Raio X do comércio com a China e a diplomacia fundamentalista bolsonariana, por Luis Nassif

Não se trata apenas de excentricidades de circo. Mas de um atraso que vai se consolidando, enquanto se tolera a manutenção do imbecil coletivo no governo.

A desmoralização internacional do país, pelo governo Bolsonaro, não tem implicações apenas morais. A respeitabilidade centenária do Itamarati está sendo corroída por um Ministro aloprado. Há uma reorganização internacional da economia, mudanças radicais no modelo de industrialização, o embate feroz entre dois gigantes – Estados Unidos e China =, políticas protecionistas sendo implementadas pelas maiores economias, e a única estratégia brasileira é um acordo com Israel que unifique as religiões cristãs permitindo a volta do Salvador.

As definições de política comercial de um país começam pela análise dos indicadores de comércio para, a partir deles, montar as estratégias comerciais, que vão desde acordos bilaterais até a promoções comerciais. É uma política que exige pleno conhecimento dos interesses nacionais e dos interesses dos parceiros, para se obter os melhores acordos.

Quando se compara a complexidade das políticas comerciais com as conversas de Jair Bolsonaro com Donald Trump ou com os arrufos fundamentalistas do chanceler Ernesto Araújo, percebe-se que o país está totalmente fora do jogo.

De qualquer modo, uma análise da balança comercial permite identificar estratégias óbvias, que serão retomadas assim que os fanáticos se apearem do poder.

O fator China

A China é um parceiro comercial importante, país com quem o Brasil ostenta o maior saldo comercial, de US$ 30 bilhões no acumulado de 12 meses até abril de 2019, e com crescimento consistente desde outubro de 2015.

É de longe o maior saldo comercial e o maior destino das exportações brasileiras. Confira o acumulado de 12 meses até abril.

Mesmo assim, a pauta de exportações brasileiras para lá é extremamente pobre, sendo basicamente de produtos primários. Enquanto as importações brasileiras da China são de produtos de alto valor agregado.

Comparativamente, a pauta de exportações brasileiras para os Estados Unidos é muito mais diversificada, com preponderância de produtos semimanufaturados de ferro, manufaturados, máquinas e aparelhos de terraplanagem. Enquanto as importações brasileiras são de produtos de baixo valor agregado além de uma gama relevante na categoria de “demais produtos”.

Aliás, quando se analisa a pauta de exportações de manufaturas brasileiras (os produtos de maior valor agregado) percebe-se a relevância dos mercados vizinhos da América do Sul.

É só conferir a pauta de exportações para a Argentina.

As estratégias

A partir daí, governos inteligentes teriam um corredor pela frente para definir as estratégias de políticas comerciais.

Com os Estados Unidos, por exemplo, haveria a necessidade de acordos que blindassem os produtos brasileiros da alta de tarifas de importação anunciadas pelo governo Trump. Em vez disso, Bolsonaro se contentou com a promessa vaga, talvez, quem sabe, de apoio de Trump ao ingresso do Brasil na OCDE. Qual o ganho que o país teria com esse ingresso? Nenhum.

Em relação à China, há um interesse estratégico pelas matérias primas brasileiras. Mas que isso, pela exploração dos mercados de energia, de alimentos e minerais. Em outros tempos, governos mais inteligentes se valeram da disputa de hegemonia entre nações para conseguirem grandes saltos no desenvolvimento brasileiro. Vargas conseguiu a Companhia Siderúrgica Nacional e os planos da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos.

Em um momento de profundas transformações tecnológicas, com os gigantes chineses de tecnologia buscando alianças no Ocidente, uma estratégia inteligente poderia arrancar concessões relevantes, ou da China ou dos EUA. Em um mundo em que os maiores países, como Estados Unidos, China e Alemanha, montam políticas industriais visando fortalecer a produção interna, a burrice diplomática só tem olhos para o acordo final com Israel, que abriria espaço para o fim do mundo e a salvação das almas.

Não se trata apenas de excentricidades de circo. Mas de um atraso que vai se consolidando, enquanto se tolera a manutenção do imbecil coletivo no governo.

Luis Nassif

7 Comentários

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  1. Sinceramente, nesse campo impera o faça o que eu digo, não faça o que eu faço…..

    Basta assistir ao documentário O rei leão e o cantor desconhecido pra entender como as coisas são…..burros, canalhas e entreguistas, só os daqui……….

  2. Quanto maior a demora pra entender os significados do antipetismo, maior a surpresa e a perplexidade com esse bando de malucos.

    A bússola desses tarados é simples: se o PT, PT, PT é a favor, são contra; se o PT, PT, PT é contra, eles são a favor; se o PT, PT, PT fez, desfaz. E por aí vai…

    Não precisa nem ter noção de COISA NENHUMA!

