Os dez anos da Lei de Responsabilidade Fiscal

Coluna Econômica – 05/05/2010

Os dez anos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) merecem comemoração mas também uma reflexão sobre seus resultados.

A transição do regime militar para a democracia colocou à mostra a fragilidade fiscal do país. Não havia consolidação de contas públicas. Orçamento federal, Previdência e estatais tinham, cada qual, uma contabilidade separada.

Havia ralos enormes por onde se esvaía o dinheiro público, como a conta movimento do Banco do Brasil. O BB podia emprestar o que quisesse, sacando da conta, que o Tesouro cobria.

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A estabilidade fiscal foi conquistada gradativamente. Ainda na gestão Dilson Funaro, na Fazenda, com o fim da conta movimento e a criação da Secretaria do Tesouro. Depois, com a introdução gradativa dos Planos Plurianuais (PPAs) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), um definindo programas de longo prazo, outro definindo os gastos do orçamento seguinte, em cima das diretrizes dos PPAs.

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A LRF consolidou um conjunto de princípios e de limites de endividamento dos três entes federativos – União, Estados e Municípios. Definiu regras rígidas, previu restrições – mas não punições – a quem a desobedecesse.

Mas, construída em um período em que o Banco Central reinava absoluto, deixou de fora o principal fator de despesa pública dos últimos 15 anos: os gastos do BC com a política monetária, de juros escorchantes.

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No primeiro governo FHC, o BC praticamente quebrou o país, com o nível de juros praticados. Não sofreu qualquer restrição para definir limites de juros. O conceito de superávit primário fez com que toda fiscalização da União se desse cima das despesas primárias – com pessoal, Previdência, gastos sociais. O BC podia criar o rombo que quisesse em uma ponta.

Esse modelo persiste até hoje. E, pelo menos até quatro anos atrás, persistia o enorme anacronismo de se cortar despesas na boca do caixa. O orçamento definia um conjunto de programas. Ministérios, estatais, estados e municípios não podiam planejar suas despesas pois, no meio do caminho, estavam sujeitas a um contingenciamento fiscal, decidido arbitrariamente pela STN.

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O setor público aprendeu a economizar da forma mais porca possível. Obras interrompidas, devido ao contingenciamento de recursos, acabavam saindo muito mais caras do que se tivessem chegado ao final.

Boas idéias de organização do orçamento – como o Avança Brasil – acabaram fracassando devido à inércia em se corrigir irracionalidades ampla.

Criou-se o pior dos mundos, com o mito da lição de casa. Se o país economizasse para pagar os juros da dívida, pouco importando a maneira como se daria essa economia, se cortando programas essenciais, se suspendendo a execução de obras de infra-estrutura, o desenvolvimento se faria como em um passe de mágica.

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Apenas no final da gestão Antonio Palocci, na Fazenda, essa inércia foi rompida, quando a Casa Civil conseguiu demonstrar ao presidente da República a irracionalidade do modelo. Foi quando se decidiu pelas PPIs, obras que ficariam à salvo do contingenciamento e da contabilização tradicional de despesa pública.

Luis Nassif

3 Comentários

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  1. COMENTÁRIO

    Prezado Nassif

    Causa decepção a sua defesa constante do modo PT de governar que, convenhamos, não preza nem pela ética, nem pela decência no trato da coisa pública e faz do projeto de permanencia no poder o seu objetivo principal pouco se importando com o Breasil.

    A Lei de Responsabilidade Fiscal é um instrumento de regulação em todos os níveis de gestores da coisa pública – municipal, estadual e federal. 

    Você sabe muito bem que nossos gestores políticos, de um modo geral, não tendo um instrumento de controle promovem gastos absurdos seja com contratações de pessoal (vide folha de pagamento das prefeituras) seja aportando dinheiro para ONGs, esquecendo-se das aplicações em educação e saúde. 

    O contigenciamento de recursos é necessário. 

    E o que a presidente propos foi realmente uma forma de se livrar de uma situação difícil pois tendo gasto muito mais do que poderia ou havia se comprometido, resolveu mudar a regra do jogo com a conivência e vassalagem da base aliada, comprada explicitamente no Diário Oficial. 

    Um abraço

  2. nao estou entendendo

    nao entendo muito de lei….mais gostaria de entender se a lei de responsabilidade fiscal tem apenas 10 anos…..como se pode falar que gosvernos anteriores a essa data fizeram isso?  acho meio errado condenar alguem mesmo se no tempo nao tinha nenhuma lei  que falar que era crime

  3. O Problema é que esse

    O Problema é que esse “instrumento de regulação em todos os níveis de gestores” funciona mais como condicionante de endividamento perpétuo do que de controle e regulação.

    Paradoxalmente, o gestor não pode gastar mais em saúde,educação, ou o que quer que seja…

    mas pode se endividar ainda mais, todavia, esse endividamento é alvo constante de especulação financeira, sem nenhum impedimento. A Lei deveria prever dispositivos claros de controle financeiro.

    Por exemplo no fanigerado “Swap cambial” é um segmento completamente desregulado onde especuladores financeiros externos e os bancos externos auferem “lucros” bilionários. A taxa de juros exorbitante para novos endividamentos em conjunto com que essa política cambial faz com que a Lei de Responsabilidade fiscal seja propulsor do “predatismo financeiro” e constritor de investimentos reais em saúde,educação, tecnologia, etc…

     

    Essa Lei precisa ser revista URGENTEMENTE !

     

     

     

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