A minha Semana de 22, por Luis Nassif

Mas a grande memória de 22 foi Villa Lobos, o gigante Villa, o gênio Villa.

Vocês não sabem o que foram os 50 anos da Semana de 22, em 1972. As comemorações começaram alguns anos antes, quando os Tropicalistas redescobriram Oswald de Andrade e a Semana. Ninguém passou incólume por essa releitura, nem Chico Buarque – com sua peça “Roda Viva”, nem os Tropicalistas com suas loucuras libertárias.

Havia uma desencanto total com a política, devido ao golpe militar. Numa ponta, os militares pretendiam impor a disciplina em todos os cantos, até nos carnavais cariocas. A reação de uma juventude sem rumo foi acabar com todas as restrições.

Na música, significou escapar da armadilha da música tonal, de duas partes, com sequências harmônicas previsíveis. Lá em São João Da Boa Vista e Poços de Caldas recebemos o impacto da nova música. Esquecemos as modinhas e passamos a ensaiar uma miscelânea de ritmos e de temas. Uma de minhas músicas – que acabou vencendo uma eliminatória da Feira Permanente da Música Popular, da TV Tupi – misturava abertura (com gravação da Cavalgada das Valquírias, de Wagner), marcha rancho, marcha batida.

A Tropicália acabava com a era das correntes musicais, a Velha Guarda, a Jovem Guarda, a bossa-nova, a MPB, tudo devidamente rotulado. Caetano Velloso se tornava o guru da nova era, como seu ídolo João Gilberto no início dos anos 50. Músicas tidas como bregas, Vicente Celestino, Peninha, tudo era misturado no liquidificador de Caetano, assim como a batida de João Gilberto abrigara Wilson Batista, Geraldo Pereira e Caymmi.

Oswald e Mário de Andrade eram nossos ídolos absolutos. No caso de Oswald, por um detalhe, seu casamento com a musa Pagu – que tinha sido amiga de juventude de uma tia minha, que morreu muito jovem.

Havia uma disputa intelectual. De minha parte, torcia para Mário e suas pesquisas fenomenais; outros colegas eram apaixonados por Oswald.

Em 1972, repórter da Veja, fui encarregado de uma reportagem sobre a Semana. Indignei-me ao saber o que meu ex-ídolo Monteiro Lobato fez com a pintura de Anita Malfati através das páginas do Estadão. Mas, para fugir do banal, busquei ajuda com o professor Antônio Cândido, que me indicou um personagem pouco conhecido, um velho jornalista que participou da Semana. Consegui localizá-lo, morando em um apartamento na avenida Rebouças. O motivo para ter sido convidado para o evento – segundo me confessou – foi apenas uma poesia com rimas brancas, uma das poucas que produziu.

Mas a grande memória de 22 foi Villa Lobos, o gigante Villa, o gênio Villa.

Sempre me incomodava a maneira como os paulistas da cena erudita tratavam Villa. Fazendo ECA (Escola de Comunicações e Artes) da Universidade de São Paulo, de vez em quando ouvia alguém falar do pouco apuro técnico de Villa, de suas peças imperfeitas, comparadas com as sinfonias de Camargo Guarnieri. Muitas décadas depois, entrevistei a viúva de Camargo Guarnieri e indaguei o que ele achava da comparação. E ela: achava ridículo! Dizia que Villa Lobos era gênio.

Anos depois da Semana, foi criado um bar em São Paulo, de nome 22 – em homenagem à Semana. E o dono Percival Maricatto teve a ideia de montar uma foto imitando a foto clássica de 22.

Vocês não imaginam o trabalho que deu.

Primeiro, encontrar roupas da época. Achamos as roupas, mas não previmos a enorme quantidade de pulgas que vieram juntas. Depois, definir os personagens. Nem me lembro que personagem eu vivi. Só sei que o Rui Castro, dono de um ego algo inflado, não aceitou o personagem que lhe destinaram. Fazia questão absoluta de ser Oswald de Andrade, não apenas pela dimensão do poeta, mas porque estava no primeiro plano da foto. Oswald era o modelo para Rui, que, nas fotos, imitava seu jeito de sorrir com sarcasmo.

Foi uma trabalheira danada, que custou várias noites. Decidiu-se por uma votação. Rui listou uma série de argumentos em favor da sua candidatura, como o seu brilho intelectual, seu charme. Mas a maioria julgou que Alfredão Nastari – na época diagramador da Veja – tinha o atributo essencial: era o mais parecido com Oswald.

Nem sei por onde anda a foto. Mas me lembro que o Brasil daqueles tempos era menos complicado.

Luis Nassif

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  1. 1.a República. República Paulista. Cabeça antes de metamorfoseramos em rabo a partir da Ditadura Absolutista Caudilhista Assassina Esquerdopata Fascista de 1930. Olhem o nível intelectual representado apenas pelas Mulheres desta época? O Revisionismo Histórico dos Lacaios da NecroPolitica pós 1930 como USP, Unvs. Federais, OAB, MEC,…O Brasil que esta sendo reconstruido a partir de 2018 é este de gigantesca capacidade intelectual como já foi a Vanguarda e Porto Seguro da Humanidade para onde vinham deseperados, miseráveis, desempregados, perseguidos da Alemanha, França, EUA, Japão, Italia, Ucrania, Polônia, Judeus, China, Russia,… ou seja de todo Terceiro Mundo buscando a Nação de SantosDumont, Carlos Chagas, André Rebouças, Osvaldo Cruz, Adolfo Lutz, Vital Brasil, Machado de Assis, Emilio Ribas, Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Carlos Gomes, Villa Lobos … Cabeça do Mundo antes de metamorfosearmos em rabo a partir de 1930 com Ditadura Caudilhista Absolutista Assassina Esquerdopata Fascista entre Nazistas como Dutra ou Getulio Vargas, Nepotismo Canalha de Familiares como Tancredo Neves, Jango, Alzira/Ivete Vargas, Leonel Brizola, Lacaios entre JK, Itamar Franco, PTB, PDT, Eugênio Gudin, Chateaubriand e Assassinos e Torturadores como Filinto Muller, Gregório Fortunato, Alcino João do Nascimento, Tenório Cavalcanti,…O Brasil que reconstruimos a partir de 2018, já fomos até 1930. A Semana de Arte Moderna, o Teatro Municipal no Centro de São Paulo, as criticas de outro Gigante como Monteiro Lobato mostram o quanto.

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