Enquanto o decreto para recriar a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos aguarda a assinatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o programa TVGGN Justiça recebeu, na última sexta-feira (3), três especialistas em investigação dos crimes cometidos durante a ditadura militar para falar sobre a importância de revisitar casos e revelar as atrocidades cometidas enquanto os militares estavam no poder.
Professor da Faculdade e do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Pará (UFPA), Gilberto Marques conta que atualmente um dos grupos está investigando os desdobramentos do caso Volkswagen, em que um conjunto de sindicalistas apurava a relação da montadora com a ditadura, conseguiu comprovar essas vinculações a partir de depoimentos de trabalhadores torturados dentro da fábrica da Volkswagen.
Em função disso, a empresa teve de fazer um termo de ajustamento de conduta para evitar uma repercussão maior do caso. “Desse termo, ela teve de pagar um valor, um determinado montante, e a parcela teve destinação diversas desse montante, inclusive para pagar as vítimas, uma pequena parcela foi destinada para estimular outras investigações.”
Além da montadora, outras 12 empresas estão sob investigação, entre elas o jornal Folha de São Paulo, Fiat, Petrobrás, Josapar (que produz o arroz Tio João), e Embraer.
Mas um dos casos mais emblemáticos é o da Aracruz Celulose, do Grupo Paranapanema, que teve “um rastro de violação terrível particularmente na Amazônia”, segundo Marques.
“A vinculação das empresas com a ditadura rendeu muitos ganhos para elas, mas por outro lado foi acompanhada de um conjunto de violações contra trabalhadores em geral. No caso da Paranapanema, foi contra povos originários, eles tomaram territórios. Inclusive a investigação da Aracruz, conduzida pela professora Joana Darc, mostrou que alguns desses indígenas que se rebelaram contra a ditadura eram enviados para o presídio Guarani”, continua o professor.
Apuração
Nilmário Miranda, assessor especial de Defesa da Democracia, Memória e Verdade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), também participou do programa e comentou que, em maio de 2023, 728 vítimas da Operação Condor (campanha de repressão política e terror de Estado levada a cabo pelas ditaduras de direita do Cone Sul, com o apoio dos Estados Unidos) se reuniram na Esma.
O evento teve como objetivo reunir os representantes de países em que a operação esteve em vigor, a fim de reiterar apoio e cooperação para o avanço das investigações.
O grupo teme, porém, que a Argentina não permaneça no acordo após a eleição de Javier Milei. “Mas vamos continuar, é um trabalho lento, mas que não pode deixar de ser feito”, comentou Miranda.
Importância
Até o momento, a Comissão da Verdade indicou que a ditadura fez 434 vítimas, entre mortos e desaparecidos. Este número, porém, é “uma gota no oceano”, segundo Gilberto Marques, tendo em vista que deste total, 41 pessoas seriam camponesas.
Mas, de acordo com o levantamento do pesquisador colaborador da Universidade de Brasília (UnB) e ex-preso político Gilney Viana, 1.654 camponeses foram mortos ou desapareceram do golpe de 1964 até a promulgação da Constituição, em 1988.
O massacre foi ainda maior entre os povos originários. Estima-se que cinco mil indígenas da tribo Cinta Larga foram mortos pelos militares. Entre os Jiahui, de mil indígenas sobreviveram ao regime apenas seis.
“É o massacre direto, é o bombardeio, é o assassinato, é a disseminação de doença, como foi o caso do sarampo. A mais terrível de todas foi o sarampo, que contagiou aldeias inteiras. Os que estavam vivos não tinham forças para enterrar os mortos que estavam se decompondo”, contou Gilberto Marques.
O programa contou ainda com a participação de Leo Alves, integrante do coletivo Filhos e Netos Memória Verdade e Justiça, que contou a história do avô Mario Alves de Souza Vieira, desaparecido pela ditadura em 1970.
Confira o debate completo na TVGGN:
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Nassif estou chocado?Pq tanto indígena morreu ?