    Enguliram umas pilulas de “liberalismo”, deu um “barato”, e foram aceitos na festa dos sedizentes “liberais” (que jamais deram uma palavra sobre DHs)… Agora vem a ressaca.

    Mas eles vão se entender, Nassif. O antipetismo ainda os une.

    E a coisa vais sendo empurrada com a barriga, como foi o final da ditadura, como foi o governo Sarney… Vale tudo e qualquer coisa para que qualquer que seja a representação popular ela não tenha vez nem voz.

    Em breve, até o setor primario vai ser entregue também, e o pessoal vai viver da renda do Estado “minimo” (que quer dizer “pra poucos”).

  3. Nassif, então você não sabe que “o sangue de Cristo salva”. Tem que perseverar. O Lemann perseverou e vai levar a Eletrobrás por uns trocados. O Bradesco, o Safra, o Itaú perseveraram e vão levar a capitalização. O Moro e o Gebran perseveraram e vão levar uma vaga no STF. Os pobres perseveraram e a parte mais adulta vai levar chumbo, os mais velhos vão se alimentar de luz com a novidade do brejo da cruz. A coisa está tão feia que até Jesus Cristo já subiu na goiabeira pra ver se a terra é plana.

  4. Nassif o Ernesto é coisa mandada,Olavo é sionista(defensor dos banqueiros)e aliado de Bannon/EUA ,eles falam de conspiração mas a conspiração são eles ,sempre trabalham com DIVERSIONISMO,acusam os outros do q eles próprios são,tive a certeza de q o alvo são as Instituições brasileiras com o ataque de Olavo(a mando de Bannon/Cia)aos militares (última instituição com alguma credibilidade)veja tb q Guedes desestrutura todo o Brasil na questão econômica,isto é proposital,aí fica fácil fácil para os banqueiros(Rockfellers e Cia)dominarem tudo,os bancos/rentistas/financistas não vão querer o país próspero nem a pau,os fatos estão aí e muitas vezes é difícil de enxergar pq há muita informação e diversionismo/cortina de fumaça mas eu daqui debaixo vejo tudo com estes meus óculos !!

  5. Assistindo hoje, o dia que acabou na China, onde, bravamente, o Mourão sobe as escadas chinesas junto com a sua comitiva e é educada e sardonicamente recebido pelas autoridades, percebi que o chefe de estado e de governo é o Mourão.
    Ao Bozo, como a qualquer palhaço, cabe divertir a platéia para a manutenção do circo.
    Mais que isso, põe a público a queda iminente do mandatário danação, já que a figura de um confiável governante tenta se fazer lá fora pela presença do Mourão.

  6. ENQUNTO ISSO, NO OUTRO MUNDO DA REALIDADE PARALELA VIRTUAL QUE FOI PROMETIDA COMO REDENÇÃO DO SÉCULO XXI

    DO BLOGUE DA BOITEMPO, recebido por email (original em https://blogdaboitempo.com.br/2019/05/23/a-terceira-guerra-mundial-ja-comecou-e-a-gente-nem-se-deu-conta/)

    “A Terceira Guerra Mundial já começou e a gente nem se deu conta!

    Se alguém souber de um planeta disponível, me avise. Quero ir pra lá. [Minha resposta ao professor: Acho melhor ouvirmos e organizarmos o povo para salvar esse aqui mesmo, pois se houver outro habitável, os senhores da guerra tratarão de ocupar primeiro até destruirem, de novo e de novo. Não tenhamos medo do poder do povo de boa vontade, e da revolução!)

    Publicado em 23/05/2019 // 1 comentário

    Slim Pickens, no papel do major Kong, em fotograma do filme Dr. Fantástico (1964), de Stanley Kubrick.
    Por Flávio Aguiar.

    Estávamos acostumados com as guerras convencionais. A Alemanha invade a Polônia. E a catástrofe começa. Este é apenas um exemplo. Agora, a catástrofe já começou. E a gente nem se deu conta.

    A cena geopolítica de hoje é dominada pela beligerância do governo norte-americano, que cada vez mais se parece com uma guerra de todos os tipos contra tudo e contra todos.

    Washington promove uma guerra híbrida contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela e uma campanha pela desestabilização dos governos de Cuba e da Nicarágua, depois da bem sucedida campanha de ajuda por grupos de mídia especializados em fake news para eleger Bolsonaro e para fomentar o afastamento de Lula da corrida presidencial, através da Lava Jato.

    Ao mesmo tempo, promove uma guerra eletrônica contra a empresa de telecomunicação Huawei, da China, proibindo sua atuação nos Estados Unidos, incitando aliados tradicionais a fazerem o mesmo. É a nova Guerra Fria. A quente.

