para nossos filhos. Esse mecanismo tem nome: chama-se “cooperação internacional”.

O mecanismo agrade a cooperação. Agradece os R$ 10 bilhões “repatriados” do Brasil para aos investidores americanos – ressarcimento dos custos. Padilha deve entender o mecanismo; ele é só mais uma engrenagem desse mecanismo, mas também necessita dar lucro. Os investidores são os mesmos.

Em quatro anos de guerra híbrida – a primavera brasileira – transformaram-nos de um país altivo e próspero em uma nova colônia. Exportadores de minérios e produtos agrícolas não manufaturados novamente – com mão de obra abundante e de baixa remuneração.

Mas contar essa história – uma tragédia épica – a morte de uma nação – está acima do talento de Padilha. Resta-nos o “classe B” de Padilha – uma refilmagem de “De volta para o futuro” – para o “Brasil, país do futuro”.

Por fim, Padilha se apresenta como um indignado desiludido: “confesso que esperava mais dos formadores de opinião da esquerda. Pensei que em algum momento da história fossem acordar do estupor ideológico e ajudar pessoas de bem na luta contra o mecanismo que opera no mundo real …”

Cometeu o erro fatal –  uma hora, todo malandro vacila– deixou escapar de que lado está – do lado das ”pessoas de bem”.  Mas, para usar essa expressão – ”pessoas de bem” – tem que vestir camisa amarela, bater panela e de fazer cara de idiota – a bandeira do Brasil nunca será vermelha.

o mecanismo

Era isso que Padilha esperava de nós?

Padilha é um grande ficcionista. Um grande ficcionista com um grande problema; passou a acreditar na ficção que ele mesmo criou. Nela, ele é o “esperto” e os outros são os “otários”. Nada tão incomum assim. É da essência da malandragem o malandro fingir acreditar em si mesmo, mesmo quando ninguém mais acredita.

Vai para casa, Padilha. Teu mecanismo broxou – você agora só come coxinha.

 

PS: Oficina de Concertos Gerais e Poesia – o filme. Breve em um mecanismo próximo de você.

Redação

19 Comentários

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  1. Parabenizo quem consegue ler

    Parabenizo quem consegue ler os textículos desses prepostos dos ricos traidores. Não consigo!

    Minha mulher faz as vezes e resume as indignidades escritas por essa corja.

    Com o golpe entendi e infelizmente comecei a aceitar o fato de alguns países usarem o Paredón contra traidores nacionais.

    Esse conterrâneo faz por merecer, mas quem fará?

    As Forças Armadas que “monitoram” o MST?

     

  2. Esquerdista, segue o teu caminho e deixa o Padilha latir

    Esse filme não vai influenciar em nada a noção que a maioria da população tem do Lula, assim com o filme a Lei é para todos, exceto para os poderosos, desapareceu sem mostrar ao que veio. O povo que vota em Lula não vai assistir a esta série e se assistir e aqueles Lulistas que vierem a assistir não acreditarão no seu conteúdo.

    Eles estão pregando para o coro, isto é, para a classe mérdia que baba de ódio dos pretos, dos pobres, das putas e dos petistas.

    Ignora essa bosta. Ele não nenhum Antonioni nem um Polanski. É um bosta n’água que se alimenta das migalhas do banquete dos vermes.

  3. Tempo de corrupção universalizada-(Marx em Miséria da Filosofia)

    Como diria o Arnaldo Jabaca, a população saqueia cargas de carros acidentados nas estradas, sonega, foge com o processo fiscal contra a globo, buzina em frente a hospitais e escolas, é desonesto intelectualmente mas exige que os polpiticos sejam honestos. Ora, esses políticos vieram da Lula ou do seio da população que segue a globo cegamente?

    Afinal do que esses hipócritas reclamam? Porque acusam os outros dos crimes que eles próprios cometem? Isso é só um mecanismo de defesa, projetar nos outros aquilos que somos, a fim de manter as aparencias e salva as migalhas do banquete burguês?

     

    O filme do Padilha está para a arte cinematográfica assim com a ‘música’ Eguinha Pocotó está para Yesterday, dos Beatles.

  4. Só um reparo: grande ficcionista uma ova.

    As “licenças poéticas” de padilha são tão caricatas e chapa-branca pró-golpe que o colocam ao lado de Ed Wood, como feitor de uma das piores séries, no presente caso fascista e reacionária. Ao lado, não, abaixo. Ed Wood era trash, mas não era maniqueísta.

  5. Caro Sergio Saraiva

    A série mostra o doleiro “Roberto Ibrahim” sendo preso em 2003.

