Pandemia do coronavírus também gerou explosão de mortes em casa

Fenômeno tem se repetido em outros países e regiões cujos sistemas de saúde têm sido duramente atingidos pelo novo coronavírus

Foto: INGRID ANNE/BBC

Jornal GGN – O avanço do coronavírus no Brasil provocou um fenômeno em que mais pessoas estão morrendo em suas próprias casas. As razões para isso são várias, desde doenças não relacionadas ao Covid-19, mas sem espaço para tratamento em hospitais, pessoas com Covid-19 ou outras doenças que temem a hospitalização e casos que foram enviados para tratamento em casa, e que avançaram repentinamente para quadro grave.

“No momento, é difícil determinar com certeza, mas é provável que essas coisas estejam acontecendo juntas”, afirmou o estatístico do Departamento de Ciências de Cuidados Primários da Universidade de Oxford, Jason Oke, à BBC Brasil. “Ainda não temos dados completos, e não é que as pessoas estejam sendo impedidas de ir ao médico, mas há menos exames de câncer e menos cirurgias sendo feitos, e há evidências também de que as pessoas estão fazendo menos consultas e evitando ir aos hospitais”, contou.

Leia a reportagem completa da BBC Brasil abaixo:

Coronavírus: O que está por trás da ‘explosão’ de mortes em casa em meio à pandemia de covid-19

Por Paula Adamo Idoeta

Em um único plantão, uma médica do Samu (Serviço do Atendimento Móvel de Urgência) em Manaus chegou a atestar cinco mortes por covid-19 de pessoas que morreram em suas próprias casas.

“Era muita coisa. Antes disso, eu não costumava constatar nenhum óbito (doméstico) no meu plantão”, conta a médica, que pediu para não ser identificada. “Em geral eram pessoas idosas, de 70, 80 anos. Esperavam em casa mesmo, porque sabiam que não iam ter assistência nos hospitais (superlotados). Tentavam no limite tudo o que podiam em casa.”

Enquanto a situação é dramática em boa parte da rede de saúde brasileira em meio à pandemia, há pacientes como esses, em estado grave, que nem estão tendo a chance de receber atendimento médico: estão morrendo fora dos hospitais, muitas vezes de uma piora rápida e inesperada da covid-19 ou com medo de ir ao médico e pegar a doença.

No Brasil, as mortes em casa totalizaram 27,2 mil entre 16 de março e 30 de abril. Isso representa um aumento de 10,4% em relação ao mesmo período no ano passado, segundo dados divulgados em 7 de maio pelos cartórios no Portal da Transparência do Registro Civil.

Em alguns Estados esse aumento foi muito maior: o Amazonas teve 149%, o Rio de Janeiro, 40% a mais e São Paulo, 14,5%.

É um fenômeno que tem se repetido em outros países e regiões cujos sistemas de saúde têm sido duramente atingidos pelo novo coronavírus. No Reino Unido, um levantamento recente do jornal The Guardian identificou cerca de 8.000 mortes domiciliares a mais durante a pandemia do que no mesmo período de anos anteriores.

Nos EUA, o país com o maior número de casos e mortes de covid-19 no mundo, também há preocupações com um aumento expressivo de mortes fora de hospitais. Em abril, um levantamento feito na cidade de Nova York apontou que o número de moradores morrendo em casa subiu para 200 por dia. Antes da pandemia, eram 20 a 25 por dia.

Lá, também, aumentou o temor das pessoas em procurar médicos e hospitais. Em abril, uma pesquisa do Colégio Americano de Médicos Emergenciais apontou que quase um terço dos adultos ativamente adiaram ou evitaram buscar atenção médica, com medo de se exporem ao coronavírus.

Quatro causas prováveis

Desse total, segundo as certidões de óbito, 80% das pessoas morreram de problemas não relacionados à covid-19. Isso parece ser um indicativo de que pacientes com outras enfermidades graves podem estar tendo menos acesso a tratamentos, uma vez que quase todo o sistema de saúde está voltado ao controle da pandemia.

Para Jason Oke, estatístico do Departamento de Ciências de Cuidados Primários da Universidade de Oxford, no Reino Unido, a ausência de detalhamento dos dados até agora dificulta explicações definitivas sobre o aumento das mortes domésticas. Mas ele aponta três causas prováveis e simultâneas:

  • Pacientes com covid-19 com quadro moderado, mas que pioraram repentinamente;
  • Pacientes com doenças terminais que provavelmente morreriam em hospitais mas, em meio à pandemia, acabam temendo a hospitalização e ficam em casa;
  • Pacientes com outros problemas médicos, desde sinais de mal-estar que podem ser de um infarto até um AVC, por exemplo. Com medo de se infectar, esses pacientes estão evitando buscar atendimento médico e perdendo acesso adequado ao serviço de saúde.

Nesse último caso, os pacientes podem acabar morrendo não por causa do coronavírus em si, mas como um efeito colateral da pandemia.

“No momento, é difícil determinar com certeza, mas é provável que essas três coisas estejam acontecendo juntas”, diz Oke à BBC News Brasil. “Ainda não temos dados completos, e não é que as pessoas estejam sendo impedidas de ir ao médico, mas há menos exames de câncer e menos cirurgias sendo feitos, e há evidências também de que as pessoas estão fazendo menos consultas e evitando ir aos hospitais.”

Mortes em casa

Comparação entre os períodos de 16 de março a 30 de abril de 2019 e 2020

Ente Aumento (em %)
Amazonas 149
Rio de Janeiro 40,6
Distrito Federal 31,1
Paraná 21,8
Pernambuco 20,3
São Paulo 14,5
Fonte: Portal da Transparência dos Cartórios

A essas hipóteses o epidemiologista Paulo Lotufo, professor de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da USP, soma os estragos que o novo coronavírus pode causar no corpo, e que, em alguns casos, vão muito além do quadro gripal ou do comprometimento pulmonar.

“A gente inicialmente achava que o vírus causasse só uma gripe ou, nos casos mais graves, uma pneumonia. Mas não é só isso. O vírus atua também no sistema circulatório, elevando o risco de uma morte súbita em casa por doenças cardíacas”, explica o médico.

Outro efeito “terrível”, diz Lotufo, é que há casos em que o vírus “atua no sistema nervoso central, fazendo com que o cérebro deixe de identificar a baixa oxigenação do pulmão. Alguns pacientes relatam uma sensação de bem-estar (respiratório) mesmo estando péssimos. Chegam no hospital com oxigenação muito baixa, quadro em que normalmente estariam em coma, mas chegam conversando”.

Continue a leitura na BBC News.

 

Redação

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