Agência Nacional de Águas, um equívoco, por Ivan Bispo

Agência Nacional de Águas, um equívoco

por Ivan Bispo

Em 2003, um grupo de pessoas preocupadas com a situação das águas no município de Cristalina-GO, que conta com uma grande área irrigada por pivô central, criou a Associação Amigos das Águas (AMA), com o objetivo de estimular, propagar o bom uso das águas e participar da gestão de nossos recursos hídricos.

Em 2008, fomos mobilizadores para a instalação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paranaíba (CBH Paranaíba), na região sudeste do Estado de Goiás, quando dedicamos com afinco para que o processo de escolha dos primeiros membros obtivesse, e conseguimos, o êxito almejado e onde depositávamos nossas esperanças de que a gestão seria, enfim, melhorada.

Em 2013, participamos do processo de escolha dos membros do CBH Paranaíba e obtivemos a titularidade para uma das vagas, representando a sociedade civil.

Os membros de órgãos colegiados, da Administração Pública Federal direta, caso do CBH Paranaíba, que teve sua criação prevista na Lei das Águas e o detalhamento feito em Decreto Presidencial, tem direito ao recebimento de diárias, conforme dita o Decreto 5992/06.

Mas, a Agência Nacional de Águas (ANA), após mais de 16 anos de sua criação, ainda não sabe, entendeu ou reconheceu, que o CBH Paranaíba, por ser um ente de Estado, conforme suas próprias publicações, cursos, oficinas, é integrante da Administração Pública Federal direta e sujeito ao cumprimento do normativo federal.

Peticionamos, argumentamos, sugerimos, etc. junto a Entidade Delegatária, ao CBH, a ANA, a Procuradoria Federal, na intenção de esclarecer como se dá o pagamento de diárias aos membros do CBH Paranaíba, porém as respostas obtidas vieram desfocadas.

Nas nossas leituras sobre administração pública anotamos que o Estado tem na sua composição somente os três poderes: Legislativo, Judiciário e Executivo e que sendo o CBH Paranaíba o formulador de políticas públicas, que é uma exclusividade do Estado, inerentes a recursos hídricos da bacia, é, portanto, integrante da Administração Pública Federal direta, pois faz parte do executivo.

A Associação sem fins lucrativos contratada, de acordo com a Lei 10881/04, para prestação de serviços de secretaria executiva do CBH emitiu uma Portaria interna, extrapolando seus poderes, assinada pelo seu Diretor Presidente e o Coordenador Administrativo e Financeiro, onde consta: “Art. 2º – Os membros do Conselho de Administração e do Conselho Fiscal da ABHA, e membros do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paranaíba, que, eventualmente, se deslocarem da sede, por motivo de serviço no desempenho de suas funções, farão jus à percepção de diárias para custeio de despesas com alimentação e pousada, de acordo com as normas estabelecidas nesta Portaria.” Esta Portaria fixa valores e critérios em completa afronta ao normativo federal, pois não cabe a Entidade Delegatária de funções de Agência de Bacia, fixar critérios e valores, para cumprimento pelos membros do CBH Paranaíba, o que criaria uma situação esdruxula, membros da Plenária que emitem deliberações e moções para cumprimento pela Entidade Delegatária, sujeitando-se a ditames da Diretoria da mesma, foi quando nasceu e permanece até hoje o problema sem solução que a ANA como apoiadora e estimuladora para criação de comitês de bacia ainda não regulamentou.

A Auditoria Interna da ANA também foi instada a pronunciar sobre irregularidades no pagamento de diárias no CBH Paranaíba, dizendo, a nosso ver equivocadamente, que: “Por último, esclarecemos que esta Agência não interfere na administração daquela associação de direito privado, quando no cumprimento das suas competências legais, respaldada pelo Contrato de Gestão 006/ANA/2012 e os normativos pertinentes.” No nosso entendimento é obrigação da ANA fiscalizar o fiel cumprimento das cláusulas contratuais e a aplicação correta  dos normativos federais pela Entidade Delegatária, que é, meramente, uma contratada pela ANA para exercer o papel de secretaria executiva do CBH, sem nenhum poder de decisão e nenhuma ascenção sobre os membros da Plenária do Comitê;

