No dia de hoje…

A morte de Lamarca foi imediatamente admitida (e comemorada) pela ditadura militar, mas a de Iara Iavelberg permaneceu até 2006 com a versão de que teria se suicidado durante o cerco que sofreu em um apartamento em Salvador/BA.

da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos

No dia de hoje…

Em 11 de junho de 2006, mais de 30 anos após sua morte, os remanescentes ósseos de Iara Iavelberg, judia, foram finalmente transferidos da ala dos suicidas para serem enterrados com honras religiosas, após uma cerimônia celebrada pelo rabino Henri Sobel, no Cemitério do Butantã, em São Paulo/SP.

Até o ano de 2003, a família Iavelberg convivia de maneira inconformada com a versão de suicídio para a morte de Iara. Ela era uma jovem alegre, cheia de ideais e que tinha partido para a Bahia em 1971 justamente para preservar sua vida e realizar o sonho de ser mãe. Contudo, ela e seu então companheiro, Lamarca, foram caçados e vitimados pela Operação Pajuçara das forças repressoras.

O casal, que precisava se esconder em cidades diferentes na Bahia, fazia planos de se encontrar e viver juntos, mas isto nunca aconteceu. Iara foi morta em 20 de agosto, sendo que sua morte permaneceu em sigilo. A notícia foi dada somente depois da morte de Lamarca, em 17 de setembro.

A morte de Lamarca foi imediatamente admitida (e comemorada) pela ditadura militar, mas a de Iara permaneceu até 2006 com a versão de que teria se suicidado durante o cerco que sofreu em um apartamento em Salvador/BA.

Como de costume na cultura judaica, a versão dos fatos levou Iara a ser enterrada na área dos suicidas do cemitério. Apenas em setembro de 2003 a família conseguiu realizar a exumação para perícia do corpo. O exame concluiu que não era possível assegurar que se tratava de suicídio. A CEMDP, ainda na década de 1990, quando da apreciação do requerimento dos Iavelberg, já havia levantado a possibilidade de o episódio não ter se tratado de suicídio, a partir do que havia sido possível apurar por relatos de testemunhas.

Iara nasceu em 7 de maio de 1944 e casou-se pela primeira vez muito cedo, aos 16 anos, um pouco antes de ingressar no curso de Psicologia na Universidade de São Paulo, onde além de estudar também atuou no Teatro da USP e presidiu a Associação dos Estudantes de Psicologia. Apaixonada por artes e política, dividiu seu tempo entre as sessões da Cinemateca Brasileira e as reuniões da Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop). Também foi militante da Vanguarda Armada Popular Revolucionária (Var-Palmares), transformada posteriormente em Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8).

No ano de 2014, em busca de entender a história de sua tia, e também a sua e de sua família, Mariana Pamplona, sobrinha da militante, lançou um filme. “Em busca de Iara” revela não somente a figura potente da jovem estudante de Psicologia, como também a saga da família em busca de respostas sobre as circunstâncias de sua morte.

Como dito acima, essa resposta chegou apenas em 11 de junho de 2006, quando Iara finalmente recebeu um sepultamento digno de sua religião e de sua história.

“Para que não se esqueça, para que não se repita.”
———

As cartas de amor entre Iara e Lamarca são famosas pelo seu conteúdo sofrido e ao mesmo tempo esperançoso. Em véspera de um Dia dos Namorados, é impossível deixar de homenagear esse aspecto da vida de tantos e tantas jovens que tiveram suas vidas ceifadas em busca de um país melhor para os menos favorecidos.

Por isso, pedimos licença para acrescentar ao texto de hoje parte da letra da música “Sem Fantasia” de Chico Buarque, que nos parece refletir perfeitamente os sentimentos desses corajosos casais.

“Ah, eu quero te dizer
Que o instante de te ver
Custou tanto penar
Não vou me arrepender
Só vim te convencer
Que eu vim pra não morrer
De tanto te esperar

Eu quero te contar
Das chuvas que apanhei
Das noites que varei
No escuro a te buscar
Eu quero te mostrar
As marcas que ganhei
Nas lutas contra o rei
Nas discussões com Deus
E agora que cheguei
Eu quero a recompensa
Eu quero a prenda imensa
Dos carinhos teus”

———-
INFORME

Os textos “No dia de hoje… para que não se esqueça, para não se repita” são de responsabilidade das pessoas que administram a página da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.
Baseado em fontes como Wikipedia e Relatórios finais de Comissões da Verdade, ele compõe um conjunto de publicações que estão sendo feitas diariamente entre 10.06 e 24.06.2019, na página do evento “Vozes do Silêncio contra a Violência de Estado”, como forma de divulgação e preparação para o ato.
Neste texto de 11.06, colaborou: Paula Franco.

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