    Olha só: o doleiro Youssef foi de fato preso em 2003, tendo fechado o acordo de delação premiada em 2004. Ou seja, nesse aspecto a série não distorceu os dados.

    A série não diz que as ilegalidades do doleiro começaram em 2003. Ao contrário, diz que o delegado da PF o persegue há anos, deixando claro que a corrupção vem de antes.

    1. Sim, todos os patos amarelos

      Sim, todos os patos amarelos devem ter entendido e obviamente o caso Banestado com desvio de bilhões de dólares foi muito bem detalhado. Obviamente que o diretor mostrou que o juiz era o mesmo da farsajato, que nenhum político foi sequer investigado, que apenas alguns diretores de segundo escalão do banco foram condenados (e absolvidos depois) e que o Presidente do Banestado, o conterrâneo Domingos Tarço Murta Ramalho, cupincha de Jaime Lerner, foi absolvido pelo Moro por “falta de provas”.

       

      https://www.conjur.com.br/2009-dez-24/juiz-absolve-ultimo-acusado-evasao-divisas-banestado

  6. Máfia maçonaria tucana dos inférno! Tomaram os 3 poderes e tudo+

    DO UOL:

    “José Padilha: O mecanismo agradece – 

    Esperava que formadores de opinião da esquerda fossem sair do estupor ideológico e combater o mecanismo de corrupção do mundo real, em vez de se associar a ele para lutar contra o mecanismo exposto na Netflix”

     

    Esse padilha está se achando heim! Está vivendo o estupor dos holofotes. O mané mercenário barato de quinta categoria, acredita que existe otário nas esquerdas para juntarem-se aos otários das direitas, que ele faz parte, e sair gritando por aí “abaixo a corrupção!!”; ou até mesmo para apoiar moro e sua pf no mesmo sentido. Esses manés criam o tal do show combate a corrupção, coisa de otário que acredita que pode acabar com esse tipo de proble interferir / invadindo 4 paredes, e acha que tem gente de esquerda que vai entrar nessa, esquerdistas sabedores que combate a corrupção é com processos administrativos sem shows midiáticos e nem filmes imbecis. Ei padilha! lança um filme aí para chamar o povo a clamar no combate ao estupro, ao aborto e até contra a sua idiotice que todos sabem que não tem como interferir… lamentável…

     

  7. O serra foi delatado, o

    O serra foi delatado, o alkmin foi delatado, o anastasia, esse todo mundo defendeu apesar do ditado “quem anda com porcos……”, e nada aconteceu com eles,

     

    esse mecanismo, eufemismo idiota, é capenga, só lenga lenga nos mesmos moldes da “justiça para tolos”, aliás, para todos………é para enganar trouxas…………………………..

  8. A Farsa e seu farsante
    Não tem como enviar para o painel do leitor e publicar no site do jornal? No painel é claro que não vão publicar mas quem sabe o mecanismo neofascista falha e ops, “olha como somos plurais”.

    Este coitado aprendeu política em algum livreco daqueles ” Brasil para apressados”, “entenda o Brasil em 90 minutos e se torne um intelectual da hora”, repete bobagens que qualquer aluno de ensino médio ruim consegue desmontar seu mecanicinismo.

    Parece aqueles charlatães de borracharia que inventaram a “rebimboca da parafuseta” para enganar trouxa.
    Alguém perguntou pra esse imbecil como um mecanismo apartidário tem fixação oral-anal em único partido? É caso para Freud ou para enquadrar no artigo 171 do código penal?

    Pessoas sérias gastam anos para construir teorias sobre o Brasil, pensam sobre o assunto usando ferramentas pesadas como a crítica dialética, estudam documentos e uma extensa bibliografia para descobrir que foram enganados: basta ir pros EUA copiar truques de montagem de imagem e de repente, são iluminados: Heureca, só pode ser o mecanismo da cara pau para debochar dos idiotas alfabetizados incapazes de raciocínio crítico, e temos um intelectual descolado (que usa touca e imita o sorriso amarelo de canastroes de filme B), da realidade e de qualquer compromisso com algo além do próprio bolso, e por isso agradece, por ter sido levado a sério demais quando é apenas um contrabandista de idéias falsificadas tratado como um comerciante respeitável.
    Isso deve servir para a dessacralização dos objetos culturais. Não é porque se usa um formato consagrado como técnica de produção artística que merece respeito ou atenção.
    É lixo, e não é menos execrável que os bots de rede social porque se pretende um produto artístico.
    O imbecil agradece porque é cínico e sem respeito próprio, um Adam Sandler do cinema pseudo político.
    A Farsa de SP perdeu a noção do ridículo. Até programas de fofocas são mais interessados no contraditório e na busca da verdade que esse panfleto fétido. Ela também agradece que o GGN continue considerando o panfleto um jornal cujo conteúdo importa e lhe dando destaque. É o mantra de gente baixa que faz de tudo para aparecer: fale mal mas fale de mim. O mascate do baú é menos cínico: quem topa tudo por dinheiro? A Farsa e seu farsante mecanicista agradecem o mote e já negociam uma coluna no caderno de cultura sem partido, ex ilustrada, atual “a trollada”.

