Augusto Cesar Barreto Rocha
Augusto César Barreto Rocha é Professor Associado da UFAM. Possui Doutorado em Engenharia de Transportes pela UFRJ (2009), mestrado em Engenharia de Produção pela UFSC (2002), especialização em Gestão da Inovação pela Universidade de Santiago de Compostela-Espanha (2000) e graduação em Processamento de Dados pela UFAM (1998).

Enquadrando os debates sobre a Amazônia: beneficiários e perdedores, por Augusto Rocha

Quando se olhou para a seca nos dois últimos anos, a questão crucial é se teria eletroeletrônico em tempo para a Black-Friday.

Enquadrando os debates sobre a Amazônia: beneficiários e perdedores

por Augusto Cesar Barreto Rocha

               Os debates sobre a Amazônia seguem sendo enquadrados sob uma ótica de ocupação. Não se faz conta, não se faz análise em profundidade. Ignoram-se as pessoas, o meio-ambiente, os sistemas econômicos existentes e tudo o mais que há na região. As análises do Governo Federal, da mídia “nacional” olham apenas sob a perspectiva central. São raríssimos os momentos em que isso não acontece.

               A forma é tudo. A mensagem que se passa é valiosa. Afinal, quem não quer “explorar as riquezas”? Pouco ou nada se fala de passivo. Fala-se apenas do ativo e do ganho. As perdas viram genéricas sobre o “risco”, “meio-ambiente” e são tipicamente depreciativas, questionando a necessidade de pensar neste detalhe. Onde estão os contrastes entre ganhos e perdas? Em discussões sobre perdas, apenas os opositores são mencionados com nomes genéricos, sem a apresentação de seus argumentos. Não há um contraste de ideias, apenas de princípios, com uma vantagem recorrente para o capital, independentemente de quem o defenda.

               Quando participo de discussões sobre a infraestrutura para o Amazonas, o que acontece é um olhar de prioridade para outra região e não para a Amazônia. Da mesma maneira quando se discute o petróleo na costa do Amapá. A questão é sempre o que o outro ganha. Por exemplo, toda a discussão sobre dragagem na região da Foz do Madeira não é para o interesse central do Amazonas, mas sim para a garantia do escoamento da soja nacional para a exportação. A questão recorrente, que permanece no cerne das preocupações nacionais, é como melhorar a exportação dos nossos produtos agrícolas.

               Simplesmente está fora da pauta a questão do problema da indústria do Amazonas ou do comércio da cidade de Manaus. Pessoas? Nem pensar. Quando se olhou para a seca nos dois últimos anos, a questão crucial é se teria eletroeletrônico em tempo para a Black-Friday. Não havia, nem há hoje, preocupação e ação claramente voltadas para a correção dos problemas de infraestrutura de Manaus. Por isso seguimos numa conversa sem fim no assunto da BR-319. O centro do problema não é o meio-ambiente, mas quem vai se beneficiar.

               Há um enquadramento alternativo que proponho: vamos olhar quem são os beneficiários e quem são os perdedores de cada um dos projetos de infraestrutura ou grande porte na Amazônia. Quando estes beneficiários estiverem primariamente na região, a sua realização será desafiante ao extremo, tendo como consequência não fazer nada. Quando os benefícios forem para outros lugares do mundo, será observável a sua realização, sem muitas compensações.

               Neste texto não explorarei o caminho para a mudança de cenário. Se o leitor conseguir começar a interpretar o enquadramento da Amazônia e das grandes questões de infraestrutura debatidas desta forma, teremos o objetivo alcançado. Isso talvez te faça repensar a questão da BR-319, das concessões de estradas e rios, do escoamento da soja ou da extração de petróleo. Olhar quem ganha, quem perde, quem se beneficia e demandar esta informação claramente pode ser transformador.

Nas análises de projetos na Amazônia, os maiores beneficiários estão fora da região. O consenso é que os projetos não avancem ou enfrentem forte oposição, exceto quando os benefícios são externos. Vale lembrar que o Amazonas destina 17% do PIB para impostos, acima da média nacional de 15%, e as desigualdades regionais permanecem sem solução.

Augusto Cesar Barreto Rocha – Professor da UFAM.

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