    Empresas norte-americanas já concordaram em vetar o acesso por parte da empresa da China ao apoio técnico por parte de seus produtos e sistemas. O governo norte-americano acusa a empresa de espionagem em favor do governo chinês.

    Contra este os Estados Unidos promovem uma dura guerra fiscal contra a China, sobretaxando produtos de exportação deste país. Além disto, a ofensiva tecnológica dos EUA contra a China já é um ato de guerra, na frente do cyberspace, onde os futuros conflitos serão decididos. Tropas de ocupação continuam a ser fundamentais. Mas é necessário desarticular antes o inimigo. Antes isto se dava através de bombardeios. Mas na Idade Média era fundamental isolar o adversário, cercando suas cidades. Hoje este cerco vai se dar no campo virtual. Pelo menos nas brigas de cachorro grande como EUA x China.

    No Oriente Médio, enquanto o presidente Trump declara não querer uma guerra, seu governo promove uma enorme escalada de presença militar, com o deslocamento de porta-aviões, bombardeiros e ameaça de deslocamento de tropas terrestres, cujo objetivo é conter o que vê como uma influência indevida do Irã na região e uma ameaça a “seus interesses” nela. Esta escala contra o Irã tem como objetivo também atender os interesses dos dois grandes aliados dos Estados Unidos na região, Israel e a Arábia Saudita, que não se cansam de propalar a sua contrariedade em relação ao regime de Teerã.

    Essa escalada, bem como a guerra eletrônica contra a Huawei, tem um efeito colateral importante, que é o de aumentar a pressão sobre os países empresas da União Europeia, cuja força, sobretudo a da Alemanha, Trump não vê com bons olhos. A pressão visa cortar os laços comerciais da União com o Irã, já abalados pelas sanções econômicas que vetam negócios de empresas com o Irã, e a presença da Huawei na Europa.

    É verdade que até o momento essa beligerância geopolítica de Washington têm tido pouco sucesso completo. A exceção fica por conta da bem sucedida operação combinada entre os efeitos da Lava Jato e a eleição de Bolsonaro, domesticando, por assim dizer, o Brasil.

    Os Estados Unidos ainda não conseguiram derrubar o governo de Maduro, nem abalar os da Nicarágua e Cuba. O fundador da Huawei chinesa, Ren Zhengfei, declarou que sua empresa estes em condições de enfrentar esta nova guerra eletrônica e continuar suprindo os usuários de seus aparelhos com aportes que substituam o apoio e a as tecnologias das empresas norte-americanas. Muitos dos tradicionais aliados dos Estados Unidos na Europa recusaram-se, até o momento, a banir os produtos da Huawei de seus mercados.

    Por fim, a presença militar norte-americana tendo por alvo o Irã, por ora, fica no campo das ameaças, embora não se possa banir de todo a hipótese de uma tentativa de guerra convencional.

    Há três interpretações correntes para esse estado de beligerância permanente provocado pelas iniciativas de Washington. A primeira diz que ela parte de uma redefinição estratégica da política externa de Washington, que visa reafirmar os Estados Unidos como maior potência militar da história da humanidade, num momento em que sua posição de hegemonia econômica não mais se sustenta devido, sobretudo, a presença da China. A segunda insiste na necessidade do governo de Trump necessitar deste clima guerreiro em várias frentes para assegurar a reeleição do presidente em 2020, combinada com a guinada fundamentalista com tintas religiosas promovidas pelos falcões Mike Pompeo e John Bolton. Por fim, a terceira, e a mais provável, combina as duas anteriores.

    Por ora, como já se disse, estamos no campo das ameaças. Mas pode ser que a combinação destas duas tendências explosivas leve de fato a algum conflito armado em algum daqueles recantos do globo. Enquanto isto, Bolsonaro e Ernesto Araújo brincam de política externa, como se isto fosse um joguinho de mesa, no tabuleiro de suas casas.

    Se alguém souber de um planeta disponível, me avise. Quero ir pra lá.

    ***

    Flávio Aguiar nasceu em Porto Alegre (RS), em 1947, e reside atualmente na Alemanha, onde atua como correspondente para publicações brasileiras. Pesquisador e professor de Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, tem mais de trinta livros de crítica literária, ficção e poesia publicados. Ganhou por três vezes o prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro, sendo um deles com o romance Anita (1999), publicado pela Boitempo Editorial. Também pela Boitempo, publicou a coletânea de textos que tematizam a escola e o aprendizado, A escola e a letra (2009), finalista do Prêmio Jabuti, Crônicas do mundo ao revés (2011) e o recente lançamento A Bíblia segundo Beliel (2012). Seu mais novo livro é O legado de Capitu, publicado em versão eletrônica (e-book). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às quintas-feiras.”

    Sampa/SP, 23/05/2019 – 15:25

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