A Estranha Política para o Fomento de Pesquisa Praticada pelo CNPq, por Fábio de O. Neves

A nomeação do professor Ricardo Galvão, juntamente com a Ministra Luciana Santos, foi inicialmente vista como um sinal positivo.

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A Estranha Política para o Fomento de Pesquisa Praticada pelo CNPq

por Fábio de Oliveira Neves

A política de fomento à pesquisa do CNPq tem sido alvo de críticas devido à sua abordagem peculiar. Durante a transição do governo Bolsonaro para o Governo Lula, havia uma esperança de melhoria nos financiamentos para os laboratórios universitários, apesar dos desafios enfrentados devido à implementação de políticas liberais nos governos anteriores, especialmente durante o governo Temer e o aprofundamento dessas políticas no governo Bolsonaro.

A nomeação do professor Ricardo Galvão, juntamente com a Ministra Luciana Santos, foi inicialmente vista como um sinal positivo. No entanto, as preocupações surgiram devido às limitações orçamentárias. Esperava-se que, pelo menos, o financiamento de bolsas para novos pesquisadores fosse ampliado, proporcionando alívio para os mais de 60 mil pesquisadores desempregados devido às políticas anteriores.

Entretanto, o primeiro edital lançado no final do ano passado (32/2023), inicialmente programado para encerrar em novembro, foi prorrogado até janeiro de 2024. Apesar dos esforços dos pesquisadores para atender aos requisitos do edital, incluindo a busca por supervisores e melhorias rápidas em seus currículos, um ponto crítico tornou-se evidente. O critério de avaliação G, relacionado ao doutorado pleno no exterior (GDE), acabou por prejudicar praticamente todos os novos doutores brasileiros. Esse critério favorece os pesquisadores com doutorado realizado no exterior, enquanto aqueles que realizaram seus estudos no Brasil, mesmo em meio à pandemia, são penalizados. [Leia explicação do CNPq aqui]

A celebração deste edital pelo CNPq (como consta em seu web site) parece ser irônica, já que perpetua uma política excludente. Para um pesquisador brasileiro obter uma bolsa, não basta atingir a nota máxima; seu supervisor e a instituição de ensino também devem ser avaliados de forma positiva, criando uma competição desigual com pesquisadores estrangeiros já que eles têm um gatilho com pontuação extra.

Além disso, essa política parece favorecer pesquisadores que residem em outros países, oferecendo bolsas que excedem em mais do que o dobro o valor disponibilizado para pesquisadores brasileiros, como o programa “Programa Conhecimento Brasil”. Essas bolsas incluem benefícios como auxílio previdência e seguro saúde, mesmo tendo o SUS, além, claro, das despesas de capital de demandas, pontos estes que sempre foram objeto de luta para os pesquisadores no Brasil.

A exaustão é generalizada entre os pesquisadores, que frequentemente trabalham mais de 40 horas por semana. Muitos se sentem presos nesse ciclo de pesquisa, pois concluem seus estudos de pós-graduação após os 30 anos. A comunidade acadêmica está desanimada, pois percebe que essa política exclui aqueles que estão dedicados à pesquisa no Brasil.

Muitos pesquisadores agora recorrem a trabalhos informais, como motoristas de aplicativos ou entregadores, para sobreviver. Eles trabalham incessantemente na esperança de publicar artigos e, assim, melhorar suas chances de obter financiamento em editais futuros, mesmo que já tenham passado dos 35 anos.

Embora a pesquisa brasileira continue, está cada vez mais limitada a uma elite, excluindo a grande maioria dos pesquisadores do país.

Fábio de Oliveira Neves – Biotecnologista UNIFAL/MG. Mestre em Ecologia e Tecnologia Ambiental UNIFAL/MG. Doutor em Ciências Ambientais UNESP/Sorocaba

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4 Comentários

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    1. Olá,
      Todos os programas e editais quem vem sendo abertos pelo CNPq, nesta gestão, tem o intuito de estimular a volta de pesquisadores. Com os dois editais abertos tanto o 32/2023 (este com fomento para pesquisa interna), quanto o programa conhecimento brasil este específico para os doutores do exterior. É importante reconhecer que essas iniciativas podem inadvertidamente sugerir uma hierarquia entre pesquisadores estrangeiros e nacionais.
      Concordo plenamente que todos os pesquisadores, independentemente de sua localização geográfica, contribuem significativamente para o avanço do conhecimento científico. É essencial garantir que os pesquisadores brasileiros recebam o devido reconhecimento e apoio, e que não sejam considerados inferiores aos seus colegas estrangeiros.
      Não adianta incentivar o retorno de pesquisadores sem assegurar oportunidades de trabalho para aqueles que já estão no país. No grupo de pesquisa em que atuo, tenho testemunhado diversas propostas de saída tanto para mim quanto para outros alunos. Essa situação cria uma espiral onde alguns são atraídos, mas muitos acabam deixando o país

    2. A política salarial para MD, PhD, e pós PhD, tem que ser boa para todos, tornando-se atrativas até para os cientistas formados em outros países.

  1. Olhando por fora, como um leigo que não faz parte da academia, tenho uma impressão de residir nisso certo viralatismo, mesmo em se tratando de pessoas altamente gabaritadas. Aí, fica só uma impressão mesmo.
    O que realmente acho que faz mais sentido eu pensar é que, mesmo que falemos de incentivos científicos visando “repatriar” nossos cérebros, penso que afora as questões problemáticas expostas pelo professor, temos também a falta de um planejamento contundente no país que propicie aos cientistas aplicar seu conhecimento em função do desenvolvimento do país! Basta ver o quão pouco investimos em desenvolvimento e tecnologia no geral! O que quase sempre faz com que o Brasil, além de investir poucos em tecnologias importantes para o nosso desenvolvimento, investe em um time terrivel. Enquanto falamos de, sei lá, investir R$2bi para o desenvolvimento de semicondutores, a China investe praticamente um dinheiro infinito nisto. Se não houver uma ideia de desenvolvimento que abranja toda a cadeia de produção cientifica, desde o financiamento a pesquisas até o desenvolvimento do produto e que perpasse toda uma elaboração do sistema de patentes e segurança, não só estaremos excluindo àqueles que se aplicam dentro do país, como estaremos realizando um esforço inútil ao país e com recursos muito mal empregados. Enquanto escrevo, ocorre-me que a maioria das Universidades no Brasil hoje, sequer tem um sistema seguro no repasse de e-mails, onde armazenamos em provedores internacionais toda a nossa produção acadêmica.

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