Ai Philomena, se eu fosse como tu… por Luciano Hortencio

Ai Philomena, se eu fosse como tu…

por Luciano Hortencio

BAHIANO, Manuel Pedro dos Santos, nascido em Santo Amaro da Purificação, interpreta AI PHILOMENA, Canção italiana, denominada VIVA GARIBALDI, com adaptação de J. Carvalho Bulhões.

Gravação de 1915.

Disco original Odeon/Casa Edison número 120988. Com o fim do mandato presidencial do marechal Hermes da Fonseca, apelidado pelo povo de “seu Dudu”, surgiram sátiras a sua fama de agourento, como esta aqui. A letra se refere a um sarau no Palácio do Catete, em 1914, quando a primeira dama Nair de Tefé tocou ao violão o “Corta-jaca”, de Chiquinha Gonzaga, causando grande escândalo e protesto até mesmo de Ruy Barbosa, na tribuna do Senado. Samuel Machado Filho.

Trata-se de uma adaptação da popularíssima polca “Uma canção italiana”, parodiada a torto e a direito no Brasil — a mais famosa talvez tenha sido a cantiga de roda “Viva Garibaldi”. No caso de “Ai, Philomena”, composta para a peça de teatro-revista do mesmo nome, brinca-se com o marechal Hermes da Fonseca, presidente da República de 1910 a 1914, que acabara de deixar o governo.

Alguns esclarecimentos:

1) Dudu era o apelido do marechal, dono de reluzente careca;

2) Hermes da Fonseca era tido como um grande pé-frio. Mal assumiu o governo, estourou a Revolta da Chibata (ver “Os reclamantes”); sua primeira mulher, Orsina, morreu no início do mandato; e, enquanto era presidente, o Brasil perdeu a soma de 2,4 milhões de libras depositada num banco russo, que quebrou;

3) A segunda mulher do marechal, Nair de Teffé, que fazia caricaturas sob o pseudônimo de Rian, era muito avançada para a época. Por isso, vivia na mira dos conservadores. Durante um sarau, ao tocar ao violão o maxixe “Corta-Jaca”, tido como lascivo pelos caretas da época, escandalizou a elite carioca;

4) O marechal foi o primeiro presidente a viver no Palácio Guanabara, embora mantivesse o Catete para os despachos políticos e administrativos. Daí a referência à casa que ganhou com os “cobres do Tesouro”;

5) Não está claro quem seria o “Rainha”, que no Senado só dizia “muito bem” ao presidente, mas provavelmente trata-se do senador gaúcho Pinheiro Machado, homem forte da República na época e eminência parda do governo Hermes da Fonseca (ver “No bico da chaleira”).

 

“A minha sogra

Morreu em Caxambu

Com a tal urucubaca

Que lhe deu o seu Dudu.

 

Ai, Philomena,

Se eu fosse como tu

Tirava a urucubaca

Da careca (cabeça) do Dudu.

 

Dudu quando casou

Quase que levou a breca

Por causa da urucubaca

Que ele tinha na careca.

 

Ai, Philomena …

 

Na careca do Dudu

Já trepou uma macaca

E por isso coitadinho

É que tem urucubaca

 

Ai, Philomena …

 

Dudu tem uma casa

E com chave de ouro

Quem lhe deu foi o Conde

Com os cobres do Tesouro

 

Ai, Philomena …

 

Se o Dudu sai a cavalo

O cavalo logo empaca

Só começa a andar

Ao ouvir o “corta-jaca”

 

Ai, Philomena …

 

Dudu tem uma casa

Que nada lhe custou

Porque nesse “presente”

Foi o povo quem “marchou”

 

Ai, Philomena …

 

Mas a Rainha

Cavou o seu também

Dizendo no Senado

Tão somente “muito bem”

 

Ai, Philomena …

 

Eu me arrependo

De ter ido ao Caju

E não ter vaiado

A saída do Dudu”

 

Ai, Philomena …”

Contribuição de Josimar Alves Bezerra.

 

 

 

Luciano Hortencio

Música e literatura fazem parte do meu dia a dia.

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  • Mas quando chegar a hora, nos não vamos deixar passar a nossa vaia ao bozo idiotizado. Através da descrição percebe-se que Hermes da Fonseca era muito mais avançado, que o atual bozo na presidência. Dificil competir nesse nivel. E a Tefé tocou violão e deixou Rui Barbosa indignado. E pode mulher tocar alguma coisa? E as mulheres tocaram suas vidas. Agora cem anos depois, querem que a mulher seja apenas recatada, do lar e se vista de rosa. Ai, Philomena!

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