    Sampa/SP, 01/04/2018 – 12:48

  9. Brilhante texto!!!

    Gostaria apenas de acrescentar algumas coisas:

    “…como a lei foi sancionada com PT e PMDB no poder, os políticos denunciados foram Palocci, Lula, Cunha, Cabral e Temer”

    1- O fato da lei ter sido sancionada no governo do PT em nada impede que se investigue crimes ocorridos anteriormente. Simplesmente é uma desculpa esfarrapada!

    2-Além disso, Serra, Aécio, Alckmin, FHC aparecem sim entre os acusados… e mesmo assim pouco se viu de investigação! Logo, essa teoria é furada!

    3-O tal “mecanismo” não atua nos governo estaduais do PSDB???

    O TAL MECANISMO NÃO CONTA COM UM “BRAÇO MIDIÁTICO” AO QUAL PADILHA ESTARIA VINCULADO???

    Muito curioso um tal “Mecanismo Universal de Corrupção” ocorrer embaixo do nariz de uma imprensa tão crítica, investigativa e radical como a nossa… sem que NUNCA tenha gerado nenhuma desconfiança, só durantes os governos do PT. 

    Essa imprensa era ingênua ou participou do tal mecanismo??? 

     

  10. Deixemos ‘Tropadilha de Elite’ Explicar

    O ‘Tropadilha de Elite’ fez um artigo para municiar as tropas da ‘elite’ (inexistente, na realidade temos a rude e medíocre classe dominante), esses esgarçados patos-sapos do Skaf, passistas amarelos-CBF da Globo e ritmistas de panela & varandão, todos “pessoas de bem & pais de família”. 

    O problema do ‘Tropadilha de Elite’ nessa missão escrita para explicar o filmado, acabou plural, esqueceu o transcendental, “pais de família” e deixou a dupla identidade falha com a “pessoas de bem”, solteira, podendo confundir o eleitorado alvo, na imensa maioria sabidamente incapaz de lidar com a intelecção de texto e esqueceu que, apesar de circundarem espertamente a Petrobras e o periodo pós 2002, as empresas na Petrobras eram as mesmas no “Metrô”, “Roboanel”, etc., em São Paulo, e nos arquivos contábeis das ditas e nas ‘delações premiadas com soltura de prisões infinitas’, brotaram também, Santos, Mineirinhos, Carecas, 500 mil e por aí segue a procissão, pelo jeito ‘Tropadilha de Elite’ de ver e mecanizar o pensamento político, apenas federal.

    ‘Tropadilha de Elite’ não merece nosso tempo, além de holofotes datados e de curta duração, melhor que ninguém, é quem ao explicar, consegue sua mais precisa revelação.

    Sem contar que, “O Mesmanismo”, é uma série ruím de doer, do repetir-se cinematográfico.

    Deixemos então, ‘Tropadilha de Elite’ se explicar…     

  11. Maniqueísmo Padilhista

    Apesar de Nietzsche ter nos convidado a irmos além do bem e do mal, o Padilha ainda é pré-nietzschiano, isto é, ainda está aquém do bem e do mal.

     

    “Os indivíduos mutilados executam os processos descritos por Franz Neumann, em Behemoth, o livro clássico sobre o nazismo: “Aquilo contra o que os indivíduos nada podem – e que os nega – é justamente aquilo em que se convertem.” O mundo da vida aparece sob a forma farsista de um CONFLITO ENTRE O BEM E O MAL, objetivado em estruturas que enclausuram e deformam as subjetividades. A indignação individualista e os arroubos moralistas são expressões da impotência que, não raro, se metamorfoseia em violência. Convencidas da universalidade do seu particularismo, as “boas consciências” distribuem bordoadas nos que estão no mundo exatamente como eles, só que do lado contrário.” – Luiz Gonzaga Belluzzo

     

    O Padilha é um individuo mutilado.

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