As discussões sobre o auxílio aos bancos e os riscos de crise sistêmica

Em suma, o país dispõe de um conjunto de instrumentos para enfrentar a depressão que se avizinha. Mas não será sob o comando inepto de Paulo Guedes, do presidente do BNDES, Gustavo Montezano, do presidente do Banco do Brasil, o inacreditável Rubens Novaes, que chegará à vitória. Há um exército de técnicos competentes à disposição. Mas não há comando, no momento, capaz de mobilizá-los com eficácia.

Em 2002, véspera das eleições presidenciais, o presidente do Banco Central Armínio Fraga e o diretor de política monetária Luiz Fernando Figueiredo resolveram lançar o sistema de “marcação a mercado” para definir o valor dos fundos de investimento.

Antes, o fundo adquiria um papel pré-fixado. Digamos que a taxa de juros fosse de 10% ao ano. Se fosse de um ano, significaria que pagou 91 pelo papel para receber 100 no final do período. A diferença equivale aos juros do peródo. A marcação era feita incorporando diariamente no valor do papel o juro do dia,

Com a marcação do mercado mudou. O valor do papel passou a ser contabilizado pela negociação diária no mercado. E esse valor passou a variar de acordo com as taxas de juros do mercado.

Volte ao exemplo anterior. Com 10% de juros ao ano, o valor inicial do papel é 90,9 (100 / (1,10). Se a taxa de juros do mercado aumentar para 12% ao ano, por exemplo, o preço do ano cai para 89,3 (100 / 1,12). Ou seja, no caso de títulos públicos pré-fixados, cada vez que a taxa Selic aumenta, cai o preço do papel e vice-versa. E a marcação a mercado obriga todos os fundos, mesmos os que irão levar o papel até o vencimento, a remarcar o valor de suas cotas.

Em 2002, para estimular o mercado a adquirir mais títulos pré-fixados, o BC montou numa operação de colocação de papel cambial – muito procurado por receio da explosão do câmbio — amarrado aos papéis pre-fixados. O mercado comprou parte do pacote, ficou com as cambiais e vendeu as LTNs. O aumento da oferta da LTN derrubou seu preço. Embora fossem operações restritas, pelas regras da marcação a mercado, todas as instituições que detinham LTNs tiveram que remarcar seus papéis, o que provocou uma redução no valor das cotas de muitos fundos e, consequentemente, um início de pânico.

Ocorre algo semelhante agora, mas com papeis de dívida privada, as debêntures. Com investidores querendo resgatar seus papéis, os fundos tiveram que vender LFTs e debêntures no mercado. Os preços caíram e acabaram afetando o patrimônio de todos os fundos e bancos detentores de debêntures.

Este é o ponto central de preocupações do mercado e do Banco Central. Daí a decisão de permitir ao BC a compra de dívida pública e privada.

Aí voltamos ao tema de ontem: como impedir uma crise financeira fatal e, ao mesmo tempo, não deixar acontecer a socialização dos prejuízos do mercado, especialmente em um mercado tão pouco transparente como o de debêntures, na qual cada papel tem que ser avaliado individualmente?

Com todas as dúvidas possíveis sobre o futuro da economia, das empresas, o prazo de recuperação, quem morre, quem vive, manter a marcação a mercado para papéis privados será uma loucura.

Ontem, o GGN organizou um belíssimo debate juntando Monica De Bolle, do Peterson Institute, Fernando Nogueira da Costa, do Instituto de Economia da Unicamp, e Gabriel Galippo, presidente do Banco Fator.

Algumas conclusões foram unânimes:

  1. O governo não tem que estatizar o crédito, mas o consumo. Isto é, garantir renda para toda a população através de programas de apoio aos vulneráveis e desempregados. Mais que nunca, não se pode deixar o consumo cair.
  2. O apoio ao sistema financeiro é imprescindível, mas não se pode abrir mão de contrapartidas. E as contrapartidas são obrigar quem recorrer às linhas de apoio suspender pagamento de dividendos, bônus de diretoria. Mas é pouco.
  3. Ao adquirir títulos privados, o BC estará sujeito a perdas futuras. O ideal seria os controladores aportarem ações em um fundo compensatório e, mais adiante, montar a compensação, cobrindo os prejuízos.
  4. Uma alternativa interessante foi proposta por Fernando. Em vez do BC, o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) adquirir as debêntures através da BNDESPAR, seu fundo de participação. Essas debêntures são conversíveis em ações. No vencimento, se a empresa não tiver condições de honrar os papéis, o banco converte em participação e ajuda na reestruturação da empresa, recuperando o valor investido mais adiante.

Em suma, o país dispõe de um conjunto de instrumentos para enfrentar a depressão que se avizinha. Mas não será sob o comando inepto de Paulo Guedes, do presidente do BNDES, Gustavo Montezano, do presidente do Banco do Brasil, o inacreditável Rubens Novaes, que chegará à vitória. Há um exército de técnicos competentes à disposição. Mas não há comando, no momento, capaz de mobilizá-los com eficácia.

 

 

Luis Nassif

1 Comentário

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  1. Nassif, não me parece justo o BC ter LIBERDADE para comprar títulos q não valem nada com o nosso dinheiro,favorecendo os seu amiguinhos especuladores,a coisa tá muito distorcida!!!

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