Sem medidas ousadas, ficamos reféns do mercado e condenados a um crescimento pífio, diz Juliane Furno

Carla Castanho
Carla Castanho é repórter no Jornal GGN e produtora no canal TVGGN

Economista do BNDES e professora da UERJ, Juliane defende imposto de exportação e ajustes na política de juros

E,m entrevista à TV GGN, a economista do BNDES e professora da UERJ, Juliane Furno. Foto: reprodução/TV GGN

O Brasil voltou a crescer, impulsionado pela geração de empregos e pelo aumento da renda média, com o consumo das famílias como motor central dessa recuperação. No entanto, a política monetária do Banco Central apresenta desafios ao avanço econômico, embora haja confiança de que ajustes adequados – desde que sejam feitos – possam garantir a continuidade desse crescimento, permitindo à economia se consolidar de maneira equilibrada e sustentável nos próximos anos.

“A profecia de que o aperto monetário vai desacelerar a economia em 2025 pode acabar se concretizando”, alerta a economista do BNDES e professora da UERJ, Juliane Furno, em entrevista à TV GGN, na última sexta-feira (07/03) [confira a entrevista completa abaixo].

“Se não propusermos medidas ousadas – como taxação de exportação e ajustes na política de juros –, ficamos reféns do mercado financeiro e condenamos o Brasil a um crescimento pífio”.

Furno aborda o dilema que coloca o Brasil em uma situação vulnerável diante das decisões sobre a taxa de juros. Apesar da crença de que a taxa básica de juros responde apenas a uma lógica de mercado, há um forte componente político na sua definição. “Muita gente acredita que a Selic segue apenas uma equação técnica, mas basta lembrar do governo Bolsonaro, quando os juros foram drasticamente reduzidos. Isso teve um efeito paradoxal: se mal calibrados, juros baixos podem levar à desvalorização cambial e à alta da inflação – que pesa muito mais sobre os mais pobres”, analisa.

A armadilha dos juros e do câmbio

Para a economista, que recentemente lançou o livro “Economia para transformação social: pequeno manual para mudar o mundo”, em parceria com o professor da Unicamp Pedro Rossi, há espaço para redução dos juros sem comprometer a estabilidade do país. “A inflação atual não é puxada pelo consumo, mas por fatores cambiais e estruturais“.

Enquanto o Banco Central mantém a Selic elevada para evitar a fuga de capitais e segurar o câmbio, argumenta que o aquecimento do mercado de trabalho representa um risco inflacionário – uma visão que não se sustenta, explica Juliane Furno.

“O Brasil não tem uma moeda forte no cenário global e, por isso, precisa oferecer juros mais altos do que os Estados Unidos para atrair capital estrangeiro. Mas esse modelo gera um efeito perverso: quanto mais altos os juros, mais difícil a recuperação da economia real”, ilustra a economista.

Alimentos caros e exportação desenfreada

A inflação também é pressionada por outro fator: a priorização das exportações pelo agronegócio. “Com o real desvalorizado e os preços das commodities em alta, a produção agrícola brasileira escoa para o exterior, reduzindo a oferta interna e encarecendo os alimentos no mercado doméstico”, analisa.

Uma alternativa seria a taxação das exportações em momentos de alta excepcional dos preços globais – prática comum em diversos países. “Aqui, tudo isso virou tabu. Mas o imposto de exportação é uma ferramenta legítima para evitar desabastecimento e garantir preços mais justos internamente”, defende.

A melhora na economia

O crescimento econômico, de 3,4%, anunciado na semana passada pelo IBGE, tem sido impulsionado pelo mercado de trabalho, que fortalece o consumo das famílias – responsável por 65% do PIB. “O crescimento do PIB é explicado, sobretudo, pela melhora no mercado de trabalho. Com mais pessoas empregadas e salários em alta, há uma pressão positiva sobre o consumo, que se espalha para outros setores da economia”, aponta a economista.

O setor de serviços, especialmente informática e telecomunicações, puxou a alta, à luz das mudanças tecnológicas e a demanda por mão de obra qualificada. A indústria também se beneficiou da retomada, especialmente nos setores de construção civil e transformação.

Vale lembrar que nos últimos anos, o Brasil apresentou um crescimento errático, girando em torno de 1,5% ao ano. Desde 2011, a economia brasileira tem oscilado entre ciclos de crescimento modesto e estagnação, sem contar a pandemia e a crise de 2015-2016.

Para um país com tantas carências estruturais, esse patamar de crescimento é insuficiente. “Diferente dos países europeus, que já têm infraestrutura consolidada e um padrão de distribuição de renda mais estruturado, o Brasil ainda precisa expandir o saneamento e gerar empregos de qualidade”, compara a economista.

O cenário para o próximo ano, portanto, ilustra a professora, é de incerteza. “Temos uma economia que finalmente se recuperou, mas, se insistirmos nesse modelo de juros altos, corremos o risco de travar o crescimento novamente”.

Confira a entrevista completa abaixo:

1 Comentário

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  1. Num certo momento havia no País um quadro de necessidade pela baixa quantidade de reservas internacionais, de atrair volumes de dólares para o Brasil. Com uma economia muito mais fragilizada do que hoje, criou-se alguns benefícios para assegurar a permanência desses recursos. Com taxas de inflação não muito diferentes das atuais não existiam pressões cambiais e o real estava até apreciado. O que mudou ao longo do tempo é que o Brasil decepcionou em relação ao que dele se esperava. Que se tornasse um lugar de investimentos aos setores produtivos. Mas quem define isso é o País, os investidores aproveitam oportunidades. O País oferece a segunda maior taxa real de juros atualmente, a inflação estourou a meta superior mesmo estando abaixo de 5 pp ao ano, com todos os esforços o déficit fiscal foi drasticamente reduzido e há muita instabilidade no câmbio. Esse quadro de quase estagnação que sofre o País que mesmo retirando os resultados de 2015/16 e de 2020, teve a mediana de 1,5 pp no resultado do PIB, deixa claro o caminho seguido. Sem crescimento econômico não há esperança. Você pode escolher vários culpados, o governo, teto de gastos, desequilíbrio fiscal, etc, ao fim de tudo o quadro só vai ficar pior.

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