Por Walnice Nogueira Galvão*
Para Mário de Andrade, professor de piano, estética e história da música no Conservatório Dramático e Musical, essa arte vinha em lugar de honra, a par com a literatura. Sabemos o quanto se bateu pela criação de uma música brasileira moderna.
Hoje em dia, estão aí as escolas de música, tantas e de tão alta qualidade, pelo Brasil afora. Ao todo, 116 faculdades de ensino superior oferecem cursos de música, segundo informa o MEC.
Lembramos ainda as Ongs e outras agremiações dedicadas à vertente popular tradicional, marcando presença não só na musicologia como na etnomusicologia. Veremos a seguir como atuam os profissionais nesses três tipos de instituição: centros de pesquisa, Universidades e Ongs.
Começando pelos centros de pesquisa, é exemplar o percurso da musicóloga Flávia Camargo Toni no Instituto de Estudos Brasileiros da USP, guardião da maior concentração de acervos sobre o modernismo.
Flávia cuida do Fundo Mário de Andrade, completando ou editando vários livros de Mário, pondo em ordem as partituras e os Programas Musicais que ele colecionava, decifrando as anotações nas capas de seus discos. Também organizou o acervo da Missão de Pesquisas Folclóricas que Mário, quando no Departamento de Cultura, enviara ao Nordeste e Norte.
A obra de Flávia é vasta e impecável, sendo que boa parte pode ser lida em pdf. Recentemente capitaneou o resgate da música das noitadas modernistas do Theatro Municipal em 1922. O título dos 4 CDs e catálogo com estudos é: Toda Semana: Música e literatura na Semana de Arte Moderna – selo Sesc.
Passando à Universidade, o exemplo é Carlos Sandroni, que integra o Departamento de Música da Universidade Federal de Pernambuco. Ali desenvolveu pesquisas, ampliando o interesse pela disciplina enquanto ia orientando dissertações de mestrado e teses de doutoramento. Escreveria inúmeros artigos e livros, e faria frequentes participações em congressos, dentro e fora do Brasil. Etnomusicólogo, dedicou-se particularmente às proezas e teorias de Mário, mas também à produção popular da região.
Devemos a ele um inestimável estudo sobre o desenvolvimento e institucionalização da etnomusicologia em nosso país. O estudo mostra como a área foi-se expandindo a partir do início dos anos 80, localizando seus principais focos. Uma tal dinâmica levaria à fundação em 2002 da Associação Brasileira de Etnomusicologia (ABET), da qual Sandroni foi o primeiro presidente, e de sua revista Música e cultura.
Novo documentário do Jornal GGN denuncia ameaça de golpe eleitoral de Bolsonaro e os esquemas da ultradireita mundial. Apoie o lançamento: WWW.CATARSE.ME/XADREZ-ULTRADIREITA
Se voltamos nossa atenção para as Ongs, encontramos na Associação Cultural Cachuêra!, comandada por Paulo Dias, as sondagens e a difusão dos folguedos tradicionais.
Devemos à Associação um arquivo de som e imagem, que já é notável mas não cessa de crescer, bem como um estúdio de gravação de última geração, que atende a outros músicos. Fez programas para a Rádio USP e para a Rádio Cultura. Gravou em campo os 6 CDs da Coleção Documentos SonorosBrasileiros, de música tradicional do Sul e Sudeste. E mais vários outros CDs e DVDs com registro de brincadeiras como o jongo e o batuque de umbigada, ou o Lambe Sujo de Sergipe.
Cachuera! editou livros atraentes, ilustrados com desenhos originais coloridos, trazendo fotografias dos folguedeiros e minibiografias feitas a partir de depoimentos deles próprios.
Para conhecer melhor seus feitos ao nível da reflexão teórica, podemos recorrer a alguns eruditos artigos, pinçados de uma produção mais vasta, assinados por Paulo Dias. Seu complexo percurso é esclarecido em duas entrevistas (“Grupo Cachuera!” e “Batuqueiro de informação”, em pdf), mostrando como procura integrar anos de estudo de piano clássico em Paris a seu amor à percussão. Para ele, que maneja com perícia seus instrumentos, oblitera-se a contradição entre erudito e popular.
Como podemos verificar neste rápido informe, são ricos em diversidade, e convergentes no saber que investigam, tanto os centros de pesquisa quanto a Universidade e as Ongs. Já possuímos um tesouro, vivo e variado, neste campo artístico em pleno desenvolvimento.
*Walnice Nogueira Galvão é Professora Emérita da FFLCH-USP
O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem um ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.