Solicitamos também o parecer da Superintendência de Apoio ao Sistema da ANA, quando perguntamos: 1 – Se o CBH Paranaíba é um órgão colegiado integrante da administração pública federal? E obtivemos a seguinte resposta: “Em complemento, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH em sua Resolução nº 5, de 10 de abril de 2000, estabelece “diretrizes para a formação e funcionamento” dos CBHs, definindo-os no art. 1º, § 1º, como “órgãos colegiados com atribuições normativas, deliberativas e consultivas a serem exercidas na bacia hidrográfica de sua jurisdição”. Não obstante, essa configuração normativa não autoriza considerar um CBH como integrante da Administração Pública, portanto entende-se como negativa a resposta à questão 1.” É possível um ente de estado não fazer parte de um dos três poderes que o constitui? Entendemos que o CBH Paranaíba, um ente estatal, tem obrigatoriamente de estar em um dos três poderes, in casu, no executivo que é a administração pública federal e só por mágica estaria ele excluído ou fora.

A Procuradoria Federal junto a Agência Nacional de Águas, também pronunciou, num despacho, a nosso ver, confuso e inconcluso. Onde lemos: ” não existe submissão do CBH Paranaíba e da Entidade Delegatária ao Decreto 5992/06”. E ainda, “… concluindo que o valor pago a título de diárias, a colaborador eventual de CBH pode ser regido por norma interna do órgão, não podendo, entretanto, superar o que seria pago com base nos critérios estabelecidos no Decreto 5992/06. Este, portanto, servirá como teto para referida despesa, em atenção ao princípio da economicidade, não se admitindo a adoção de valores superiores, ainda que fixados em deliberações internas aprovadas pelo Comitê.”  Notamos uma confusão entre membro de CBH e colaborador eventual. E o CBH Paranaíba, como ente estatal e integrante do poder executivo ou administração pública federal, tem, obrigatoriamente, que seguir o Decreto 5992/06 que dispõe sobre a concessão de diárias no âmbito da administração federal direta, autárquica e fundacional, senão seria aberta uma exceção para que o Comitê não cumprisse o estatuído.

Existe uma dicotomia entre entidade delegatária e comitê de bacia hidrográfica e o Tribunal de Contas da União respondendo a uma consulta da Presidência da Câmara dos Deputados, não deixa dúvidas: “De fato, as receitas decorrentes da cobrança pelo uso da água em rios de domínio da União de que tratam os incisos I, III e V do art. 12 da Lei 9.433/97 não são recursos orçamentários da ANA, que apenas as arrecada e as repassa às entidades delegatárias. Assim, não se pode dar a tais repasses o mesmo tratamento destinado aos recursos voluntariamente transferidos às entidades delegatárias, cuja aplicação está sujeita às restrições previstas na legislação que trata de convênios e instrumentos análogos. Já as receitas da cobrança pelo uso da água pertencem, em última instância, aos comitês das bacias hidrográficas em que foram arrecadadas. ”

Há mais de dois anos e meio venho tentando resolver a questão, mais tenho encontrado muita empáfia, arrogância, achismo e pouca vontade de solucionar da Entidade Delegatária, do CBH e da ANA que durante esse período poderia muito bem ter consultado o Conselho Nacional de Recursos Hídricos ou o Ministério do Meio Ambiente e/ou a Secretaria de Gestão de Pessoas e Relações do Trabalho no Serviço Público do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

Agora só nos resta ir à Justiça, com pedido de perdas e danos morais, simplesmente porque a ANA não conseguiu emitir uma resolução disciplinando o pagamento de diárias a membros de comitês de bacia hidrográfica e dirigentes e empregados de entidades delegatárias, o que é sua obrigação legal.

Ivan Bispo

Presidente da Associação Amigos das Águas

Membro do CBH Paranaíba

Secretário do CBH Corumbá, Veríssimo e

Porção goiana do São Marcos

Redação

1 Comentário

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  1. Diária
    Prezado Bispo, receba meus sinceros votos de sucesso e respeito especial a iniciativa e atitude por suas insistente busca pela melhoria e transparência do sistema de gestão RH, embora que, por se tratar de um assunto que envolve valores monetários, tenha recebido tamanha desconfiança e pouca consideração ao tema e a vossa representatividade… Seja qual for a decisão futura da Justiça servirá no mínimo para elucidar este e outros pontos obscuros da relação da ANA para com os comitês e suas respectivas delegatárias.

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