Fatos X Narrativas sobre o PL 1581/2020, por Orlando Silva

Mas vamos ao mérito da votação do PL 1581/2020 e a emenda nº 1, vendida por aqueles que nos atacam como uma isenção bilionária a templos religiosos.

Fatos X Narrativas sobre o PL 1581/2020

por Orlando Silva

Nos últimos dias, eu, meu Partido e lideranças de outras legendas temos sido alvo de uma campanha de ataques nas redes sociais capitaneada até por setores da esquerda. Entre as mensagens, há pessoas bem intencionadas e verdadeiramente preocupadas em debater; e outras mais interessadas em disseminar a confusão para obter dividendos políticos e eleitorais.

Esse texto se destina ao primeiro grupo, incluídos aí eleitores, amigos e gente que, mesmo tendo outras opções políticas, acompanha e respeita o trabalho que procuro realizar. Com estes, me sinto apto a estabelecer o diálogo.

O método usado agora não foge muito do já consagrado nos linchamentos virtuais, que objetivam, na palavra da moda, “cancelar” determinadas figuras públicas. Para tanto, distorções factuais e simplificações maniqueístas são usadas para criar uma narrativa parcial e difundir um efeito manada de ataques.

No centro da controvérsia, uma votação ocorrida no Congresso e requentada para causar “escândalo” 20 dias depois. A mando de quem e com quais objetivos, não se sabe. Apenas registro que a campanha foi iniciada 3 dias após a convenção que oficializou minha candidatura a prefeito. Mistérios que moram longe.

Mas vamos ao mérito da votação do PL 1581/2020 e a emenda nº 1, vendida por aqueles que nos atacam como uma isenção bilionária a templos religiosos. A premissa não é verdadeira, como bem destaca a nota da liderança do PCdoB: “o texto aprovado não trata da tributação ou de perdão de dívidas de pessoas físicas relacionadas a essas igrejas. Nem perdoa fraudes porventura existentes. Regula a imunidade já garantida pela Constituição, e alcança todas as denominações religiosas”.

A saber, o artigo 150, inciso VI, alínea b da Constituição Federal veda expressamente à União, estados e municípios instituir impostos sobre templos de qualquer culto. Lido este dispositivo em conjunto com o artigo 5º, inciso VI, que assegura a inviolabilidade de do direito à crença e garante o livre exercício de cultos religiosos, temos que o constituinte quis não apenas salvaguardar a liberdade religiosa como impedir embaraços, inclusive financeiros, ao funcionamento dos templos.

Há inclusive um debate jurídico que diferencia imunidade e isenção de impostos no caso de templos religiosos. Vejam: o artigo 5º, VI, que é cláusula pétrea, assegura o direito à crença e o artigo 150, VI, b, impede todas as esferas de governo de lhe cobrarem impostos, tratando-se de imunidade e não isenção ocasional. Pode-se discordar, mas o constituinte de um lado garantiu o direito e, do outro, forneceu os meios materiais para seu exercício.

Nota-se na imensa maioria das mensagens um incômodo especial com o benefício às religiões neopentecostais. É sabido por todos que há charlatães que se utilizam da fé alheia para influenciar na política e até mesmo para amealhar fortunas. Tais práticas são repugnantes e condenáveis, mas já existem no ordenamento jurídico brasileiro as formas de punição aos malfeitos. Esse não era o debate daquela emenda.

Por outro lado, gostaria mesmo de chamar atenção a um mal disfarçado preconceito de certas parcelas progressistas, em tese mais politizadas e engajadas, contra os evangélicos. Trata-se de parcela crescente de nosso povo, que, por flagelos diversos ou opção mesmo, encontra nas igrejas algum tipo de acolhimento.

Já houve tempo em que esse papel era exercido principalmente pela igreja católica, por clubes de mães, associações de moradores, sindicatos. Foi um momento de avanço das lutas populares e democráticas que, infelizmente, não se verifica na conjuntura atual. Mas as pessoas continuam sofrendo e procurando um bálsamo naquilo que lhes resta.

Cabe aqui dizer que existem milhares de denominações religiosas, pequenas, médias e grandes, espalhadas pelo Brasil, em particular em locais carentes. É de uma profunda insensatez fazer tábula rasa de todas e colocá-las, em bloco, como inimigas do povo. É tudo o que Bolsonaro e os certos líderes desejam.

Além disso, é um preconceito demofóbico terrível, é desconhecer a realidade sofrida de nosso povo e fechar os olhos para as aceleradas mudanças no perfil da população. É profundamente antimarxista: negar a realidade para repudiá-la e não conhecer para transformá-la.

Vale ainda lembrar que todos os cultos estão inclusos nos artigos 5º e 150º da Constituição, de maneira que também estão albergados aqui os templos de matriz africana, tão violentados nos dias de hoje, as igrejas católica, ortodoxa e toda a sorte de manifestações religiosas que o sincrético Brasil felizmente acolhe.

Finalizo voltando ao início do artigo. A essência da democracia é o livre debate, o pensamento crítico, a troca, por vezes até acalorada, de opiniões. O que extrapola é falsear narrativas, distorcer os fatos e estigmatizar condutas para obter dividendos políticos. Mentira não é de esquerda ou de direita, é só mentira.

Orlando Silva é deputado federal pelo PCdoB-SP

Redação

3 Comentários

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  1. Prezado deputado.
    É jabuti sim. Causa espanto o senhor não analisar a redação final do art. 9 e parágrafo único do projeto de lei.
    Lá fala expressamente em nulidade de autuações da receita federal por contribuição sobre lucros. Se há lucro a atividade é empresarial. Uma coisa é a imunidade ou mesmo isenção para as “igrejas” consoante a atividade religiosa. Outra bem diferente é a “igreja” atuando com empresa em atividades não ligadas aos seus cultos religiosos, ou seja, explorando o atividade mercantil em homenagem ao Deus Mercado.
    Estude mais, abraço.

  2. Seria bom também que o texto da lei deixasse muito claro o que se entende por igreja e seus bens. Hoje em dia, talvez por ter uma definição clara muitos charlatães agasalha como da igreja os mais variados tipos de bens, como mansões, helicopteros, iates, redes de rádio e televisões, gráficas, escolas e hospitais.
    Seria bom que a lei determinasse quantas propriedades de cada tipo cada religião deve possuir sem pagar impostos, passando a pagar sobre o restante.

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